domingo, julho 29, 2012

poucos de nós estão prontos ou capacitados a amar


Sobre a dificuldade de amar o próximo
Zygmunt Bauman*
Numa cena de Korczak, o filme mais humano de Andrzej Wajda, Janus Korczak (pseudônimo do grande pedagogo Henryk Goldszmit), um herói cinematográfico muito humano, é relembrado dos horrores das guerras travadas no curso da vida de sua sofrida geração. Ele recorda essas atrocidades, é claro, e elas o ofendem e repugnam. E de modo ainda mais vívido, e com o maior dos horrores, ele se lembra de um bêbado chutando uma criança.
Em nosso mundo obcecado por estatísticas, médias e maiorias, tendemos a medir o grau de desumanidade das guerras pelo número de baixas que elas causam. Tendemos a medir o mal, a crueldade, a repugnância e a infâmia da vitimização pelo número de vítimas.  Mas, em 1944, em meio à guerra mais mortífera já travada pelos seres humanos, Ludwig Wittgennstein observou:
Nenhum clamor de tormento pode ser maior que o clamor de um homem.
   Ou, mais uma vez, nenhum tormento pode ser maior do que aquilo que um único ser humano pode sofrer.
   O planeta inteiro não pode sofrer tormento maior do que uma única alma.
Meio século depois, quando questionada por Leslie Stahl, da rede de televisão CBS, sobre o cerco de meio milhão de crianças mortas em função do continuado bloqueio militar imposto pelos Estados Unidos ao Iraque, Madeleine Albright, então embaixadora norte-americana na ONU, não negou a acusação, admitindo ter sido “uma escolha difícil de fazer”. Mas justificou-a: “Achamos que era um preço que valia ser pago.”
Albright, sejamos justos, não estava nem está só ao seguir esse tipo de raciocínio. “Não se pode fazer uma omelete sem quebrar os ovos” é a desculpa favorita dos visionários, dos porta-vozes das visões oficialmente endossadas e dos generais que agem da mesma forma sob o comando dos porta-vozes. Essa fórmula transformou-se, com o passar dos anos, num verdadeiro slogan de nossos admiráveis tempos modernos.
Quaisquer que sejam aqueles “nós” que “achamos” e em cujo nome falava Albright, foi exatamente a fria crueldade de seu tipo de avaliação que provocou a oposição de Wittgenstein e deixou Korczak chocado, ultrajado e revoltado, resolvido a dedicar toda uma vida a essa revolta.
A maioria de nós concordaria que esse sofrimento sem sentido e essa dor insensivelmente infligida não podem ser desculpados e não teriam defesa perante tribunal algum. Mas menos estariam prontos a admitir que provocar a fome ou causar a morte de uma única pessoa não é, não pode ser, “um preço que vale ser pago”, não importa quão “sensata” ou até nobre possa ser a causa pela qual se pague. Tampouco a humilhação ou a negação da dignidade humana pode ser esse preço. Não é apenas que a vida digna e o respeito devido à humanidade de cada ser humano se combinem num valor supremo que não pode ser superado ou compensado por nenhum volume ou quantidade de outros valores, mas que todos os outros valores só são valores na medida em que sirvam à dignidade humana e promovam a sua causa. Todas as coisas valorosas na vida humana nada mais são que diferentes fichas para a aquisição do único valor que torna a vida digna de ser vivida. Aquele que busca a sobrevivência assassinando a humanidade de outros seres humanos sobrevive à morte de sua própria humanidade.
A negação da dignidade humana deprecia o valor de qualquer causa que necessite dessa negação para afirmar a si mesma. E o sofrimento de uma única criança deprecia esse valor de forma tão radical e completa quanto o sofrimento de milhões. O que pode ser válido para omeletes torna-se uma mentira cruel quando aplicado à felicidade e ao bem-estar humanos.
É comumente aceito pelos biógrafos e discípulos de Korczak que a chave para seus pensamentos e atos era o amor que tinha pelos filhos. Essa interpretação é bem fundamentada. O amor de Korczak pelos filhos era apaixonado e incondicional, total e abrangente – o bastante para sustentar toda uma vida caracterizada por uma sensibilidade e uma integridade singularmente coesas. Ainda assim, como a maior parte das interpretações, essa também não corresponde à totalidade de seu objeto.
Korczak amava os filhos como poucos de nós estão prontos ou capacitados a amar, mas o que amava neles era sua humanidade. A humanidade no que ela tem de melhor – sem distorções, sem truncamentos, sem enfeites nem mutilações, plena em sua incipiência e nascença, cheia de promessas que ainda não foram traídas e de potenciais ainda não comprometidos. O mundo em que os potenciais portadores de humanidade nascem e crescem é, ao que se sabe, mais propenso a prender as asas de que a estimular os supostos voadores a abri-las, e assim, na opinião de Korczak, era apenas nas crianças que essa humanidade podia ser encontrada, capturada e preservada (por algum tempo, só por algum tempo!) intacta e ilesa.
Talvez fosse melhor mudar os costumes do mundo e tornar nosso hábitat mais hospitaleiro à dignidade humana, de modo que amadurecer não exigisse o comprometimento da humanidade de uma criança. O jovem Henryk Goldszmit compartilhava as esperanças do século em que nasceu e acreditava que mudar os abomináveis hábitos do mundo estava ao alcance dos seres humanos, sendo uma tarefa viável e que ao mesmo tempo tendia a ser realizada. Mas com o passar do tempo, à medida que as pilhas de vítimas e os “danos colaterais” provocados tanto pelas más quanto pelas mais nobres intenções atingiam dimensões estratosféricas, e em que a necrose e a putrefação da carne em que os sonhos tendiam a se transformar deixava cada vez menos espaço à imaginação, essas esperanças exaltadas foram sendo despidas de sua credibilidade. Janus Korczak conhecia muito bem a desconfortável mentira que Henryk Goldszmit praticamente ignorava: não pode haver atalhos que conduzam a um mundo feito sob medida para a dignidade humana, e ao mesmo tempo é improvável que o “mundo realmente existente”, construído dia a dia por pessoas já espoliadas de sua dignidade e desacostumadas a respeitar a das outras, possam algum dia ser refeito segundo essa medida.
A este nosso mundo não se pode impor legalmente a perfeição. Não se pode forçá-lo a adotar a virtude, mas tampouco persuadi-lo a se comportar de modo virtuoso. Não se pode fazer com que seja terno e atencioso para com os seres humanos que habitam, e ao mesmo tempo tão adaptado aos seus sonhos de dignidade quanto idealmente se desejaria que fosse. Mas você deve tentar. Você vai tentar. Você o faria, de qualquer maneira, se fosse aquele Janus Korczak inspirado em Henryk Goldszmit.
Mas como você tentaria? Um pouco como os antiquados visionários utópicos que, não tendo conseguido tornar quadrado o círculo da segurança e da liberdade na Grande Sociedade, transformaram-se em projetistas de comunidades controladas, shopping centers e parques temáticos... No seu caso, protegendo a dignidade com que cada ser humano nasce dos gatunos e falsários que tramam roubá-la ou desvirtuá-la e mutilá-la. E você começaria pelo trabalho perpétuo de protegê-la enquanto é tempo, durante a infância dessa dignidade. Tentaria trancar o estábulo antes que o cavalo fugisse ou fosse roubado.
Uma das formas de fazê-lo, aparentemente a mais razoável, é abrigar as crianças dos eflúvios venenosos de um mundo infectado e corrompido pela humilhação e a indignidade humanas, barrar o acesso à lei da selva que começa justamente do outro lado da porta do abrigo. Quando seu orfanato se mudou do endereço anterior à guerra, em Krochmalma, para o Gueto de Varsóvia, Korczak ordenou que aporta de entrada permanecesse trancada e as janelas de andar térreo fossem tapadas. Quando as deportações para as câmaras de gás estavam se tornando uma certeza, Korczak supostamente se opôs à idéia de fechar o orfanato e despachar as crianças para que buscassem individualmente a chance de escapar que algumas poderiam (apenas poderiam) ter. Ele pode ter concluído que não valeria correr o risco: uma vez fora do abrigo, as crianças aprenderiam a temer, a humilhar-se e a odiar. Elas perderiam o mais precioso dos valores – sua dignidade. Uma vez privadas desse valor, qual a vantagem de permanecerem vivas? O valor, o mais precioso dos valores humanos, o atributo sine qua non de humanidade, é uma vida de dignidade, não a sobrevivência a qualquer custo.
(*) Zygmunt Bauman, “um dos mais originais e perspicazes sociólogos ainda em atividade”. Trecho do livro Amor Líquido - Sobre a fragilidade dos laços humanos.

quinta-feira, julho 19, 2012

um sonho suspenso entre a expectativa e a lembrança


Contardo Calligaris


Assisti a "Na Estrada", de Walter Salles, na sexta passada, no Rio. E passei o fim de semana pensando na minha vida.
Li "Na Estrada", de Jack Kerouac, no fim dos anos 1960, provavelmente em Nova York --mas talvez em Houston. O texto que eu li era uma versão expurgada; isso, na época, eu não sabia. Não voltei ao texto em 2007, quando a Viking publicou o manuscrito original (em português pela L&PM). Mas o texto voltou em mim com força, na sexta-feira, quando assisti ao filme.
Nos anos 1960, eu era um hippie lendo um "beat". Na mesma época, "Almoço Nu", de William Burroughs, me seduzia, mas me assustava --longe demais de minha experiência (das drogas, do sexo e da vida). Também lia Allen Ginsberg e Gregory Corso, mas, aos dois, preferia Lawrence Ferlinghetti --outra escolha "bem comportada", dirá alguém.
O fato é que "Na Estrada" foi a parte da herança "beat" da qual eu me apropriei imediatamente. Por quê? As drogas, o álcool ou o sexo "livre" me pareciam secundários --apenas um jeito de dizer: "Não esperem que a gente viva como manda o figurino".
O essencial, para mim, era a junção da fome de aventura com uma raivosa vontade de escrever. A vida se confundia com um projeto literário que exigia os excessos: era preciso viver intensa e loucamente, de peito aberto, para que valesse a pena contar a história. Por isso, eu e outros podíamos, ao mesmo tempo, venerar Kerouac e Hemingway --os quais, álcool à parte, provavelmente, não se dariam.
Pensando bem, eu fui mais um "beat" atrasado do que um hippie. A procura por iluminações interiores e comunhões cósmicas da idade de Aquário, tudo isso me parecia pacotilha para "Hair", coisa da Broadway. Fiz minha peregrinação à Índia e ao Nepal, mas considerava com desconfiança o orientalismo que estava na moda: o budismo dos anos finais de Kerouac e Ginsberg não me parecia mais sério do que o hinduísmo dos Beatles.
O problema é que eu era um espécimen bastardo: "mezzo" hippie e "mezzo" maio-68 francês, "mezzo" descendente dos "beats" e "mezzo" filho marxista do pós-guerra europeu.
Kerouac não tinha simpatia pelo marxismo. Ele preferia o individualismo dos que procuram uma fronteira para desbravar --pouco a ver com um projeto de reforma social ou de revolução. Para os "beats", aliás, transformar a sociedade seria um problema. Certo, Neal Cassady e Gregory Corso passaram tempo na cadeia; e Burroughs, Kerouac e Ginsberg foram censurados. Mas, justamente, num mundo que não lhes resistisse, a vida dos "beats" perderia sua dimensão épica.
Ao longo dos anos 1970 e 1980, fazendo um balanço, eu teria dito que, em mim, a herança marxista europeia prevalecera sobre a herança "beat". Hoje, penso o contrário -não sei se por decepção política ou por maturidade. Mas não tenho muitas certezas: por exemplo, minha errância pelo mundo foi uma experiência da estrada ou uma versão "chique" do cosmopolitismo forçado dos trabalhadores modernos?
E será que vivi como um fogo de artifício? Ou então durar e continuar vivo se tornou, para mim, mais importante do que me arriscar na intensidade das experiências?
O filme de Salles está sendo a ocasião imperdível de um balanço -ainda não decidi se festivo ou melancólico. Cuidado, o balanço não interessa só minha geração. Cada um de nós pode se perguntar, um dia, como resolveu a eterna e impossível contradição entre segurança e aventura: quanta aventura ele sacrificou à sua segurança?
Essa conta deveria ser feita sem esquecer que 1) a segurança é sempre ilusória (todos acabamos morrendo) e 2) qualquer aventura não passa de uma ficção, um sonho suspenso entre a expectativa e a lembrança.
Que você tenha lido ou não o livro de Kerouac, e seja qual for sua geração, assista ao filme e se interrogue: se uma noite, inesperadamente, Neal Cassady tocar a campainha de sua casa, louco de aventuras para serem vividas e com o olhar fundo de quem dirige há horas e ainda quer se jogar na estrada, você saberia e poderia, sem fazer mala alguma, simplesmente ir embora com ele?
Nota. Na semana passada, neste espaço, escrevi, como sempre, uma coluna (www.migre.me/9Ttsq). Aparentemente, Barbara Gancia leu outra. A essa outra coluna, que eu não escrevi, ela respondeu na sexta (www.migre.me/9TtFI). Não sei se um mal-entendido tamanho tem conserto ou interesse. Seja como for, hoje, comentar "Na Estrada" era decididamente mais importante, para mim.

Contardo Calligaris, italiano, é psicanalista, doutor em psicologia clínica e escritor. Ensinou Estudos Culturais na New School de NY e foi professor de antropologia médica na Universidade da Califórnia em Berkeley. Reflete sobre cultura, modernidade e as aventuras do espírito contemporâneo (patológicas e ordinárias). Escreve às quintas na versão impressa de "Ilustrada".
Fonte: Folha de São Paulo / Colunistas, 19/07/2012 - 03h00

sábado, julho 07, 2012

o avanço sobre o espaço natural não encontrava barreiras

por Paulo Kliass
A História da humanidade está marcada por um processo contínuo e crescente de desenvolvimento das forças produtivas e de avanço do ser humano sobre o espaço natural. E isso se deu desde os primeiros registros de organização social, ainda sob a forma de coletores ou caçadores até o quadro atual de atividades que colocam em risco a sobrevivência do planeta e da própria espécie.
Dessa foram se sucedendo os saltos propiciados pela evolução das sucessivas formações sociais e pelo desenvolvimento técnico-científico. Fixação territorial das comunidades e início das atividades de agricultura e pastoreio, marcando o início dessa exploração e conquista do homem sobre a natureza. Domínio de técnicas para geração de energia a partir de recursos naturais (fogo). Consolidação de grupos sociais vivendo em espaços urbanos, afastados dos processos associados à produção de alimentos. Descobertas de novas formas de geração de energia (hidráulica), inovações para aumento da produtividade agrícola e início do processo de transformação produtiva sob a forma artesanal. Utilização em escala crescente dos bens da natureza para consolidar as bases estruturais da sociedade, como os minerais e a madeira para construir ferramentas, bens de uso, meios de transporte, residências, palácios, monumentos, estradas e outros.
O salto industrial e o aprofundamento da degradação
Uma mudança de qualidade nesse processo foi a inovação tecnológica que veio a propiciar a evolução da manufatura e o advento da produção em escala industrial. O desenvolvimento científico revolucionou setores fundamentais como saúde e transportes, possibilitando a redução da mortalidade, o aumento populacional e o deslocamento de bens e pessoas nas regiões e entre continentes. As descobertas relativas às fontes de energia de combustível fóssil (carvão e petróleo) impulsionaram a conquista do homem sobre a natureza, exatamente no momento em que o modo capitalista de produção se afirmava como hegemônico em escala internacional. Produção e consumo em massa se assentavam sobre o modelo colonialista em expansão, onde os países europeus imprimiam a marca da super exploração dos recursos humanos e naturais dos demais continentes.
Com exceção das populações tradicionais que conviviam em harmonia com a natureza e isoladas do ímpeto do chamado “progresso”, o avanço do modelo capitalista de espoliação do espaço natural não encontrava barreiras. Por outro lado, as próprias experiências socialistas do século XX não buscaram alternativas que não estivessem baseadas no extrativismo e no produtivismo exacerbados. Tudo se passava como se o processo civilizatório fosse sinônimo de avanço irracional da sociedade humana sobre o espaço natural. 
Os resultados mais recentes desse processo milenar estão mais do que conhecidos. O fato, porém, é que apenas ao longo das últimas décadas os riscos de sobrevivência do planeta começaram a se tornar mais evidentes e aceitos. Poluição generalizada e devastadora, aquecimento global, elevação do nível dos oceanos, desastres nucleares, efeitos perversos do uso indiscriminado de agrotóxicos e fertilizantes, incapacidade de dar conta de resíduos e lixo, conseqüências negativas e desconhecidas a respeito do uso de transgênicos, aprofundamento da falta de água: eis apenas alguns dos dramas que a sociedade deveria enfrentar seriamente nos tempos atuais. Esses fenômenos causados pela ação direta do homem aliam-se à dinâmica própria de alteração dos ecossistemas e as conseqüências tornam-se ainda mais imprevisíveis.
Desenvolvimento sustentável “versus” economia verde
Porém, parece claro que a questão ambiental não é uma questão isolada. Ela não pode estar dissociada da questão econômica e da questão social. A degradação da Terra ocorre justamente pelos interesses envolvidos no atual modelo de exploração econômica, onde a busca do lucro a curto prazo e a exploração da força de trabalho são partes integrantes do mesmo processo. As características da desigualdade e da concentração, tão típicas do capitalismo, se fazem presentes no que se refere à distribuição dos recursos naturais. A Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente de 1992 consagrou o conceito de “modelo sustentável”. E essa idéia força vinha sempre associada com a necessidade de enfocar o tema da sustentabilidade em seus 3 eixos interdependentes: a) ambiental; b) econômico; c) social.
Não é intenção deste artigo sugerir um balanço dos resultados obtidos com a Rio + 20. Mas, de toda forma, parece consensual a avaliação de que muito pouco foi realizado pelos governos, pelos organismos multilaterais e pelas grandes corporações multinacionais a respeito do tema ao longo dessas duas décadas. Como foram vinte anos dominados pelo discurso neoliberal e pela crença na supremacia absoluta nas forças do mercado para buscar as soluções ditas “mais eficientes”, muito pouco foi efetivado em termos de regulação, fiscalização e controle das atividades comprometedoras do equilíbrio do planeta – seja em escala global, nacional ou local.
Como a Conferência oficial deste ano ainda se pautou pela inércia da influência política e ideológica dos anos de chumbo do liberalismo irracional, as questões do mercado e da iniciativa privada terminaram por ganhar mais espaço nos debates e na até mesmo na Declaração Final. Aliás, essa foi uma das reclamações apresentadas pelas organizações envolvidas com a realização da Cúpula dos Povos, evento paralelo ao oficial da diplomacia e dos governos, organizado por um sem número de entidades envolvidas com o tema pelo mundo afora.
Uma das novidades do documento final da Rio + 20, “O futuro que queremos”, é a presença do conceito de “economia verde”. Apesar de pouco esclarecedor e merecedor de uma multiplicidade de definições, o fato é que ele abre espaço para as tentativas de consolidar a mercantilização do meio ambiente – fenômeno já em marcha há décadas. No entanto, antes de avançar por aqui, é importante deixar registrado que, ao longo das 59 páginas do texto da ONU, a expressão “economia verde” sempre aparece acompanhada da expressão “no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza”. Ou seja, há quem avalie que o termo ainda não se expressaria como um caminho exclusivamente de mercado para a crise ambiental.
Os instrumentos da mercantilização
Porém, a Declaração Final não é muito mais do que isso: apenas uma declaração de intenções. A realidade das dinâmicas econômica, política e social operam em uma velocidade bem superior à das negociações diplomáticas. E, aliás, isso é até natural e compreensível. Portanto, aproveitando-se dessa distância, o conceito de “economia verde” já está há um bom tempo sendo utilizado pelos governos, implementado pelas grandes empresas e divulgado pelos meios de comunicação como a grande panacéia para todos os males que o capitalismo tem provocado sobre o ecossistema. Só que a problemática é bem mais complicada do que aparenta.
Assim, em sua tendência a universalizar as relações mercantis, o atual sistema econômico passou a incorporar a dimensão do “meio-ambiente” também como instrumento de acumulação e dinamização do mercado. Os primeiros esboços concentraram-se na área de emissão de gases do efeito estufa (GEE). A partir das determinações previstas no Protocolo de Kyoto, lançado em 1997, começaram a surgir os “créditos de carbono”, que vieram a se constituir em instrumentos de negociação no próprio mercado financeiro. Com isso, as empresas que conseguissem reduzir seu volume de emissão de GEE teriam direito a emitir esses títulos de crédito de carbono, que passaram a ser precificados e negociados no mercado. De acordo com os padrões estabelecidos atualmente, um crédito de carbono equivale à redução de 1 tonelada de dióxido de carbono (CO2).
O objetivo implícito é que ele seria um mecanismo de estimular a substituição de processos produtivos “sujos” por novos processos “limpos”. O termo genérico desse tipo de ação ficou conhecido como “mecanismo de desenvolvimento limpo” (MDL) e contaria com algum tipo de regulação e fiscalização por parte da ONU, de maneira a evitar que os títulos de crédito de carbono pudessem ser objeto de fraude e descontrole. O crescimento do volume de títulos emitidos e a generalização de sua negociação criaram um verdadeiro mercado, com todo tipo de produto financeiro associado. O crédito de carbono tem uma cotação nas Bolsas de Mercadorias, tendências de alta, expectativas de queda, operações de mercado futuro e por aí vai. Como todos os títulos similares, está bastante sujeito a muita especulação.
Mais recentemente, outros instrumentos financeiros passaram a ser incorporados à prática dos grandes grupos multinacionais, mas ainda não são objeto de regulação e controle institucional. Trata-se do procedimento de “redução de emissão por desmatamento e degradação evitados” (REED), por meio do qual as corporações e seus empreendimentos de larga escala buscam obter ganhos econômicos a partir de iniciativas que possam diminuir o ritmo de destruição ambiental, como a redução de áreas de floresta ou comprometimento de áreas envolvidas com extração mineral. E aqui novamente o mercado financeiro pode atuar como facilitador dos negócios e da alavancagem de projetos, pois tudo se consolida em emissões de títulos que passam a ter um valor e são negociados nos mercados mobiliários por todos os cantos do planeta. E como quase tudo no mercado opera com base na especulação, o que dizer de operações sem nenhum lastro no setor real da economia? 
Busca de alternativas à solução de mercado
Além disso, vale ressaltar que outros elementos da natureza já estão submetidos ao regime de mercantilização ou correm o risco de virem a passar pelo mesmo processo. É o caso da terra e do solo para atividades agropecuárias, extrativas e as demais no espaço urbano. A água, em sua condição de bem essencial para a vida, começa a dar os sinais de escassez preocupante em escala global e não apenas nas regiões historicamente afetadas pela seca. Os mares e oceanos pelo potencial energético, de alimentação e de pesquisa, além da questão estratégica de ser utilizado como meio de transporte. Os ares e a atmosfera por sua característica fundamental do oxigênio, além de outras como água, ventos e chuvas.
Portanto, a incorporação do conceito de economia verde no documento final da Rio+ 20 reflete o estágio atual da correlação de forças a nível internacional. Há setores fortemente interessados em que a dimensão do meio-ambiente continue nessa trajetória crescente de mercantilização, com abertura de novos espaços de negócios em nome da salvação do planeta. Porém, é preciso que se denuncie a incapacidade das forças de mercado em darem conta dessa árdua tarefa, inclusive porque sua preocupação maior é com o lucro imediato e não com a viabilidade no longo prazo.
A solução passa por buscas de uma abordagem integradora da sustentabilidade, incorporando suas dimensões econômica, social e ambiental. Afinal, não se pode exigir de países do interior do continente africano o mesmo “sacrifício” que se propõem a efetuar as populações dos países escandinavos. Uns ainda sobrevivem em péssimas condições, passam fome, apresentam elevadas taxas de mortalidade, não têm acesso às mínimas facilidades do padrão de vida do mundo dito desenvolvido. Outros se permitem até mesmo falar em estagnação econômica, pois atingiram um padrão social típico do Estado do bem estar.
O nível gritante de desigualdade sócio-econômica exige que os diferentes sejam tratados de forma diferenciada. Assim, a trilha para se alcançar uma humanidade mais justa e homogênea em termos de qualidade de vida não deve repetir a mesma trajetória equivocada, em particular a do padrão dos últimos 50 anos. No entanto, transformar o meio ambiente em mercadoria e operar apenas por meio de referência de preços artificialmente construídos tampouco se apresenta como solução para os graves problemas de nosso tempo.
Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

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