(...) A AMIZADE, ENTENDIDA COMO INSERÇÃO DO HOMEM NO MUNDO, POSTURA EXISTENCIAL, PASSA POR UMA ABERTURA FUNDAMENTAL AO DINAMISMO DO REAL, DO QUAL SOMOS TAMBÉM EXPRESSÃO. ESSA ABERTURA É SOLIDÁRIA DA CAPACIDADE HUMANA DE MARAVILHAR-SE, DE ENCANTAR-SE, DE ACOLHER A PRESENÇA DO EXTRAORDINÁRIO NO ORDINÁRIO; AFIRMA UMA OUTRA ORDEM ATRAVÉS DA QUAL OS DIVERSOS NÍVEIS DE REALIDADE PODEM SER COMPREENDIDOS.
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O SER QUE SE COLOCA EM ESTADO DE AFINIDADE E DE CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS SERES PODE OUVIR A SUA VOZ E CONHECER OS SEUS MISTÉRIOS.
O CONHECIMENTO NÃO É O RESULTADO DE UM ACÚMULO DE INFORMAÇÕES; NÃO É FRUTO EXCLUSIVO DA VONTADE HUMANA, É UMA BENÇÃO DADA ÀQUELE QUE ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM O SAGRADO, RECEPTIVO AOS SINAIS DA NATUREZA E SOLIDÁRIO À VIDA SEM SUAS MÚLTIPLAS MANIFESTAÇÕES.
O ENCANTO PERMEIA A DIMENSÃO DO REAL. A “DIVINA RADIÂNCIA” (QUE) “EXTINGUIU-SE NA HISTÓRIA DO MUNDO” [HEIDEGGER], É A MORADA, O ABRIGO DO EXTRAORDINÁRIO, CUJA IRRADIAÇÃO O SER HUMANO VÊ SOMENTE QUANDO HABITA A MORADA QUE CORRESPONDE À SUA NATUREZA MAIS ESSENCIAL.
A NATUREZA É TAMBÉM A AMBIÊNCIA DO ENCANTO, DO MISTÉRIO, DO EXTRAORDINÁRIO. ESTA SENSIBILIDADE PARA FAZER UMA LEITURA SIMBÓLICA DO COSMO, DOS FENÔMENOS DA NATUREZA E DOS RITMOS DA VIDA É UMA DIMENSÃO CONSTITUTIVA DO HOMEM, MESMO QUANDO É NEGADA, COMO O FOI E AINDA É NAS SOCIEDADES MODERNAS. SEU DISCURSO REALIZA UM CONSTANTE VAI-E-VEM ENTRE O SENTIMENTO DO SAGRADO, A AMIZADE COM OS SERES DA NATUREZA E A SOLIDARIEDADE AO OUTRO SER HUMANO. NESTE MODO DE SER, A SOLIDARIEDADE TEM UM SENTIDO NÃO SOMENTE ÉTICO, MAS COGNITIVO. ESSE DIÁLOGO PRESUPÕE A RELAÇÃO ENTRE UM EU E UM TU; NÃO PODE ACONTECER ENTRE UM SUJEITO E UM OBJETO.
A NATUREZA RETRAI-SE, “ELA SE ABUSA E VAI EMBORA”, QUANDO O SER HUMANO PROJETA A SOMBRA DE SUA VORACIDADE SOBRE AS COISAS.
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A PLANETARIZAÇÃO QUE ABOLIU TODAS AS FRONTEIRAS (ESPACIAIS E TEMPORAIS) COLOCA UM DESAFIO, O DE APRENDER A LIDAR COM O PODER DA TÉCNICA. PARA ISSO PRECISA COMPREENDER O SEU SENTIDO. POR NÃO ESTAR PREPARADO PARA ESTA TRANSFORMAÇÃO RADICAL O SER HUMANO VIVE UM DESENRAIZAMENTO DE SUA ESSÊNCIA.
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DESENRAIZAMENTO NÃO SÓ CAUSADO POR FATORES EXTERNO NEM COMO EFEITO DA NEGLIGÊNCIA HUMANA, MAS DO ESPÍRITO DA ÉPOCA. APRENDER A LIDAR COM ESSE PODER TECNOLÓGICO É CUIDAR SEMPRE PARA QUE ESSA REALAÇÃO SEJA DE INDEPENDÊNCIA [HEIDEGGER]. VIVER ENTRE AS COISAS DO MUNDO TECNOLÓGICO, MAS SEM SER DOMINADO POR ELAS, E ACEITAR O FATO DE QUE DESCONHECEMOS O SENTIDO PROFUNDO DESSE MOMENTO. ACEITAR ESSE PENSAMENTO TECNOLÓGICO COMO ÚNICO MODO DE PENSAMENTO ALIENARIA O HOMEM DE SUA NATUREZA ESSENCIAL.
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O MUNDO TECNOLÓGICO NÃO É O ÚNICO MODO SEGUNDO O QUAL AS COISAS PODEM SER, OBJETOS DE UM SUJEITO EGOCENTRADO E ONIPOTENTE. TAL PROCESSO PROVÉM DE UM ESQUECIMENTO DO SENTIDO DO SER, UM OFUSCAMENTO, EMPOBRECIMENTO DO PRÓPRIO SER HUMANO, QUE É SIMULTANEAMENTE O ESQUECIMENTO DE NOSSA IDENTIDADE AUTÊNTICA. A DISPOSIÇÃO DE ‘DEIXAR-SE” OS SERES E A ABERTURA EM FAVOR DO MISTÉRIO DÃO-NOS A POSSIBILIDADE DE UM NOVO ENRAIZAMENTO, O RE-ENCONTRO, MORADA ORIGINÁRIA, PRESENTIFICADA SEMPRE AO SER QUE SE DISPÕE A SER POR ELA ACOLHIDO.
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PRECISAMOS DE UM SABER QUE CONVIVA COM O MISTÉRIO, COM A ALTERIDADE, COM OUTRAS MODALIDADES DE RELACIONAMENTO COM O REAL. O MISTÉRIO NÃO É AQUILO QUE NÃO PODE SER EXPLICADO. TAMBÉM NÃO É O AINDA-NÃO-CONHECIDO, É AQUILO QUE, PODENDO SER EXPLICADO, NUNCA PODE SER EXAURIDO, PORQUE É FONTE (ARQUÉ) NO SEU REVELAR PERMANENTE. O SABER EM CONSONÂNCIA COM ESTE PRINCÍPIO SEMPRE VIGENTE É UM SABER ORGANIZADO PELA EXPERIÊNCIA, PELO RITMO, PELA ALTERNÂNCIA, PELA DIALÉTICA. ORGANIZA UM MODO DE SER, UMA ÉTICA.
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UM SABER DO MISTÉRIO RESIDE EM COMPREENDER O RITMO DO PLANETA.
[Unger, Nancy Mangabeira. Da Foz a Nascente]
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