quinta-feira, fevereiro 25, 2010

insônia

Normalmente mata-se o que é diferente.

Insiste-se em que a sociedade invade a família, e que o meio faz o indivíduo. Mais apropriado seria dizer: A família constrói toda uma sociedade, e é absolutamente a que temos.

Engana-se mais, apesar de toda informação disponível.

Inevitavelmente tornamo-nos escravos do crédito.

O desapego é a maior liberdade.

Quem sabe aprender a amar seja ser o que se é diante do outro. E continuar sendo.

Se for cair... Relaxe, derreta-se, desarme-se, se desmanche entre as dimensões duras e etéreas que puder encaixar-se, encontre-se fluindo sem controles ou tensões. Daí, provavelmente encontre um ponto de equilíbrio. Pelo menos momentâneo.

Às vezes quando silenciamos as respostas que queremos chegam até nós.

Há alguma chance para mamíferos com olhos para o próprio umbigo, indivíduos competitivo-destrutivos, insaciáveis consumidores de proteína pronta e recursos naturais, e que crê nas leis do mercado como a solução para o equilíbrio das coisas?

quinta-feira, fevereiro 11, 2010

meu meteoro

Um meteorito no Alto
por Afranio Campos

Uma tarde quente estendia a rua de terra até o mar, a brisa soprada trazia o cheiro de ondas e salitre, um dia ensolarado barrufava toda a comunidade da Aminadab Valente. Horácio, ainda um menino de calça curta estava sentado imóvel, como um paralelepípedo solitário, na soleira do portão da casa de praia de sua avó Abigail. Ele se impressionava com o Alto, localidade humilde em suas dimensões humanas e materiais; imaginava às vezes penetrando naquelas ruelas, sustentando-se por pinguelas instáveis, passagens apertadas completadas por barracos de madeira e barro, construções de pau-a-pique, poucas com serviço público de energia e nenhum de saneamento básico. Observava de longe as lavadeiras e sabia com uma visão de menino estudioso dos girinos escondidos na água escura de aroma forte, salobra, que em dada estação cobria-se de jibóias bem verdes que preenchia metade da lagoa negra, ricamente e profundamente misteriosa.

A sua curiosidade era atiçada nas formas adotadas na feitura dos fifós, nas tintas e ranhuras do porrão fundo de bojo largo, no vapor do ferro de passar a carvão esticando as linhas das calças e camisas, e também nos lençóis brancos estalando secos e alvos no varal de arame. Seu costume era ficar observando a vida de lá, da gente que apanhava água em latas carregadas sobre rodilhas de cabeça, geralmente as mulheres, um quadro que despertava toda sua arte. Um conjunto de casebres e palafitas levantados sobre um areal próximo da Grande Lagoa.

De repente, como se apontado por alguém ao longe, ele suspende seu olhar para o alto, e vê claramente passar um meteorito, nada que assustasse, um diamante riscando o céu duro azulado sem nuvens sobre sua cabeça, ia desenhando um rastro de fogo encantado, com sua cauda esticada que continuou num trajeto infinito até se perder de vista entrando no horizonte largo, tão longe quanto a imaginação de Horácio. Uma imagem simples, uma chama viva de rocha se movimentando vigorosa, e daí em diante todas as sensações desse entardecer jamais se desmanchariam. Ainda surge radioativa revitalizando memórias.


sábado, fevereiro 06, 2010

miséria da ideologia

Da miséria ideológica à crise do capital

O livro da cientista social Maria Orlanda Pinassi emerge, em tempos de ilusões pós-modernas, na oposição da apologética acadêmica niilista. Pinassi reflete sobre a incidência do conceito de decadência ideológica na atualidade, principalmente diante das ideologias que pregam o “fim da história”, o “fim da ideologia”, o “fim do trabalho”. O grande mérito da autora foi resgatar a categoria decadência ideológica como um dos mais férteis instrumentos da crítica marxiana-lukacsiana. A resenha é de Ricardo Lara, professor da Universidade Federal de Santa Catarina.

Data: 04/02/2010

RESENHA

PINASSI, M. O. Da miséria ideológica à crise do capital: uma reconciliação histórica. São Paulo, Boitempo, 2009, 140p. (Coleção Mundo do Trabalho)

O livro da cientista social Maria Orlanda Pinassi emerge, em tempos de ilusões pós-modernas, na oposição da apologética acadêmica niilista. A teoria social articulada em seus ensaios alimenta-se na tradição ontológica materialista e dialética que se agarra a práxis revolucionária. Aliada ao conceito de decadência ideológica – “um dos mais férteis instrumentos da ciência marxiana da história” (PINASSI, 2009, p. 16) –, a autora oferece contundente arsenal de críticas as ideologias irracionais que se instauraram no pensamento social após a consolidação da hegemonia burguesa.

O conceito de decadência ideológica, elaborado por Georg Lukács (1885 – 1971) designa a crise espiritual da burguesia após 1848. Para Lukács (1968, p. 52) o que temos, com a evolução do pensamento social burguês, é a:

liquidação de todas as tentativas anteriormente realizadas pelos mais notáveis ideólogos burgueses, no sentido de compreender as verdadeiras forças motrizes da sociedade, sem temor das contradições que pudessem ser esclarecidas; essa fuga numa pseudo-história construída a bel prazer, interpretada superficialmente, deformada em sentido subjetivista e místico, é a tendência geral da decadência ideológica.

Pinassi reflete sobre a incidência do conceito de decadência ideológica na atualidade, principalmente diante das ideologias que pregam o “fim da história”, o “fim da ideologia”, o “fim do trabalho”. O pensamento burguês contemporâneo, na maioria dos casos, apresenta tendências que não se preocupam em construir conhecimentos que levam em consideração a materialidade social. O pensamento social faz das ciências sociais e humanas um mecanismo irracional que nega o desenvolvimento sócio-histórico e evita produzir conhecimentos que têm como pressuposto o mundo da atividade concreta e sensível do homem.

Nos tempos presentes a irracionalidade burguesa avança a passos vastos, as concepções científicas de todas as áreas do saber mostram-se capacitadas para responder as ânsias de um modo de vida que sobrevive entre a plena realização da coisa (fetiche do capital) e a barbárie social. As possíveis respostas para os fenômenos sociais e naturais que afligem a humanidade estão presentes em todas as ciências, mas os abismos entre a realidade social e suas percepções científicas geram concepções caóticas.

Os “paradigmas” científicos explicam o homem tentando buscar sua essência, mas não compreendem que a essência humana deve ser encontrada no conjunto das relações sociais, pois “a essência humana não é uma abstração intrínseca ao indivíduo isolado. Em sua realidade, ela é o conjunto das relações sociais”. (MARX; ENGELS, 2007, p. 534).

A trajetória DA MISÉRIA IDEOLÓGICA À CRISE DO CAPITAL delongou aproximadamente 130 anos para sua RECONCILIAÇÃO HISTÓRICA, composta pelo ponto de partida, as “origens do processo da consolidação da hegemonia burguesa, momento pós-revolucionário que impõe uma enorme transfiguração das ideologias clássicas do século XVIII em ideologias apologéticas” (PINASSI, 2009, p. 11), e o ponto de chegada, a crise estrutural do capital iniciada nos anos de 1970, com seus limites absolutos, crônicos e implacáveis. O livro é uma denúncia imprescindível, um chamado para a consciência crítica e revolucionária, uma arma em potencial para combater as delirantes abstrações e aberrações ideológicas da atualidade. O grande mérito de Pinassi foi de resgatar a categoria decadência ideológica como um dos mais férteis instrumentos da crítica marxiana-lukacsiana. A autora indica com radicalidade teórica o vínculo e a coexistência da ideologia apologética com a eficiência da produção material capitalista.

A decadência ideológica desvenda o “racionalismo burguês”, justificador do desenvolvimento capitalista do final da segunda metade do século XIX, que se ancora no período imperialista, e concretiza-se nas crises cíclicas do século XX. Nessa processualidade social surgem os causídicos do sistema, com suas teorizações do “pleno emprego”, do “estado de bem estar social”, sustentadores da inconsciência burguesa. Pinassi expõe o poder da ideologia, revestida de apologética, que oferece sustentação para a acumulação capitalista. O conceito de decadência ideológica revela a crítica da totalidade social, revela a conexão entre força material e construção ideológica do sistema do capital, oferece a possibilidade da crítica, genuína e fecunda, que resgata a perspectiva ontológica.

Os ensaios que compõem o livro depositam confiança na alternativa socialista como a única opção para a sobrevivência da humanidade. Aborda questões fundamentais da transição socialista. Desmistifica a irracionalidade burguesa e abre o caminho para a teorização da revolução socialista, pois a história da humanidade não é algo dado e acabado como ampara o pensamento burguês apologético. A luta de classes e a constituição da classe revolucionária é o principal tema perquirido ao longo das páginas. Os textos abordam as principais polêmicas do projeto verdadeiramente socialista, Pinassi não teme em deixar evidente sua postura radical contra as ilusões irracionais acadêmicas pós-modernas.

Para isso ela inquieta-se com a universalização do capital e suas absurdas e cruéis formas de irracionalismo. Para levar a êxito tal posicionamento, nota-se, no livro, a atenta interlocução com as obras de Marx, Lukács e Mészáros, ganhando evidência a percepção audaz de extrair os debates nodais da crítica ontológica expirada na ciência da história marxiana. As interlocuções com os clássicos do pensamento marxiano rejuvenesce as críticas impenitentes ao capitalismo. Sem rodeios apologéticos, a autora vai a questão essencial: só é possível liberdade e democracia numa sociedade para além do irracionalismo burguês, da propriedade privada e da alienação.

O principal fundamento da crítica marxiana foi a descoberta de quê a produção e reprodução da vida social burguesa se estabelece pela dialética da propriedade privada e do trabalho estranhado. Nos onze ensaios do livro, observamos a crítica ontológica que orienta a humanidade na suprassunção da propriedade privada em busca da emancipação humana.

Temas e categorias teóricas – transição socialista, emancipação humana, revolução, propriedade privada, luta de classes, criminalidade, ecletismo, reforma agrária, consciência de classe, movimentos sociais – hesitados pelos cientistas sociais contemporâneos, ou criminalizados pelo irracionalismo burguês, ressurgem com autenticidade e necessidade histórica nos textos da autora. Esses assuntos são colocados na história e ganham significados ontológicos e transitórios. Observe a seguinte afirmação em relação a luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST):

o que poderia constituir uma debilidade – ou seja, a particularidade histórica da luta pela reforma agrária – pode ser um dos seus maiores triunfos. Ou seja, da bandeira que evoca velhas contradições nacionais não resolvidas pode aflorar a consciência para as mais atuais formas assumidas pela exploração de classe e pela dominação imperialista. (PINASSI, 2009, p. 71).

Pinassi destaca a importância de analisar o MST como um movimento que luta pela transitoriedade, pela superação do sistema de funcionamento do capital. O MST é considerado uma base fundamental para compreender a práxis das atuais organizações alternativas constituídas no mundo do trabalho latino-americano.

A autora, ao abordar as temáticas polêmicas, questiona o medo dos homens contemporâneos, o temor que vem transvestido de mais alienação. A teoria social tem medo de questionar a realidade e colocar em xeque o metabolismo social do capital. Perante isso, evidencia-se a generosa crítica aos anticapitalistas românticos que não questionam a exploração da mais-valia e a propriedade privada, e aos que levantam a bandeira visionária dos “direitos das minorias”. A racionalidade pseudo-crítica não questiona as raízes das contradições da sociedade burguesa, ignora a luta de classes e não resgata a crítica a barbárie social imposta pela ordem do capital. Depois de ler o livro, percebemos o quanto e o porquê as ciências sociais e humanas estão tão distantes da realidade social.

Enfim, na contemporaneidade, muito se escreve e muito se lê sobre a sociedade humana e suas relações sociais submetidas à lógica do capital, mesmo aqueles que se pautam na crítica da sociabilidade burguesa acabam, em alguns casos, reproduzindo estilos acadêmicos oriundos da decadência ideológica. Pinassi diverge da maioria da intelectualidade atual, afronta o “tema” da emancipação humana como prioridade no debate das ciências sociais e humanas. O destemido livro representa a imprescindível crítica radical às ideologias apologéticas e, por conseguinte, irracionais. A leitura é uma interlocução, segura, com Marx, Lukács e Mészáros, na melhor maneira da aspiração ontológica, as análises são sobre determinadas condições de existência reais, históricas e transitórias, as críticas teóricas são sobre as relações de produção e reprodução da vida humana sob as contradições inconciliáveis do sistema do capital.

Referências bibliográficas

LUKÁCS, G. Marxismo e teoria da literatura. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968, 288p.

MARX; ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo, Boitempo, 2009, 614p. (Coleção Marx e Engels)

PINASSI, M. O. Da miséria ideológica à crise do capital: uma reconciliação histórica. São Paulo, Boitempo, 2009, 140p. (Coleção Mundo do Trabalho)

(*) Professor Adjunto do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. E-mail: ricbrotas@ig.com.br

quarta-feira, fevereiro 03, 2010

paradoxo ambiental

Entre a água e a comida

Criar gado e cultivar trigo em pleno deserto. Na Arábia Saudita, essa é a realidade há mais de uma década. Porém, a alta produtividade nesses dois setores, resultante de investimentos pesados em tecnologia, pode ter um preço alto demais: o esgotamento das fontes aquíferas do país. Alain Gresh*

Ao longo da estrada desértica que vai de Riyad a Kharj se alinham, uma ao lado da outra, fábricas de tâmaras que não nos deixam esquecer que a Arábia Saudita é o maior produtor mundial do fruto.

Na entrada da cidade, um grande cartaz anuncia a base aérea Príncipe Sultão, famosa por ter abrigado, até 2003, tropas americanas. Alguns quilômetros à frente, uma bifurcação conduz a uma porta bem protegida, sobre a qual uma inscrição proclama: “Al Safi, a maior fazenda integrada de criação de gado leiteiro do mundo”. O carro é desinfetado antes de ser autorizado a prosseguir. No hall de recepção está exposta uma cópia da página do Livro Guinness dos Recordes de 1998 dedicada à empresa por seus 3.500 hectares e 24 mil vacas – hoje contam-se 37 mil cabeças. Importado originalmente do Canadá, o gado malhado Holstein foi inseminado artificialmente. Os vitelos machos são abatidos para o mercado de carne e as fêmeas se tornam leiteiras.

A adaptação ao clima não foi simples. Refrigeradores mantêm a temperatura nos estábulos a menos de 27°C e painéis móveis protegem os animais de um sol escaldante. A ordenha é automatizada e controlada por computador. Na mesma área vê-se a usina de laticínios, também automatizada e dirigida pela sociedade francesa Danone, sócia do projeto desde janeiro de 2001. A fazenda produz 220 milhões de litros de leite por ano e supre cerca de um terço do que é consumido no país.

A companhia Al Safi nasceu do cérebro de um visionário, morto há dois anos, o príncipe Abdallah Al Fayçal, irmão mais velho do atual ministro das Relações Exteriores. Ele, que antes tinha pensado em rebocar ice- bergs do polo Norte para garantir o consumo de água no país, ofereceu ao reinado autos-suficiência em leite. “Nós atingimos altos desempenhos em produtividade: 33 litros por cabeça e por dia, acima das médias internacionais”, explica Karim Manssour, o jovem diretor geral de al Safi-Danone. “Contamos com 30 mil pontos de venda, 25 depósitos na Arábia, cinco no Golfo, um braço na Jordânia, outro no Iêmen e temos projetos para o Líbano e a Síria. São 2.500 pessoas trabalhando [fora as outras mil que trabalham na fazenda da qual a Danone não é parceira]. Um quarto delas é indiana. Ter apenas empregados sauditas é um desafio: é difícil encontrar trabalhadores locais para fazer serviços manuais, mas fazemos um esforço de buscá-los nas regiões pobres, no sul e no leste principalmente.”

De uma cabana de madeira surge um penacho de fumaça. É a água bombeada do solo, que sai a 70°C. Originalmente, bastava descer a 200 metros de profundidade para encontrá-la. Agora é preciso buscá-la a 2 mil metros. Mas isso não tem relação com o gado, diz Manssour: “Antes, o capim era cultivado aqui, mas nós deslocamos as plantações a 200 quilômetros para não esgotar o lençol freático. Temos também uma política de reciclagem da água”. A criação, garante ele, só consome de 3% a 4% da água do país, enquanto a agricultura absorve mais de 80%.

Poucos sabem disso, mas, nos anos 1980, a Arábia Saudita se transformou em um importante produtor de trigo. As autoridades garantiram aos agricultores um preço de compra mais alto do que o do mercado mundial, e a auto-suficiência foi conquistada desde 1984. As áreas plantadas passaram de 67 mil hectares em 1980 para 907 mil em 1992, e a produtividade melhorou: 2,12 toneladas por hectare em 1980, 4,7 em 1988, depois 5,19 em 2005 – contra 6,98 na França, 4,22 na China ou 5,03 na Áustria. Foram criadas companhias privadas que geram lucros substanciais. Em 1993, a produção atingiu seu pico, com 5,3 milhões de toneladas, e as exportações ultrapassaram 2 milhões de toneladas. Na época, a organização das Nações Unidas para a alimentação e agricultura (FAO) louvou esse desempenho.

Trigo em pleno deserto? Mesmo que a Arábia Saudita esteja longe de se limitar a terras áridas e tenha, ao norte e principalmente ao sul, regiões verdejantes, dezenas de milhares de hectares dedicados ao trigo se impuseram sobre a areia. Para compreender como isso foi possível, é preciso remontar aos anos 1970, particularmente ao boom do petróleo do pós-1973.

O terceiro mundo sonhava então com uma “nova ordem internacional” e o Ocidente ameaçava utilizar sua “arma alimentar”, ou seja, cortar as exportações de trigo e leite para alguns Estados “hostis”. Ao mesmo tempo, vários governos afirmavam a vontade de garantir sua autonomia, entre eles, a Arábia Saudita. O dinheiro do petróleo parecia abrir todas as portas...

“Nós nos tornamos o principal exportador de água da região”, explica, irônico, um engenheiro agrícola que não deseja revelar seu nome. “Produzimos trigo ou outras variedades precoces que vendemos aos vizinhos, esgotando nossas fontes de água”. Há anos, ele tenta atrair a atenção das autoridades.

Um debate quente opôs os defensores da segurança alimentar aos que querem preservar as fontes aquíferas do país. Finalmente, no caso do trigo, foi o segundo grupo que ganhou. Riyad decidiu diminuir progressivamente as subvenções à produção local, para suprimi-las totalmente até 2016. Este ano, pela primeira vez em 25 anos, o rei- nado comprará 300 mil toneladas de trigo no mercado mundial.

Investimentos no exterior

Vice-ministro da agricultura, Abdoullah Al-Obeid não é dado a conversa fiada. Esse antigo membro da delegação encarregada de negociar a adesão, efetiva desde 2005, de seu país à Organização Mundial do Comércio (OMC) reconhece de bom grado: “No Ministério, pensamos que era preciso manter a produção de trigo. Atingimos altos níveis de produtividade, principalmente no norte, e nessa região existe menos problemas de água. Gostaríamos de manter ali a produção”.

Turki Fayçal Al-Rasheed dirige uma importante sociedade agrícola, a Golden Grass Inc. Ele assistiu como observador às eleições legislativas no Kuwait e trabalha pela instauração de um sistema parlamentar na Arábia Saudita. Mas, nesse caso, compartilha as reservas de Al-Obeid: “Todos os países têm problemas de água, até os Estados Unidos. Entretanto, devemos continuar a cultivar. Isso permite dar assistência às zonas rurais pobres e nos ajuda também a dominar as tecnologias agrícolas de ponta para economia de água. Teria sido melhor associar as subvenções à utilização de mão-de-obra saudita”.

A auto-suficiência continua a preocupar os responsáveis sauditas. “A crise alimentar de 2008”, explica Al-Obeid, “foi um sinal de alarme. A Arábia Saudita é um importador regular de produtos agrícolas, principalmente de arroz, milho e soja. Isso leva o reinado a investir no exterior. Tanto que enviamos delegações oficiais, compostas também de responsáveis do setor privado, para Turquia, Ucrânia, Egito, Sudão, Tailândia, Filipinas, Vietnã, Etiópia e Uzbequistão”. Ele se defende de qualquer viés colonialista e lamenta as fantasias da imprensa internacional: “Queremos investir na agricultura no exterior, mas não desejamos que toda a produção seja monopolizada pelo reinado, pelo contrário. Temos a intenção de aumentar as áreas cultivadas e vamos garantir que uma parte da produção permaneça no país que vai nos acolher”.

O medo de investimentos intensivos dos países do Golfo na agricultura do sul rendeu assunto de capa em muitos jornais. “Corrida às terras aráveis”, dizia o título do Le Monde de 13 de dezembro de 2008. O periódico publicou um mapa da organização não governamental Grain, afirmando, por exemplo, que a Arábia Saudita teria comprado 1.610.117 hectares pelo mundo. “Os Estados que monopolizam as terras agrícolas na África”, denunciava, por seu lado, o site Afrik.com em 12 de dezembro. “Passaram a mão nas terras agrícolas do sul”, explicava um professor de história do ensino médio num blog destinado a seus alunos [1].

Geralmente, quando uma idéia se torna lugar-comum na mídia, pode-se estar certo de que ela é, no mínimo, exagerada. Para medi-la, basta perguntar aos empresários sauditas envolvidos com a agricultura.

“Evoca-se muito os investimentos no Sudão”, reconhece Al-Rasheed, que dedicou vários artigos na imprensa local ao assunto. “Esse país dispõe de vários atributos: uma enorme área cultivável da qual somente 20% é utilizada; água em abundância, chuva e o rio Nilo. De fato, um clima favorável.” Já nos anos 1970, o Sudão era apresentado como “o celeiro do mundo árabe”. E, no entanto, segue Al-Rasheed, “os obstáculos são inúmeros: além da pobreza da agricultura sudanesa, com seu caráter artesanal e atraso técnico, não existe um regime claro de propriedade. Além disso, as terras visadas se situam em regiões petrolíferas – e, portanto, correm o risco de ser expropriadas de uma hora para outra. Quando tudo for acertado, e isso é antes de tudo responsabilidade das autoridades de Kartum, poderemos investir. Não é nada imediato.” O outro eldorado frequentemente evocado, o Egito, suscita as mesmas reservas. Quanto à Ásia, ela parece bem longe...

Os investimentos privados estrangeiros

No setor da agricultura têm uma história longa. Há vários séculos os países ocidentais estão presentes em suas antigas colônias, e as independências não alteraram essa situação.

O aumento do preço dos produtos agrícolas em 2008, apesar de breve, sem dúvida atiçou a cobiça. Mas a ideia está longe de ser realizada, e é um pouco abusivo denunciar a dominação colonial dos países do Golfo sobre as terras agrícolas do mundo. Ainda mais por se tratar de investidores privados que, se cultivam arroz ou trigo, é para vender no mercado mundial com o maior lucro possível. Pode-se duvidar de que eles reservarão a produção a seu país de origem.

A ONG Grain listou os projetos de investimentos agrícolas de diferentes países em 2008. Para a Arábia Saudita e os países do Golfo, trata-se quase sempre de intenções, visitas, declarações, mais que de contratos assinados. até o acordo dado como certo entre o grupo saudita Bin Laden e a Indonésia (US$ 4,3 bilhões para desenvolver 500 mil hectares de arroz basmati, particularmente apreciado pelos consumidores sauditas) não parece ser nada mais que um projeto. E a crise financeira, somada ao recuo – mesmo que provisório – dos preços dos insumos agrícolas, também vai limitar muitos apetites.

Com uma população que cresce rapidamente, lençóis freáticos poluídos ou esgotados, os projetos para racionalizar o consumo e a construção de novas usinas de dessalinização não são suficientes para garantir o abastecimento de água do país [2]. Como ninguém mais evoca o projeto de trazer icebergs do polo Norte, a Arábia Saudita deverá encontrar meios inéditos de garantir sua segurança alimentar.

*Alain Gresh é jornalista e integra a redação de Le Monde Diplomatique (França).

[1] http://tribouilloterminales.over-blog.com

[2] “Le secteur de l’eau en Arabie Aoudite” [O setor da água na Arábia Saudita], embaixada da França na Arábia Saudita, missão econômica, 22 de novembro de 2008. os dados datam de 2006.

na tela ou dvd

  • 12 Horas até o Amanhecer
  • 1408
  • 1922
  • 21 Gramas
  • 30 Minutos ou Menos
  • 8 Minutos
  • A Árvore da Vida
  • A Bússola de Ouro
  • A Chave Mestra
  • A Cura
  • A Endemoniada
  • A Espada e o Dragão
  • A Fita Branca
  • A Força de Um Sorriso
  • A Grande Ilusão
  • A Idade da Reflexão
  • A Ilha do Medo
  • A Intérprete
  • A Invenção de Hugo Cabret
  • A Janela Secreta
  • A Lista
  • A Lista de Schindler
  • A Livraria
  • A Loucura do Rei George
  • A Partida
  • A Pele
  • A Pele do Desejo
  • A Poeira do Tempo
  • A Praia
  • A Prostituta e a Baleia
  • A Prova
  • A Rainha
  • A Razão de Meu Afeto
  • A Ressaca
  • A Revelação
  • A Sombra e a Escuridão
  • A Suprema Felicidade
  • A Tempestade
  • A Trilha
  • A Troca
  • A Última Ceia
  • A Vantagem de Ser Invisível
  • A Vida de Gale
  • A Vida dos Outros
  • A Vida em uma Noite
  • A Vida Que Segue
  • Adaptation
  • Africa dos Meus Sonhos
  • Ágora
  • Alice Não Mora Mais Aqui
  • Amarcord
  • Amargo Pesadelo
  • Amigas com Dinheiro
  • Amor e outras drogas
  • Amores Possíveis
  • Ano Bissexto
  • Antes do Anoitecer
  • Antes que o Diabo Saiba que Voce está Morto
  • Apenas uma vez
  • Apocalipto
  • Arkansas
  • As Horas
  • As Idades de Lulu
  • As Invasões Bárbaras
  • Às Segundas ao Sol
  • Assassinato em Gosford Park
  • Ausência de Malícia
  • Australia
  • Avatar
  • Babel
  • Bastardos Inglórios
  • Battlestar Galactica
  • Bird Box
  • Biutiful
  • Bom Dia Vietnan
  • Boneco de Neve
  • Brasil Despedaçado
  • Budapeste
  • Butch Cassidy and the Sundance Kid
  • Caçada Final
  • Caçador de Recompensa
  • Cão de Briga
  • Carne Trêmula
  • Casablanca
  • Chamas da vingança
  • Chocolate
  • Circle
  • Cirkus Columbia
  • Close
  • Closer
  • Código 46
  • Coincidências do Amor
  • Coisas Belas e Sujas
  • Colateral
  • Com os Olhos Bem Fechados
  • Comer, Rezar, Amar
  • Como Enlouquecer Seu Chefe
  • Condessa de Sangue
  • Conduta de Risco
  • Contragolpe
  • Cópias De Volta À Vida
  • Coração Selvagem
  • Corre Lola Corre
  • Crash - no Limite
  • Crime de Amor
  • Dança com Lobos
  • Déjà Vu
  • Desert Flower
  • Destacamento Blood
  • Deus e o Diabo na Terra do Sol
  • Dia de Treinamento
  • Diamante 13
  • Diamante de Sangue
  • Diário de Motocicleta
  • Diário de uma Paixão
  • Disputa em Família
  • Dizem por Aí...
  • Django
  • Dois Papas
  • Dois Vendedores Numa Fria
  • Dr. Jivago
  • Duplicidade
  • Durante a Tormenta
  • Eduardo Mãos de Tesoura
  • Ele não está tão a fim de você
  • Em Nome do Jogo
  • Encontrando Forrester
  • Ensaio sobre a Cegueira
  • Entre Dois Amores
  • Entre o Céu e o Inferno
  • Escritores da Liberdade
  • Esperando um Milagre
  • Estrada para a Perdição
  • Excalibur
  • Fay Grim
  • Filhos da Liberdade
  • Flores de Aço
  • Flores do Outro Mundo
  • Fogo Contra Fogo
  • Fora de Rumo
  • Fuso Horário do Amor
  • Game of Thrones
  • Garota da Vitrine
  • Gata em Teto de Zinco Quente
  • Gigolo Americano
  • Goethe
  • Gran Torino
  • Guerra ao Terror
  • Guerrilha Sem Face
  • Hair
  • Hannah And Her Sisters
  • Henry's Crime
  • Hidden Life
  • História de Um Casamento
  • Horizonte Profundo
  • Hors de Prix (Amar não tem preço)
  • I Am Mother
  • Inferno na Torre
  • Invasores
  • Irmão Sol Irmã Lua
  • Jamón, Jamón
  • Janela Indiscreta
  • Jesus Cristo Superstar
  • Jogo Limpo
  • Jogos Patrióticos
  • Juno
  • King Kong
  • La Dolce Vitta
  • La Piel que Habito
  • Ladrões de Bicicleta
  • Land of the Blind
  • Las 13 Rosas
  • Latitude Zero
  • Lavanderia
  • Le Divorce (À Francesa)
  • Leningrado
  • Letra e Música
  • Lost Zweig
  • Lucy
  • Mar Adentro
  • Marco Zero
  • Marley e Eu
  • Maudie Sua Vida e Sua Arte
  • Meia Noite em Paris
  • Memórias de uma Gueixa
  • Menina de Ouro
  • Meninos não Choram
  • Milagre em Sta Anna
  • Mistério na Vila
  • Morangos Silvestres
  • Morto ao Chegar
  • Mudo
  • Muito Mais Que Um Crime
  • Negócio de Família
  • Nina
  • Ninguém Sabe Que Estou Aqui
  • Nossas Noites
  • Nosso Tipo de Mulher
  • Nothing Like the Holidays
  • Nove Rainhas
  • O Amante Bilingue
  • O Americano
  • O Americano Tranquilo
  • O Amor Acontece
  • O Amor Não Tira Férias
  • O Amor nos Tempos do Cólera
  • O Amor Pede Passagem
  • O Artista
  • O Caçador de Pipas
  • O Céu que nos Protege
  • O Círculo
  • O Circulo Vermelho
  • O Clã das Adagas Voadoras
  • O Concerto
  • O Contador
  • O Contador de Histórias
  • O Corte
  • O Cozinheiro, o Ladrão, Sua Mulher e o Amante
  • O Curioso Caso de Benjamin Button
  • O Destino Bate a Sua Porta
  • O Dia em que A Terra Parou
  • O Diabo de Cada Dia
  • O Dilema das Redes
  • O Dossiê de Odessa
  • O Escritor Fantasma
  • O Fabuloso Destino de Amelie Poulan
  • O Feitiço da Lua
  • O Fim da Escuridão
  • O Fugitivo
  • O Gangster
  • O Gladiador
  • O Grande Golpe
  • O Guerreiro Genghis Khan
  • O Homem de Lugar Nenhum
  • O Iluminado
  • O Ilusionista
  • O Impossível
  • O Irlandês
  • O Jardineiro Fiel
  • O Leitor
  • O Livro de Eli
  • O Menino do Pijama Listrado
  • O Mestre da Vida
  • O Mínimo Para Viver
  • O Nome da Rosa
  • O Paciente Inglês
  • O Pagamento
  • O Pagamento Final
  • O Piano
  • O Poço
  • O Poder e a Lei
  • O Porteiro
  • O Preço da Coragem
  • O Protetor
  • O Que é Isso, Companheiro?
  • O Solista
  • O Som do Coração (August Rush)
  • O Tempo e Horas
  • O Troco
  • O Último Vôo
  • O Visitante
  • Old Guard
  • Olhos de Serpente
  • Onde a Terra Acaba
  • Onde os Fracos Não Têm Vez
  • Operação Fronteira
  • Operação Valquíria
  • Os Agentes do Destino
  • Os Esquecidos
  • Os Falsários
  • Os homens que não amavam as mulheres
  • Os Outros
  • Os Românticos
  • Os Tres Dias do Condor
  • Ovos de Ouro
  • P.S. Eu te Amo
  • Pão Preto
  • Parejas
  • Partoral Americana
  • Password, uma mirada en la oscuridad
  • Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas
  • Perdita Durango
  • Platoon
  • Poetas da Liberdade
  • Polar
  • Por Quem os Sinos Dobram
  • Por Um Sentido na Vida
  • Quantum of Solace
  • Queime depois de Ler
  • Quero Ficar com Polly
  • Razão e Sensibilidade
  • Rebeldia Indomável
  • Rock Star
  • Ronin
  • Salvador Puig Antich
  • Saneamento Básico
  • Sangue Negro
  • Scoop O Grande Furo
  • Sem Destino
  • Sem Medo de Morrer
  • Sem Reservas
  • Sem Saída
  • Separados pelo Casamento
  • Sete Vidas
  • Sexo, Mentiras e Vídeo Tapes
  • Silence
  • Slumdog Millionaire
  • Sobre Meninos e Lobos
  • Solas
  • Sombras de Goya
  • Spread
  • Sultões do Sul
  • Super 8
  • Tacones Lejanos
  • Taxi Driver
  • Terapia do Amor
  • Terra em Transe
  • Território Restrito
  • The Bourne Supremacy
  • The Bourne Ultimatum
  • The Post
  • Tinha que Ser Você
  • Todo Poderoso
  • Toi Moi Les Autres
  • Tomates Verdes Fritos
  • Tootsie
  • Torrente, o Braço Errado da Lei
  • Trama Internacional
  • Tudo Sobre Minha Mãe
  • Últimas Ordens
  • Um Bom Ano
  • Um Homem de Sorte
  • Um Lugar Chamado Brick Lane
  • Um Segredo Entre Nós
  • Uma Vida Iluminada
  • Valente
  • Vanila Sky
  • Veludo Azul
  • Vestida para Matar
  • Viagem do Coração
  • Vicky Cristina Barcelona
  • Vida Bandida
  • Voando para Casa
  • Volver
  • Wachtman
  • Zabriskie Point