quinta-feira, novembro 20, 2014

A falta d’água deixou de ser um problema do semiárido


A crise hídrica em São Paulo e no São Francisco, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Publicado em novembro 5, 2014 por 
sistema cantareira

[EcoDebate] Alguém pode imaginar que São Pedro (o santo que controla as chuvas) está brigado com São Paulo e com São Francisco. Mas sem querer entrar nos meandros dos bastidores do céu, considero que a falta d’água é um problema bem terreno.
O Brasil possui o maior volume de água doce do mundo e uma grande disponibilidade hídrica per capita. Mesmo assim sofre de escassez no meio da abundância e vive a maior crise de abastecimento da história. A falta d’água deixou de ser um problema do semiárido para atingir o Estado mais rico e populoso da Federação e até mesmo o rio da integração nacional, o velho Chico.
O mais impressionante é que em meio à maior crise hídrica dos 500 anos do Brasil, a questão foi tratada de maneira superficial na campanha eleitoral de 2014, servindo mais de arma para atacar, do que meio para solucionar. Evidentemente a crise hídrica não é culpa exclusiva nem de Aécio Neves e Geraldo Alckmin (PSDB) e nem de Fernando Haddad e Dilma Rousseff (PT), mas não houve sequer um político brasileiro, dentre os eleitos, que teve a coragem de reconhecer que a escassez de água é consequência de um modelo de desenvolvimento demoeconômico que degrada a natureza e destrói os ecossistemas em benefício de uma espécie antropocêntrica e egoísta.
As questões ecológicas e os direitos da natureza foram ignorados na campanha fratricida pelo voto e pelo controle das benesses do poder estadual e nacional. A ideologia do crescimento predominou na campanha eleitoral e não houve espaço para se discutir o decrescimento das atividades antrópicas.
A cidade de São Paulo (SP) tinha 31.385 habitantes em 1872, ultrapassou um milhão de habitantes em 1940, superou 10 milhões de pessoas no ano 2000 e se aproxima de 12 milhões em 2014. A região metropolitana de SP tem mais de 20 milhões de habitantes (o dobro da população de Portugal). São Paulo é o município mais populoso e o mais rico do Brasil. Mas a cidade se enriqueceu às custas da pauperização do meio ambiente e da depleção dos seus recursos hídricos.
O território da cidade de São Paulo é favorecido por bom volume pluviométrico e já foi recortado por belos rios, como Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, que forneciam água, peixes, diversidade de vida animal e vegetal, além de escoarem as águas da chuva fertilizando os solos. Mas a maioria dos rios foram enterrados vivos, totalmente desfigurados, poluídos pelo lixo e dejetos humanos, tornando-se verdadeiros esgotos a céu aberto ou canalizados. Sem oxigênio, viraram “rios da morte” que exalam mau cheiro, sujeira e envergonham os cidadãos da cidade, do estado e do país.
As movimentadas avenidas 23 de Maio e Nove de Julho, por exemplo, foram construídas sobre rios canalizados. O Vale do Anhangabaú foi aterrado para dar lugar a prédios, asfaltos e estacionamentos. A especulação imobiliária venceu a riqueza da biodiversidade e o livre fluxo das águas. São Paulo deve ter, neste próximo verão, falta de água potável e, ao mesmo tempo, enchentes e alagamentos.
A sede dos paulistanos foi aplacada, em parte, pela busca de fontes mais distantes, como aquelas provenientes das nascentes dos rios que nascem no sul de Minas Gerais e que formam o rio Jaguari (que junto como os rios Camanducaia e Atibaia, formam o rio Piracicaba). No território paulista, o Rio Jaguari é represado, para captar água para o sistema Cantareira, que abastece grande parte da Região Metropolitana de São Paulo.
Essa crise não se limita à cidade de São Paulo. Dezenove municípios paulistas efetuam racionamento de água, dos quais doze ficam na região de Campinas. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) estima que milhares de postos de trabalho já tenham sido fechados em decorrência da falta d’água. A Secretaria da Agricultura estima que a estiagem tenha reduzido as safras de café, cana, algodão e outros produtos, com grande prejuízo para a produção agropecuária.
Acontece que o desmatamento ocorrido no Estado de São Paulo nos últimos 150 anos, eliminou as matas ciliares e retirou a parte da vegetação que permitia a infiltração da água do subsolo, alimentando os lençóis freáticos. O sobre-uso dos aquíferos também contribuíram para a escassez da água subterrânea. Menos vegetação significa menor capacidade de captar CO2, contribuindo para o aquecimento global e as mudanças climáticas que aumentam os efeitos climáticos extremos, gerando muita chuva ou muita seca, deixando o clima “maluco”, em diferentes momentos.
Atualmente, os paulistanos e os paulistas estão pagando o preço de década de degradação ambiental provocada pelo modelo “extrai-produz-descarta”, que rouba as riquezas da natureza para produzir luxo e devolve lixo ao meio ambiente. A solução, apresentada por alguns políticos, de captar mais água e fazer mais reservatórios pode até satisfazer a sede e a ganância egocêntrica contemporânea, mas, indubitavelmente, vai apenas adiar e aprofundar um modelo de desenvolvimento que já se mostrou insustentável e injusto.
De fato, a humanidade tem monopolizado os recursos hídricos, transformando-os em commodities, sem respeito aos direitos da água e nem ao direito que as demais espécies vivas devem ter ao acesso às mesmas fontes da sobrevivência. Esta agressão não acontece só em São Paulo.
O rio São Francisco, um dos mais belos patrimônios naturais do Brasil, está morrendo graças à ambição, avidez, sofreguidão e cobiça do ser humano. A sêde do lucro parece ser maior do que a sêde dágua. O Rio São Francisco tem 2,7 mil quilômetros de extensão, corta 5 estados Brasileiros (MG, BA, PE, AL e SE) e sua bacia abarca 500 municípios, com uma população aproximada de 15 milhões de habitantes. As atividades antrópicas se alimentam das riquezas do rio, usam a sua energia e devolvem sujeira e poluição.
O rio está pedindo socorro, mas em vez de um projeto de recuperação e revitalização, o que o Governo Federal propõe é sugar mais água do leito, por meio da transposição. Mas o volume de água está diminuindo e o assoreamento está aumentando. Um rio que já foi navegável está virando uma pista de barro seco. Mas governo, com o projeto de transposição e a oposição, que não tem coragem de se opor, querem somente tirar mais água como se a fonte fosse inesgotável.

serra da canastra - nascente do rio São Francisco

Pela primeira vez na história, a nascente do rio São Francisco secou na Serra da Canastra, no município de São Roque de Minas. Este desastre anunciado aconteceu por conta do desmatamento e do fogo que eliminaram a vegetação que retêm as águas e abastecem os lençóis freáticos. O Parque Nacional da Serra da Canastra foi criado em 1972 com o objetivo de proteger uma área de 200 mil hectares, mas somente 71.525 hectares estão demarcados e parcialmente protegidos.
O rio São Francisco está sofrendo com o assoreamento, o desmate das matas ciliares, a erosão, o sobre uso das águas, os represamentos, a poluição dos esgotos e dos efluentes industriais, a contaminação de metais pesados e os agrotóxicos. A pesca predatória agrava a ameaça de extinção de peixes como o Surubin, o Dourado e outros peixes de piracema. A migração entre locais de alimentação e de reprodução é impedida pelas barragens hidrelétricas que são um dos principais obstáculos para a reprodução destes peixes.
Por ironia, a falta de água já compromete os grandes lagos das represas hidrelétricas que represam e impedem o livre fluxo das águas. Notícia do jornal Estado de Minas, de 13/10/2014, relata o risco de paralisação da Usina de Três Marias, que pode parar de gerar energia em novembro. Atualmente, ela opera com apenas duas das seis turbinas. Com capacidade total de 396 megawatts/hora (MWh), Três Marias tem em sua barragem apenas 4,5% do seu volume de água. Trata-se do nível mais crítico desde a inauguração, em 1962.
Em Pirapora, município do norte mineiro, há um dos mais belos trechos do rio São Francisco que atualmente (novembro de 2014) está em filetes d’água há semanas. Em alguns pontos, debaixo das duas pontes na cidade, atravessa-se a pé onde havia forte correnteza.
Existem estudiosos, como o professor José Alves Siqueira, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), em Petrolina, Pernambuco, que falam na “Extinção inexorável do Rio São Francisco”, caso o modelo de dominação e exploração do rio não for modificado. Um dos grandes defensores do rio São Francisco, o ambientalista Roberto Malvezzi (Gogó), alertou durante a campanha presidencial de 2014: “Assim, seja qual for o eleito, se o São Francisco depender de alguma política pública – e tantos outros rios brasileiros -, a finalização de seu assassinato é questão de tempo”.
Sem dúvida, as diversas nascentes do Velho Chico estão sendo degradadas. Nas últimas décadas, o São Francisco já perdeu três dos 16 afluentes perenes. Os rios Verde Grande, Salitre e Ipanema tornaram-se temporários, reduzindo o volume de água disponível para navegação, irrigação, pesca e geração de energia.
Por exemplo, o Parque das Andorinhas que foi criado para proteger a nascente do rio da Velhas, principal afluente do rio São Francisco, não consegue evitar as atividades ilegais de mineração e desmatamento que estavam (e ainda estão em menor monta) destruindo as fontes de água. A mineração da pedra Ouro Preto que é usada como piso de casas e jardins provoca uma grande erosão do solo, pois a terra em volta do quartizito é retirada e levada pelas chuvas, assoreando toda a área. Esta situação é agravada pelo desmatamento e pelas queimadas realizadas pela população pobre dos morros de Santana e São Sebastião, em Ouro Preto, Minas Gerais, que utilizam o fogo para fazer pastagem (para vacas, cavalos e cabras) e para a retirada de lenha para ser usada fonte de energia nas cozinhas.
Estas atividades causam danos irreparáveis, pois retiram boa parte das matas ciliares, de cabeceira e demais formações vegetais essenciais à proteção das águas das nascentes, reduzindo o fluxo de água do leito dos córregos. Como resultado, o volume de água da Cachoeira das Andorinhas vem diminuindo ano a ano, esvaziando o rio das Velhas.
O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas disse que, com o período de estiagem, Belo Horizonte e a região metropolitana estão consumindo 85,7% da água do maior afluente do rio São Francisco. A vazão do rio ao chegar a Bela Fama está variando de 7 a 8 metros cúbicos por segundo (m3/s), quando o normal em períodos de seca como este deveria ser 14 m3/s. Somente o abastecimento urbano da Grande BH vem captando 6 m3/s, para atender 51 cidades ou 60% do volume consumido na capital e 40% nos demais municípios. O que sobra para o leito do rio é muito pouco após a retirada de água além da capacidade.
O resultado de tudo isto é que a quantidade de água que chega à foz do São Francisco está diminuindo. O povoado de Cabeço, localizado em ilha na Foz do Rio São Francisco, na divisa entre Alagoas e Sergipe, sucumbiu e, em poucos anos, o mar invadiu casas e construções da comunidade pesqueira, que tinha 400 habitantes. A completa evacuação do povoado foi concluída há 14 anos. O processo de avanço do mar sobre a vila é atribuído à degradação das nascentes, ao sobreuso das águas e às represas construídas no Rio São Francisco, como a Usina Hidrelétrica do Xingó, que reduziram a vazão do Velho Chico e abriram espaço para o mar. Grandes extensões do rio tiveram suas águas salinizadas, inviabilizando as culturas agrícolas das margens. Na foz, a antiga vila foi completamente destruída. Seu símbolo é um velho farol do século 19, que ficava em terra e hoje está a dezenas de metros da costa.

foz do São Francisco

Este processo de avanço dos oceanos não ocorre somente no rio São Francisco. A elevação do nível do mar, entre outras ameaças, prejudica os deltas dos principais rios do mundo, segundo artigo de James Syvitski e co-autores, “Naufrágio dos deltas devido às atividades humanas” (Sinking deltas due to human activities), publicado na Revista Nature Geoscience, em 2009.
Para a tristeza geral, o rio São Francisco está morrendo desde as nascentes até a foz. Evidentemente falta decisão política e recursos para recuperar as nascentes e evitar o assoreamento e o sobreuso das águas. Uma mobilização da sociedade civil em defesa do meio ambiente, da água e dos rios poderia ser a alternativa. Mas parece que as autoridades públicas consideram mais fácil e mais lucrativo fazerem grandes obras, executadas por grandes empreiteiras que vão dar material para o caixa 2 das campanhas e o marketing eleitoral.
Os problemas do Estado de São Paulo e dos cinco Estados da bacia do rio São Francisco são um sinal de alerta sobre os rumos equivocados do desenvolvimentismo nacional. A civilização brasileira pode sucumbir se não houver uma luta eficaz pelo direito da água e pelo livre fluxo dos rios. É preciso acabar com este ecocídio.
Como escrevi em artigo de 08/04/2010, sem a recuperação e a revitalização do rio São Francisco, mesmo a proposta questionável da transposição estará comprometida, pois “não haverá água suficiente para ser transposta”. As chuvas de verão podem ajudar, mas sem o respeito aos seus rios e sem a proteção ecológica, o rio São Francisco pode minguar e São Paulo pode sucumbir e experimentar um grande retrocesso que vai afetar a vida de milhões de pessoas.
Geólogos já estudam o uso do Aquífero Guarani. Porém, não é uma questão de maior acesso e maior planejamento do uso, mas principalmente falta discutir o decrescimento do abuso da água. Para além da questão da mercantilização dos recursos hídricos, existe o problema da antropogenização da água. É preciso uma gestão eficiente da demanda de água pela agricultura, pela industria, pelo setor serviço e pelos domicílios.
A atual crise hídrica do Brasil é apenas um alerta, pois situações piores devem acontecer nas próximas décadas. As agressões à natureza precisam diminuir e o modelo de desenvolvimento precisa ser repensado. O que está acontecendo no Brasil é parte do que acontece em qualquer lugar, quando se desrespeita a vida de milhões de outras espécies e os direitos da água. Ao invés de se preocupar em ser a quarta ou a quinta potência mundial, o Brasil deveria se reconciliar com seu espaço natural, respeitando-o.
Referências:
ALVES, JED. As nascentes do São Francisco. EcoDebate, RJ, 08/04/2010
ALVES, JED. A opressão do Rio Tietê. EcoDebate, RJ, 25/01/2012
ALVES, JED. A degradação do rio São Francisco. EcoDebate, RJ, 18/07/2012
ALVES, JED. GRILLO, J. Corredor ecológico Rio das Velhas-Paraopeba em Nova Lima. EcoDebate, RJ, 01/08/2013
ALVES, JED. Terra, água e estresse hídrico. EcoDebate, RJ, 19/09/2012
Projeto Manuelzão: http://www.manuelzao.ufmg.br/
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Publicado no Portal EcoDebate, 05/11/2014

Se não cuidarmos...


A Executiva Nacional do PT e a ausência da consciência ecológica

O grande desafio, aquele que não assumido, invalida todos os outros,
é o ecológico, palavra que não ocorre nenhuma vez no texto da Executiva
Nacional do PT


Leonardo Boff (*)
Arquivo


No dia 3 de novembro do corrente ano a Executiva Nacional do PT estabeleceu algumas diretrizes tendo em vista o 5º Congresso do Partido dos Trabalhadores.

Retomou com razão o ideário que vem desde os anos  1980:”para transformar o Brasil precisa-se combinar ação institucional, mobilização social e revolução cultural”. Acrescentou agora, num contexto mudado, “a reforma política e a democratização da mídia”. Lançou uma consigna clara:”O PT precisa estar à altura dos desafios deste novo período histórico”.

É a partir desta consigna que pretendo trazer alguma contribuição, a meu ver, imprescindível para estar à altura dos desafios deste novo período histórico. Estimo que o “novo período histórico” não se restringe apenas ao Brasil. Significaria um estreitamento da análise como se o Brasil pudesse ser pensado nele mesmo, desvinculado do resto mundo no qual está irrefragavelmente inserido.

 Considero acertadas as diretrizes, todas elas fundamentais, especialmente o que se esconde atrás “da revolução cultural” que é a projeção de outro tipo de Brasil, de outros valores e sonhos, a partir das bases populares e englobando generalidade de nosso povo em sua riqueza singular e em toda a produção de sentido, de arte e de beleza.

 Mas o grande desafio, aquele que não assumido, invalida todos os acima referidos, é o desafio ecológico, palavra que não ocorre nenhuma vez no texto da Executiva Nacional. Isso é preocupante, pois, nas palavras de Frijhof Capra, tal omissão representa grave analfabetismo ecológico.

A preocupação ecológica, ou o destino da Terra, da natureza e de nossa civilização estão em jogo. Esta preocupação está deixando cada vez mais o campo dos especialistas e entrando na consciência coletiva da humanidade e no Brasil, nos movimentos populares como a CONTAG, a CUT, o MST e outros, além de muitos cientistas e dos movimentos especificamente ecológicos.

Por isso causa espécie que esta consciência não seja compartida pelos membros da Executiva e, diria, em grande parte pelo próprio PT.

Para citar um argumento de autoridade que vem da Carta da Terra que sob a coordenação de Michail Gorbachev (tive a honra de participar do grupo de 23 pessoas) fez entre 1992-2000 uma vasta consulta em grande parte da humanidade de como deveríamos nos comportar para salvar a vida e a espécie humana na Terra. É um dos mais belos e profundos documentos nos inícios do século XXI, imediatamene assumido pela UNESCO e por grandes instituições.

A primeira frase da Carta começa assim:”Estamos diante de um momento crítico na história da da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro….A escolha é esta: ou formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a destruição da diversidade da vida”(Preêmbulo). Não são ideias apocalípticas, mas advertências fundadas nos dados mais seguros  da ciência, seja dos cientistas que nos acompanhavam seja das grandes comunidades científicas dos países centrais.

Não estamos indo ao encontro do aquecimento global. Estamos  já dentro dele e de forma cada vez mais  acelerada. Já em 2002 a Academia Nacional Norte-americana de Ciências fazia esta comunicação:”O novo paradigma de um aquecimento abrupto está bem estabelecido pela ciência mas esse dado é pouco conhecido e escassamente tomado em conta pela vasta comunidade dos cientistas da natureza, pelos cientistas sociais e ainda pelos que tomam decisões políticas(policymakers: National Academy Press, 2001, p.1))”. O clima pode subir de  4-6 graus Celsius. “Estamos jogando uma roleta russa com o revolver apontando para a geração de nossos filhos e netos” (Andrew C. Revkin, em New York Times, 28 de março 2009). Com  esta temperatura dificilmente a vida que conhecemos subsistirá e a humanidade estará sob grande ameaça em sua sobrevivência.

Outros dados poderiam ainda ser citados. Basta uma severa advertência de um nosso cientista Antônio A. Nobre que acaba de publicar um livro sobre O futuro climático da Amazônia (2014) no qual diz:"A agricultura consciente, se soubesse o que a comunidade científica sabe, estaria na rua, com cartazes, exigindo do governo a proteção das florestas e plantando árvores em suas propriedades."

O PT como partido majoritário que reelegeu para a Presidência Dilma Rousseff não pode se omitir diante deste grave desafio. O Brasil por sua situação ecológica é um dos fatores principais no equilíbrio climático da Terra. Se não cuidarmos, a Terra pode continuar sua trejetória mas sem nós.


(*) Leonardo Boff escreveu A grande transformação na economia, na política e na ecologia, Vozes 2014.

com os neoliberais o mercado assalta as instituições políticas


A economia não é aritmética

"Todos, e insisto nisto, todos os Estados membros estão obrigados a cumprir as normas do Pacto de Estabilidade e Crescimento" - Angela Merkel.


Jorge Moruno Danzi
Como em todo campo disciplinar, a economia tem uma autonomia relativa, ou seja, conta com uma série de regras que lhe são próprias, assim como na política. Mas chegar a pensar que uma destas esferas é totalmente autossuficiente e não interage com o resto é um erro. As posturas que reduzem a economia à mera aritmética, a uma discussão de números, a uma simples matemática, desprendem uma grande carga ideológica. E o fazem quanto mais estão convencidos de que a economia não tem nada a ver com a política. Claro que não ela é massa de modelar, mas não é somente aritmética.
 
Na atualidade, a economia é uma forma de poder que não está submetida à decisão democrática, isto significa que independentemente do que a cidadania decida com seu voto, há certas regras e lógicas econômicas que funcionam por cima da democracia. Uma forma de poder que, por um lado, pede que a política não interfira em seus assuntos, mas ao mesmo tempo participa politicamente 365 dias ao ano, avisa, amedronta e ameaça a população sobre as consequências de manter suas opções políticas. 

Todos somos juridicamente iguais e, nas eleições, o voto de um vagabundo vale o mesmo que o do milionário, mas na vida cotidiana em que dependemos da nossa capacidade de decidir e exercer a democracia, somos materialmente desiguais.
 
Pode haver democracia sem serviços públicos, com altas taxas de pobreza, sem acesso aos meios de vida? Para a tradição liberal, a política começa e termina com o voto, depois deve se restringir ao âmbito privado, das portas de casa para dentro, até as eleições seguintes. Questionar este mecanismo limitado da democracia, em que a liberdade econômica é muitas vezes sinônimo de liberdade de poucos para decidir sobre a vida de muitos, alguns percebem como ataque à democracia.
 
Agora, paradoxalmente, as teses liberais sobre a economia jamais funcionaram à margem do apoio do poder político e estatal especialmente. Não existe algo que seja laissez-faire por um lado, e por outro o Estado intervencionista, ambos crescem juntos na história. A União Europeia é um grande exemplo disso; primeiro foram os ordoliberais alemães do pós-guerra que assentaram suas bases, depois vieram os neoliberais, com os quais finalmente o mercado assalta as instituições políticas. 

A UE funciona sem coordenação política econômica, isto é o que sempre definiram e defendem as elites alemãs como uma comunidade de estabilidade orçamentária: um mesmo marco monetário em que cada Estado deve garantir de forma individual o equilíbrio do orçamento, sem políticas fiscais e econômicas comuns, agravando uma divisão europeia do trabalho. A UE somente coordena para que o déficit não supere os 3% e a dívida os 60% do PIB. E o BCE, independente da democracia, fixa seu objetivo de que a inflação não supere 2%. Os arquitetos do neoliberalismo acreditam que colocando esta série de limites, a economia pode funcionar com base em automatismos que por si só disciplinam os Estados membros. 

Mas ao não existir programas comuns fiscais, este modelo aplicado como regra moral geral, independentemente da realidade produtiva de cada país e de seu lugar na divisão europeia do trabalho, era apenas questão de tempo observar seus limites. Em 2007, os países do coração da UE tinham superávit comercial, exportando mais do que importavam: Alemanha (7,9% do PIB), Holanda (8,1%), Bélgica (3,5%). Em contrapartida, países do sul tinham déficit comercial, Portugal (8,5% do PIB), Espanha (9,6%) e Grécia (12,5%). Os primeiros aplicaram medidas que congelavam os salários para ganhar em competitividade e a redução da demanda interna, suprida com exportações. Os segundos tinham um tipo de interesse real muito baixo que propiciava bolhas (imobiliária) e o financiamento que recebiam vinha dos créditos que alimentavam os milhões de excedente dos primeiros para que os segundos comprassem suas exportações. Eu te empresto dinheiro para que você compre de mim. 

Quando este mecanismo encontrar seus limites, a opção final passará por acertar as políticas de retrocesso social que dificultam, ainda mais, a saída da crise. Mecanismos como o TECG (Tratado de Estabilidade, Coordenação e Governança, 2012) e do MEDE (Mecanismo Europeu de Estabilidade) funcionam assim: o primeiro para impor mais regras de disciplina orçamentária, enquanto o segundo aporta dinheiro para restaurar a coerção dos mercados financeiros sobre os Estados.
 
O dinheiro somente circula pelos mercados financeiros e toda essa liquidez injetada serve somente para gerar novas bolhas especulativas. As regras da austeridade são, definitivamente, as regras da deflação em uma economia do saque pela vida da dívida, que sempre aposta na redução das condições de trabalho, na privatização de serviços públicas e no arrocho salarial. Em que os Estados possam desvalorizar a moeda e na ausência de políticas fiscais expansivas europeias, nos resta pressionar para fazer valer que somos a quarta economia da Europa e nos somarmos a outros países do sul para modificar os tratados da UE. Na medida do possível, em aliança com os alemães. O BCE é, para dizer em termos modernos, o novo Palácio de Inverno.  
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Jorge Moruno Danzi é sociólogo e escritor. Participa desde seu lançamento da iniciativa política Podemos. Colaborou nos livros “Los indignados del 15 de Mayo”, “Les raons dels indignats” e “Cuando las películas votan”. Artigo publicado no site espanhol Publico.es.

quarta-feira, novembro 19, 2014

a racionalidade modela nosso modo de ser e estar no mundo


A dimensão racional da Técnica e a modelagem da vida

Para o filósofo italiano Umberto Galimberti, compreender os significados da palavra técnica nos ajuda a entender como esta racionalidade modela nosso modo de ser e estar no mundo

Por: Márcia Junges e Ricardo Machado

O olhar quase sereno de Umberto Galimberti esconde um sujeito que não tem nada de comedido quando se trata de defender suas posições teóricas e sua análise sobre as sociedades tecnocientíficas. Em quase uma hora de entrevista concedida pessoalmente à IHU On-Line, durante sua visita ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU, o italiano tratou de defender seu conceito de técnica de forma entusiástica, objetiva e contundente. “Não temos que entender a palavra técnica como máquinas, isso é tecnologia. Temos que entender a palavra técnica como um tipo de racionalidade, que consiste em alcançar os máximos objetivos com o emprego mínimo dos meios”, explica Galimberti.
“Tudo aquilo que não entra neste tipo de racionalidade é expulso das nossas vidas. Somente o mundo da vida prevê o irracional, como o amor, o sentimento, a dor, e tudo isso, do ponto de vista técnico, é insignificante e é visto como um elemento de distúrbio”, aponta o professor. Na opinião de Galimberti, o momento de transição que vivemos jogou fora tudo aquilo que não parte de uma visão calculista/utilitarista do mundo. “A técnica não é uma entidade, é uma racionalidade de visão generalizada. É por isso que eu entendo o que é útil e necessário, mas não compreendo o que é bom, o que é belo, o que é verdadeiro, o que é santo e o que é justo. Todos esses valores se perdem e resta somente o valor da utilidade”, lamenta.
Para o teórico, a cultura do domínio judaico-cristã venceu a cultura grega e é por isso que a ciência e a técnica que conhecemos são manifestações desse domínio, pois surgem no impulso destas tradições. A questão que se impõe, entretanto, é: “O Ocidente vai sobreviver até o fim do cristianismo? Ou vice-versa, o cristianismo vai sobreviver ao fim do Ocidente? Em todo caso, a ciência e a técnica são produtos da cultura de domínio”, provoca. O autor ainda sustenta que não há, sequer, o desejo humano de se opor à técnica. “Não há uma oposição, porque os homens desejam a técnica mesmo que tenham medo dela. Podemos atingir um objetivo se tivermos um meio técnico de alcançá-la. Mesmo que tenhamos medo do aparato técnico, nós o desejamos”, argumenta.
Umberto Galimberti é italiano e professor titular de História da Filosofia e Psicologia Geral da Universidade de Veneza – Itália. É discípulo e tradutor das obras de Karl Jaspers e Heidegger, a quem dedicou três de suas obras, além de ser estudioso de Antropologia Filosófica e Psicologia Analítica. Atualmente, é colunista de um dos maiores jornais da Itália, o La Repubblica. É reconhecido por seu conhecimento circular notável, do mito à Ciência, da Filosofia à História, da Psicologia à Sociologia, da Filosofia da língua à Teologia, da Antropologia à Introdução da técnica, até a obscuridade e o relacionamento técnico dramático do homem. 
Será publicado, em breve, o texto “O Homem na Idade da técnica”, no Cadernos IHU ideias. 
O professor tem 17 obras publicadas, inclusive algumas editadas em francês, espanhol, alemão, grego, português e japonês. Entre elas estão Cristianesimo. La religione dal cielo vuoto (Milano: Editora Feltrinelli, 2012), Il viandante della filosofia (com Marco Alloni. Roma: Editora Aliberti, 2011) e Psiche e Techne. O homem na idade da técnica (São Paulo: Paulus, 2005).
Confira a entrevista.
IHU On-Line - A técnica em nosso tempo foi ontologizada? Ela se tornou um ente superior? Por quê?
Umberto Galimberti – Não temos que entender a palavra técnica como máquinas, isso é tecnologia. Temos que entender a palavra técnica como um tipo de racionalidade, que consiste em alcançar os máximos objetivos com o emprego mínimo dos meios. Tudo aquilo que não entra neste tipo de racionalidade é expulso das nossas vidas. Somente o mundo da vida prevê o irracional, como o amor, o sentimento, a dor, e tudo isso, do ponto de vista técnico, é insignificante e é visto como um elemento de distúrbio. A técnica não é uma entidade, é uma racionalidade de visão generalizada. É por isso que eu entendo o que é útil e necessário, mas não compreendo o que é bom, o que é belo, o que é verdadeiro, o que é santo e o que é justo. Todos esses valores se perdem e resta somente o valor da utilidade. 

IHU On-Line - Em que sentido a técnica, invenção humana, saiu do controle do seu criador?
Umberto Galimberti – Nós usamos instrumentos técnicos, mas não temos condições de possuir suas técnicas. O celular contém uma concentração de inteligência humana que supera as minhas competências cognitivas e de conhecimento. Eu posso usar os instrumentos técnicos, mas não tenho o conhecimento técnico destes aparatos. A técnica já superou a capacidade individual de conhecimento. 

IHU On-Line - Por que a técnica é o destino das sociedades ocidentais avançadas? Estamos diante de um beco sem saída?
Umberto Galimberti – Estamos, sim, diante de um beco sem saída e é inútil que tenhamos esperança, porque a ciência e a técnica nasceram no ocidente por meio do impulso da cultura judaico-cristã. No Gênesis, Deus diz a Adão: vais dominar a terra e os animais; os peixes nas águas e os pássaros no céu. Mas os gregos não pensavam assim. Platão , por exemplo, disse “não pensa, homem mesquinho, que esta natureza foi criada para ti. Tu serás justo e vais te ajustar de forma harmônica à natureza”. A cultura do domínio é a cultura judaico-cristã, ela venceu a cultura grega e é por isso que a ciência e a técnica, que são a manifestação desse domínio, nasceram através do impulso desta tradição. Como o Ocidente é cristão, também os ateus são cristãos, os agnósticos são cristãos, porque o cristianismo não é somente uma religião, é uma cultura. O problema que temos é: o Ocidente vai sobreviver até o fim do cristianismo? Ou vice-versa, o cristianismo vai sobrevier ao fim do Ocidente? Em todo caso, a ciência e a técnica são produtos da cultura de domínio.

IHU On-Line - A partir desse cenário, como podemos compreender que nos tornamos objetos do grande sujeito da história no qual se converteu a técnica?
Umberto Galimberti – Porque o homem foi sempre pensado como o padrão do universo. Quando a ciência foi criada, em 1600, Descartes  dizia que através da ciência o homem se torna o dominador do mundo. Isso porque a essência do humanismo é a essência da técnica. Entretanto, a técnica quando se desenvolveu e difundiu a cultura da racionalidade utilitarista, reduziu o homem a um operador da técnica. Assim, qualquer trabalhador, na fábrica ou no escritório, é responsável pelo protocolo, através das ordens dos superiores. Não é responsável pelos fins de suas atividades, é uma engrenagem do aparato não diferente dos instrumentos que utiliza. Ele não é mais um sujeito de vida, e sim um funcionário da técnica que utiliza. Isso determina também a queda da moral tradicional, porque a moral estabelecia o que é justo e injusto, o que é bom e o que é ruim e depois previa, também, o perdão.
A técnica é mais feroz que a moral, porque se a eficiência e a produtividade não são respeitadas, se está fora do sistema técnico e, automaticamente, do sistema social. Nesse sentido "podemos" ser imorais porque entra uma sanção técnica mais feroz que a moral.

IHU On-Line - Quais são as implicações éticas fundamentais desse cenário?
Umberto Galimberti – Nós não temos uma moral à altura da Idade da Técnica. Porque a moral cristã é moral da intenção, que te considera bom ou ruim conforme as intenções pela qual os sujeitos agem. Por meio dessa moral nasceu todo o sistema jurídico ocidental, dependendo das intenções de meu delito vou ter um ou outro tipo de condenação; trata-se de uma perspectiva que está relacionada à ética da intenção. Na idade da técnica não é importante o objetivo de por que se faz determinada ação, mas são importantes as consequências das ações. A Oppenheimer  não interessava suas intenções quando inventaram a bomba atômica. Importante é o contrário, conhecer as consequências da bomba atômica. Nem mesmo a moral laica está à altura desta razão. Quando Kant  queria fundar uma moral apenas sobre a razão prescindindo das religiões, que não podem criar uma moral universal, ele dizia que era preciso tratar o homem como um fim e não como um meio. Hoje esta moral não tem como funcionar, porque na Idade da Técnica tudo é mais complicado. Afinal, o ar é um fim ou um meio a ser protegido? A água é um fim ou somente um meio? A fauna, a flora, a biosfera, a atmosfera são fins ou são meios que devem ser salvaguardados? Nós não temos uma ética que tenha se responsabilizado pela natureza, nós temos a ética para reduzir o conflito entre os homens, mas não para proteger a natureza.
A ética vai funcionar se ela se tornar psique. Se eu estuprar uma moça vou ser percebido como culpado, mas se eu poluo como serei considerado? Max Weber  formulou a ética da responsabilidade e disse que era necessário considerar a consequência das ações (até o ponto que essas consequências possam ser previsíveis). O problema é que as consequências da ciência e da técnica não são previsíveis. Aquilo que consideramos como o fim da ciência e da técnica são os resultados dos procedimentos. Não se trata de afirmar algo como “temos que curar o câncer”. A ciência não funciona assim. A tecnociência opera a partir da seguinte lógica: “deve-se estudar certo aminoácido por 20 anos”; “estude esta proteína por dez anos”. Se perguntássemos qual é o objetivo, o cientista responderia “não sei”. Ele argumentaria que é necessário conhecer tudo aquilo que é possível e se com o resultado desses conhecimentos tivermos uma vantagem para a humanidade, ok, mas este não é o objetivo e sim o resultado final de uma série de procedimentos. Ninguém projetou a clonagem humana, apenas viu-se que era possível. 

IHU On-Line - Qual é o nexo entre a radicalização da técnica enquanto uma das faces do niilismo diagnosticado por Nietzsche?
Umberto Galimberti – Nietzsche  definia o niilismo nos seguintes termos: falta de objetivo, falta de resposta ao “por que”, todos os valores se perdem. Que os valores percam os próprios “valores” não é importante. Porque eles não são entidades metafísicas que descem do céu, são coeficientes sociais nos quais as populações tentam viver da melhor maneira possível. O mais decisivo nesse aspecto é que não há objetivo, porque a técnica não tem objetivos, não tem como objetivo o bem-estar da humanidade, ela não salva, não redime, a técnica funciona. Aquilo que ela determina não é um bem-estar da sociedade, mas, sim, seu próprio desenvolvimento. A técnica quer a si mesma e o seu desenvolvimento independente das condições dos humanos. Dessa forma, o futuro se torna imprevisível e nesse sentido falta o objetivo, falta a resposta ao “por que” — por que estou no mundo, por que estou nessa situação de operador da técnica —, nós não temos nada onde nos agarrar, o que seria o próprio niilismo. 

IHU On-Line - Em que medida é preciso repensar e até mesmo refundar conceitos como a política, a ética e a religião tomando em consideração o paradigma da técnica em nosso tempo?
Umberto Galimberti – Em relação à política, Platão pensava que a política deveria ser o local da decisão. Ele mesmo chamava a política de técnica régia. A técnica sabe como são feitas as coisas e a política sabe se é necessário e como se deve fazer. A política seria, então, o local da decisão. Hoje a política, ao contrário, não é local onde se decidem as coisas, porque para tomar decisões a política olha para a economia, e a economia para fazer suas coisas olha para os objetos tecnológicos. Nós temos, portanto, a política e a economia e a economia e a técnica. A política aparece na televisão, mas não é mais onde se decidem as coisas. Em relação às religiões, parece que ainda tem futuro, mas somente como um contraponto à racionalidade técnica, porque tudo aquilo que não tem a ver com a racionalidade técnica encontra no cenário religioso um local onde pode ter algum sentido. Porém, este sentido só é entendido na irracionalidade da religião, pois a religião é um local irracional, onde tem consolação, esperança, confiança, que são todos cenários excluídos do horizonte técnico. Mas na luta entre religião e técnica a técnica vencerá.

IHU On-Line - Em que aspectos a desconstrução que o senhor propõe de mitos como o da neutralidade, da instrumentalidade e da não humanidade da técnica representam uma falsa e alienante oposição homem versus máquina?
Umberto Galimberti – Não há uma oposição, porque os homens desejam a técnica mesmo que tenham medo dela. Podemos atingir um objetivo se tivermos um meio técnico de alcançá-la. Mesmo que tenhamos medo do aparato técnico, nós o desejamos. Por exemplo, há 25 anos houve a Queda do Muro de Berlim, e o fim do regime da União Soviética não foi porque as pessoas tinham fome, porque eram controladas, porque não podiam sair do país, não foram as razões humanísticas que determinaram o fim do regime. Em 1960, a técnica da União Soviética era igual ou um pouco superior à técnica de seu antagonista que era os Estados Unidos. De fato, os soviéticos já haviam lançado seu Sputnik  ao espaço e, obviamente, o Comunismo não poderia acabar naquela época. Quando, em 1989, a técnica da União Soviética era infinitamente inferior à americana, o Comunismo caiu. Agora a técnica é a condição para realizar os objetivos, então todos desejam a técnica.

IHU On-Line - Qual é o nexo que une a hiper-racionalidade contemporânea, o surgimento e a consolidação da técnica?
Umberto Galimberti – A técnica com sua hiper-racionalidade determina também nosso modo de pensar. Heidegger  disse de forma oportuna que o inquietante não é que o mundo se transforme em um grande aparato técnico, o mais inquietante é que não estamos preparados para essa grande transformação do mundo. E ainda mais inquietante é que não temos um pensamento alternativo ao modelo calculista/cartesiano de racionalidade. A técnica não oferece somente instrumentos técnicos, mas nos faz pensar desta forma. Uma vez eu estava em um trem e havia uma moça com uma harpa, um instrumento grande que atrapalha, e um senhor muito distinto começou a conversar com ela, conversaram por meia hora, a moça se sentiu gratificada por alguém interessado por sua arte, depois, no final, este mesmo senhor perguntou: “Onde estão os negócios desta arte?”. Isso nos faz entender que pensamos somente com a categoria do cálculo. 

IHU On-Line - Em que medida a ética do viandante serve como contraponto ao status da técnica em nosso tempo?
Umberto Galimberti – A ética do viandante é uma ideia que ainda deve se tornar um livro. O viandante não é o viajante. O viajante vai de um lugar para o outro e todos os interlugares não existem. Viandante é, ao contrário, aquele que caminha, não tem mapa, e caminhando deve tomar suas decisões. Se chega diante de uma montanha, por exemplo, ele deve decidir se vai transpor a montanha ou contorná-la. Se tiver um rio, terá que ver por onde poderá passar. Se atualmente vivemos em um cenário onde não temos mais princípios, não temos mais regras morais, temos que utilizar a ética do viandante, que é a da contínua decisão, mas nela existe um critério, que não é o critério do bem, mas do menor mal. Neste sentido, esta será a ética do futuro, causada pelo colapso de todas as éticas por causa da técnica.
Houve uma época em que se nascia conforme a natureza, hoje as pessoas podem nascer por meio da técnica, assim como se pode morrer. A técnica modifica também todas as regras éticas. A ética diante da técnica se torna patética porque pergunta à técnica o que ela pode fazer, mas sabe que ela não faz tudo aquilo que pode. Isso nunca foi visto na história.

IHU On-Line - O senhor aponta a experiência totalitária do Nazismo como consumação da Idade da Técnica, rumo ao niilismo. As outras experiências totalitárias, de estado de exceção, que vivemos em nosso tempo continuam corroborando sua ideia? Por quê?
Umberto Galimberti – Eu iniciei a Idade da Técnica com as experiências nazistas. Tínhamos as tecnologias e as armas, mas a experiência nazista inventou um modelo que se tornou o modelo da técnica. Günther Anders , que era marido de Hannah Arendt , fala muito bem sobre isso. Há uma bela entrevista de uma jornalista húngara, que faz 170 perguntas a um diretor do campo de concentração de Treblinka  e questiona ao nazista o que ele sentia quando fazia aquele trabalho. Ele não responde inicialmente, mas no final, contrapõe: “Que tipos de pergunta você está fazendo para mim? Eu não tinha o dever de sentir alguma coisa, minha tarefa era eliminar 3 mil pessoas até o fim da tarde, porque às 17 horas chegava outra carga que precisava ser eliminada até o dia seguinte. Este era o meu trabalho e eu o fazia muito bem”. Deste ponto de vista, o diretor era um ótimo trabalhador. Isso porque, na Idade da Técnica, as pessoas não são responsáveis por suas ações, mas devem prestar contas da responsabilidade à empresa onde trabalham, aos equipamentos, mas não pelo que se faz. A responsabilidade se limita aos superiores. “Eu não sou responsável por minhas ações, mas pela boa execução das minhas ações.” O conteúdo não interessa. O bem e o mal se tornam o bem feito e o mal feito.
Trabalhadores ou delinquentes
A Itália é o primeiro país que construiu perfeitas minas anti-homens. Como chamamos este operário que fez estas minas, trabalhador ou delinquente? Eu acredito que devemos chamá-lo de operário. Se eu oferecer um trabalho que pague mais, ele vai exercer este outro trabalho. Mas por que devemos considerá-lo um bom operário? Porque ele faz bem, tecnicamente, seu trabalho, mas não é o responsável por ele. A técnica, portanto, reduz a responsabilidade humana. Recordo que, antes da Guerra do Iraque, uma agência do banco nacional do trabalho no Canadá estava ligada ao tráfico de armas que fornecia armamento ao Saddam . O empregado daquela banca é culpado ou não? No primeiro momento ele pode saber, mas se ele sabe não é de sua competência. Eis a limitação da ética que opera na técnica. E o trabalho, que é uma palavra nobre e tem uma grande importância, não é levado em consideração. Quando Bush  dizia “nós iremos embora do Iraque quando tivermos acabado nosso trabalho”, que tipo de trabalho era este? É o de matar os outros. Quando Günther Anders dizia que havia escrito uma carta ao piloto que jogou a bomba sobre Hiroshima e perguntou o que ele sentia quando apertou o botão, ele respondeu: “Nada, isso era o meu trabalho!”. O trabalho se tornou uma coisa neutra em relação ao conteúdo, a avaliação de se é bem ou mal feito diz respeito aos protocolos. 

IHU On-Line - É possível vislumbrar uma síntese da dualidade homem e técnica? O que pode emergir a partir dela? 
Umberto Galimberti – Sim, uma síntese no sentido de que o homem foi absorvido pela técnica. Por exemplo, eu considero Mussolini , Stalin  e Hitler  figuras do humanismo. Onde os homens decidem todas as coisas. Hoje, isso não é mais possível. Não podem mais nascer homens que salvem ou destruam um país. Hoje o que existe é o aparato técnico, e o homem é o representante deste aparato técnico. Obama  não pode decidir. Ele representa o conjunto de interesses técnicos interpretados como vantajosos. O humanismo acabou, temos que nos dar conta, como já havia defendido Heidegger, Jaspers , Günther Anders. O homem se salva na vida privada. Para falar de um modo simples, somente no final de semana, quando encontra a si mesmo, porque nos outros momentos ele é um funcionário do aparato, mas no final de semana o homem escapa de si mesmo como escapa do pior inimigo, ele se distrai. Está terminando uma época histórica, que é a da primazia do homem sobre a terra. Agora temos a superioridade dos aparatos sobre a terra, da racionalidade elementar, o máximo dos objetivos e uso mínimo dos meios. Uma vez, por exemplo, os celulares eram grandes máquinas que tinham somente uma função, hoje são pequenos e têm mil funções. Esta é a essência da técnica.

IHU On-Line – O que, nesses quase 10 anos de Psique e Techne: o Homem na Idade da Técnica, mudou no seu pensamento acerca das sociedades tecnocientíficas?
Umberto Galimberti – Meu primeiro livro, que escrevi em 1975, quando tinha 33 anos, era intitulado A queda do Ocidente (Il tramonto dell’occidente - Milano: Feltrinelli Editore, 2005), e acredito que tenhamos chegado agora a esta queda. Com a palavra Ocidente, refiro-me à América do Norte e à Europa, mas a realidade do Brasil é diferente, ainda que vocês corram o risco de entrar na racionalidade ocidental a que me refiro e, por isso, eu sinto aqui um mundo e uma vida que se move. O mundo da vida, pela técnica, não é interessante. Se eu digo “te amo”, do ponto de vista técnico já foi dito tudo, não tenho nada mais a acrescentar, mas do ponto de vista da vida, há milhares de palavras para serem ditas. Todas estas palavras do ponto de vista da racionalidade técnica são inúteis e insignificantes, redundantes, e existe um conflito muito difícil entre a técnica e a vida. E quando nós observamos quem vence, considerando que a terra é vista do ponto de vista técnico — como já dizia Heidegger, em 1927 —, mudamos a percepção da natureza, pois quando as pessoas vão à floresta para ver as árvores, veem móveis, e quando estão diante de um rio não veem a natureza, mas a energia elétrica, se estivermos sob a terra veremos o subterrâneo; o planeta é percebido como matéria-prima. E é nesse sentido que o filósofo alemão dizia que “chegará o dia em que o homem será a matéria-prima mais importante”, não como sujeito da história, mas como matéria-prima da utilização pelo próprio homem. Depois disso temos ainda muito do mundo que ainda não é técnico, mas aqui não há como fazer previsões. Veja que a China e a Índia estão se tornando técnicas e a ideia de que a humanidade pode reapropriar a si mesma, e de que pode usar a técnica a seu serviço, não é mais possível. A técnica não é mais um instrumento nas mãos do homem, mas o homem se tornou um funcionário do aparato técnico. 

IHU On-Line - Gostaria de acrescentar algum aspecto não questionado?
Umberto Galimberti – Estou contente de estar muito velho, assim não vou poder presenciar o fim do humanismo.


O Brasil e sua Legislação Ambiental sob alerta


Estudo publicado na Science alerta sobre os perigos de eventuais mudanças em legislação ambiental brasileira

Publicado em novembro 13, 2014 por 
Cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) participam de estudo internacional publicado pela revista Science, na sexta-feira (7/11), que alerta sobre os perigos de eventuais mudanças em legislação ambiental brasileira.
O artigo “Brazil’s environmental leadership at risk”, que tem entre seus autores Luiz Aragão e André Lima, pesquisadores da Divisão de Sensoriamento Remoto do INPE, aponta que ecossistemas do Brasil, de importância mundialmente reconhecida, podem estar ameaçados se propostas para mineração em unidades de conservação e para o estabelecimento de hidrelétricas, atualmente em debate no Congresso Nacional, seguirem em frente.
Segundo os autores do estudo, as mudanças propostas podem representar uma séria ameaça para as áreas protegidas, enfraquecendo a posição internacional do Brasil como um líder ambiental.
Uma das propostas consiste em um projeto de lei para abrir 10% das áreas de proteção integral à mineração. Em uma análise inédita, a pesquisa mostra que pelo menos 20% da área de todas as reservas estritamente protegidas e terras indígenas do Brasil coincidem com as áreas que foram oficialmente registradas como de interesse para a mineração. Além disso, muitos dos sistemas hídricos associados com áreas protegidas serão influenciados pela construção de grandes usinas hidrelétricas. A sobreposição entre áreas protegidas e interesse mineral ou hidrelétrico ocorre principalmente na Amazônia.
Nos últimos anos o Brasil tem tido um crescente reconhecimento como líder mundial no combate à destruição ambiental. O país conta com a maior rede de áreas protegidas do mundo e avanços na governança ambiental contribuíram para uma redução de 80% na taxa de desmatamento na Amazônia brasileira durante a última década. No entanto, as novas propostas podem ameaçar a reputação ambiental do Brasil.
“Nossa preocupação é que, mesmo se propostas de mitigação fossem efetivadas, estas tendem a ser muito simplistas porque não consideram os efeitos indiretos de megaprojetos. Esses projetos normalmente mobilizam milhares de trabalhadores e levam a um rápido crescimento da população local. Isto, combinado com novas estradas e vias de acesso, é uma receita para o surgimento de novas fronteiras de desmatamento”, alerta Aragão.
A solução, segundo os autores do estudo, inicialmente é conscientizar que manter as funções ambientais, através da preservação de ecossistemas únicos, é parte do desenvolvimento e não um empecilho. Segundo, é ter a garantia por parte dos tomadores de decisão que as iniciativas de desenvolvimento sejam sujeitas a uma análise técnica de custo-benefício, socialmente inclusiva e de longo prazo, baseada em evidências científicas que comparem os potenciais impactos ambientais e sociais contra opções alternativas de desenvolvimento, para garantir o cumprimento da Constituição Federal.
 
Fonte: INPE
Publicado no Portal EcoDebate, 13/11/2014

"O petróleo é nosso". E a Petrobrás a que ponto chegou!


Petrobras no fundo do poço profundo do pré-sal, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Publicado em novembro 19, 2014 por 

pré-sal

[EcoDebate] Uma das mitificações mais enganosas que surgiram na era do jeito petista de governar foi dizer que: “o pré-sal é o passaporte para o futuro do Brasil”. Foi com o marketing das promessas de riqueza das profundezas oceânicas que a candidatura Marina Silva foi desconstruída nas eleições de 2014, especialmente no Rio de Janeiro, pois os prefeitos, vereadores e afins ficaram com medo de perder as benesses dos royalties de uma “dádiva da natureza” que, por enquanto, ainda é uma miragem.
Com todo o respeito às opiniões divergentes, o pré-sal pode ser tudo, menos futuro. O uso do petróleo para alavancar a economia é coisa dos séculos XIX e XX, uma vez que o futuro pertence às energias renováveis. Já nas próximas décadas, o mundo precisa superar a dependência dos combustíveis fósseis por dois motivos: 1) estamos perto do Pico do Petróleo e os custos de extração dos hidrocarbonetos estão ficando muito caros; 2) o mundo precisa parar de emitir CO2, pois o efeito estufa está acelerando o aquecimento global provocando mudanças climáticas indesejadas que podem trazer danos irreversíveis ao Planeta.
A descoberta de indícios de petróleo no pré-sal foi anunciada pela Petrobras em 2006. Foi dito que o Brasil se tornaria exportador líquido de energia fóssil. Porém, oito anos depois das promessas mirabolantes, o Brasil continua importador de petróleo e derivados. Mesmo com a queda do preço do barril de petróleo no mercado mundial (de US$ 110 para menos de US$ 80), a Petrobras anuncia o aumento do preço da gasolina no país. Isto porque os investimentos no pré-sal não são rentáveis a este nível de preço no mercado internacional. Ou seja, os consumidores brasileiros vão pagar no presente, as promessas do paraíso futuro, paraíso este que pode ficar só no sonho (ou virar pesadelo). E o pior, este aumento de novembro é só o primeiro, pois outros aumentos virão, já que o rombo financeiro da empresa que já foi “orgulho nacional” é muito alto e não tem perspectivas de alívio.
A Petrobras está atolada em denúncias de corrupção e em dificuldades financeiras. A empresa se endividou (boa parte em moeda estrangeira) para bancar seu plano de investimento de mais de US$ 200 bilhões (além de algumas compras injustificáveis e investimentos caríssimos). Dizem que o “petróleo é nosso”, mas toda a produção do pré-sal vai ter que sair diretamente para pagar as dívidas com os credores internacionais, especialmente a China (país que está reprimarizando a economia brasileira, pois exporta produtos industrializados para nós e importa petróleo bruto e outras commodities tupiniquins). O Brasil está mergulhando em uma nova dependência internacional.
A Petrobras, com 0,9% das reservas mundiais de petróleo, tem valor de mercado de US$ 74,4 bilhões. A Exxon tem 0,8% e vale US$ 406 bi; a BP Corporation, com 0,9%, é cotada a US$ 129 bi; a PetroChina também tem 0,9% e vale US$ 232 bilhões. A PriceWaterhouseCoopers (PwC), auditora dos resultados financeiros da Petrobras, recusou-se a aprovar o balanço do terceiro trimestre de 2014 e exigiu mais investigações internas sobre o suposto esquema de desvio de dinheiro na estatal, segundo reportagem de O Estado de S.Paulo.
Na quinta feira – por coincidência, um dia 13 – a Petrobras informou que não apresentaria as demonstrações contábeis do terceiro trimestre de 2014 com o relatório de revisão dos seus auditores externos, no prazo previsto pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em comunicado enviado à CVM, a empresa afirma que “a companhia não está pronta para divulgar as demonstrações contábeis referentes ao terceiro trimestre de 2014 nesta data”.
Na sexta-feira (14/11), a Polícia Federal (PF) deflagrou a sétima fase da Operação Lava Jato, cumprindo mandados de prisão e busca e apreensão em diversos Estados. Foram cumpridos quatro mandados de prisão preventiva, 14 de prisões temporárias e seis de condução coercitivas. Uma das pessoas detidas pelos 300 agentes federais envolvidos na operação é o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque.
É claro que todas estas denúncias de corrupção desmoralizam e desvalorizam a Petrobras. Porém, desde as descobertas do pré-sal, não só os maus resultados operacionais, mas também as expectativas negativas sobre o futuro fizeram as ações da Petrobras caírem de um valor acima de R$ 60,00, em 2008, para R$ 13,50 na primeira semana de novembro de 2014. No dia 14/11 a queda se aprofundou, com os papeis sendo negociados abaixo de R$ 13,00. O tombo foi espetacular, só não se sabe se chegou ao fundo do poço. O certo é que os problemas são abissais.

queda das ações da Petrobras

Mas a questão não é apenas de gestão e de fraturas internas na direção da empresa. Os altos custos da exploração dos hidrocarbonetos são evidentes. As jazidas de petróleo da camada pré-sal estão distantes do litoral, abaixo de 2.000 metros d’água, 2.000 metros da camada de sal, 3.000 metros de pós e pré-sal e poços a mais de 7.000 metros de profundidade. O custo de extração é altíssimo. Os riscos financeiro e ambiental também. O fato é que o petróleo barato já foi extraído e queimado e os novos campos requerem muitos recursos e a Energia Retornada sobre a Energia Investida (EROEI) muitas vezes não compensa a exploração.
Quanto mais “pro-fundo” está o petróleo mais “pro-alto” vão os preços dos combustíveis. Assim, vamos torcer para que as promessas do “Brasil do Futuro” não fiquem atoladas no fundo do poço do fundo do mar. Enquanto isto, os consumidores brasileiros devem se preparar para novos e seguidos aumentos do preço da gasolina e do diesel, que, por sua vez, vão impactar também no preço dos fretes e no aumento do custo dos alimentos.
O preço do litro de gasolina no Rio de Janeiro está acima de R$ 3,00 em novembro de 2014. Com uma renda per capita muito mais elevada que a brasileira, a população do Canadá paga o equivalente a R$ 2,45 por litro e os cidadãos dos Estados Unidos pagam R$ 1,87 por litro de gasolina. Desta forma, dizer que a gasolina brasileira está barata e defasada é piada. O povo brasileiro já paga caro pelos combustíveis e o custo vai aumentar ainda mais, pois dificilmente a “riqueza” do pré-sal vai mudar esta pobre realidade.
Portanto, parece que as despesas para se obter o passaporte para a estrada que leva ao futuro vão ser cada vez mais caras e vão pesar no bolso dos 200 milhões de brasileiros.
Referências:
ALVES, JED. Ascensão e queda da civilização dos combustíveis fósseis. EcoDebate, RJ, 02/04/2014
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Publicado no Portal EcoDebate, 19/11/2014

terça-feira, novembro 11, 2014

A crise hídrica no Brasil

A crise hídrica chegou para ficar, por Henrique Cortez

[EcoDebate] Na última década, pelo menos, cientistas, pesquisadores e ambientalistas insistentemente alertam para os riscos de uma grave crise hídrica.
Alertaram para a necessidade de revitalizar bacias hidrográficas, recuperar mananciais, ampliar ao máximo os sistemas de captação e tratamento de esgoto, conservar e proteger as áreas de recarga dos aquíferos. Isto sem falar, da redução do desperdício dos sistemas de distribuição, do uso perdulário da água pela agricultura e do desperdício pelos consumidores.
Além disto, cientistas, pesquisadores e ambientalistas também alertavam que o desmatamento da floresta amazônica ameaçava os ‘rios voadores’, de fundamental importância para o clima e as chuvas na região sudeste.
Alertaram em vão e foram rotulados de catastrofistas e apocalípticos, para dizer o mínimo. Os desenvolvimentistas a qualquer custo e os paladinos do agronegócio, em especial, sempre desqualificaram os alertas, por maior embasamento científico que tivessem.
Sei disto muito bem porque perdi a conta de quantas vezes enfrentei esta desqualificação.
Pois bem, exatamente como nos alertas, a crise hídrica chegou.
O estudo ‘O Futuro Climático da Amazônia‘, por exemplo, estimou que o desmatamento acumulado na Floresta Amazônica, em 40 anos de análise, somou 762.979 quilômetros quadrados (km²), o que corresponde a três estados de São Paulo. Dentre suas conclusões, destacou que floresta amazônica não mantém o ar úmido apenas para si mesma. Ela exporta essa umidade por meio de rios aéreos de vapor, os chamados “rios voadores,” que irrigam áreas como o Sudeste, Centro-Oeste e Sul do Brasil e outras áreas como o Pantanal e o Chaco, além da Bolívia, Paraguai e Argentina.
O pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Antônio Nobre, em entrevista e com base no estudo, estimou que, nos últimos 40 anos, a Amazônia perdeu 42 bilhões de árvores e que é impossível não relacionar os dados com a crise hídrica e a seca pelas quais passa o Brasil atualmente.
Ainda segundo Nobre, uma árvore grande da Amazônia chega a evaporar mil litros de água em apenas um dia. Se calcularmos todas as árvores da bacia amazônica, a quantidade de vapor que vai pra atmosfera corresponde a 20 bilhões de toneladas de água por dia (mais que o Rio Amazonas coloca no Oceano Atlântico no mesmo período).
A mesma lógica perversa também ocorre no Cerrado, vigorosamente devastado para a expansão do agronegócio. O Prof. Altair Sales Barbosa, em entrevista, destacou que …”Somente na abrangência do Cerrado, destaca, “encontram-se três grandes aquíferos responsáveis pela formação e alimentação dos grandes rios continentais. Um deles e o mais conhecido é o aquífero Guarani, associado ao arenito Botucatu e a outras formações areníticas mais antigas. Esse aquífero é responsável pelas águas que alimentam a bacia hidrográfica do Paraná, além de alguns formadores que vertem para a bacia Amazônica. Os outros dois são os aquíferos Bambuí e Urucuia (…) Os aquíferos Bambuí e Urucuia são responsáveis pela formação e alimentação dos rios que integram a bacia do São Francisco e as sub-bacias hidrográficas do Tocantins, Araguaia, além de outras situadas na abrangência do Cerrado”. Isso significa que, “representada por uma complexa teia, as águas que brotam do Cerrado são as responsáveis pela alimentação e configuração das grandes bacias hidrográficas da América do Sul”. “
Em meio a isto, o rio São Francisco agoniza, a ponto de sua nascente histórica ter secado. E, em quase todo país, os estoques de água nos reservatórios das hidrelétricas estão perigosamente baixos, como nos níveis de 2001, trazendo de volta o risco de racionamento de energia.
Diante deste grave cenário, aqueles que nos desqualificaram permanecem impávidos e incapazes de autocritica. Uma parte, relativiza a crise e aposta na generosidade de São Pedro. Outra parte, opta por defender magaobras hídricas como ‘solução’, embora em custos astronômicos. Nesta lógica imediatista, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, apresentou à presidenta Dilma Rousseff, uma lista de oito obras, orçadas em R$ 3,5 bilhões, visando a ‘segurança hídrica’ de São Paulo. Mais uma vez, mais obras, obras, obras e nada de gestão, eficiência, redução de desperdício e revitalização de bacias.
Ou seja, os desenvolvimentistas apostam em mais do mesmo. E, mais uma vez, alguns apostam e todos perdem.
Sinceramente, não percebo que governos, autoridades, gestores, usuários e consumidores realmente compreendam a dimensão da crise e que as soluções passam pelas mesmas recomendações que cientistas, pesquisadores e ambientalistas fazem há mais de uma década.
Pena, porque a crise hídrica chegou para ficar.
Henrique Cortez, jornalista e ambientalista, é editor da revista Cidadania & Meio Ambiente e do portal EcoDebate.
Referências:

Publicado no Portal EcoDebate, 11/11/2014

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