domingo, outubro 31, 2010

pra toda a vida

A liberdade

por Fundação José Saramago
A liberdade não é mulher que ande pelos caminhos, não se senta numa pedra à espera de que a convidem para jantar ou para dormir na nossa cama o resto da vida.
In Levantado do Chão, Ed. Caminho, 18.ª ed., p. 312
Fonte: Outros Cadernos de Saramago, 27/10/2010

sexta-feira, outubro 29, 2010

José e nossas palavras

Democracia substancial
por Fundação José Saramago

A democracia não pode limitar-se à simples substituição de um governo por outro. Temos uma democracia formal, necessitamos de uma democracia substancial.
“Soy un comunista libertario”, El País, Madrid, 26 de Abril de 2004
In José Saramago nas Suas Palavras

Fonte: Outros Cadernos de Saramago, 28/10/2010

o trovão no Sertão

O ‘Pai da Coalhada’ chegou sem avisar

por Juracy Nunes

Não é assombração nem ente mitológico, é assim como é chamado o trovão no Sertão nordestino. Na última quinta feira, 21/10 às 20h ouvi um ruído forte. Pareceu ser um trovão, mas em pleno mês de outubro no Cariri paraibano? Deve ter sido algum avião que passou por aqui perdido.

Mas logo após um clarão seguido de novo estrondo. Estava confirmado, era o relâmpago acompanhado do trovão.
Onde tem fumaça tem fogo, onde tem relâmpago e trovão tem chuva, assim nos ensina a sabedoria popular.
Mas chuva em Monteiro, no mês de outubro? Ou aqui vai virar Sul ou o mundo vai se acabar assim pensam os sertanejos de tanto valorizarem os fenômenos naturais.
Às 23h a chuva chegou, a água correu nas biqueiras, as ruas pareciam riachos com água corrente e uma comemoração abusiva da derrota de um político foi rapidamente suspensa. A pluviosidade chegou a 100 mm em alguns sítios. No dia seguinte fui ao consultório vazio porque ainda chovia e tendo um fato novo do porte de muita chuva fora de tempo, até as doenças vão embora. Mesmo assim chegou uma revisão. Um matuto calejado lá da Serra do Mocó de Cima. Cumprimentei o cliente indagando: Lá choveu?
Doutor choveu a noite inteira e o Pai da Coalhada não deixou ninguém dormir, por isso minha dor piorou.
Explique esta história de Pai da Coalhada, é algum fantasma? Perguntei ao cliente.
Doutor não brinque com as coisas de Deus. O Pai da Coalhada é o trovão. Ele traz a chuva. E o senhor sabe que no nosso Sertão seco cinco dias após uma chuva igual à de ontem o gado já enche o bucho. O aperitivo dos bichos é a ponta de rama, a folha que brota de mato que o senhor vendo na seca jura que morreu. O marmeleiro a jurema e as ervas rasteiras se fazem de mortas, mas com qualquer chuvinha elas brotam e com duas semanas está tudo verde e está garantido a comida farta para os bichos e prá quem cuida deles.
E a coalhada? Bem este rodeio eu fiz para responder melhor a sua pergunta. A vaca comendo pasto verde dá leite e do leite se faz coalhada. A coalhada com açúcar ou com rapadura raspada, engorda menino novo, velho descarnado e trabalhador da enxada. E tudo começa com o trovão. Entendeu?
Entendi muito obrigado pela explicação, essa capacidade de recuperação da flora sertaneja é chamada pelos biólogos de xerofilismo e graças a esta força da Natureza o Sertão não virou deserto.
Mas a chuva chegou sem aviso de meteorologista, de gente do mato ou da cidade, nem caboré ou formiga de asas se manifestaram para que tivéssemos tempo de olhar as goteiras ou limpar as calhas que levam água para as cisternas. Porque o segredo foi tão bem guardado?
È o capricho lá de cima.
O senhor está coberto de razão. Deus queira que venham outras chuvas para o trovão não perder seu apelido tão respeitado.
Monteiro/PB, 23/10/2010

Juracy Nunes juracysnunes@gmail.com
Fonte: EcoDebate, 26/10/2010

quinta-feira, outubro 28, 2010

tempos de conflito regulado

Reflexões na Reta Final de Campanha

por Jaldes Reis de Meneses* 
Desde o começo do ano, em conversa com amigos e em debates nas minhas aulas de Teoria Política, ao contrário dos que julgavam que as eleições gerais de 2010 seria um espetáculo desinteressante e rotineiro, eu pensava o inverso simétrico: as eleições seriam das mais interessantes e animadas a quem se posta como observador, uma luta renhida, muitas vezes sem quartel, envolvendo, na cena principal, os dois principais grupos em disputa pelo poder político brasileiro, o PT e o PSDB, além de uma extensa série de interesses a tomar partido nos rumos da disputa.
Esses interesses não são apenas os clássicos de uma disputa na sociedade capitalista, cujo cerne é o conflito entre a grande burguesia e os trabalhadores sindicalizados. Ou seja: a contenda entre a renda do capital e os rendimentos do trabalho, mediada pelo Estado. Na Europa (França, Grécia, Espanha, etc.) os efeitos da crise econômica de 2008 puseram na ordem do dia o conflito aberto entre o capital e o trabalho, por meio de uma pauta de reformas de iniciativa estatal.
No velho continente, da parte dos Estados nacionais, da burguesia e da tecnocracia ilustrada predominante nos cargos de mando da União Européia, busca-se a saída da crise através da remoção de direitos sociais já tradicionais, conquistados depois da segunda guerra mundial.
As soluções em curso na Europa assemelham a um dolorido um ato cirúrgico sem anestesia: pensemos na radicalidade do chamamento intrínseco ao conflito imerso na proposta de aumentar a idade mínima de aposentadoria de 60 para 62 anos. O welfare state empacou na Europa: a greve e a luta de rua voltaram à moda. (Em outro diapasão, justiça se faça a Barack Obama: enquanto na Europa busca-se programar reformas antissociais, nos Estados Unidos, o presidente enfrentou contra a direita republicana o combate pelas políticas de saúde e, logo depois de vencida essa batalha, propôs um plano de obras públicas tipicamente keynesiano).
Diferente do europeu, ou mesmo americano, é o caso brasileiro, podendo vir a ser – para ficar numa questão pontual, mas de interesse analítico – o fio da meada explicativo, afora as incompetências políticas do doutrinarismo, ao fracasso eleitoral dos partidos de discurso classista nas eleições de 03 de outubro, principalmente o PSOL. A idéia do conflito aberto encontra-se fora do lugar, atualmente. Estamos em tempos de conflito regulado.
A regulação pelo bonapartismo. O segundo mandato de Lula, na prática, congelou a pauta das reformas antissociais, ao molde das que estão estourando na Europa. Neste sentido, conciliador, ele prestou um relevante serviço à incompleta burguesia e ao inacabado capitalismo brasileiro. Getúlio Vargas costumava dizer, irônico e melancólico, que a burguesia não entendia o trabalho orgânico que ele fazia para ela porque ele se adiantava. Fez-se demiurgo. Pode-se afirmar o mesmo de Lula: nunca as taxas de lucro estiveram tão elevadas, em tempos de regime democrático, nem a paz social tão festejada na esfera política.
Teria a luta de classes desaparecido na paradisíaca terra colonial dos papagaios, como a chamavam os primeiros portugueses? Nada disso. Nosso cotidiano continua cruento, em estado de sítio popular permanente, à maneira da ficção de uma tropa de elite. A guerra de classes brasileira continua seu curso: encontramo-la no registro naturalista da luta pela sobrevivência e no conflito agônico e sem quartel das ruas, repletas de assaltos e homicídios, de saltimbancos improvisados nos sinais de trânsito e na faina sem descanso do trabalho informal.
No entanto, surgiu um balsamo. Comentava em debate com João Pedro Stedile na UFPB, ano passado: a crueldade das ruas afastou-se e não reverbera no terreno da política. A pauta política, contraditoriamente, exala o otimismo do desenvolvimento, das novas oportunidades de investimento, a exemplo do pré-sal. Na esfera política, a guerra de classes se dispersou ao mesmo tempo em que temporariamente se dissolveu o conteúdo exclusivamente classista.
Como veio à luz a prestidigitação?
Do ponto de vista estritamente político, o governo Lula permanece compondo com os mesmos setores acantonados no Estado durante o período FHC. Mas qual a novidade essencial da mesmice: doravante, na era Lula, os antigos movimentos sociais oposicionistas às reformas de FHC passaram a fazer parte do governo. Lula estendeu ao máximo a base política do Estado. Quase nenhum setor social e de classe se põe de fora do Estado, desde a FENABAM ao MST.
Novamente, é de alvitre invocar o espectro de Vargas: o caudilho gaúcho costumava deixar os órgãos de política monetária para os marginalistas e os de desenvolvimento para os cepalinos. Outro exemplo das práticas de Vargas: entregou o nordeste às velhas oligarquias, mas estimulava o crescimento do PTB nos centros urbanos emergentes do processo de industrialização. O conflito era o próprio governo, mas a palavra final era do presidente, que até estimulava o conflito sob as rédeas internas.
Como cogitar entender tanta coisa nova, ainda mais este modo heterodoxo de operar a política, conquanto de raízes fincadas na história do país?
Tornei a cogitar o populismo como categoria explicativa ao formidável movimento societário que se passa aos nossos olhos. Populismo e hegemonia, ou a construção de uma fase de hegemonia populista no Brasil.
Em teoria política, populismo é um conceito polissêmico, mais descritivo que rigoroso. Há vários mal-entendidos sobre o populismo.
Em primeiro lugar, precisa-se conhecer a história do populismo, desde a origem romântica e russa, no século XIX, até a influente corrente norte-americana antitruste, em começos do século passado. Desprovido de análise histórica e repleto de preconceitos, a corrente principal do mundo acadêmico norte-americano sempre tratou os regimes populistas liminarmente, em insossa abordagem economicista. Conforme os autores do maistream, populistas são os regimes “gastadores”, voluntaristas, avessos à disciplina fiscal, preocupados com o crescimento e a distribuição de renda, todavia sem medir os riscos de inflação e de déficit externo, as coerções externas e a resposta dos agentes econômicos às políticas agressivas contrárias ao mercado (Rudiger Dornbush & Sebastián Edwards, The macroeconomics of populism in Latin America).
Na verdade, o alvo de tais definições são as políticas redistributivas dos diferentes populismos. Escapam a estas definições os contextos políticos, contrastantes no tempo e no espaço, principalmente abordar a riqueza social e dramática de todo populismo: a necessidade, para se manter vivo ou sobrevivendo, da compulsão de crescer economicamente.
A nota curiosa é que a sociologia paulista – um dos braços intelectuais tanto do PSBD como do PT – recebeu o populismo brasileiro com aguda desconfiança. Florestan Fernandes costumava dizer alto e bom som que sequer tivemos populismo, como na Argentina, mas simplesmente demagogia. Caio Prado Jr. cuidou de definir a “era Vargas” em “A revolução brasileira” na condição de “malfadado” período histórico. Francisco Weffort estudou a “manipulação” dos trabalhadores.
Justifica-se a posição acre dos intelectuais paulistas. Entre vários aspectos nocivos, por exemplo, quanto à estrutura sindical, o regime populista foi de tutela corporativa do Estado sobre a organização dos trabalhadores. Ironia da história, o PT nasceu sob a influência dessa crítica sociológica. Com o tempo, na medida em que foi se amoldando à vida política institucional, passou a gerir e a gostar da estrutura herdada. Nos dias de hoje, o governo Lula, no âmbito das várias acomodações, conseguiu conciliar o antigo sindicalismo pelego (representando pela Força Sindical) e o novo/velho sindicalismo neoestatal dos fundos de pensão (CUT e consortes). Fez-se a partilha: a Força Sindical dirige o Ministério do Trabalho (ou seja, os negócios atinentes a quem representa e deixa de representar os trabalhadores), ao passo que a CUT comanda os negócios da china dos fundos de pensão.
Enganam-se, no entanto, aqueles que vêem na adesão das massas ao populismo simplesmente manipulação. Apesar de tudo, as massas não são simplesmente “traídas”. Há um jogo de perde e ganha, ontem e hoje, de apelo hegemônico, nas fimbrias do sistema institucional construído, caso contrário o regime sumiria rapidamente do mapa.
Nestes termos, para abreviar, penso que o segundo governo Lula moveu as peças do xadrez, gerando tanto adesão como oposição. A engenharia política permitiu o acesso à criação social. Passamos da política institucional às placas tectônicas que se movem no subsolo. São muitas as transformações sociais, a mais importante das quais a mobilidade dos grupos que transpuseram nos últimos anos o umbral da pobreza absoluta, da carência, integrando, a partir do acesso permanente ao consumo com base no mercado interno, o embrião de uma nova classe média de origem popular. Estimativas conjeturam 36 milhões de cidadãos, na fronteira entre a cidadania passiva e ativa.
A propósito, no clima de campanha eleitoral, há muita confusão a respeito do fenômeno da pobreza. Setores dilmistas, bem intencionados e ingênuos, aludem uma hipotética “erradicação” da pobreza. É preciso ir devagar com o andor. Caso haja continuidade das políticas sociais, alçamos a um processo, talvez, de erradicação da pobreza absoluta. Diverso é o problema da pobreza relativa, que persistirá, pois como denota a própria expressão, ela é relativa, tem como medida a desigualdade social capitalista. Ademais, a problemática desigualdade no capitalismo, deve desaguar na comparação dos rendimentos do trabalho vis-à-vis os rendimentos do capital.
Por outro lado, a oposição ao governo tem sido chamada a dar respostas políticas a uma série de fatos novos. O grupo de Serra/PSDB/DEM/PPS responde de duas maneiras: a primeira, dominante no primeiro turno, buscando aparentar ser mais lulista que o lulismo, nas promessas de continuidade, 13º da bolsa família e 600 reais de salário mínimo. Mais que proposta para valer, o objetivo é disputar simbolicamente com o populismo emergente. Pode-se ser contra, mas demonstra argúcia tática. Em segundo lugar, a oposição pratica zoologia política. Gosto muito dessa expressão de Leon Trotsky, que significa a política que apela aos baixos instintos. Neste sentido, a campanha eleitoral tucana desentupiu do poço da irracionalidade, dos recalques e da ignorância, os argumentos mais vis de que se tem notícia em eleições presidenciais desde 1989. Trata-se de um jogo perigoso, nos termos do que fazer com esse espólio sujo no caso de operar a difícil almejada virada. Os tucanos desceram dos salões ao prostíbulo.
*Jaldes Reis de Meneses é professor de Teoria da História (UFPB).
Fonte: Blog Campo de Ensaio, 15/10/2010

quarta-feira, outubro 27, 2010

com Ton, Vinicius sempre...

O Manifesto

Manifesto aos Brasileiros e Brasileiras
por Marilena Chauí e Paul Singer
Em 31 de outubro deste ano, os brasileiros serão chamados novamente às urnas para decidir os rumos do país pelos próximos quatro anos. A campanha tem se caracterizado por um acirrado duelo de denúncias, calúnias e boatos, que quase não deixou espaço para a discussão dos problemas da nação e as diferentes opções políticas que existem para solucioná-los. Não podemos permitir que o mesmo se repita neste segundo e derradeiro turno, como se a escolha da pessoa que ocupará a Presidência da República dependesse exclusivamente das intenções ostensivas ou ocultas dos candidatos.
Os dois candidatos que disputarão nossos votos são Dilma Roussef e José Serra, que representam as duas coligações partidárias que governaram o Brasil durante os últimos 16 anos, com objetivos e métodos distintos, derivados de interesses e ideologias de classe muito diferentes.
É necessário então explicitar os projetos e se posicionar a partir de uma avaliação das opções que cada uma das coalizões representa, manifestada nas gestões, tanto nacionais como estaduais, que dirigiram.
A coligação que apóia Serra governou durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, e teve por mérito encerrar a violenta crise inflacionária que atingiu o país entre 1979 e 1994 por meio duma política que abriu completamente o mercado interno às importações de produtos industriais, vindas principalmente da Ásia, barateadas pelo baixo custo da mão de obra nos países de origem e pela valorização do real. O custo de vida efetivamente deixou de subir, tirando da miséria no primeiro ano do plano real alguns milhões de brasileiros, mais atingidos pela inflação alta. Contudo, os custos também foram altos. A indústria nacional entrou em terrível crise, que quebrou grande número de empresas e eliminou milhões de postos de trabalho. O desemprego tornou-se de massa, a ponto dos movimentos reivindicatórios dos sindicatos cessarem, com a trágica exceção das greves de protesto contra demissões coletivas.
O custo da estabilização dos preços foi altíssimo e foi pago pela classe operária, na forma de desemprego em massa e duradouro e de persistente queda dos salários, decorrente do excesso de oferta de força de trabalho no mercado. Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, a economia nacional só cresceu em alguns anos excepcionais; durante os demais a economia ficou em recessão, causada por sucessivas crises financeiras internacionais, de cujos efeitos a política liberal posta em ação foi completamente incapaz de proteger o país.
Durante o governo Lula a política econômica, que foi paulatinamente sendo retirada da camisa de força liberal, fez com que o Brasil crescesse duas vezes mais que durante os quatriênios tucanos. A oposição tucana alega que isso se deve à sorte de Lula de governar numa época em que as crises financeiras foram menos freqüentes. Este argumento foi posto à prova quando estourou a atual crise financeira internacional, em 2008, que é de longe mais extensa e profunda que as crises ocorridas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Como todos sabem, a economia brasileira foi afetada apenas durante dois trimestres graças à vigorosa política anticíclica do governo. Este ano espera-se que a economia brasileira cresça algo como 7%, enquanto a maioria das economias do 1o Mundo ainda estão mergulhadas na crise.
O crescimento econômico havido durante o governo Lula é fruto portanto de opções políticas, que apesar do ponto de vista cambial e monetário não ter se distinguido consideravelmente do período de FHC, no computo geral realizou uma inflexão na política econômica, ampliando o credito, fomentando o mercado interno, recolocando o estado como agente ativo do crescimento, taxando o capital especulativo estrangeiro que entra no país, valorizando o salário mínimo e inclusive desenvolvendo em escala uma serie de políticas sociais, que também tiveram importante impacto do ponto de vista econômico, ao ampliar a demanda efetiva por bens e serviços no mercado interno.
No que diz respeito às políticas sociais, o governo tucano iniciou ou deu continuidade a algumas políticas sociais: a distribuição de auxílios às famílias com renda abaixo dum patamar mínimo e a concessão de crédito subsidiado pelo Pronaf aos pequenos agricultores mais necessitados. Mas estes programas foram executados de forma tão limitada que beneficiaram apenas uma fração dos que deveriam ser atendidos. Quando diferenças de quantidade se tornam muito grandes, geram diferenças de qualidade: no governo FHC as políticas sociais eram marginais e de pouco impacto, mas no governo Lula elas se tornaram prioritárias, ganhando abrangência e desencadeando forte estímulo ao desenvolvimento econômico local.
Em suma, a grande prioridade do governo tucano foi impedir a volta da inflação, o que foi conseguido pelo recurso a medidas recessivas sempre que turbulências financeiras atingiam o Brasil. A outra prioridade deste governo foi reduzir as dimensões do Estado mediante a privatização da indústria siderúrgica, das empresas estatais de produção e distribuição de energia elétrica, de telecomunicações, além da maioria dos bancos públicos. O coroamento deste processo foi a privatização da Vale do Rio do Doce, feita sem qualquer justificativa de interesse público, mas apenas pelo princípio ideológico de que qualquer empreendimento que possa ser operada pela iniciativa privada não deve permanecer em poder do Estado. Apesar da venda de grande parte do patrimônio público, o governo FHC acumulou enorme dívida pública.
O governo do Presidente Lula priorizou desde o seu início a retomada do desenvolvimento com redistribuição da renda. Para atingir estes objetivos, o governo lançou o Programa de Fome Zero, estratégia estruturante de combate à pobreza e distribuição de renda, que, entre outras coisas, tratou de estimular a produção alimentar pela agricultura familiar e propiciar segurança alimentar para o povo brasileiro. Ao mesmo tempo unificou diversos programas de renda mínima, até então fragmentados e localizados, e deu escala, resultando no admirado e internacionalmente imitado Programa de Bolsa Família, que resgatou da fome e da miséria dezenas de milhões de brasileiros e levou pela primeira vez desenvolvimento econômico aos bolsões de pobreza. Mais recentemente, o governo promoveu a criação do Sistema Único de Assistência Social, o SUAS, ampliando a rede de proteção social rumo à universalização da promoção dos direitos para crianças e adolescentes em situação de risco, população de rua e outros segmentos vulneráveis.
No governo Lula, o crescimento econômico não esteve apartado do respeito ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Ainda que haja muito a ser feito, é inegável que o país assumiu o protagonismo na defesa do uso da matriz energética limpa e propondo compromissos internacionais importantes na redução do desmatamento e da emissão dos gases de efeito estufa. Para não falar da Política Nacional dos Resíduos Sólidos, que significará uma nova etapa em termos de sustentabilidade e inclusão social, com o reconhecimento dos catadores de materiais recicláveis alcançando um patamar de dignidade. Isso é respeito ao meio ambiente aliado com o desenvolvimento humano.
Na área da segurança pública, por meio do Ministério da Justiça, que ao fazer a articulação entre a política de segurança e ações preventivas na área social, inaugurou uma nova etapa no combate à violência em nosso país, enfrentando ao mesmo tempo as causas e o crime em si.
A natureza deste manifesto não permite descrever cada uma das muitas políticas sociais realizadas pelo governo petista. Vamos apenas enumerar as mais importantes: a Luz para Todos que atingiu a quase totalidade das famílias dela carentes; o Pronaf, que atuava na prática apenas no Sul do Brasil foi estendido a todo território nacional, resgatando assentados da reforma agrária, indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos; o salário mínimo foi reajustado sistematicamente acima da inflação, beneficiando milhões de assalariados e aposentados. O programa de Aquisição de Alimentos criou um mercado seguro para os pequenos produtores agrícolas, preferencialmente organizados em cooperativas, e juntamente com o Programa Mais Alimentos e o de Alimentação Escolar arrancou da miséria grande parte do campesinato, a ponto da emigração do campo às cidades ter cessado apesar do desemprego nas metrópoles ter caído à metade nos últimos sete anos.
De fato, o crescimento econômico aliado às políticas ativas de trabalho e emprego fizeram que fossem gerados mais de 14 milhões de postos de trabalho formais nos últimos anos. Além disso, o governo fomentou o trabalho associado em economia solidária, fortaleceu a agricultura familiar e facilitou a formalização de milhares de empreendedores individuais. O resultado tem sido a redução do trabalho informal e desprotegido.
Haveria que mencionar ainda a ampliação notável das redes públicas de escolas do primeiro ao terceiro grau, estimuladas pelo FUNDEB, que ampliou o financiamento público para toda a educação básica, coroada pelo Programa ProUni, que abriu as portas do ensino superior a centenas de milhares de jovens oriundos de famílias de baixa renda e/ou racialmente discriminadas; e a acentuada expansão de escolas técnicas tem a mesma natureza redistributiva.
Além disto, o governo Lula criou novos programas que buscam uma transformação mais profunda da sociedade, criando novos modelos de desenvolvimento e de participação social nas políticas publicas, como por exemplo, as políticas de apoio à economia solidária, os Territórios da Cidadania, as ações de etnodesenvolvimento para as comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, todas elas grandes inovações na integração e gestão democrática das políticas públicas.
Para além dos programas, o governo Lula, deu à Secretaria de Direito Humanos da Presidência da República, o status de Ministério, reforçando o compromisso do Governo Federal com os direitos humanos. Os trabalhos desse Ministério, corajosos e bravos, não passaram despercebidos pela sociedade, que tomou conhecimento – se bem que por via distorcida por um certo olhar conservador vindo da grande imprensa – de temas como o direito à memória e à verdade a respeito dos anos fatídicos da Ditadura Militar, a democratização dos meios de comunicação de massa e a ampliação dos direitos de setores excluídos da população.
Outro aspecto que revela quão distintos são os projetos de cada uma das coalizões partidárias em disputa é a forma de encaminhar a participação social no desenvolvimento das políticas públicas. Se no governo de FHC não houve completo esvaziamento dos espaços de exercício da democracia direta, como Conselhos e Conferências, estas práticas ficaram restritas a pouquíssimas temáticas.
Durante o governo Lula se buscou ampliar os espaços de democracia direta e de participação da sociedade civil organizada nas políticas públicas. Foram realizadas dezenas de conferencias nacionais, cobrindo quase todos temas de políticas publicas, da saúde à comunicação, da economia solidaria ao desenvolvimento rural, do meio ambiente à problemática urbana. Estas conferencias elaboraram propostas que se transformaram em políticas públicas, sendo inseridas no Plano Plurianual votado pelo Congresso Nacional. Os Conselhos nacionais, que foram criados ou reavivados pelo governo Lula, tem sido um importante espaço de participação da sociedade civil nos rumos do governo e um importante avanço em direção ao orçamento participativo na esfera federal. Desta maneira, tem se caminhado nos últimos anos para a democratização do estado e mediante a abertura de canais de democracia direta.
Fica claro que os dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições representam projetos de país consideravelmente diferentes. São as diferenças destes projetos que devem guiar a decisão de cada eleitor, não os seus supostos ou pretensos méritos individuais. Uma eleição presidencial nada tem de parecido com um concurso para a escolha do indivíduo mais apto para “gerenciar” o país. É a ocasião em que os cidadãos têm a oportunidade, que só a democracia oferece, de escolher pelo voto livre a coligação partidária que lhes parece melhor atender aos interesses e aspirações da maioria.
Para que esta escolha seja consciente é essencial que o 2o turno permita que o projeto de país de cada um dos candidatos seja conhecido, esmiuçado e submetido à critica de todos brasileiros politicamente engajados.
Apesar deste debate de projetos ainda não ter ocorrido, as experiências de cada coalizão que disputa este segundo turno, tanto em âmbito federal, comparando os períodos de FHC e de Lula, como as experiências estaduais, nos fazem crer que o projeto representado pela coalizão encabeçada por Dilma Roussef é aquele que representa a maior possibilidade de transformação do Brasil, com desenvolvimento econômico, redistribuição de renda e ampliação e radicalização da democracia.
É justamente Dilma, que por sua trajetória de luta ao longo da vida e papel central que teve no governo Lula, que representa a garantia de continuidade, consolidação e avanço deste projeto iniciado pelo Presidente Lula.
Para assinar este manifesto, envie seus dados (nome completo e RG) para cultura@pt.org.br, com assunto “Manifesto aos Brasileiros e Brasileiras de Marilena Chauí”.
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Fonte: Vi o mundo, 26/10/2010

terça-feira, outubro 26, 2010

écoutez la colere du peuple


A greve francesa

por Jaldes Reis de Meneses*
Há um belo soneto do grande poeta francês Charles Baudelaire que começa assim: a rua em torno era um frenético alarido (A uma passante).
Paris, Lyon, Marseille, julho, 1789; fevereiro, 1848; maio, 1968; outubro, 2010: tão longe, tão perto. 
Sem dúvida, o alarido das multidões nas ruas vem a ser, junto com o vinho e os queijos, uma moderna tradição francesa. A explicação estrutural do fenômeno de protestar nas ruas e erguer barricadas deita no próprio processo da revolução francesa de 1789: na radicalização jacobino (1792), os franceses fizeram uma reforma agrária ousada, fatiando os antigos feudos em pequenas propriedades camponesas. Dessa maneira, a acumulação primitiva de capitais no campo foi relativamente lenta, tendo em vistas o acelerado processo inglês. Ou seja: a transferência de renda e capital do campo para a cidade se deu de modo constante, mas num ritmo equilibrado, tanto que até os dias de hoje os pequenos proprietários rurais são uma voz política importante na França.
Qual a conexão da evolução das estruturas econômicas da industrialização francesa com o mundo da política? O processo de revolução na França configurou um tipo de hegemonia no qual as figuras do camponês e do artesão, lado a lado com as formas sociais novas do operário fabril e do burguês, tiveram que estabelecer formas de convivência, certamente conflituosas, de hegemonia burguesa, decerto incorporadora, embora muitas vezes assumindo contornos bonapartistas, das demandas sociais dos de baixo. Enfim, o paradoxo do processo de revolução burguesa na Franca lídimo e simples: o desmoronamento dos estamentos aristocráticos, e do clero, requisitou de um amplo consentimento social.
Foi esta sui generis configuração da econômica com a política, o solo no qual germinaram as idéias radicais republicanas e socialistas que tanto agradou o jovem Marx e tanto ódio despertou, em uníssono, de todos os membros, sem exceção, do pensamento conservador, numa escala de Burke a Nietzsche. Neste ínterim, é o caso de recordar o pensamento corporativista de Saint-Simon – fundamento ideológico do Estado Social Francês –, atentando ao fato de que o corporativismo pregava a paz social, mas a partir do acordo entre as partes litigantes.
Deve-se perceber que as raízes do Estado de Bem Estar Social francês estão arraigadas na cultura política do país. Desmontá-lo, portanto, se assemelha a uma autêntica operação de guerra. Por isso, o atual movimento grevista contra a lei de Sarkozy, que eleva a idade mínima de aposentadoria de 60 para 62 anos (na verdade, o fio do novelo de outras medidas), conta a adesão, conforme pesquisas, de 71% da população.
É fato que as bases definitivas do Estado Providência Francês é relativamente recente: adveio dos chamados acordos de Grenoble, acordo corporativo entre o Estado gaulista e os sindicatos comunistas que selou o fim dos movimentos de 1968, reiterando a tradição dos acordos de classe se seguirem aos estertores do movimento revolucionário.
Para entender Sarkozy e os acontecimentos da greve francesa, talvez seja o caso de recuar a maio de 1968.
No movimento do século passado, tínhamos a circunstância da irrupção de surpresa de um protesto juvenil, nascido nas Universidades, que se espalhou como um barril de pólvora para muito próximo de uma classe operária fabril compacta, massiva e sindicalizada. Mais ainda: a aliança entre operários e estudantes estava acompanhada de um audacioso projeto de emancipação social e humana – a imaginação histórica estava funcionando a pleno vapor –, no qual os intelectuais tiveram um papel de destaque, sem comparação em nenhum movimento político recente, na Europa ocidental.
Não devemos fantasiar 1968, até porque tínhamos a outra face da moeda, afinal vitoriosa. Do ponto de vista político, rememorando as melhores tradições bonapartistas francesas, tivemos a atuação do General de Gaulle, que sabia ser fundamental que o aparelho de Estado e as elites agissem sob um comando único (o seu) durante a crise, sem apresentar sequer nesgas de dissidências.
Todos deram carta branca ao comando unipessoal do general, que agiu em dois flancos: não pestanejou no uso dos instrumentos constitucionais de exceção ao seu dispor; porém, a dissuasão aos movimentos de rua foi dura, mas a repressão policial seguinte relativamente branda, poucas pessoas foram presas e ninguém condenado – “não se pode prender Sartre, não se pode prender Voltaire” disse o general em plena crise, uma frase de efeito que denota uma estratégia.
Resultado: o movimento deixou poucas cicatrizes (é lembrado até com bom humor e saudosismo), e algumas bandeiras do movimento foram sendo paulatinamente absorvidas pelo establishment – ao menos em sua dinâmica cultural e comportamental –, contíguo com boa parte das lideranças estudantil e os intelectuais, sendo perfeitamente integrados.
Revendo a poeira de 1968, Nicolas Sarkozy, estava ao lado do Estado e contra as barricadas. Não mudou de lado. Contudo, há uma novidade de perfil. Trata-se de um político-camaleão sem medo de usar o discurso da externa direita.
Bem define Sarkosy, no atual momento da Europa, o sociólogo Pierre Rosanvallon, “Houve, sucessivamente, o sarkozysmo liberal, o nacional-colbertista [protecionista], o securitário e o quase xenófobo. Berlusconi, na Itália, e Cameron, no Reino Unido, são parecidos. Representam uma direita conquistadora e sem complexos.
O verdadeiro fenômeno na Europa é essa guinada geral à direita. Desde junho de 2009, quando houve as últimas eleições para o Parlamento europeu, os 13 pleitos legislativos nacionais que ocorreram na Europa deram vitória à direita.
Mas, ao contrário da direita social e republicana de gente como Jacques Chirac, a ruptura que Sarkozy representa não é somente uma questão de estilo.
Sarkozy não hesita em tomar emprestado parte da linguagem e da agenda da extrema direita. Mas, aí também, é algo comum a todos os países europeus. Até a Suécia, fortaleza social-democrata, viu a extrema-direita se impor como fiel da balança na última eleição”.
Sarkozy, até o momento, não dispõe da unidade da assustada classe média e das elites, como De Gaulle em 1968. Virá a ter no futuro próximo? Dificilmente, pois a crise econômica atual é mais grave e profunda que a de 68.
Na greve atual, ao contrário da irrupção de surpresa do passado, que paralisa os operários, os transportes públicos, as refinarias, as escolas, os hospitais, enfim, a maioria dos serviços estatais, era uma queda de braço anunciada pelo menos desde a crise econômica de 2008. A atitude inicial de parecer um político “durão” foi um completo desastre. Passava pela cabeça do marido de Carla Bruni o ganho simbólico de derrotar o antagonismo dos sindicatos, cabeça ceifada a ser exibida ao mundo dos negócios, e aos consortes chefes de Estado da União Européia.
Qualquer que seja o desfecho, o Presidente Francês encontra-se encurralado. Evidentemente, ele sabe que depois de um ápice, em algum momento, a greve vai arrefecer. Talvez negocie algumas reivindicações secundárias dos grevistas, sem abrir mão do essencial: o aumento no tempo de aposentadoria. De todo modo, o desgaste é irremediável. Não é pouco, quando se sabe que a direita européia tem sido vitoriosa em todas as eleições recentes, depois de 2008. Pode-se abrir um espaço para a esquerda e até para a emersão de um projeto político de classe em um país fundamental do capitalismo mundial.
Tivemos uma greve geral dos serviços públicos na Franca em 2007. É impressionante como a opinião pública se deslocou de lá para cá: dois anos passados, era difícil explicar aos usuários a greve nos serviços públicos. Hoje, o apoio é generalizado. Criou-se uma greve de força popular, no qual a situação dos sindicatos é de ofensiva. Quando é criada uma situação dessas, sem negociar as reivindicações, caso o movimento se mantenha firme e unitário, no limite só resta uma alternativa ao poder do Estado: a repressão e até o Estado de Sítio. Vamos aguardar os próximos acontecimentos.
*Jaldes Reis de Meneses é Professor de Teoria da História (UFPB). 
Fonte: Blog Campo de Ensaio, 20/10/2010

domingo, outubro 24, 2010

uma constatação tão perspicaz

Tropa de Elite 2 – A saga do “herói brasileiro” e o quanto há de política na afirmação de que “filme é apenas arte”
por Fabiana Melo Sousa

Assistir o filme “Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro” e não fazer comparações com o primeiro é tarefa muito difícil, tanto no que diz respeito à estética quanto à repercussão da opinião pública a respeito da violência no Rio de Janeiro. Mas será possível encaminhar uma análise destas duas instâncias de forma separada? Talvez a maior indagação seja: quais são os limites que separam arte e política?
No início do filme somos avisados que “qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência”. Esta é a primeira imagem-aviso que recebemos numa afirmação diagética do espaço onde estamos: expectadores numa sala escura, comendo pipoca numa tarde de sábado. E somos muitos: 3 milhões em menos de uma semana de exibição, chegando ao valor de R$30 milhões arrecadados com a bilheteria do filme, somente na primeira semana de exibição. 
        Mas o que leva tantas pessoas ao cinema? Em primeiro lugar, o tema do filme é mais do que nacional. Ao contrário dos discursos hegemônicos de que brasileiro só gosta de filmes estrangeiros e de que estamos cansados de tanta violência sobre o Brasil no cinema, o longa retrata a crise que as grandes cidades brasileiras estão passando hoje, transformando-se em palco principal dos contrastes sociais que o país vive, em que a riqueza e beleza, no caso de Tropa, da cidade maravilhosa, convivem lado-a-lado com as favelas.
O argumento da obra tem como principal pensador o ex-comandante do BOPE do Rio de Janeiro, Rodrigo Pimentel, e mostra neste cenário desigual um policial humanizado como protagonista desta cidade em crise. Esta saga do “herói brasileiro” é novamente vivida por Wagner Moura que dessa vez traz uma densa atuação, conforme o filme pede, com uma expressão corporal que diria tudo por si, mas que fica prejudicada em diversos momentos por uma maquiagem exagerada.
Nosso herói agora está com outros problemas: separado de sua esposa Rosane interpretada por Maria Ribeiro, ela agora é casada com Fraga (Irandhir Santos), um militante de direitos humanos e um dos maiores críticos da atuação do BOPE que mais tarde candidata-se a deputado estadual, tentando instaurar uma CPI para investigar as milícias do Rio de Janeiro. É claro que este conflito confunde-se entre ideológico e pessoal quando o que está em questão é o filho de Nascimento e sua formação de opinião quanto ao trabalho de seu pai. 
        Um homem que, primeiramente, precisava escolher entre a ética que envolve seu trabalho e o futuro de sua família, agora vive um policial maduro e vê a sua crença de colocar ordem nesta sociedade corrupta através de sua “tropa de elite” cair por terra ao descobrir que existe uma lógica de sistema que sustenta toda esta desordem. Lógica que é maior do que a relação dualista e estreita entre bandido (traficante e policial corrupto) e mocinho (o policial do BOPE). O Capitão Nascimento agora está dentro do sistema e, ao tentar combatê-lo, percebe que a corrupção está em seu cerne. Muito tarde, o militar se dá conta de que ela não é um defeito, mas sim parte da concepção de Estado que é exercida neste país. “O inimigo agora é outro” aponta o próprio título do filme.
Nosso herói agora está arrependido e tenta de muitas formas desfazer o mal feito, mas percebe que o problema é muito mais grave do que imaginava, pois está cercado de inimigos: o governador que apoia a milícia por questões eleitorais, os deputados estaduais que ganham muito com a ascensão da milícia e todas as outras figuras conhecidas, até a mídia que atua como poderosa arma na opinião pública para legitimar a violência.
      A sensação de impotência diante de algo que já está ali há muitos anos sendo vivenciado pelo herói é claramente identificada pelo expectador. Quem de nós como cidadãos brasileiros nunca tivemos essa sensação numa fila de hospital público ou ao tentar educar nossos filhos nas escolas do Estado. Para os poucos que chegam à universidade é de indignar ver a estrutura física das instituições de ensino sucateadas ou mesmo, quando no limite desta questão, sofremos com a violência propriamente dita, executada por aqueles que cedem ao abandono da humanidade e se assumem como parte da barbárie com o outro. 
A estética documental que é mantida neste segundo filme também ajuda muito na aproximação com a “realidade” e na simpatia dos 3 milhões de expectadores. 
          A fotografia lavada de Lula Carvalho, onde as imagens não são retocadas deixam um clima tenso e ao mesmo tempo parece que estamos assistindo cenas que vimos todos os dias nos noticiários. A câmera é inquieta e em algumas sequências a instabilidade do enquadramento chega a incomodar, como é o caso da primeira, que retrata uma rebelião numa penitenciária. 
     Daniel Rezende respeita o tempo interno que o filme exige numa montagem, valorizando os atores em cena e dando maior intensidade à câmera perturbadora e com movimentos inquietos, que também são explorados em primeiríssimos planos nos momento em que Nascimento conversa sobre seu filho com sua ex-esposa.
O elenco como um todo é atravessado pelo trabalho de Fátima Toledo que mais uma vez deixa sua marca na preparação de elenco em filmes que exigem dos atores intensidade e entrega total para viver o instante das cenas: suas vozes, posturas e olhares passam para o expectador todos os incômodos e emoções possíveis, principalmente nas cenas de violência explícita, assim como nos diálogos improvisados que marcam muitos momentos do filme.
Mas será que estes elementos estéticos do filme dão conta de responder a pergunta: o porquê de o público brasileiro identificar-se tanto com Tropa de Elite 2? Estes elementos fílmicos nos levam a outra pergunta: o que estes elementos em conjunto contribuem ou não para a nossa construção de mundo que por sua vez influenciariam em nossa construção política de mundo?
Esta questão não é só de quem escreve estas palavras, a declaração do atual comandante do BOPE, Paulo Henrique Moraes também aponta esta preocupação, pois ele mesmo declarou em entrevista coletiva sobre o filme no dia 14/10/2010 que, ao misturar ficção e realidade, o filme pode vir a confundir a opinião dos expectadores. Atrevo-me a afirmar que o capitão pode estar certo e errado ao mesmo tempo.
O grande incômodo que o primeiro filme “Tropa de Elite” causou nos grupos de direitos humanos foi exatamente a respeito de sua estética documental que aproximava acontecimentos reais vividos pela sociedade carioca, que era o caso da guerra entre o tráfico de drogas do Rio de Janeiro e a relação com a polícia, mas que tinha como pano de fundo a saga de um herói que em muitos momentos aparecia em cenas de tortura. Não são necessários estudos muito profundos para perceber o quanto o personagem Capitão Nascimento caiu no gosto popular: fantasia de carnaval da tropa de elite, o jargão “pede pra sair” que estava na boca das crianças e mesmo a opinião pública a favor da atuação da polícia nas favelas são sinais do quanto a população como um todo foi influenciada pelo o que o filme retratou. Sobre este aspecto, talvez o atual comandante tenha razão.
O fato da produção do segundo filme ter esperado as eleições passarem para ser lançado pode ter explicações políticas também: seus personagens são idênticos a algumas personalidades públicas do atual cenário carioca, principalmente os que representavam o corpo político de nossa câmara de vereadores. 
O desfecho do filme também traz uma mensagem explícita: sobre o Planalto do Palácio em Brasília, Capitão Nascimento em off narra a verdadeira raiz da falha das políticas de segurança pública do país, que é não conseguir chegar ao verdadeiro crime organizado. Se as investigações fossem levadas a sério iriam chegar aos senadores, à bolsa de valores e às grandes esferas de poder do Brasil e do mundo.
Neste sentido sim, o comandante Moraes tem razão em preocupar-se com os resultados de um filme que retrata a política brasileira com o que ela de fato é: o resultado de um Estado que serve aos interesses de um projeto de mundo neoliberal que ao criminalizar a pobreza desvia a atenção do eleitor para as verdadeiras causas da violência que estamos inseridos e, como lembra Milton Santos, que organiza a cidade dentro destes interesses.
E criminalizar a pobreza é coisa que a mídia sabe fazer muito bem. A mídia, assim como todas as empresas, representam os interesses deste sistema e percebem que numa sociedade midiática tudo o que se produz em imagens é percebido como mensagem e é sempre carregado de ideologia. 
Mas por outro lado, esta mesma indústria de imagens que transmite, divulga e reafirma a criminalização da pobreza, é a mesma que aliena com a indústria do entretenimento, e aí é que começo a pensar que Moraes talvez possa ficar despreocupado.
As ditaduras militares nos anos 60 aqui no Brasil e na América Latina fizeram mais do que torturar, instalaram em nós um pensamento difícil de desconstruir, que é o da descrença numa mudança de sociedade. O grito de esperança de um mundo sem injustiças foi amordaçado pelas mãos do mesmo sistema que o filme “Tropa de Elite 2” denuncia. Hoje, como resultado, temos uma sociedade que a cada dia luta para seus interesses individuais, desta forma, ir ao cinema e assistir um filme que traz uma constatação tão perspicaz é apenas entretenimento.
Voltamos então a pergunta: quais são os limites entre arte e política? E a ela acrescento outra: para que serve a arte se ela não transforma nada ou para que serve hoje lutar se atualmente temos uma sociedade que não se interessa pelas lutas coletivas?
Os limites que separam arte e politica são tênues e muitas vezes a confusão entre os dois é criticada tanto por aqueles que atuam na primeira quanto na segunda esfera, mas se o que nos difere na maioria dos outros animais é o fato de sermos seres sociais e culturais, isso quer dizer que procurar estabelecer lugares opostos para cada coisa é perder a oportunidade de trazer a tona questões que estão em nossa vida.
Não vamos esperar, assim como o Capitão Nascimento, que algo nos atravesse de forma avassaladora e destruidora para que tenhamos mais do que indignação, mais coragem para enfrentar os problemas em nossa sociedade. Precisamente, no caso da violência do Rio de Janeiro, estar sensibilizado com as lutas de heróis como o Nascimento e o deputado Fraga são importantes, mas é em nossa participação ativa e coletiva que podemos ver transformações.
Ir ao cinema, assistir um filme e comentar com os amigos, debatê-lo em sala de aula, conversar com as pessoas na fila do banco, promover exibições coletivas em casa ou em cineclube é mais do que um ato pela divulgação da indústria cultural em nosso país, é um ato político.
Santiago Alvarez, grande representante do cinema latino-americano dos anos 1960, diz ter muitas dificuldades em distinguir o que não é um filme político e talvez a sua dificuldade seja em conseguir perceber o que não é política nas ações humanas. 
Identificar o filme “Tropa de Elite 2” com a nossa realidade brasileira é perceber que o tema ainda não se esgotou, portanto ele não é a única e verdadeira realidade Brasileira.
Se existe uma coisa que aproxima o fazer artístico da atuação política é o fato que em ambos nos sentimos mais vivos e mais humanos, que não vale a pena viver apenas para sobreviver. Se a arte serve para mexer com os nossos sentimentos e, se a indignação tanto com a imagem de um torturador quanto com a de um deputado honesto que tenta denunciar uma milícia é algo provocado por um filme, e se esta indignação é uma mola motora para transformação, então fazer arte é um ato político.
Ao final do filme, o filho então adolescente do Capitão Nascimento leva um tiro numa tentativa de assassinato, pois estava no mesmo carro do seu padrasto que, enfim, consegue aprovar a CPI das milícias. Na última cena, o garoto numa cama de hospital abre os olhos. E então, vamos abrir os nossos? Qualquer semelhança com a realidade é coincidência? 
Fonte: Blog Leia Cinema, 18/10/2010

"...hoje, é preciso senso crítico sempre atilado"

As bolas de papel da democracia desejada

por Gilson Caroni Filho
Quando as redações da grande imprensa, em campanha aberta pela candidatura Serra, erigem o preconceito como norma de juízo, a mentira não é apenas abominável: é suicida. A opinião pública brasileira dispõe, hoje em dia, dos elementos necessários para julgar os acontecimentos políticos, sociais, econômicos e culturais sem se deixar levar pelo filtro ideológico de conhecidas técnicas de edição. Há muito tempo, a sociedade aprendeu a aquilatar a qualidade ética da informação oferecida, os desvios de apuração e o descompromisso do noticiário com a verdade factual.
O Jornal Nacional de quinta-feira, 21/10, não foi apenas uma tentativa patética de recriar o tiro que matou o Major Vaz. Os sete minutos gastos na “fabricação” da fita adesiva que teria atingido o candidato tucano revelam desorientação no tempo e no espaço. A Rua Tonelero não fica em Campo Grande, zona oeste do Rio de Janeiro. Além disso, passados 56 anos, não há lugar para atores políticos com indefinição ideológica evidente. Serra não é Lacerda; falta-lhe talento. O PSDB não é a UDN; tem lastro histórico mais precário. Mas em ambos, no candidato e em seu partido, convivem a vergonha de serem ostensivamente autoritários e o medo de serem inteiramente democráticos. A face dupla do moralismo udenista, transposto para 2010, realça o desbotamento de um Dorian Gray mal-acabado.
A campanha oposicionista padece de velhos vícios e truncamentos de origem. Parece acreditar que o povo, em toda a parte, é uma entidade incapaz e como tal deve ser tratado, sob pena de hecatombe social iminente. Deve-se também ameaçar a esquerda com a hipótese sempre latente de um golpe de Estado. E lembrar aos setores populares, principalmente à nova classe média, que se eles não tiverem juízo virão aí os bichos papões e, com eles, os massacres dos Kulaks, as igrejas fechadas, os asilos psiquiátricos, a supressão da liberdade, em suma, o socialismo sem rosto humano.
Essa agenda está superada, mas seu simples ressurgimento deve nos remeter a pontos importantes. Se atualmente é difícil calar organizações que expressam as demandas dos seus membros e representados, como é o caso do MST, do movimento estudantil e do mundo do trabalho, muitos obstáculos ainda têm que ser ultrapassados.
Exigir liberdades democráticas não é uma gesticulação romântica, desde que se dêem consequências às suas implicações. É preciso apostar na organização crescente das forças sociais com o objetivo de consolidar uma saída definitivamente nacional e popular para temas que vão da questão agrária ao controle social dos meios de comunicação.
A análise histórica mostra que, quando não avançamos na democracia concreta, damos aos seus adversários tempo para que se reorganizem, utilizando as oficinas de consenso para caluniar, difamar, fazer o que for necessário, para deter o ímpeto vital que lhes ameaça.
Nos dias de hoje, é preciso senso crítico sempre atilado, não se deixar envolver pela vaga e traiçoeira tese do aperfeiçoamento democrático a qualquer preço, pois as forças retrógadas costumam cobrar bem caro por nossas distrações ou equívocos. Por tudo isso, a eleição de Dilma Rousseff é um passo decisivo para erradicarmos de vez o cartorialismo econômico, a indiferença moral e a incompetência administrativa que marcaram vários governos até 2003.
Na Rua Tonelero, o futuro vislumbrado é o de um país que realizará suas potencialidades. O que importa saber é que atores são capazes de assegurar uma democracia com ênfase social, assentada também nos direitos individuais e na liberdade econômica. Nesse cenário, as bolinhas de papel passeiam na calçada. O vento - e não mais o cálculo político - dita o rumo de cada uma delas.
Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil.
Fonte: Carta Maior, 23/10/2010.

sábado, outubro 23, 2010

Conferência do Desenvolvimento

"... nunca é demais repetir e insistir que o desenvolvimento se faz para o homem." Celso Furtado, em seu livro Um Projeto para o Brasil
Conferência do Desenvolvimento – Code/Ipea
24 a 26 de novembro de 2010, Esplanada dos Ministérios, Brasília (DF)
   Durante os três dias da conferência, serão realizados nove painéis (palestras e debates com convidados, no plenário da Code) e 88 oficinas do desenvolvimento (palestras promovidas pelas sete diretorias que compõem o Ipea, em salas montadas dentro da conferência). Também haverá atividades de desenvolvimento cultural. A programação começará às 8h e se estenderá até as 20h. Confira, quais serão os temas e os horários de cada atividade. 
   O objetivo da Code é criar um espaço nacional de debates no coração do Brasil, no momento em que o país volta a discutir planejamento e estratégias de desenvolvimento. Para isso, a conferência terá vídeos, apresentações de livros, instalações, projeções, oficinas e palestras. As exposições serão norteadas pelos sete eixos temáticos do desenvolvimento definidos pelo Ipea: inserção internacional soberana; macroeconomia para o desenvolvimento; fortalecimento do Estado, das instituições e da democracia; estrutura tecnoprodutiva integrada e regionalmente articulada; infraestrutura econômica, social e urbana; proteção social, garantia de direitos e geração de oportunidades; e sustentabilidade ambiental.
    A programação é dividida em três tipos de atividades: painéis (palestras e debates mais abrangentes, no plenário da conferência); oficinas do desenvolvimento (exposições e mesas de debate realizadas em salas de aula dentro da Code); e desenvolvimento cultural (apresentações de experiências de desenvolvimento do ponto de vista da cultura). Para obter outras informações sobre as atividades e anotar o horário das que mais interessam, acesse www.ipea.gov.br/code.
    Aberta a toda a sociedade, a conferência será realizada no canteiro central da Esplanada dos Ministérios, em frente à Catedral de Brasília. Estarão presentes conselheiros de orientação do Ipea, diretores e técnicos de planejamento e pesquisa do Instituto, além de acadêmicos e autoridades de todas as regiões do país. O Ipea não arcará com despesas de transporte, alojamento e alimentação, que ficarão a cargo do público.
As inscrições se encerram em 5 de novembro de 2010
Fonte: IPEA (http://www.ipea.gov.br/code/index.html)

sexta-feira, outubro 22, 2010

Mata Atlântica, água e biodiversidade

Água para 123 milhões de brasileiros depende da Mata Atlântica

.
Um dos conjuntos de ecossistemas mais ameaçados do mundo, bioma apresenta alto índice de destruição, inferior apenas ao das florestas quase extintas da Ilha de Madagascar. Mas ainda é uma das regiões do mundo mais ricas em diversidade biológica.
A Mata Atlântica apresenta hoje a área de vegetação nativa brasileira mais devastada do País. Reduzida a apenas 27% de sua cobertura original, ainda é uma das regiões do mundo mais ricas em diversidade biológica, embora dados apresentados pela SOS Mata Atlântica assegurem que apenas 7,26% de seus remanescentes permanecem bem conservados.
Sua manutenção e preservação deixou de ser uma prioridade restrita aos ambientalistas. Agora, depende do envolvimento de todos os setores produtivos, econômicos e sociais do Brasil, uma vez que em seus limites vivem 123 milhões de pessoas – 67% de toda a população brasileira.
Esse número expressivo de habitantes necessita da preservação dos remanescentes de vegetação nativa, dos quais depende o fluxo de mananciais de águas que abastecem pequenas e grandes cidades.
As áreas de cobertura vegetal nativa que ainda restam prestam serviços ambientais importantes, como a proteção de mananciais hídricos, a contenção de encostas, a temperatura do solo e a regulação do clima, já que regiões arborizadas podem reduzir a temperatura em até 2º C.
Segundo um estudo da entidade WWF, mais de 30% das 105 maiores cidades do mundo dependem de unidades de conservação para garantir seu abastecimento de água. As matas ciliares, nome dado ao conjunto de vegetação localizada às margens dos cursos de água, foram avaliadas como comprometidas na Mata Atlântica. São fundamentais para a proteção e preservação da diversidade da flora e fauna, pois além de evitar o agravamento de secas e o aumento das enchentes, também funcionam como corredores para que animais e sementes possam transitar entre as áreas protegidas e garantir a alimentação e variabilidade genética das mais diferentes espécies.
As áreas bem conservadas e grandes o suficiente para garantir a biodiversidade e manutenção da Mata Atlântica a longo prazo não chegam a 8% de sua cobertura vegetal original. A região continua a sofrer sérias ameaças, que podem se agravar caso o Código Florestal brasileiro sofra alterações que não garantam a utilização responsável e sustentável de seus recursos naturais.
Além de reduzidos, os remanescentes estão fragmentados e se distribuem de maneira não uniforme ao longo do território, fator que compromete a perpetuidade de espécies raras, endêmicas e ameaçadas de extinção.
Hotspot – Especialistas estimam que a Mata Atlântica, considerada um hotspot (área prioritária para conservação, com alta biodiversidade e endemismo e ameaçada no mais alto grau) possua mais de 20.000 espécies de plantas, aproximadamente 35% de toda a flora existente no País.
Segundo dados da Conservação Internacional (CI), trata-se do hotspot número 1 entre as regiões monitoradas em todo o mundo. Levantamentos indicam que sua área abriga 849 espécies de aves, 370 de anfíbios, 200 de répteis , 270 espécies de mamíferos e cerca de 350 espécies de peixes. Outro dado alarmante: das 472 espécies ameaçadas de extinção em todo o território nacional, 276 (mais de 50%) estão na região.
“As ações de proteção do MMA direcionadas à Mata Atlântica incluem o aperfeiçoamento da legislação, com a aprovação da Lei da Mata Atlântica e a instituição de projetos e programas de conservação e recuperação de mata nativa”, afirma o coordenador do núcleo Mata Atlântica do MMA, Wigold Schaffer. “Também envolvem o monitoramente e fiscalização dos desmatamentos e queimadas, a criação e implementação de unidades de conservação e a ampliação de parcerias com instituições públicas e privadas da sociedade civil.”
Considerada por especialistas como um avanço na legislação ambiental brasileira, a Lei da Mata Atlântica (nº 11.428/2006) e sua regulamentação possuem regras claras e incentivos para que a conservação, proteção, regeneração e utilização sustentável de seus componentes sejam implementadas.
Schaffer explica que uma das principais metas do Governo Federal é transformar pelo menos 10% da área total da região em unidades de conservação (UCs) de proteção integral e uso sustentável. Atualmente, existem 123 UCs federais e 225 estaduais na Mata Atlântica, o que resulta em quase 1,7 milhão de hectares transformados em áreas de proteção integral (3%) e pouco mais de 2 milhões de hectares de áreas de uso sustentável.
Ameaça – Dentre as espécies de flora ameaçadas em seus limites, destacam-se o pau-brasil, araucária, palmito-juçara, jequitibá, jaborandi, jacarandá e imbuia, além de orquídeas e bromélias.
Com relação à fauna, das 202 espécies de animais consideradas oficialmente ameaçadas de extinção no País, 171 eram da Mata Atlântica. Das 20 espécies de répteis ameaçadas no Brasil, 13 ocorrem neste bioma. Entre os animais terrestres que ocorrem na região sob alto risco de extinção, 185 são vertebrados (quase 70% do total ameaçado no Brasil), entre eles 118 aves, 16 anfíbios, 38 mamíferos e 13 répteis.
Alguns deles ficaram bastante conhecidos após campanhas de preservação, como o mico-leão-de-cara-dourada, mico-leão-da-cara-preta, a saíra-sete-cores, papagaio-da-cara-roxa e o tatu-bola.
Além da perda de hábitat, as espécies da Mata Atlântica são vítimas do tráfico de animais, comércio ilegal que movimenta no mundo US$ 10 bilhões por ano.
Fatores de perda – Entre os fatores de destruição da vegetação nativa da Mata Atlântica constam a expansão da pecuária bovina, a implantação de monoculturas agrícolas, o reflorestamento com espécies exóticas, a abertura de novas fronteiras de agricultura e de ferrovias e rodovias sem estratégias sustentáveis.
O avanço desordenado das cidades, empreendimentos e grandes obras de infraestrutura, bem como a mineração e a exploração madeireira também contribuíram para a degradação da cobertura vegetal original.
De 2005 a 2008, os estados que mais desmataram foram Minas Gerais, Santa Catarina e Bahia, responsáveis por mais de 80% do total de desmatamento ocorrido no período.
Em 2006, o MMA indicou 880 áreas prioritárias para conservação distribuídas em 429 mil km2 de Mata Atlântica. Desse total, 522 são áreas novas e 358 já possuem algum tipo de proteção.
Corredor Ecológico – O conceito de corredor ecológico ou corredor de biodiversidade se refere a extensões significativas de ecossistemas nos quais ocorre o fluxo de indivíduos e genes entre áreas remanescentes de ecossistemas, unidades de conservação e áreas protegidas. Aumentam, assim, a probabilidade de sobrevivência das diferentes espécies que neles habita, e asseguram a manutenção de processos evolutivos em larga escala.
O Corredor Central da Mata Atlântica, localizado nos estados da Bahia e Espírito Santo ao longo da costa atlântica, estende-se por mais de 1.200 km no sentido norte-sul, e foi implementado desde março de 2002. O corredor agrega ecossistemas aquáticos de água doce e marinhos (dentro da plataforma continental).
O projeto conta com a assistência técnica da Cooperação Brasil-Alemanha (GTZ) e com investimentos do banco alemão KFW e da União Europeia. Também atuam em projetos de conservação da região a Fundação SOS Mata Atlântica, Conservação Internacional, WWF, Mater Natura e outras entidades não-governamentais.
Outra grande área de preservação dentro dos limites da Mata Atlântica é o Corredor da Serra do Mar, que cobre cerca de 12,6 milhões de hectares, do Paraná ao Rio de Janeiro, englobando as serras do Mar e da Mantiqueira.
Bom exemplo – Quando adquiriu a Fazenda Bulcão, em Aimorés (MG), o fotógrafo Sebastião Salgado encontrou uma propriedade quase totalmente formada por pasto degradado. Com o processo de recuperação da área, realizado pelo Instituto Terra, o local foi transformado em Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), e a fazenda foi tornou-se a primeira RPPN recuperada de área degradada na Mata Atlântica.
Nela já foram plantadas mais de 1 milhão de mudas nativas desde 1999. Como resultado, o fluxo de água da região ficou mais homogêneo ao longo do ano, e foram cadastradas sete nascentes que ainda não haviam sido identificadas no Córrego do Bulcão, que passa dentro da propriedade. O local funciona também como corredor ecológico e referência de envolvimento social na preservação da Mata Atlântica.
Definição e abrangência – A Mata Atlântica é composta por um conjunto de formações florestais, campos naturais, restingas, manguezais e outros tipos de vegetação que são considerados ecossistemas associados e compõem diferentes paisagens. Essas formações cobriam originalmente total ou parcialmente 17 estados brasileiros e abrangiam uma área de aproximadamente 1,3 milhão de quilômetros quadrados.
Ilhas oceânicas também se agregam aos seus domínios, além dos encraves de Mata Atlântica – como formações florestais e brejos interioranos – existentes em meio a outros biomas. As limitações da região estão estabelecidas no Mapa da Área de Aplicação da Lei nº11.428/2006, do IBGE, que pode ser encontrado nos sites www.ibge.gov.br ou www.mma.gov.br.
Texto de Carine Corrêa e Edição de Rafael Fontana, Ministério do Meio Ambiente.
Fonte: EcoDebate, 21/10/2010

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