sábado, julho 30, 2011

a Europa das grandes empresas e do capital financeiro

A política e a economia na (des)construção europeia

Para quem assiste nos dias de hoje a tudo o que se passa na zona do euro, parece haver uma enorme distância entre os sonhos utópicos da construção da então chamada “Europa dos povos e das nações” e a crise atual de natureza econômica e financeira que parece colocar em xeque tantas décadas de uma difícil trilha em busca de algum tipo de unificação.
É claro que, desde o início de tal movimento no velho continente, havia uma tentativa de se contrapor, do ponto de vista geopolítico e ideológico, ao avanço dos países que experimentavam o caminho do socialismo pelo lado da Europa oriental. Porém, não há como negar tampouco que do lado dos sonhadores de uma unificação europeia estavam também os que lutavam por um espaço de maior solidariedade e de afirmação da paz em um continente tão marcado pelos horrores das guerras sucessivas.
Não por acaso, os primeiros passos mais concretos para essa iniciativa foram dados logo depois do final da Segunda Guerra Mundial, quando 6 países resolveram estabelecer a Comunidade Econômica do Carvão e do Aço (CECA). Assim, em 1951 Bélgica, Holanda, Luxemburgo, França, Alemanha e Itália constituem essa primeira tentativa de união aduaneira em torno dessas duas mercadorias essenciais ao processo de industrialização que se avizinhava para a reconstrução pós 1945. A base para tal acordo foi justamente uma tentativa anterior dada pelos 3 primeiros países, numa união que ficou conhecida como Benelux.
O processo diplomático e econômico evolui aos poucos e em 1957 esse mesmo grupo de países firma o importante Tratado de Roma, instituindo oficialmente a Comunidade Econômica Européia (CEE). Para além de simples união aduaneira, os signatários avançam mais do que a mera circulação de mercadorias sem pagamento de impostos. O tratado já apontava na direção da livre circulação de pessoas e de serviços. Os aspectos positivos da construção atraem, mais tarde, a Grã Bretanha, a Dinamarca e a Irlanda, que se associam ao bloco em 1973. No jargão da diplomacia, encerrava-se a fase da “Europa dos 6” e tinha início a etapa da “Europa dos 9”.
Apesar das dificuldades intrínsecas à construção da unidade interna em conjunto tão diverso de identidades nacionais, os dirigentes políticos europeus percebiam a necessidade de ampliarem também o espaço para novos países, tanto em termos de novos mercados como de expansão territorial da união. O período de crescimento econômico dos anos 60/70 parecia favorecer tal tentativa e na década de 80 foram aceitos Grécia (1981) e depois Portugal e Espanha (1982). Era a início da fase da “Europa dos 12”.
A década de 90 é marcada por importantes saltos no caminho da construção do mercado monetário. Em 1991, o Tratado de Maastricht formaliza a transformação da “simples” CEE (comunidade) em um organismo mais complexo, a União Européia (UE). Com isso, começa a ganhar corpo a estratégia de constituição orgânica de uma Europa de natureza quase confederativa e que estaria mais consolidada, tanto do ponto de vista político-institucional quanto da perspectiva econômica e monetária.
Na esteira de tal movimento, em 1993 é aprovada a criação de uma moeda única para esse espaço europeu – o euro. A previsão era de que a entrada em vigor desse novo padrão monetário fosse para o início da década seguinte. Por outro lado, ainda em 1995, a UE ganha três novos membros: Áustria, Finlândia e Suécia. A partir de então, fala-se da “Europa dos 15”.
Na sequência, 2002 vem a ser um ano especial. É quando tem início a vigência, de forma efetiva, do novo padrão monetário no interior da UE. Em uma experiência absolutamente inédita na história, os países abandonavam suas respectivas moedas nacionais e as substituíam pelo novo euro – uma moeda supranacional. Porém, como estava previsto nos acordos, 3 membros decidem não avançar tão profundamente na unificação. Grã Bretanha, Dinamarca e Suécia optam por uma postura de maior cautela e constituem uma exceção: continuam a ser membros da UE, mas lançam mão do argumento da soberania para não compartilhar a união monetária. Continuam operando em seus próprios espaços nacionais com a libra esterlina e as coroas dinamarquesa e sueca.
Os processos de pedidos de adesão continuam a chegar e o espaço da UE vai sofrer ainda mais dois momentos de ampliação. Em 2005 entram 10 novos países de uma só vez: Chipre, Malta, Polônia, Estônia, Letônia, Lituânia, Hungria, República Tcheca, Eslováquia e Eslovênia. Esse conjunto dura pouco tempo, pois em 2007 entram Bulgária e Romênia, constituindo o quadro atual da “Europa dos 27”.
Uma das singularidades que mais chamam a atenção no caso da unificação européia é a combinação do elemento político-institucional com o econômico. Isso porque, ao contrário do pouco espaço oferecido pela grande imprensa ao movimento, trata-se de um longo processo, em que os países abrem voluntariamente mão de aspectos de soberania nacional para construção de um espaço e de uma institucionalidade supranacionais. 
A UE conta hoje com um poder legislativo (Parlamento Europeu), cujos integrantes são eleitos diretamente pelos cidadãos de cada um dos 27 membros, com algum grau de proporcionalidade ao tamanho de suas respectivas populações. Os países mais populosos elegem um máximo de 96 deputados cada um e os menores ficam com um mínimo de 6 representantes cada. A União é dirigida pelo Conselho Europeu que reúne os Chefes de Estado de todos os países membros, com reuniões trimestrais ordinárias.
O Conselho da União Européia representa algo mais próximo do organismo responsável pelo estabelecimento de políticas públicas e de implementação de matérias aprovadas pelo parlamento. Ele é composto por um representante ministerial de cada governo. O peso de cada país nessa instância é proporcional à sua economia e à sua população. Assim, por exemplo, Alemanha, França, Itália e Grã Bretanha detêm 29 votos cada, enquanto Chipre, Estônia, Letônia, Luxemburgo e Eslovênia têm direito a 4 votos cada um. Dentre as atribuições do Conselho, estão a aprovação do Orçamento da UE, a aprovação da política externa, a definição de uma política econômica comum, entre outros aspectos. Finalmente, temos a famosa Comissão Européia, que é responsável pela condução da UE em seu cotidiano. São 27 “comissários” indicados por seus países e referendados pelo Parlamento Europeu. Cada membro tem um mandato de 5 anos. O poder da Comissão é enorme, pois ela é encarregada de tocar aquilo que se poderia chamar de “governo europeu” em termos de política governamental e administrativa.
Além disso, a UE constituiu organicidade também na área judiciária, com a criação do Tribunal de Justiça. Para sua composição, cada Estado membro indica um Juiz, com mandato de seis anos, renovável. Por outro lado, foi criado um Tribunal de Contas, sem poder de decisão definitivo, mas que se encarrega de acompanhar os processos relativos à lisura na condução da administração pública da UE e também as suspeitas de corrupção.
Um outro órgão que tem chamado bastante a atenção no período recente é o Banco Central Europeu (BCE). Ele foi oficialmente criado já em 1998, como sucessor do então Instituto Monetário Europeu, antes mesmo da entrada oficial em curso do euro nos países da região. O banco é dirigido por uma Diretoria composta por 6 membros indicados pelos governos dos 16 países que adotam o euro como moeda. Cada diretor tem um mandato de 8 anos. Acima da diretoria está o Conselho de Governadores, que reúne os 6 membros da diretoria e mais os representantes dos Bancos Centrais dos países da zona euro. Ao Conselho cabe a definição dos elementos gerais da política monetária e a taxa de juros do BCE.
Como se pode perceber, o processo de construção da UE guarda uma complexidade político-institucional, elemento necessário para assegurar justamente a convivência da pluralidade e da diversidade dos países membros. Com isso, o ritmo da construção européia é o ritmo da política e da diplomacia, a busca do consenso e do convencimento. Porém, correndo paralelamente, foi sendo desenhada também a arquitetura da união econômica e monetária da Europa. E esse processo tem início justamente durante os anos 80 e 90 do século passado, quando imperava absoluto o paradigma neoliberal pelo mundo afora – inclusive no interior de governos socialistas à frente do processo de unificação européia, cujo maior simbolismo ficou por conta de François Mitterand, presidente da França por 14 anos – de 1981 a 1995.
E o ritmo da economia acabou por ser muito mais acelerado do que o da política e do institucional. A construção da ordem econômica e financeira da UE, dessa forma, terminou por ser o elemento determinante na configuração final do modelo de união adotado. Ao invés da Europa dos povos e das nações, o que se via cada vez mais claramente era a construção da Europa das grandes empresas e do capital financeiro.
A distância física e a falta de sintonia dos órgãos centrais europeus reforçam o sentimento com que passam a ser tratados “aqueles de Bruxelas”, como se aos poucos o sonho da Europa unida fosse desconstruído pelos pesadelos provocados pelas decisões de uma tecnocracia desvinculada das preocupações da maioria da população e mesmo de seus governos nacionais. A independência do BCE é a perfeita concretização de tal tendência.
Tal descompasso entre a política e a economia vai desembocar num certo desencanto de parcelas crescentes da população de diversos países da região, provocando mesmo um conjunto de manifestações contrárias em plebiscitos convocados para referendar os acordos assinados pelos governos. Mais do que um “não” à Europa em geral, tratava-se de uma posição contrária à forma como aquela união estava sendo constituída, com o eterno chamado ao sacrifício da maioria e os também conhecidos benefícios para poucos. A negativa nas consultas efetuadas na França, Holanda e Irlanda na primeira década do milênio foram os primeiros alertas a respeito das dificuldades colocadas pelo modelo europeu em andamento.
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.
Fonte: Carta Maior | Debate Aberto, 28/07/2011

I Miss You

não consigo andar pelo mundo pegando coisas e trocando-as

Caí no mundo e não sei voltar

por Eduardo Galeano
O que acontece comigo é que não consigo andar pelo mundo pegando coisas e trocando-as pelo modelo seguinte só por que alguém adicionou uma nova função ou a diminuiu um pouco…
Não faz muito, com minha mulher, lavávamos as fraldas dos filhos, pendurávamos na corda junto com outras roupinhas, passávamos, dobrávamos e as preparávamos para que voltassem a serem sujadas.
E eles, nossos nenês, apenas cresceram e tiveram seus próprios filhos se encarregaram de atirar tudo fora, incluindo as fraldas. Se entregaram, inescrupulosamente, às descartáveis!
Sim, já sei. À nossa geração sempre foi difícil jogar fora. Nem os defeituosos conseguíamos descartar! E, assim, andamos pelas ruas, guardando o muco no lenço de tecido, de bolso.
Nããão! Eu não digo que isto era melhor. O que digo é que, em algum momento, me distraí, caí do mundo e, agora, não sei por onde se volta.
O mais provável é que o de agora esteja bem, isto não discuto. O que acontece é que não consigo trocar os aparelhos de som uma vez por ano, o celular a cada três meses ou o monitor do computador por todas as novidades.
Guardo os copos descartáveis! Lavo as luvas de látex que eram para usar uma só vez. Os talheres de plástico convivem com os de aço inoxidável na gaveta dos talheres! É que venho de um tempo em que as coisas eram compradas para toda a vida!
É mais! Se compravam para a vida dos que vinham depois! A gente herdava relógios de parede, jogos de copas, vasilhas e até bacias de louça.
E acontece que em nosso, nem tão longo matrimônio, tivemos mais cozinhas do que as que havia em todo o bairro em minha infância, e trocamos de refrigerador três vezes.
Nos estão incomodando! Eu descobri! Fazem de propósito! Tudo se lasca, se gasta, se oxida, se quebra ou se consome em pouco tempo para que possamos trocar. Nada se arruma. O obsoleto é de fábrica.
Aonde estão os sapateiros fazendo meia-solas dos tênis Nike? Alguém viu algum colchoeiro encordoando colchões, casa por casa? Quem arruma as facas elétricas? o afiador ou o eletricista? Haverá teflon para os funileiros ou assentos de aviões para os talabarteiros?
Tudo se joga fora, tudo se descarta e, entretanto, produzimos mais e mais e mais lixo. Outro dia, li que se produziu mais lixo nos últimos 40 anos que em toda a história da humanidade.
Quem tem menos de 30 anos não vai acreditar: quando eu era pequeno, pela minha casa não passava o caminhão que recolhe o lixo! Eu juro! E tenho menos de… anos! Todos os descartáveis eram orgânicos e iam parar no galinheiro, aos patos ou aos coelhos (e não estou falando do século XVII). Não existia o plástico, nem o nylon. A borracha só víamos nas rodas dos autos e, as que não estavam rodando, as queimávamos na Festa de São João. Os poucos descartáveis que não eram comidos pelos animais, serviam de adubo ou se queimava..
Desse tempo venho eu.  E não que tenha sido melhor…. É que não é fácil para uma pobre pessoa, que educaram com “guarde e guarde que alguma vez pode servir para alguma coisa”, mudar para o “compre e jogue fora que já vem um novo modelo”.
Troca-se de carro a cada três anos, no máximo, por que, caso contrário, és um pobretão. Ainda que o carro que tenhas esteja em bom estado… E precisamos viver endividados, eternamente, para pagar o novo!!! Mas… por amor de Deus!
Minha cabeça não resiste tanto. Agora, meus parentes e os filhos de meus amigos não só trocam de celular uma vez por semana, como, além disto, trocam o número, o endereço eletrônico e, até, o endereço real.
E a mim que me prepararam para viver com o mesmo número, a mesma mulher e o mesmo nome (e vá que era um nome para trocar). Me educaram para guardar tudo. Tuuuudo! O que servia e o que não servia. Por que, algum dia, as coisas poderiam voltar a servir.
Acreditávamos em tudo. Sim, já sei, tivemos um grande problema: nunca nos explicaram que coisas poderiam servir e que coisas não. E no afã de guardar (porque éramos de acreditar), guardávamos até o umbigo de nosso primeiro filho, o dente do segundo, os cadernos do jardim de infância e não sei como não guardamos o primeiro cocô.
Como querem que entenda a essa gente que se descarta de seu celular há poucos meses de o comprar? Será que quando as coisas são conseguidas tão facilmente, não se valorizam e se tornam descartáveis com a mesma facilidade com que foram conseguidas?
Em casa tínhamos um móvel com quatro gavetas. A primeira gaveta era para as toalhas de mesa e os panos de prato, a segunda para os talheres e a terceira e a quarta para tudo o que não fosse toalha ou talheres. E guardávamos…
Como guardávamos!! Tuuuudo!!! Guardávamos as tampinhas dos refrescos!! Como, para quê?  Fazíamos limpadores de calçadas, para colocar diante da porta para tirar o barro. Dobradas e enganchadas numa corda, se tornavam cortinas para os bares. Ao fim das aulas, lhes tirávamos a cortiça, as martelávamos e as pregávamos em uma tabuinha para fazer instrumentos para a festa de fim de ano da escola.
Tuuudo guardávamos! Enquanto o mundo espremia o cérebro para inventar acendedores descartáveis ao término de seu tempo, inventávamos a recarga para acendedores descartáveis. E as Gillette até partidas ao meio se transformavam em apontadores por todo o tempo escolar. E nossas gavetas guardavam as chavezinhas das latas de sardinhas ou de corned-beef, na possibilidade de que alguma lata viesse sem sua chave.
E as pilhas! As pilhas dos primeiros rádios Spica passavam do congelador ao telhado da casa. Por que não sabíamos bem se se devia dar calor ou frio para que durassem um pouco mais. Não nos resignávamos que terminasse sua vida útil, não podíamos acreditar que algo vivesse menos que um jasmim. As coisas não eram descartáveis. Eram guardáveis.
Os jornais!!! Serviam para tudo: para servir de forro para as botas de borracha, para por no piso nos dias de chuva e por sobre todas as coisas para enrolar.
Às vezes sabíamos alguma notícia lendo o jornal tirado de um pedaço de carne!!! E guardávamos o papel de alumínio dos chocolates e dos cigarros para fazer guias de enfeites de natal, e as páginas dos almanaques para fazer quadros, e os conta-gotas dos remédios para algum medicamento que não o trouxesse, e os fósforos usados por que podíamos acender uma boca de fogão (Volcán era a marca de um fogão que funcionava com gás de querosene) desde outra que estivesse acesa, e as caixas de sapatos se transformavam nos primeiros álbuns de fotos e os baralhos se reutilizavam, mesmo que faltasse alguma carta, com a inscrição a mão em um valete de espada que dizia “esta é um 4 de copas”.
As gavetas guardavam pedaços esquerdos de prendedores de roupa e o ganchinho de metal. Ao tempo esperavam somente pedaços direitos que esperavam a sua outra metade, para voltar outra vez a ser um prendedor completo.
Eu sei o que nos acontecia: nos custava muito declarar a morte de nossos objetos. Assim como hoje as novas gerações decidem matá-los tão-logo aparentem deixar de ser úteis, aqueles tempos eram de não se declarar nada morto: nem a Walt Disney!!!
E quando nos venderam sorvetes em copinhos, cuja tampa se convertia em base, e nos disseram: Comam o sorvete e depois joguem o copinho fora, nós dizíamos que sim, mas, imagina que a tirávamos fora!!! As colocávamos a viver na estante dos copos e das taças. As latas de ervilhas e de pêssegos se transformavam em vasos e até telefones. As primeiras garrafas de plástico se transformaram em enfeites de duvidosa beleza. As caixas de ovos se converteram em depósitos de aquarelas, as tampas de garrafões em cinzeiros, as primeiras latas de cerveja em porta-lápis e as cortiças esperaram encontrar-se com uma garrafa.
E me mordo para não fazer um paralelo entre os valores que se descartam e os que preservávamos. Ah!!! Não vou fazer!!!
Morro por dizer que hoje não só os eletrodomésticos são descartáveis; também o matrimônio e até a amizade são descartáveis. Mas não cometerei a imprudência de comparar objetos com pessoas.
Me mordo para não falar da identidade que se vai perdendo, da memória coletiva que se vai descartando, do passado efêmero. Não vou fazer.
Não vou misturar os temas, não vou dizer que ao eterno tornaram caduco e ao caduco fizeram eterno.
Não vou dizer que aos velhos se declara a morte apenas começam a falhar em suas funções, que aos cônjuges se trocam por modelos mais novos, que as pessoas a que lhes falta alguma função se discrimina o que se valoriza aos mais bonitos, com brilhos, com brilhantina no cabelo e glamour.
Esta só é uma crônica que fala de fraldas e de celulares. Do contrário, se misturariam as coisas, teria que pensar seriamente em entregar à bruxa, como parte do pagamento de uma senhora com menos quilômetros e alguma função nova. Mas, como sou lento para transitar este mundo da reposição e corro o risco de que a bruxa me ganhe a mão e seja eu o entregue…
Eduardo Galeano é jornalista e escritor uruguaio.
Fonte: Tribuna da Imprensa (Tribuna da Internet), 24/07/2011

quinta-feira, julho 28, 2011

cartilha sobre mudanças climáticas que traz uma ótica diferente sobre o tema

Olhar indígena sobre mudanças climáticas

Publicação ajudará a garantir a participação qualificada das comunidades indígenas no debate internacional sobre o clima
Acaba de ser publicada uma cartilha sobre mudanças climáticas que traz uma ótica diferente sobre o tema. Produzida por 29 alunos do Centro Amazônico de Formação Indígena (CAFI), a cartilha busca traduzir a complexidade do tema para leitores que vivem no contexto das aldeias amazônicas.
O trabalho é resultado de um curso sobre Mudanças Climáticas oferecido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) em parceria com o CAFI. “A intenção é munir as comunidades indígenas com informações técnicas e científicas, mas com linguagem acessível, o que não é muito comum em documentos sobre o tema”, explica André Nahur (IPAM), um dos responsáveis pela capacitação dos autores.
Segundo ele, tudo foi feito com a participação direta dos estudantes do CAFI. Os textos e as ilustrações trazem o tema das mudanças climáticas para o dia a dia das aldeias. “É ali que os efeitos das alterações do clima são diretamente percebidos pelos indígenas, seja no aspecto natural ou nas adaptações já necessárias nos hábitos dos povos da floresta devido ao aquecimento global”, diz Sônia Guajajara, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), responsável pela publicação e distribuição da cartilha.
A iniciativa, segundo ela, foi pensada para assegurar a participação qualificada das comunidades indígenas nos processos de discussão e tomada de decisão no cenário político nacional e internacional sobre as mudanças climáticas. Temas como o mecanismo de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal) – que deverá remunerar quem mantém de pé as florestas – e os acordos internacionais para redução das emissões de gases de efeito estufa fazem parte do conteúdo da publicação.
A publicação, que deverá circular entre as comunidades indígenas, também está disponível para download. A versão impressa da cartilha também pode ser solicitada através do e-mail secretaria@coiab.rcom.br ou pelo telefone (92) 3184.6567
Mudanças Climáticas e aquecimento global na visão dos povos indígenas. COIAB, CAFI, 2011.
Formato: PDF Tamanho: 9.52 MB
Colaboração de Jaime Gesisky para o EcoDebate, 28/07/2011
Fonte: EcoDebate, 28/07/2011

terça-feira, julho 26, 2011

tudo que sobe à cabeça, desce!

o que está ocorrendo agora é muito familiar

"Podemos estar perto de reviver a crise de 1930"
Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, o que está ocorrendo agora é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que alimentou a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o "impulso" que a economia precisava. O artigo é de Paul Krugman.
Esta é uma época interessante, e digo isso no pior sentido da palavra. Agora mesmo estamos vivendo, não uma, mas duas crises iminentes, cada uma delas capaz de provocar um desastre mundial. Nos EUA, os fanáticos de direita do Congresso podem bloquear um necessário aumento do teto da dívida, o que possivelmente provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais. Enquanto isso, se o plano que os chefes de Estado europeus acabam de pactuar não conseguir acalmar os mercados, poderemos ter um efeito dominó por todo o sul da Europa, o que também provocaria estragos nos mercados financeiros mundiais.
Somente podemos esperar que os políticos em Washington e Bruxelas consigam driblar essas ameaças. Mas há um problema: ainda que consigamos evitar uma catástrofe imediata, os acordos que vêm sendo firmados dos dois lados do Atlântico vão piorar a crise econômica com quase toda certeza.
De fato, os responsáveis políticos parecem decididos a perpetuar o que está sendo chamado de Depressão Menor, o prolongado período de desemprego elevado que começou com a Grande Recessão de 2007-2009 e que continua até o dia de hoje, mais de dois anos depois de que a recessão, supostamente, chegou ao fim. 
Falemos um momento sobre por que nossas economias estão (ainda) tão deprimidas. A grande bolha imobiliária da década passada, que foi um fenômeno tanto estadunidense quanto europeu, esteve acompanhada por um enorme aumento da dívida familiar. Quando a bolha estourou, a construção de residências desabou, assim como o gasto dos consumidores na medida em que as famílias sobrecarregadas de dívidas faziam cortes.
Ainda assim, tudo poderia ter ido bem se outros importantes atores econômicos tivessem aumentado seu gasto e preenchido o buraco deixado pela crise imobiliária e pelo retrocesso no consumo. Mas ninguém fez isso. As empresas que dispõem de capital não viram motivos para investi-lo em um momento no qual a demanda dos consumidores estava em queda.
Os governos tampouco fizeram muito para ajudar. Alguns deles – os dos países mais débeis da Europa e os governos estaduais e locais dos EUA – viram-se obrigados a cortar drasticamente os gastos diante da queda da receita. E os comedidos esforços dos governos mais fortes – incluindo aí o plano de estímulo de Obama – apenas conseguiram, no melhor dos casos, compensar essa austeridade forçada.
De modo que temos hoje economias deprimidas. O que propõem fazer a respeito os responsáveis políticos? Menos que nada. A desaparição do desemprego da retórica política da elite e sua substituição pelo pânico do déficit tem verdadeiramente chamado a atenção. Não é uma resposta à opinião pública. Em uma sondagem recente da CBS News/The New York Times, 53% dos cidadãos mencionava a economia e o emprego como os problemas mais importantes que enfrentamos, enquanto que somente 7% mencionava o déficit. Tampouco é uma resposta à pressão do mercado. As taxas de juro da dívida dos EUA seguem perto de seus mínimos históricos.
Mas as conversações em Washington e Bruxelas só tratam de corte de gastos públicos (e talvez de alta de impostos, ou seja, revisões). Isso é claramente certo no caso das diversas propostas que estão sendo cogitadas para resolver a crise do teto da dívida nos EUA. Mas é basicamente igual ao que ocorre na Europa.
Na quinta-feira, os “chefes de Estado e de Governo da zona euro e as instituições da UE” – esta expressão, por si só, dá uma ideia da confusão que se tornou o sistema de governo europeu – publicaram sua grande declaração. Não era tranquilizadora. Para começar, é difícil acreditar que a complexa engenharia financeira que a declaração propõe possa realmente resolver a crise grega, para não falar da crise europeia em geral. 
Mas mesmo que pudesse, o que ocorreria depois? A declaração pede drásticas reduções do déficit “em todos os países salvo naqueles com um programa” que deve entrar em vigor “antes de 2013 o mais tardar”. Dado que esses países “com um programa” se veem obrigados a observar uma estrita austeridade fiscal, isso equivale a um plano para que toda a Europa reduza drasticamente o gasto ao mesmo tempo. E não há nada nos dados europeus que indique que o setor privado esteja disposto a carregar o piano em menos de dois anos.
Para aqueles que conhecem a história da década de 1930, isso é muito familiar. Se alguma das atuais negociações sobre a dívida fracassar, poderemos estar perto de reviver 1931, a bancarrota bancária mundial que tornou grande a Grande Depressão. Mas se as negociações tiverem êxito, estaremos prontos para repetir o grande erro de 1937: a volta prematura à contração fiscal que terminou com a recuperação econômica e garantiu que a depressão se prolongasse até que a II Guerra Mundial finalmente proporcionasse o impulso que a economia precisava.
Mencionei que o Banco Central Europeu – ainda que, felizmente, não a Federal Reserve – parece decidido a piorar ainda mais as coisas aumentando as taxas de juros?
Há uma antiga expressão, atribuída a diferentes pessoas, que sempre me vem à mente quando observo a política pública: “Você não sabe, meu filho, com que pouca sabedoria se governa o mundo”. Agora, essa falta de sabedoria se apresenta plenamente, quando as elites políticas de ambos os lados do Atlântico arruínam a resposta ao trauma econômico fechando os olhos para as lições da história. E a Depressão Menor continua.
(*) Paul Krugman é professor de Economía em Princeton e Prêmio Nobel 2008.
Tradução: Katarina Peixoto 
Fonte: Carta Maior | Economia, 25/07/2011

la creencia en los mercados libres y sin restricciones

La crisis ideológica del capitalismo occidental
por Joseph Stiglitz
Tan sólo unos años atrás, una poderosa ideología –la creencia en los mercados libres y sin restricciones– llevó al mundo al borde de la ruina. Incluso en sus días de apogeo, desde principios de los años ochenta hasta el año 2007, el capitalismo desregulado al estilo estadounidense trajo mayor bienestar material sólo para los más ricos en el país más rico del mundo. De hecho, a lo largo de los 30 años de ascenso de esta ideología, la mayoría de los estadounidenses vieron que sus ingresos declinaban o se estancaban año tras año.
Es más, el crecimiento de la producción en los Estados Unidos no fue económicamente sostenible. Con tanto del ingreso nacional de los EE.UU. yendo destinado para tan pocos, el crecimiento sólo podía continuar a través del consumo financiado por una creciente acumulación de la deuda.
Yo estaba entre aquellos que esperaban que, de alguna manera, la crisis financiera pudiera enseñar a los estadounidenses (y a otros) una lección acerca de la necesidad de mayor igualdad, una regulación más fuerte y mejor equilibrio entre el mercado y el gobierno. Desgraciadamente, ese no ha sido el caso. Al contrario, un resurgimiento de la economía de la derecha, impulsado, como siempre, por ideología e intereses especiales, una vez más amenaza a la economía mundial – o al menos a las economías de Europa y América, donde estas ideas continúan floreciendo.
En los EE.UU., este resurgimiento de la derecha, cuyos partidarios, evidentemente, pretenden derogar las leyes básicas de las matemáticas y la economía, amenaza con obligar a una moratoria de la deuda nacional. Si el Congreso ordena gastos que superan a los ingresos, habrá un déficit, y ese déficit debe ser financiado. En vez de equilibrar cuidadosamente los beneficios de cada programa de gasto público con los costos de aumentar los impuestos para financiar dichos beneficios, la derecha busca utilizar un pesado martillo – no permitir que la deuda nacional se incremente, lo que fuerza a los gastos a limitarse a los impuestos.
Esto deja abierta la interrogante sobre qué gastos obtienen prioridad – y si los gastos para pagar intereses sobre la deuda nacional no la obtienen, una moratoria es inevitable. Además, recortar los gastos ahora, en medio de una crisis en curso provocada por la ideología de libre mercado, simple e inevitablemente solo prolongaría la recesión.
Hace una década, en medio de un auge económico, los EE.UU. enfrentaba un superávit tan grande que amenazó con eliminar la deuda nacional. Incosteables reducciones de impuestos y guerras, una recesión importante y crecientes costos de atención de salud –impulsados en parte por el compromiso de la administración de George W. Bush de otorgar a las compañías farmacéuticas rienda suelta en la fijación de precios, incluso con dinero del gobierno en juego– rápidamente transformaron un enorme superávit en déficits récord en tiempos de paz.
Los remedios para el déficit de EE.UU. surgen inmediatamente de este diagnóstico: se debe poner a los Estados Unidos a trabajar mediante el estímulo de la economía; se debe poner fin a las guerras sin sentido; controlar los costos militares y de drogas; y aumentar impuestos, al menos a los más ricos. Pero, la derecha no quiere saber nada de esto, y en su lugar de ello, está presionando para obtener aún más reducciones de impuestos para las corporaciones y los ricos, junto con los recortes de gastos en inversiones y protección social que ponen el futuro de la economía de los EE.UU. en peligro y que destruyen lo que queda del contrato social. Mientras tanto, el sector financiero de EE.UU. ha estado presionando fuertemente para liberarse de las regulaciones, de modo que pueda volver a sus anteriores formas desastrosas y despreocupadas de proceder.
Pero las cosas están un poco mejor en Europa. Mientras Grecia y otros países enfrentan crisis, la medicina en boga consiste simplemente en paquetes de austeridad y privatización desgastados por el tiempo, los cuales meramente dejarán a los países que los adoptan más pobres y vulnerables. Esta medicina fracasó en el Este de Asia, América Latina, y en otros lugares, y fracasará también en Europa en esta ronda. De hecho, ya ha fracasado en Irlanda, Letonia y Grecia.
Hay una alternativa: una estrategia de crecimiento económico apoyada por la Unión Europea y el Fondo Monetario Internacional. El crecimiento restauraría la confianza de que Grecia podría reembolsar sus deudas, haciendo que las tasas de interés bajen y dejando más espacio fiscal para más inversiones que propicien el crecimiento. El crecimiento por sí mismo aumenta los ingresos por impuestos y reduce la necesidad de gastos sociales, como ser las prestaciones de desempleo. Además, la confianza que esto engendra conduce aún a más crecimiento.
Lamentablemente, los mercados financieros y los economistas de derecha han entendido el problema exactamente al revés: ellos creen que la austeridad produce confianza, y que la confianza produce crecimiento. Pero la austeridad socava el crecimiento, empeorando la situación fiscal del gobierno, o al menos produciendo menos mejoras que las prometidas por los promotores de la austeridad. En ambos casos, se socava la confianza y una espiral descendente se pone en marcha.
¿Realmente necesitamos otro experimento costoso con ideas que han fracasado repetidamente? No deberíamos, y sin embargo, parece cada vez más que vamos a tener que soportar otro. Un fracaso en Europa o en Estados Unidos para volver al crecimiento sólido sería malo para la economía mundial. Un fracaso en ambos lugares sería desastroso – incluso si los principales países emergentes hubieran logrado un crecimiento auto-sostenible. Lamentablemente, a menos que prevalezcan las mentes sabias, este es el camino al cual el mundo se dirige.
Joseph Stiglitz fue Premio Nobel de Economía en 2001
Fonte: Sin Permiso Nº8, 24/07/11

domingo, julho 24, 2011

quem tem amor na vida tem sorte

O que é o amor?

por Antonio Ozaí da Silva
“Não há você sem mim,
eu não existo sem você”
(Vinicius de Moraes / Antonio Carlos Jobim)
“As águas da torrente, jamais poderão
apagar o amor,
nem os rios afogá-lo”
(Cântico dos cânticos 8, 7)
No século XVIII, um pequeno livro escrito por Goethe, provoca uma febre romântica que se alastrou pela Europa. Os sofrimentos do jovem Werther, escrito na primeira pessoa, é composto por várias cartas enviadas ao narrador, as quais expõem a paixão dilacerante e tempestuosa do jovem Werther por Charlotte, noiva de Albert. A impossibilidade do amor, diante da decisão dela em casar-se, leva o jovem apaixonado a um desenlace trágico: o suicídio. Muitos dos leitores, identificados intensamente com o personagem do célebre escritor alemão, fizeram o mesmo. Uma onda de suicídio sacudiu a Europa e, diante de repercussão tão trágica, alguns governos tentaram a circulação da obra. O livro foi um best-seller, é um clássico da literatura mundial e considerado a obra inaugural do romantismo moderno.
O romantismo, enquanto corrente literária e filosófica, é uma reação à sociedade burguesa, um apelo ao sentimento contra a razão iluminista. Expressa o desencanto com a modernidade. Não obstante, o amor romântico, tão tragicamente expressado pelos sofrimentos do jovem Werther, é uma invenção anterior à publicação da obra de Johann Wolfgang von Goethe. Qual leitor moderno não leu Romeu e Julieta, de Shakespeare – ou pelo menos assistiu alguma peça, filme, etc., inspirado na obra? Recordemos Abelardo e Heloísa, Tristão e Isolda, outros casais emblemáticos da mitologia romântica que povoa o imaginário ocidental.
Seria preciso analisar as obras românticas, enquanto representações literárias do amor em determinados contextos históricos, para compreender as sociedades que elas expressam e, ainda, a invenção e evolução do conceito e dos valores que configuram o amor-romântico tal qual o concebemos e o sentimos na atualidade. Então, talvez seja possível compreender o amor do ponto de vista histórico e sociológico.
Este, porém, é um exercício puramente teórico. Quem ama não fica a perguntar-se sobre tais questões, a problematizar racionalmente. Ama-se simplesmente e não há teorias explicativas que dêem conta. Como afirma a música, “sinônimo de amor é amar”. É simples, ama-se e ponto! Como afirma Fernando Pessoa: “Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?”
É extremamente complexo compreender as razões do amor. Por que entre milhares de seres humanos a paixão direciona-se a alguém particular? O que torna esse alguém tão especial? Como explicar que o amor brote entre duas pessoas tão díspares como “Eduardo e Mônica” (Renato Russo)? Por que este sentimento se impõe a despeito das impossibilidades ditadas pela razão? É possível encontrar o equilíbrio necessário entre a razão e a sensibilidade, entre o pensar o amor e senti-lo? E se o amor dilacera a razão ao ponto de submetê-la e a torná-la refém? O fim trágico ditado pela insana paixão, não é, infelizmente, restrito à ficção.
Afinal, o que é o amor? O que é amar? Recordo de um tempo em que a moda era figurinhas com a frase “amar é…” e uma resposta breve. Era uma forma simples e popular de definir o amor e o amar, não tão rebuscada como os poemas dos grandes poetas clássicos. O amor é egoísta, suicida e até há quem admita que ele é assassino (quem já não ouviu a absurda expressão “matar por amor”?!) O amor, porém, também pode ser altruísta e, sobretudo, se expressar de várias formas. O amor está presente nas relações humanas para além dos nossos estereótipos monogâmicos e heterossexuais.
O amor é incondicional, ele brota no ser, tem vida própria e ninguém é capaz de obrigar o outro a amar ou deixar de amar. Daí as dores e sofrimentos dos amores não correspondidos, como os do jovem Werther. E como dói a certeza do amar sem ser amado, ainda que a razão deseje extirpar o mínimo vestígio da presença do amor que se revela impossível! Felizes os que encontram o amor e se encontram no ser amado, ainda que sob as mais difíceis circunstâncias. Sofre quem ama sem ser amado. Mas, se o amor é incondicional, como evitar o sofrimento alheio quando não se compartilham os mesmos sentimentos? Imagino, porém, que os mais infelizes são os incapazes de amar.
O amor é indecifrável, inexplicável. É da ordem do sentir, ainda que a razão tente entender. Poetas, compositores e outros tentam defini-lo em metáforas, poemas… E muitos têm a capacidade de fazer-nos sentir o amor apenas pelas palavras, especialmente quando proferidas como doces melodias que encantam nossos sentidos. O amor, contudo, permanece incógnito, inacessível à razão. No entanto, me encanta a definição bíblica da Primeira Carta aos Coríntios, do apóstolo Paulo:
“O amor é paciente, é benfazejo; não é invejoso, não é presunçoso nem se incha de orgulho; não se faz nada de vergonhoso, não é interesseiro, não se encoleriza, não leva em conta o mal sofrido; não se alegra com a injustiça, mas fica alegre com a verdade. Ele desculpa tudo, crê tudo, espera tudo, suporta tudo” (1Cor 13, 4-7).
Eis uma definição ideal do amor, entre outras possíveis. O amor humano é real, porém, não é tão puro quanto estas palavras expressam. Paulo se refere ao amor caridade. O amor, para além do ideal paulino, pode ser tudo isto, parte disto ou até mesmo o oposto. Afinal, é do humano demasiado humano que se trata e não dos anjos e candidatos à canonização. O amor, portanto, é imperfeito – como é próprio do humano. Não é por acaso que a moral religiosa o condena quando ele escapa às suas amarras. Nada, porém, pode detê-lo. A despeito do medo da condenação e do que dita a razão e a moral convencional, o amor é incontrolável. É difícil defini-lo!
Fonte: Blog do Ozaí | Reflexões do Cotidiano, 23/07/2011

Amy Winehouse - Back To Black

Amy Winehouse - Valerie

quarta-feira, julho 20, 2011

uma “desproporção” entre a força de sua economia e a questão da educação

Brasil não pode ser 7° em economia e 88° em educação

Novo presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Daniel Iliescu, defende que Congresso mude proposta do governo e fixe em 10% do produto interno bruto (PIB) meta de investimentos em educação, para combater contradição entre a força da economia brasileira e a posição do país no ranking mundial da educação. Em entrevista à Carta Maior, Iliescu critica política econômica adotada pela gestão Dilma Rousseff nos seis primeiros meses, elogia postura da presidenta de 'tolerância zero' com corrupção e garante que UNE terá 'independência' do governo federal.
BRASÍLIA – O Brasil ostenta hoje uma “desproporção” entre a força de sua economia e seus níveis educacionais que o Plano Nacional da Educação (PNE) 2011-2020 precisa ajudar a combater. É a sétima economia do mundo, posição tomada recentemente da Itália, mas, ao mesmo tempo, ocupa só a 88ª posição no ranking das Nações Unidas na área da educação.
Para o novo presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Daniel Iliescu, a superação da contradição exige que o Congresso Nacional mude o PNE proposto pelo governo e fixe em 10% do Produto Interno Bruto (PIB), e não em 7%, a meta de investimentos públicos na área - hoje o patamar é de 5%, segundo o ministério da Educação. E que a meta seja atingida até 2014, fim do governo Dilma Rousseff, e não apenas em 2020.
“10% do PIB é uma bandeira muito poderosa. Não é só do movimento educacional, tem relação com o projeto de futuro que a gente quer debater para o Brasil”, diz Iliescu, eleito para um mandato de dois anos neste domingo (17/07), último dia do 52° Congresso Nacional da UNE, realizado em Goiânia (GO).
Estudante de sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Iliescu, de 26 anos, é filiado ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que comanda a UNE há tempos. Ele representa a continuidade de uma gestão que costuma ser acusada por opositores de Dilma e do ex-presidente Lula de adesista ao governo federal. 
Em entrevista à Carta Maior, Iliescu diz que a UNE tem e seguirá tendo independência em relação ao governo, com o qual se relaciona por “obrigação” de defender os interesses da classe estudantil, e aponta a divergência no PNE como exemplo de autonomia. 
Ele também faz uma avaliação dos seis primeiros meses do governo Dilma, com críticas à política econômica (ajuste fiscal e aumento de juro “preocupam muito”) e elogio à postura política da presidenta (há “tolerância zero com corrupção”). E fala sobre erros e acertos da gestão do ministro da Educação, Fernando Haddad.
A seguir, o leitor confere a íntegra da entrevista.
Sua eleição representa a continuidade de uma gestão que adversários do governo chamam de chapa-branca. A UNE é chapa branca?
Daniel Iliescu: A nossa gestão vai procurar, em primeiro lugar, ter uma relação de independência com o governo federal. É uma relação que a UNE desenvolve historicamente com todo e qualquer governo. A UNE tem obrigação de se relacionar com os governos, em respeito aos interesses dos estudantes pelos quais ela luta. E as principais opiniões que a gente tem levantado, as principais campanhas em que a UNE tem apostado, são opiniões de dissenso em relação ao governo. Em especial, nossa abordagem ao Plano Nacional de Educação, que é um assunto que a UNE discute há algum tempo, desde a Conferência Nacional de Educação de 2010. A UNE defende [investir em educação] 10% do PIB até 2014, contrastando e criticando a proposta do governo federal de 7%. Então, apesar dessas opiniões de alguns adversários do governo federal, de caricaturar a ação do movimento estudantil, a gente consegue passar muita confiança para a sociedade brasileira de que é função da UNE ter independência e pressionar o governo federal a ter mais compromisso com o país.
O PNE vai ser, na sua gestão, o principal ponto de reivindicação e de negociação no nível federal?
Daniel Iliescu: Pelo menos nessa largada da gestão, vai ser a prioridade. É a principal discussão que o Brasil faz sobre educação de dez em dez anos. A gente apresentou, junto com a UBES [União Brasileira dos Estudantes Secundaristas], cerca de 60 emendas ao projeto na comissão especial da Câmara dos Deputados. E vamos convocar os estudantes brasileiros a se unir ao movimento social e à sociedade civil organizada para construir, no fim de agosto, uma grande jornada nacional de lutas sobre o PNE. Mas a gente espera que o PNE não seja a única pauta da gestão.
Você acha que há condições de, fazendo pressão no Congresso, convencer o Executivo a ampliar de 7% para 10%?
Daniel Iliescu: 10% do PIB é uma bandeira muito poderosa, que pode se tornar a bandeira de todo o país, não é uma bandeira corporativa, só do movimento educacional. É uma bandeira que tem relação com o projeto de futuro que a gente quer debater para o Brasil. O Brasil vive uma oportunidade ímpar de desenvolvimento econômico, ultrapassou a Itália e é a quinta economia do mundo. No entanto, a ONU, pelo seu braço que é a Unesco, que mede níveis educacionais de vários países como taxa de analfabetismo e acesso à universidade, coloca o Brasil na posição de número 88. É muito desproporcional hoje o Brasil em termos de suas possibilidades econômicas e o Brasil em termos de educação que oferece à população. O Brasil precisa ampliar de forma robusta o financiamento. O PNE aprovado em 2001 já apontava a necessidade de investir 7% do PIB até 2010 e isso não foi cumprido pelos governos na última década. 
Quer dizer, já é uma meta defasada...
Daniel Iliescu: É uma necessidade defasada. O Brasil vive um bônus demográfico de 50 milhões de jovens, precisa aproveitar essa geração e investir de forma mais robusta para poder financiar o que a gente entende que seja uma revolução na educação brasileira, que vai desde o combate ao analfabetismo, a valorização dos professores em todos os níveis de ensino, até a produção de tecnologia de ponta, de pesquisa nas universidades. Só uma ampliação desse patamar [de investimento em educação] para no mínimo de 10% do PIB, e a gente propõe que isso seja feito até 2014, com o aumento de 1,25% ao ano, é que a gente consegue enfrentar os desafios e superar as desigualdades que o Brasil historicamente tem constituído.
E qual será a prioridade em 2012, depois do PNE?
Daniel Iliescu: O grande desafio que a gente quer assumir é de se associar ao que tem de melhor no pensamento brasileiro, melhor do pensamento acadêmico, do pensamento político, jornalístico, da sociedade civil organizada, para debater o Brasil na década, debater os rumos do desenvolvimento brasileiro. A UNE se pauta há 74 anos por um projeto de desenvolvimento que seja democrático, soberano, ambientalmente sustentável. E achamos que um debate sobre os destinos da educação faz parte sobre esse grande debate sobre os rumos do país. O nosso congresso discutiu temas que vão desde economia até meio ambiente, que vão desde política até sexualidade. Existe uma pauta extensa, que interessa aos rumos do país. Este ano mesmo, o Brasil já vive um processo de conferência nacional de juventude, as suas etapas municipais, a etapa nacional vai ser daqui a alguns meses. Então, vamos fazer um esforço de dar opinião sobre tudo o que diz respeito à juventude, de exercer diálogo com a sociedade e pressão sobre o governo no Congresso para aprovar o que for de interesse da juventude brasileira.
Qual sua avaliação do primeiro semestre do governo Dilma?
Daniel Iliescu: O governo foi eleito interpretando a vontade da grande maioria dos brasileiros de aprofundar mudanças no país. Mas houve até agora algumas sinalizações contraditórias, especialmente no âmbito econômico, que, na nossa opinião, vão contra este interesse de aprofundar o desenvolvimento e mesmo da pauta que foi aprovada pela maioria dos brasileiros. Alguns exemplos disso? O corte no orçamento de R$ 50 bilhões, dos quais R$ 3 bilhões da educação. A política de constante subida dos juros, que pode travar o investimento no país, não beneficia as forças produtivas brasileiras. O próprio dólar sobrevalorizado pode acarretar um risco de desindustrialização. Então, a gente observa com muita preocupação esse início de governo. Mas mantendo expectativa também na capacidade de diálogo, no aprofundamento da democracia para que a sociedade organizada possa influenciar nesses rumos e ajudar o Brasil daqui para frente.
E do ponto de vista político? É um governo que, em seis meses, perdeu dois ministros por denúncias de desvios éticos...
Daniel Iliescu: A gente obviamente, como toda a sociedade brasileira, fica consternada e quer fazer pressão para que os mandatários sejam honestos, a gente fica indignado com todo e qualquer envolvimento em corrupção. Mas a ação da presidenta Dilma até aqui foi muita assertiva. Ela passou uma certa segurança à população brasileira de que a tolerância será zero com todo e qualquer caso de corrupção. Ficamos também na expectativa para ver se o Brasil finalmente consegue republicanizar mais a sua relação com o poder público, que é uma expectativa de toda a sociedade. Isso se relaciona também com o debate sobre reforma política, que alguns atores têm entendimento de que é fundamental para o país. Nós também temos uma expectativa grande de que medidas como a reforma política possam moralizar mais a vida pública.
Especificamente sobre o ministro da Educação, Fernando Haddad, qual a sua avaliação?
Daniel Iliescu: Em primeiro lugar, foi uma gestão com um grau bastante razoável de diálogo, que é uma postura importante no Ministério da Educação. Não temos do que reclamar deste ponto de vista. É também uma gestão com vitórias importantes e alguns limites importantes a serem considerados também. Entre as vitórias, eu citaria a ampliação do acesso à universidade. A gente realizou no Congresso da UNE um ato para comemorar a marca de 1 milhão de estudantes beneficiados pelo Prouni. E não são quaisquer estudantes, são de baixa renda, que ganham de um a três salários mínimos, é um dado a ser comemorado pelo país, talvez seja um dos maiores programas de inclusão educacional de todo o continente. No entanto, existem alguns limites importantes. O próprio limite do financiamento, em que pese na gestão do Haddad ter tido sempre uma trajetória ascendente, mas achamos que é um ritmo ascendente ainda muito tímido, não é compatível com as necessidades do Brasil. 
Fonte: Carta Maior | Política, 18/07/2011

domingo, julho 17, 2011

o eterno privilegiar do capital contra a maioria da população

Indignados de todo o mundo: uni-vos!

Enquanto estiver na fase da simples negação das medidas adotadas pelos governos, não haverá tanta dificuldade quanto a partir do momento em que os indignados passem a ser chamados a dizer o que sugerem como propostas ou sugestões para uma ordem social e econômica mais justa.

Até poucos dias atrás, antes da retomada da mobilização na Grécia, a bola da vez parecia estar com a Espanha. E com toda a sua rica diversidade política, cultural, social. Os gritos eram bradados em catalão, em basco, em galego, em castelhano. Da mesma forma, os escritos dos cartazes e das faixas. Talvez pudéssemos sintetizá-los todos em “Não nos representam!”.
Ao longo dos últimos meses, o cenário mundial tem apresentado algumas novidades em termos de mobilização política. Por um lado, foram todas as manifestações observadas nos países árabes e do norte da África, caracterizadas essencialmente por reivindicações de natureza democrática face a seus governos. De outro lado, tem crescido o volume dos protestos que atingiram os países europeus mais duramente afetados pelas exigências de austeridade e rigor na ortodoxia dos ajustes econômicos por parte da União Européia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Foram os casos da Irlanda, da Grécia, da Islândia. E agora, a Espanha.
Muitos analistas tentam se debruçar com mais detalhe sobre esse momento e o conjunto de tais manifestações. A primeira tentação é inescapável. Comparar o primeiro semestre de 2011 com a famosa primavera de 33 anos atrás, quando a onda de manifestações atingiu um conjunto imenso de países por todos os continentes. Protagonizado por estudantes e trabalhadores, o movimento de 1968 mobilizava multidões em cidades e regiões tão diversas quanto distantes como Paris, Praga, São Francisco, Tóquio, além das mobilizações ocorridas inclusive no Brasil, já sob o regime militar do golpe de 64.
Porém, as diferenças também são significativas. O movimento de 68 tendia a expressar mudanças em operação na base das sociedades àquela época. A pauta da nova geração falava de um novo modo de vida, apresentava a crítica ao modelo da sociedade industrial e de consumo. Denunciava as iniciativas bélicas, simbolizadas na operação norte-americana no Vietnã. “Faça amor, não faça guerra!”. As flores nas bocas dos canhões. Na pauta e na essência das manifestações, mudanças comportamentais e a liberação de costumes como as drogas, o sexo, o rock and roll. O Festival de música de Woodstock entrou para a história como um dos símbolos daquele novo tempo que se iniciava.
Nos tempos atuais, a hegemonia do pensamento liberal e a falência dos regimes dos países socialistas tornam menos evidente a aceitação generalizada dos princípios de solidariedade presentes nos movimentos de protesto. Infelizmente, ao que tudo indica, as sociedades estão mais marcadas pelo sentido da postura individual e menos para ações coletivas. E a questão comportamental parece mais influenciada pelas inovações tecnológicas proporcionadas pelos contatos via celular e internet do que pela essência das atitudes e proposições libertárias dos movimentos precedentes. Uma das principais tarefas reside na divulgação e no convencimento de outros setores sociais, bem como no combate ao conteúdo conservador dos fundamentalismos de todos os gêneros (religioso, moral, político, cultural, etc) que marcam nosso tempo.
Em meio a essa multiplicação de experiências alternativas de demonstração de descontentamento com a ordem política vigente, um antigo combatente das causas democráticas e populares resolveu também tomar a iniciativa e lançou o que imaginou que fosse sua “modesta” contribuição. Stéphane Hessel, um francês já com 93 anos, publicou em 2010 um manifesto que intitulou de “Indignez-vous!”. Transformado em livro, está batendo recorde de vendas, com mais de 1 milhão só na França. No Brasil, a Editora Leya Livros lançou uma tradução como “Indignai-vos!” Trata-se de um verdadeiro chamamento a que as gerações atuais se mobilizem e demonstrem a sua discordância com o estado atual de coisas no planeta. O autor pensava sobretudo na questão francesa face à política conservadora implementada pelo Presidente Sarkozy, mas também nas dificuldades em aceitar as medidas originadas pelas obscuras autoridades européias, sediadas em Bruxelas.
No entanto, aquilo que fora concebido como um singelo manifesto de pouco mais de 30 páginas, passa a ganhar uma dimensão política e aceitação inusitadas. Com a ajuda da divulgação proporcionada pela rede virtual, o documento ganhou o mundo. E tornou-se, aos poucos, o símbolo de um movimento que se pretende como a contraposição a tudo o que o processo atual da globalização apresentou até o momento. Um pouco na esteira do espírito altermundista e das experiências do Fórum Social Mundial, espalha-se cada vez mais internacionalmente, junto com o sentimento de que “um outro mundo é possível”. E mostra a incrível energia e disposição de quem lutou quase um século e não se acomodou!
No caso espanhol, fica visível uma negação explícita da forma tradicional das organizações políticas, partidárias e institucionais. Iniciado em Madri e Barcelona como um movimento de protesto contra as medidas restritivas de um sistema de governo (central, das regiões autônomas, das províncias e das municipalidades), seus participantes ocupam locais estratégicos e de alta visibilidade nos espaços urbanos, acampando em praças centrais. Por outro lado, a evolução da conjuntura faz com que emirja rapidamente um sentimento de solidariedade de amplos setores da população. Como se o movimento estivesse a representar alguma novidade ainda submersa na base da sociedade, não captada pelos analistas e pelos próprios ativistas.
A forma de organização é também inovadora. Ao menos nessa fase inicial, os participantes e suas lideranças não escondem que os partidos políticos, os sindicatos e demais associações tradicionais não são bem vindos. A princípio, a idéia tangencia o sentimento libertário e não se aceita a prática da representação e da delegação de poderes. As decisões são todas adotadas em reuniões abertas a todos, em uma espécie de assembleísmo permanente. Não por acaso, está sempre presente a analogia com os modelos da prática política nas sociedades antigas, como a Grécia clássica. Trata-se da busca do ideal da democracia permanente.
Ao contrário de movimentos que tiveram um início similar, os atuais tendem a contar com uma maior participação de diversos setores que não exclusivamente aquele que o imaginário popular e os meios de comunicação apresentam como a “juventude rebelde”. A própria inspiração de um combatente quase centenário como Hessel confirma essa tendência. Nas praças dos acampados e nas manifestações chega mesmo a ser emocionante verificar a solidariedade ativa de aposentados, desempregados de todas as idades, famílias inteiras, estudantes universitários, secundaristas, etc. Um intercâmbio diferente e a aceitação da construção do “novo” a partir desse sincretismo um tanto inédito. A troca de experiências entre grupos tão diversos é impressionante. De um lado, os que já viram e atuaram em não sei quantos movimentos e greves ao longo do século passado, passando pela luta na resistência contra os nazistas ou ao lado dos republicanos na guerra espanhola. De outro lado, aqueles que chegam agora com menos experiência acumulada, mas com sua força e energia políticas, e sobretudo acompanhados do potencial mobilizador oferecido pelo celular e pela rede virtual.
Um outro aspecto significativo foi a afirmação do caráter pacífico e não violento do movimento. Isso tornou-se uma expressão explícita de seus documentos e declarações oficiais, em particular depois da tentativa do sistema de inteligência espanhol de infiltrar as manifestações com supostos radicais em 15 de junho, com o objetivo de desacreditar os indignados junto à maioria da população. Para evitar esse risco, o movimento denunciou tal tentativa da polícia e reafirmou a condenação da violência extremista gratuita, como costuma acontecer em algumas manifestações dessa natureza, a partir da ação irresponsável de pequenos grupos que não representam o pensamento da maioria e só fazem isolar politicamente os movimentos.
No entanto, essas características inovadoras de tais movimentos passam a representam um limite, à medida em que as ações se ampliam e eles passam a ganhar apoio e simpatia de outros setores da população. Uma coisa é organizar acampamentos com muitas centenas e alguns milhares de pessoas. Mas quando se trata de organizar manifestações de centenas de milhares de participantes, em várias cidades espalhadas pelo país, com ações de segurança interna e outras, o movimento passa a exigir de si mesmo outro nível de organização interna e o aperfeiçoamento de mecanismos de representação institucional.
O mesmo vale para a questão política. Enquanto estiver na fase da simples negação das medidas adotadas pelos governos, não haverá tanta dificuldade quanto a partir do momento em que os indignados passem a ser chamados a dizer o que sugerem como propostas ou sugestões para uma ordem social e econômica mais justa. Sim, pois o sentimento de indignação é bastante amplo para exprimir um descontentamento com a ordem atual, mas não pressupõe a mesma unidade de ação e pensamento quanto ao como e o que fazer. Os cartazes e as intervenções tendem a apontar como responsáveis pela crise fatores amplos, que vão desde o sistema capitalista até o processo da unificação européia, passando pelo sistema político espanhol.
Há mesmo muitos intelectuais, artistas, pesquisadores e professores (1)que apóiam as iniciativas, mas parte deles reconhecem as limitações das mesmas. Assim, chamam a atenção para a importância do movimento, mas consideram a necessidade de alguma forma de institucionalização no plano da política (inclusive eleitoral) para tornar as propostas factíveis e viáveis. Caso contrário, os indignados correm o risco de revelarem-se mais uma excelente oportunidade de aprendizado e amadurecimento políticos para seus participantes, mas sem desaguar em nenhuma proposta efetivamente transformadora da ordem atual que pretendem mudar (2). Ou seja, podem entrar para a longa lista dos movimentos de protesto – importantes, sem dúvida alguma – que não lograram apresentar à sociedade uma via de implementação de suas propostas de transformação.
E que sirva como alerta para aqueles que insistem, aqui por essas latitudes mais ao sul, também em ignorar as experiências históricas e suas propostas de origem. Nos dois casos em foco na Europa, um dos aspectos mais relevantes da crítica são os cortes orçamentários para áreas sociais em contraste com o volume de recursos destinados para o saneamento financeiro, o eterno privilegiar do capital contra a maioria da população. E tudo isso sendo levado a cabo e votado nos parlamentos por governos que se dizem socialistas. Como as entidades sindicais ficaram na postura meio de peleguista de nosso conhecido “chapa-branquismo”, a onda de indignação acabou por atropelar partidos e sindicatos.
De qualquer maneira, a simples ocorrência de tais movimentos em sua sequência atual já representam um elemento inovador na ordem política. E a facilidade com que se espalham pelos continentes faz-nos lembrar o chamamento final do Manifesto escrito por Marx e Engels há mais de um século e meio: “Indignados de todo o mundo, uni-vos!”. Afinal, não têm mesmo muito a perder a não ser a sua desilusão, o seu descontentamento e a sua frustração com a ordem atual de injustiça social, política e econômica.
NOTAS
(1) É o caso da iniciativa de lançamento do manifesto “Una ilusión compartida”, que pretende ser uma cunha no debate político e eleitoral na Espanha, agora com a saída do líder do PSOE, Zapatero. Assinam Pedro Almodovar (cineasta), Ignacio Ramonet (jornalista), Pilar Barden (atriz), entre outros. Ver: www.unailusioncompartida.com.
Registro uma frase emblemática: “La corrupción democrática se ha mostrado como la mejor aliada de la especulación, separando los destinos políticos de la soberanía cívica y descomponiendo por dentro los poderes institucionales. Hay que devolverle a la vida pública el orgullo de su honradez, su legitimidad y su transparencia. Por eso resulta imprescindible buscar nuevas formas de democracia participativa y sumar en una ilusión común los ideales solidarios de la izquierda democrática y social.”
(2) Ver: De uma tendência distinta, contribui também Arcadi Oilveres, presidente da associação catalã Justicia i Pau (Justiça e Paz). Ver:http://www.justiciaipau.org/
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.
Fonte: Carta Maior | Debate Aberto, 30/06/2011

na tela ou dvd

  • 12 Horas até o Amanhecer
  • 1408
  • 1922
  • 21 Gramas
  • 30 Minutos ou Menos
  • 8 Minutos
  • A Árvore da Vida
  • A Bússola de Ouro
  • A Chave Mestra
  • A Cura
  • A Endemoniada
  • A Espada e o Dragão
  • A Fita Branca
  • A Força de Um Sorriso
  • A Grande Ilusão
  • A Idade da Reflexão
  • A Ilha do Medo
  • A Intérprete
  • A Invenção de Hugo Cabret
  • A Janela Secreta
  • A Lista
  • A Lista de Schindler
  • A Livraria
  • A Loucura do Rei George
  • A Partida
  • A Pele
  • A Pele do Desejo
  • A Poeira do Tempo
  • A Praia
  • A Prostituta e a Baleia
  • A Prova
  • A Rainha
  • A Razão de Meu Afeto
  • A Ressaca
  • A Revelação
  • A Sombra e a Escuridão
  • A Suprema Felicidade
  • A Tempestade
  • A Trilha
  • A Troca
  • A Última Ceia
  • A Vantagem de Ser Invisível
  • A Vida de Gale
  • A Vida dos Outros
  • A Vida em uma Noite
  • A Vida Que Segue
  • Adaptation
  • Africa dos Meus Sonhos
  • Ágora
  • Alice Não Mora Mais Aqui
  • Amarcord
  • Amargo Pesadelo
  • Amigas com Dinheiro
  • Amor e outras drogas
  • Amores Possíveis
  • Ano Bissexto
  • Antes do Anoitecer
  • Antes que o Diabo Saiba que Voce está Morto
  • Apenas uma vez
  • Apocalipto
  • Arkansas
  • As Horas
  • As Idades de Lulu
  • As Invasões Bárbaras
  • Às Segundas ao Sol
  • Assassinato em Gosford Park
  • Ausência de Malícia
  • Australia
  • Avatar
  • Babel
  • Bastardos Inglórios
  • Battlestar Galactica
  • Bird Box
  • Biutiful
  • Bom Dia Vietnan
  • Boneco de Neve
  • Brasil Despedaçado
  • Budapeste
  • Butch Cassidy and the Sundance Kid
  • Caçada Final
  • Caçador de Recompensa
  • Cão de Briga
  • Carne Trêmula
  • Casablanca
  • Chamas da vingança
  • Chocolate
  • Circle
  • Cirkus Columbia
  • Close
  • Closer
  • Código 46
  • Coincidências do Amor
  • Coisas Belas e Sujas
  • Colateral
  • Com os Olhos Bem Fechados
  • Comer, Rezar, Amar
  • Como Enlouquecer Seu Chefe
  • Condessa de Sangue
  • Conduta de Risco
  • Contragolpe
  • Cópias De Volta À Vida
  • Coração Selvagem
  • Corre Lola Corre
  • Crash - no Limite
  • Crime de Amor
  • Dança com Lobos
  • Déjà Vu
  • Desert Flower
  • Destacamento Blood
  • Deus e o Diabo na Terra do Sol
  • Dia de Treinamento
  • Diamante 13
  • Diamante de Sangue
  • Diário de Motocicleta
  • Diário de uma Paixão
  • Disputa em Família
  • Dizem por Aí...
  • Django
  • Dois Papas
  • Dois Vendedores Numa Fria
  • Dr. Jivago
  • Duplicidade
  • Durante a Tormenta
  • Eduardo Mãos de Tesoura
  • Ele não está tão a fim de você
  • Em Nome do Jogo
  • Encontrando Forrester
  • Ensaio sobre a Cegueira
  • Entre Dois Amores
  • Entre o Céu e o Inferno
  • Escritores da Liberdade
  • Esperando um Milagre
  • Estrada para a Perdição
  • Excalibur
  • Fay Grim
  • Filhos da Liberdade
  • Flores de Aço
  • Flores do Outro Mundo
  • Fogo Contra Fogo
  • Fora de Rumo
  • Fuso Horário do Amor
  • Game of Thrones
  • Garota da Vitrine
  • Gata em Teto de Zinco Quente
  • Gigolo Americano
  • Goethe
  • Gran Torino
  • Guerra ao Terror
  • Guerrilha Sem Face
  • Hair
  • Hannah And Her Sisters
  • Henry's Crime
  • Hidden Life
  • História de Um Casamento
  • Horizonte Profundo
  • Hors de Prix (Amar não tem preço)
  • I Am Mother
  • Inferno na Torre
  • Invasores
  • Irmão Sol Irmã Lua
  • Jamón, Jamón
  • Janela Indiscreta
  • Jesus Cristo Superstar
  • Jogo Limpo
  • Jogos Patrióticos
  • Juno
  • King Kong
  • La Dolce Vitta
  • La Piel que Habito
  • Ladrões de Bicicleta
  • Land of the Blind
  • Las 13 Rosas
  • Latitude Zero
  • Lavanderia
  • Le Divorce (À Francesa)
  • Leningrado
  • Letra e Música
  • Lost Zweig
  • Lucy
  • Mar Adentro
  • Marco Zero
  • Marley e Eu
  • Maudie Sua Vida e Sua Arte
  • Meia Noite em Paris
  • Memórias de uma Gueixa
  • Menina de Ouro
  • Meninos não Choram
  • Milagre em Sta Anna
  • Mistério na Vila
  • Morangos Silvestres
  • Morto ao Chegar
  • Mudo
  • Muito Mais Que Um Crime
  • Negócio de Família
  • Nina
  • Ninguém Sabe Que Estou Aqui
  • Nossas Noites
  • Nosso Tipo de Mulher
  • Nothing Like the Holidays
  • Nove Rainhas
  • O Amante Bilingue
  • O Americano
  • O Americano Tranquilo
  • O Amor Acontece
  • O Amor Não Tira Férias
  • O Amor nos Tempos do Cólera
  • O Amor Pede Passagem
  • O Artista
  • O Caçador de Pipas
  • O Céu que nos Protege
  • O Círculo
  • O Circulo Vermelho
  • O Clã das Adagas Voadoras
  • O Concerto
  • O Contador
  • O Contador de Histórias
  • O Corte
  • O Cozinheiro, o Ladrão, Sua Mulher e o Amante
  • O Curioso Caso de Benjamin Button
  • O Destino Bate a Sua Porta
  • O Dia em que A Terra Parou
  • O Diabo de Cada Dia
  • O Dilema das Redes
  • O Dossiê de Odessa
  • O Escritor Fantasma
  • O Fabuloso Destino de Amelie Poulan
  • O Feitiço da Lua
  • O Fim da Escuridão
  • O Fugitivo
  • O Gangster
  • O Gladiador
  • O Grande Golpe
  • O Guerreiro Genghis Khan
  • O Homem de Lugar Nenhum
  • O Iluminado
  • O Ilusionista
  • O Impossível
  • O Irlandês
  • O Jardineiro Fiel
  • O Leitor
  • O Livro de Eli
  • O Menino do Pijama Listrado
  • O Mestre da Vida
  • O Mínimo Para Viver
  • O Nome da Rosa
  • O Paciente Inglês
  • O Pagamento
  • O Pagamento Final
  • O Piano
  • O Poço
  • O Poder e a Lei
  • O Porteiro
  • O Preço da Coragem
  • O Protetor
  • O Que é Isso, Companheiro?
  • O Solista
  • O Som do Coração (August Rush)
  • O Tempo e Horas
  • O Troco
  • O Último Vôo
  • O Visitante
  • Old Guard
  • Olhos de Serpente
  • Onde a Terra Acaba
  • Onde os Fracos Não Têm Vez
  • Operação Fronteira
  • Operação Valquíria
  • Os Agentes do Destino
  • Os Esquecidos
  • Os Falsários
  • Os homens que não amavam as mulheres
  • Os Outros
  • Os Românticos
  • Os Tres Dias do Condor
  • Ovos de Ouro
  • P.S. Eu te Amo
  • Pão Preto
  • Parejas
  • Partoral Americana
  • Password, uma mirada en la oscuridad
  • Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas
  • Perdita Durango
  • Platoon
  • Poetas da Liberdade
  • Polar
  • Por Quem os Sinos Dobram
  • Por Um Sentido na Vida
  • Quantum of Solace
  • Queime depois de Ler
  • Quero Ficar com Polly
  • Razão e Sensibilidade
  • Rebeldia Indomável
  • Rock Star
  • Ronin
  • Salvador Puig Antich
  • Saneamento Básico
  • Sangue Negro
  • Scoop O Grande Furo
  • Sem Destino
  • Sem Medo de Morrer
  • Sem Reservas
  • Sem Saída
  • Separados pelo Casamento
  • Sete Vidas
  • Sexo, Mentiras e Vídeo Tapes
  • Silence
  • Slumdog Millionaire
  • Sobre Meninos e Lobos
  • Solas
  • Sombras de Goya
  • Spread
  • Sultões do Sul
  • Super 8
  • Tacones Lejanos
  • Taxi Driver
  • Terapia do Amor
  • Terra em Transe
  • Território Restrito
  • The Bourne Supremacy
  • The Bourne Ultimatum
  • The Post
  • Tinha que Ser Você
  • Todo Poderoso
  • Toi Moi Les Autres
  • Tomates Verdes Fritos
  • Tootsie
  • Torrente, o Braço Errado da Lei
  • Trama Internacional
  • Tudo Sobre Minha Mãe
  • Últimas Ordens
  • Um Bom Ano
  • Um Homem de Sorte
  • Um Lugar Chamado Brick Lane
  • Um Segredo Entre Nós
  • Uma Vida Iluminada
  • Valente
  • Vanila Sky
  • Veludo Azul
  • Vestida para Matar
  • Viagem do Coração
  • Vicky Cristina Barcelona
  • Vida Bandida
  • Voando para Casa
  • Volver
  • Wachtman
  • Zabriskie Point