sexta-feira, novembro 16, 2012

“privatização” e “concessão”

Portos: mais privatização na infra-estrutura

Mais de 90% do volume das trocas comerciais entram e saem de nosso País por portos. A demanda pela utilização das estruturas do complexo portuário em todo o território nacional tem aumentado. E a diretriz geral do pacote que está por ser anunciado pelo governo aponta para a continuidade da privatização do sistema portuário.
O anúncio oficial do pacote dos portos foi novamente adiado, em razão de algumas divergências entre os diferentes órgãos do governo federal envolvidos na elaboração do projeto. Mas a diretriz geral aponta na direção da continuidade da privatização de nosso sistema portuário. Enfim, tenho a certeza de que, mais uma vez, vai começar todo aquele debate a respeito das diferenças entre “privatização” e “concessão”. É compreensível. Afinal, os que tentam desesperadamente defender o indefensável precisam elaborar melhor seus argumentos e refinar ainda mais sua capacidade retórica. O fato é que conceder a exploração econômica de uma atividade pública ao setor privado é apenas uma das inúmeras formas de se promover a privatização. A venda de uma empresa estatal ao empreendedor capitalista é, com certeza, a modalidade mais carregada de simbolismo. Mas não é a única.
De qualquer maneira, o fato é que o governo da Presidenta Dilma está prestes a concluir a metade de seu mandato e mais uma vez reforça a opção de oferecer ao capital privado a responsabilidade pela gestão e o privilégio de auferir os lucros de um setor estratégico de nossa economia. Muito já se falou a respeito das razões que a teriam levado a trilhar esse caminho. Apesar de todas as indagações a respeito, o fato é que o argumento mais utilizado pelos defensores envergonhados da privatização - a suposta falta de recursos do Estado - não se sustenta. 
Tanto é que todas as operações de concessão realizadas até o momento foram acompanhadas de generosas benesses, como as vultosas somas de recursos financeiros do BNDES e do Tesouro Nacional para auxiliar os grupos privados.
Ora, se o dinheiro existe e está sendo oferecido a custo praticamente zero para os novos empreendedores, a única explicação que sobra é a surrada estória da suposta superioridade da eficiência privada em comparação à ação estatal. Não há dúvida de que a gestão pública em nossas terras precisa (e muito) ser aperfeiçoada e que alguns bons passos têm sido dados nessa direção ao longo dos últimos anos. Porém, o mito da superior capacidade do setor privado em oferecer serviços de melhor de qualidade e menor custo ainda está longe de se demonstrar como fato inquestionável em nossa realidade. Basta ver o que ocorre com os planos privados de saúde, com a qualidade das empresas vendedoras de diploma de ensino superior, com as tarifas e serviços nas áreas de eletricidade, telecomunicações e saneamento, entre tantos outros. Assim, a opção de Dilma é de natureza eminentemente ideológica: a crença equivocada de que o agente privado sempre faz melhor do que o setor público.
Os conhecidos gargalos de infra-estrutura estão clamando por soluções urgentes há muitos anos. Não apenas os remendos emergenciais não são feitos, como também as proposições estratégicas vêm sendo adiadas eternamente. E então a dinâmica das decisões governamentais acaba sendo determinada por algum apagão aqui, um congestionamento ali, um atraso no cronograma de exportações acolá, uma ameaça de caos aéreo logo ali na frente. E como não há um plano estratégico e consolidado a respeito de como enfrentar a questão da infra-estrutura de forma ampla, as decisões acabam sendo apresentadas no caso a caso, no setor a setor, sempre estranguladas por alguma pressão de crise conjuntural localizada. 

Assim foram sendo anunciados os planos de privatização - por meio de concessão por décadas ao capital privado - das rodovias, depois das ferrovias, em seguida os aeroportos. E agora, mais recentemente, o complexo portuário avança na fila.

Além disso, é importante não esquecer que já operam em regime de concessão e exploração pelo setor privado outras áreas estratégicas – de natureza de serviço público - para o funcionamento de nossa sociedade. É o caso da geração de energia elétrica, o sistema de telefonia, as telecomunicações de forma ampla, a terceirização da saúde por meio dos convênios com as organizações sociais, a operação de banda larga de internet, a complementação dos sistemas previdenciários via fundos de pensão e planos de seguros de previdência privada. Enfim, cada vez a sociedade se vê enredada nas teias da mercantilização generalizada de serviços que deveriam ser oferecidos pelo próprio Estado.

O Brasil tem mais de 8.000 km de costas navegáveis, com potencial de serem utilizadas como espaço de trocas comerciais com o resto do mundo por meio marítimo. O potencial de vocação ultramarina remonta há séculos, desde a chegada de nossos colonizadores em 1500. Ao longo das últimas décadas, o comércio exterior passou a ganhar relevância em nossa grade de atividade econômica. Os números relativos à corrente de comércio (somatório de exportações e importações) são bastante expressivos. Em 1991 o valor total era de US$ 53 bilhões, saltando para US$ 113 bi em 2011 e atingindo a cifra de US$ 482 no ano passado. Isso significa que, a partir do aprofundamento da abertura comercial iniciada com Collor em 1990, a troca comercial dobra de valor na primeira década e depois quadruplica nos 10 anos seguintes. Ou seja, em 2 décadas o valor se vê multiplicado por 8. 

No caso específico brasileiro, corrente de comércio exterior significa exportações e importações utilizando prioritariamente o transporte marítimo como instrumento de logística. Mais de 90% do volume das referidas trocas comerciais entram e saem de nosso País por portos. Assim, percebe-se como tem aumentado a demanda pela utilização das estruturas do complexo portuário em todo o território nacional. Quando se fala em bilhões de dólares, na verdade as operações se concretizam, fisicamente, em várias centenas de milhões de toneladas de mercadorias. As expectativas para 2012 é que a movimentação total de cargas nos portos se aproxime da marca simbólica de 1 bilhão de toneladas. Tal fato é ainda mais compreensível em razão da natureza primário-exportadora de nosso modelo econômico. Exportar “commodities”, como soja e minério de ferro, implica alta tonelagem e elevado volume, com baixo valor monetário. Basta compararmos o valor agregado diferenciado entre a exportação de uma tonelada de minério e a importação, por exemplo, de uma tonelada de computadores ou celulares. E dá-lhe desindustrialização!

Quase a metade de nossas capitais de estados são cidades com portos marítimos, além dos casos de Santos em São Paulo e de Paranaguá no Paraná, que se destacam entre os portos de maior movimentação do País, ainda que as capitais de tais unidades da federação estejam mais no interior. Nossa estrutura portuária conta com 37 portos públicos e 42 terminais de uso privativo (TUPs). Esse sistema é consolidado em 7 Companhias de Docas, distribuídas regionalmente por todo a território nacional. Como a holding federal do setor, a Portobrás, havia sido extinta em 1990, logo no início do governo Collor, o setor passou por um período grave de indefinição, que só voltou a ser minimamente restabelecido, por meio da Lei n° 8630 de 1993 – conhecida como Lei dos Portos. 
Atualmente, o modelo não é nem totalmente público, nem totalmente privado. As chamadas Autoridades Portuárias contam com um grau razoável de autonomia na gestão dos portos e são dominadas pelos setores interessados na sua própria exploração comercial. Na prática, trata-se de mais um fenômeno de apropriação privada do espaço público para usufruto de interesses econômicos, sem que o Estado consiga fazer valer sua função de regulamentação e de preservação do interesse público e nacional na gestão das atividades portuárias.
Frente a esse quadro, nem a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) nem a Secretaria Especial de Portos (vinculada à Presidência da República) conseguem imprimir sua condição de órgãos reguladores do sistema. A maior parte das cargas transita pelos TUPs, em especial os da Petrobrás e da Cia Vale – na verdade, eles respondem por 2/3 da tonelagem total envolvida no comércio exterior. Por ali escoam as exportações em granel sólido (produtos agrícolas e minerais in natura) e em granel líquido (em especial o petróleo). O outro terço circula pelos chamados “portos organizados”, que se caracterizam por sua natureza pública de concessão para exploração privada. Como a composição das exportações é bem distinta das importações, ocorre que a tonelagem das primeiras respondem também por 2/3 do total de volume de comércio, ao passo que as importações representam apenas 1/3 da corrente comercial. É o impacto sobre a dinâmica portuária de sermos exportadores de bens agrícolas e minerais, enquanto importamos bens manufaturados.
Como se pode perceber, trata-se de um setor que apresenta alta complexidade operacional, logística, comercial e financeira. Adicione-se a isso a exigência da presença de órgãos estatais em de sistemas de controle de política sanitária, aduaneira e de segurança nacional para reforçar a natureza pública do fenômeno. E finalmente a delicada sistemática de determinação de tarifas e taxas de retorno para as operações. Afinal, como determinar de forma, digamos, adequada o custo de embarcar um contêiner em um cargueiro? Ora, esse caldo de cultura exige, parece evidente, a firme presença regulamentadora e fiscalizadora do Estado. 
Não fosse apenas por isso, a operação portuária se caracteriza por aquilo que a literatura econômica chama de monopólio natural. Não se trata de um simples mercado da batatinha, em que uma multiplicidade de agentes de oferta pode operar como controlador de abuso de mercado. Não gostou do preço e da qualidade da mercadoria? Dirija-se à barraca ao lado e compre ali seu produto em melhores condições. No caso do porto, assim como na eletricidade e no saneamento, não existe essa opção. Daí porque o Estado é o agente natural provedor desse tipo de bem ou então um forte regulador, com o objetivo de assegurar o equilíbrio e o bem estar coletivo.
Se adicionarmos, por fim, o ingrediente atual da necessidade emergente do aporte de dezenas de bilhões de reais a título de investimento para ampliação e modernização da estrutura portuária, aí que não se escapa mesmo da presença estatal. A sociedade brasileira merece, é claro, um sistema de portos ágil e eficiente - a tal fato parece não haver objeção. 
Isso significa rever sistemas e processos que contribuem para que nossas tarifas sejam relativamente mais elevadas do que muitos países desenvolvidos, sem a correspondente qualidade da operação. Porém, é essencial escapar da ilusão simplista de que basta transferir a gestão e conceder o direito de exploração comercial, a perder de vista, para o setor privado para que tudo se dê às mil maravilhas.
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.
Fonte: Carta Maior | Colunistas | Debate Aberto, 14/11/2012.

sábado, novembro 10, 2012

para que as trombetas começassem a soar

Mais uma vez, sua excelência, o superávit primário

Os órgãos da grande imprensa não perdem a oportunidade de mostrar o seu inconformismo com qualquer escapada da receita conservadora, tão exigida pelo setor financeiro. Bastou o anúncio do ministro Mantega sobre o desempenho do superávit primário 2012 para que as trombetas começassem a soar.
Bastou o anúncio do Ministro Mantega a respeito do desempenho do superávit primário para 2012, para que fosse disparado o já conhecido festival de ataques por parte do financismo e dos representantes da ortodoxia. Os órgãos da grande imprensa não perdem jamais a oportunidade de mostrar o seu inconformismo com qualquer escapada da receita conservadora, tão exigida pela grande banca. Na verdade, o responsável pela política econômica apenas veio a público e fez o reconhecimento oficial daquilo que todos os que acompanhamos a economia no dia-a-dia já estávamos cansados de saber. 
Afinal, já vamos chegando a meados do mês de novembro e realmente as informações disponíveis apontam que o governo não vai conseguir cumprir a meta estabelecida lá atrás, ainda em 2011, de reservar 3,1% do PIB para o superávit primário. Em valores monetários, isso corresponderia a um esforço fiscal próximo a R$ 140 bilhões. Mas o que nos interessa refletir é a respeito das razões que teriam levado o governo a se comprometer com tal meta e quais as conseqüências para o País do não cumprimento de tal objetivo.
Plano Real e o tripé da política econômica
Os fundamentos da política econômica atual foram lançados em 1994, quando o Plano Real foi anunciado e a política de estabilização da inflação começou a apresentar resultados positivos. A partir daquele momento, veio a público e passou a ser incorporado no jargão do “economês” o famoso “tripé da política econômica”, uma trinca de fatores que foi alçada à condição de sacro-santidade imexível. Assim, passamos a conviver de forma institucional com as seguintes regras: i) definição de metas para a inflação; ii) liberdade cambial e política de câmbio flutuante; iii) definição de metas de superávit primário.
A definição de metas para a inflação foi acompanhada de um discurso e de uma prática de maior autonomia – na verdade, uma quase independência – para a atuação do Banco Central, em especial na definição da taxa oficial de juros, a SELIC. O governo teria uma meta de inflação anual a ser perseguida, com uma margem de erro para cima e para baixo. A maioria das pessoas pode até não saber, mas o BC já tem a meta definida para 2014 (!!): o centro é de 4,5%, com 2 pontos percentuais, para cima e para baixo. O acompanhamento dessa performance era realizado pelo Comitê de Política Monetária (COPOM), na verdade uma reunião periódica da diretoria do Banco Central com esse fim exclusivo: definir a taxa de juros. A base teórica para exercer o controle do crescimento dos preços era a necessidade de conter a demanda, para evitar a inflação. E o principal instrumento para tanto era elevar a taxa SELIC - arrocho monetário no “economês” – para retirar recursos do consumo e direcioná-los para a poupança.
A adoção do regime de liberdade cambial se encaixava bem no discurso neoliberal a favor das soluções de mercado para resolver as crises e oferecer sempre a alternativa considerada mais “eficiente” para a sociedade. Em contraposição à política de câmbio administrada pelo governo, a liberdade cambial retirava toda e qualquer possibilidade de que esse setor essencial da economia fosse utilizado como instrumento de política pública. A liberdade de ir e vir para o capital especulativo internacional se somou à implementação de uma monetária de taxas de juros estratosféricas por mais de uma década. Nossas terras permaneceram por um longo período como as mais atrativas do planeta em termos de rentabilidade financeira e a pressão permanente derivada do ingresso de recursos externos provocou a valorização artificial de nossa moeda, o real. As conseqüências perversas foram a farra dos importados e a perda de competitividade das exportações de manufaturados brasileiros no exterior.
Para fechar o tripé, entrou então em cena, bem fortalecido, o conceito inovador do superávit primário. Um verdadeiro golpe de mestre engendrado pelos representantes do financismo na esfera internacional. 
Essa inovação foi concebida no seio dos organismos multilaterais e implementada pelos cinco continentes afora, com a pressão e o aval de FMI, Banco Mundial i tutti quanti. É sabido que um dos postulados básicos do pensamento liberal refere-se à redução do tamanho do Estado à sua dimensão mínima. Além disso, soma-se a preocupação quase obsessiva com o desempenho das contas públicas, exigindo mais do que um sistema em equilíbrio: propõe-se o superávit das receitas sobre as despesas. Em tese, nada tão anormal assim – afinal, uma boa gestão fiscal não faz mal a ninguém e se o Estado consegue esse saldo positivo, pode até utilizar esses recursos excedentes para mais investimentos e coisa e tal.
Superávit primário: o pulo do gato
Mas o pulo do gato reside justamente no adjetivo que esconde a essência da medida: “primário”. Essa forma especial de contabilizar o superávit das contas públicas faz uma divisão malandra nas despesas realizadas pelo Estado. Isso significa que as despesas financeiras, com juros e com pagamento de serviços da dívida pública, não devem ser contabilizadas como despesas ordinárias. Por mais esquisito que possa parecer, é exatamente isso que se passou a fazer na contabilidade pública a partir de então. Assim, o setor público é chamado a fazer um grande esforço fiscal de corte de despesas orçamentárias (saúde, educação, saneamento, pessoal, previdência social e outras), com o objetivo de gerar o tal superávit primário. E todo o saldo desse resultado é dirigido automaticamente para o pagamento das despesas financeiras! Ou seja, os cortes acontecem nas despesas não-financeiras para assegurar que as despesas que beneficiam apenas o setor menos produtivo da sociedade sejam efetuadas sem nenhum risco.
Esse modelo absurdo sobreviveu durante muito tempo, apesar das constantes críticas à sua injustiça social implícita e ao benefício exclusivo para o setor rentista e parasita das economias capitalistas. No caso brasileiro, apenas com o rescaldo da crise a partir de 2008 é que alguns pilares do pensamento hegemônico conservador foram sendo relativizados.
Um deles refere-se à flexibilização da rigidez dos cálculos do superávit primário. A partir de então, os investimentos das empresas estatais, por exemplo, deixaram de ser contabilizadas como “despesa simples” e retiradas da equação. E com toda a razão, pois gastos com investimento têm efeitos duradouros a longo prazo e não podem ser tratados como qualquer despesa corrente, a exemplo das compras de material de consumo.
Mas, na essência, a idéia de sacrificar os gastos não-financeiros para não comprometer as despesas com juros permaneceu intocada por esse tempo todo. Basta lembrar que todos os anos o Orçamento Geral da União reserva parte expressiva das receitas para essa finalidade. Em 2012, por exemplo, estão previstos 40% do total orçamentário para pagamento de juros, serviços e rolagem de dívida pública. Uma loucura!
A novidade mais recente que fez elevar a temperatura e os humores nos meios do financismo é o reconhecimento explícito de que nem mesmo a meta oficial vai poder ser cumprida esse ano. Enquanto a maioria do País respira aliviada com a notícia, os representantes do sistema financeiro abrem a sua bateria de ataque contra a “falta de controle da gestão fiscal”, a “gastança irresponsável” e outras pérolas que permeiam as páginas e as telas dos grandes meios de comunicação. Mas vale observar que tal situação não decorre de nenhuma mudança de postura do governo ou alguma intenção de priorizar as despesas reais em relação às financeiras. Não, nada disso! Trata-se apenas da constatação resignada de que esse ano não vai ser possível.
A redução do superávit primário é solução e não problema
O fato é que a conjuntura econômica está levando a que a meta de 3,1% do PIB não seja mais factível. Há um conjunto de fatores que contribui para tanto. Em primeiro lugar, a redução da taxa oficial de juros ao longo dos últimos meses tem provocado uma redução do volume de juros a ser gasto com a dívida pública. Em segundo lugar, a previsão de crescimento da economia feita lá atrás (4,5% ao ano) tampouco vai se concretizar – com isso as receitas tributárias também vão diminuir, o que é normal e compreensível. Em terceiro lugar, as políticas anticíclicas adotadas pelo governo têm incluído de forma sistemática a isenção de impostos e a concessão de outros benefícios fiscais e tributários. Finalmente, o Estado tem sido chamado a tomar a iniciativa em um conjunto amplo de novos investimentos, o que significa também um aumento de gastos públicos essenciais.
Ora, face a essa nova forma de organização de fatores, não haveria mesmo como a conta fechar com aquele superávit primário exagerado. Melhor dizendo, não haveria razão para que 3,1% do PIB fossem mais uma vez dirigidos para pagamento de serviços financeiros da dívida pública. 
Com as receitas caindo e as despesas não financeiras aumentando, não há meio de manter o superávit tal como imaginado. Na verdade, essa chiadeira toda do financismo reflete o desconforto de um setor que sempre viveu às custas de uma drenagem assegurada dos recursos orçamentários para o caixa de suas empresas. Mais do que não cumprir a meta para 2012, o governo deveria tomar a iniciativa de ampliar o debate na sociedade e reintroduzir a isonomia no tratamento do gasto orçamentário. 
Com isso, a despesa de natureza meramente financeira deixaria de ter esse atendimento especial, um verdadeiro tratamento VIP. Afinal, por que os cortes sempre são feitos nas áreas sociais e não nos gastos com juros? 
Qual a razão para que itens como salário mínimo, pensões, 
aposentadorias, saúde, educação e reforma agrária sejam sempre objeto de redução, ao passo que as verbas do mesmo orçamento destinadas ao rentismo parasitário sejam mantidas sem questionamento?
A busca de um modelo de desenvolvimento social e econômico, com a necessária preocupação de sustentabilidade, deve passar por esse debate. Redefinir o esforço que o conjunto da sociedade realiza para assegurar recursos a uma parcela reduzida de sua elite é uma urgência. Assim talvez o superávit primário deixaria de ser reverenciado como Vossa Excelência e passaria à condição de todos nós, simples e honrados cidadãos da República.
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.
Fonte: Carta Maior | Colunistas | Debate aberto, 08/11/2012.

domingo, novembro 04, 2012

Oportunidade!

Nós temos uma oportunidade de sermos melhor nessa vida, e temos de tentar isso. Seja através da arte, da produção como um todo, dos avanços da técnica, para o coletivo dos seres vivos e do meio ambiente. O conjunto de serviços e produtos podem ser destinados a uma sociedade que não adoeça permanentemente, sob imaginários que só beneficiam uma pequena classe dominante e seus representantes políticos; o capitalismo não funciona com o propósito essencial de cuidar da humanidade como um todo nem da natureza, isso é fato. O que deverá mudar nesse sentido parece que está claramente apontado em meio a crise (profunda) que permanece desde 2008.

sexta-feira, novembro 02, 2012

Keith Jarrett - The Köln Concert: Part II b

“Para decifrar a ‘circulação autopropulsora do capital"

“O ano em que sonhamos perigosamente”, de Slavoj Žižek

 Boitempo Editorial


Este novo livro do filósofo esloveno Slavoj Žižek, oferece uma análise crítica de 2011, “o ano em que sonhamos perigosamente”, como já aponta o título, e no qual emergiu uma série de mobilizações globais de caráter contestatório. A obra dá continuidade ao trabalho de reelaboração teórica já anunciado nos livros Em defesa das causas perdidas e Vivendo no fim dos tempos.

Invocando a expressão persa war nam nihadan – “matar uma pessoa, enterrar o corpo e plantar flores sobre a cova para escondê-la” – a fim de descrever o atual processo de neutralização desses acontecimentos e seus significados, Žižek coloca-se diante da difícil tarefa de pensar a conjuntura global sob uma perspectiva renovadora. Por isso, tem sido considerado um dos mais originais e provocativos teóricos da contemporaneidade.

A forma aberta e o estilo ensaístico despojado desta coletânea de oito ensaios sustentam o obtuso equilíbrio entre uma articulação interdisciplinar e o que o jornalista Ivan Marsiglia, que assina a orelha do livro, descreve como a “ousadia de uma abordagem totalizante da realidade social, em tempos de saberes hiperespecializados”. Não é à toa que o livro remete também ao complexo conceito de “mapeamento cognitivo” desenvolvido por Fredric Jameson, um dos expoentes atuais desta tradição teórica.

Os dois ensaios iniciais, “Da dominação à exploração e à revolta” e “O ’trabalho de sonho’ da representação política”, tecem justamente considerações sobre o capitalismo atual e apresentam o desenvolvimento de uma teoria global dos impasses da representação ideológico-politica. Já os quatro ensaios centrais “O retorno da má coisa étnica”; “Bem-vindo ao deserto da pós-ideologia”; “Inverno, primavera, verão e outono árabes”; e “Occupy Wall Street, ou o silêncio violento de um novo começo” concentram-se na análise detida dos diversos movimentos que marcaram 2011.

Sua análise esquadrinha tanto o que chama de “sonhos emancipatórios” (Primavera Árabe, Occupy Wall Street, levantes em Londres e Atenas) como os “sonhos destrutivos” que motivaram, por exemplo, a chacina de Anders Breivik, na Noruega, e outros movimentos racistas e ufanistas que eclodiram por toda a Europa. O desafio está em situar a multiplicidade dos acontecimentos no interior do campo de forças produzido pelo capitalismo. “Para decifrar a ‘circulação autopropulsora do capital’, que hoje prescinde até da burguesia e dos trabalhadores, Žižek reafirma, em termos freudianos, a ideia de luta de classes: assim como diz Freud a respeito da sexualidade, não é que tudo se resuma à luta de classes, mas a luta de classes se faz presente em tudo”, interpreta Marsiglia.

Os ensaios “The Wire, ou O que fazer em épocas não eventivas” e “Para além da inveja e do ressentimento” refletem, a partir da cultuada série americana The Wire e de uma análise mais detida do pensamento do filósofo Peter Sloterdijk, sobre o desafio de combater o sistema sem contribuir para aprimorar seu funcionamento. Por fim, em “Sinais do futuro” Žižek anuncia um descontentamento subterrâneo em marcha e, prevendo uma nova onda de revoltas, situa o ano de 2012 em um presente que guarda o potencial oculto de um futuro utópico, manifesto em fragmentos limitados, distorcidos e até pervertidos.

Trecho do livro

“Marx descreveu a má circulação do capital, que se aperfeiçoa e cujo caminho solipsista da autofecundação chega ao apogeu nas especulações metarreflexivas da atualidade sobre os futuros. É simplista demais afirmar que o espectro desse monstro que se aperfeiçoa e segue seu caminho negligenciando qualquer preocupação humana ou ambiental seja uma abstração ideológica, e que por trás dessa abstração haja pessoas reais e objetos naturais em cujos recursos e capacidades produtivas se baseia a circulação do capital e dos quais o capital se alimenta como um parasita gigante. O problema é que, além de estar em nossa má percepção da realidade social da especulação financeira, essa abstração é real no sentido preciso de determinar a estrutura dos processos sociais materiais: o destino de todas as camadas da população, e por vezes de países inteiros, pode ser decidido pela dança especulativa solipsista do capital, que persegue seu objetivo de lucratividade com uma indiferença abençoada em relação ao modo como seu movimento afetará a realidade social.”

Sobre o autor

Slavoj Žižek nasceu em 1949 na cidade de Liubliana, Eslovênia. É filósofo, psicanalista e um dos principais teóricos contemporâneos. Transita por diversas áreas do conhecimento e, sob influência principalmente de Karl Marx e Jacques Lacan, efetua uma inovadora crítica cultural e política da pós-modernidade. Professor da European Graduate School e do Instituto de Sociologia da Universidade de Liubliana, Žižek preside a Society for Theoretical Psychoanalysis, de Liubliana, e é diretor internacional do Instituto de Humanidades da Universidade Birkbeck de Londres. O ano em que sonhamos perigosamente é o seu oitavo livro traduzido pela Boitempo. Dele, a editora também publicou Bem vindo ao deserto do Real!, em 2003, Às portas da revolução: escritos de Lenin de 1917, em 2005, A visão em paralaxe, em 2008, Lacrimae Rerum, em 2009, Em defesa das causas perdidas e Primeiro como tragédia, depois como farsa, em 2011 e Vivendo no fim dos tempos, em 2012.

PUBLICAÇÕES NA IMPRENSA:
22/10/2012 - IHU - Unisinos - A esquerda derrotada. Entrevista com Slavoj Zizek - Da redação
24/10/2012 - Carta Capital - Ideias Entrevista - A esquerda derrotada - Gianni Carta
28/10/2012 - Folha de S.Paulo - Ilustrada - Filósofo Slavoj Zizek analisa discurso do cinema em documentário - Vivian Whiteman
28/10/2012 - Correio Mariliense - Para Slavoj Žižek, 2011 foi o ano em que sonhamos perigosamente - Da redação

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