quinta-feira, julho 16, 2015

“Esse novo acordo é uma grande burrice. Vai reestruturar uma dívida ilegal..."


'A dívida grega, assim como a brasileira, é odiosa'

A brasileira Maria Lúcia Fattorelli recebeu incrédula a notícia de que o governo grego firmou novo acordo para renegociação da dívida pública do país. Um acordo que, se for aprovado pelo parlamento, obrigará a Grécia, em troca de um socorro financeiro de cerca de 80 bilhões de euros, a se submeter ao mais severo programa de austeridade fiscal já proposto na zona do euro. 
Auditora aposentada da Receita Federal do Brasil e coordenadora do movimento Auditoria Cidadã, Fattorelli atuou nas auditorias das dívidas públicas brasileira (2009-2010) e equatoriana (2007). Convidada pelo Syriza, o partido de esquerda grego que venceu as últimas eleições, ela agora integra a chamada Comissão da Verdade da Dívida da Grécia, instituída em abril, para avaliar a legalidade dos acordos que a geraram. 
“Esse novo acordo é uma grande burrice. Vai reestruturar uma dívida ilegal, correndo o risco de sacramenta-la e, no futuro, tornar muito mais difícil a sua revisão”, afirmou em entrevista exclusiva à Carta Maior, em Brasília, onde passa uma temporada, após a divulgação do relatório preliminar da Comissão da Verdade
Para a brasileira que conhece de perto as origens e razões da crise econômica e social daquele país, a dívida gregaé mero veículo de corrupção e expropriação, é parte de um grande esquema ilegal criado para salvar os bancos privados europeus. “Para mim, que tive acesso aos contratos, que vi o que ocorreu naquele país e, portanto, tenho a segurança de falar o que estou falando, é muito triste ver que o governo não suspendeu esse pagamento”, lamenta.
A entrevista é de Najla Passos, publicada por Carta Maior, 14-07-2015.
Eis a entrevista. 
As notícias que chegam da Grécia, via o relatório preliminar produzido pela Comissão da Verdade da qual você faz parte, revelam que a dívida pública foi imposta ao país como uma operação para salvar os bancos privados europeus, e não foi, em nenhuma medida, revertida em benefícios para o povo. Então, essa é uma dívida ilegal?
Exatamente. A dívida grega é o resultado de um grande esquema idealizado para o salvamento dos grandes bancos privados europeus, afetados pela bolha de 2008. A dívida da Grécia começa a ser um problema lá na década de 1980, em função dos juros sobre juros. Na década de 1990, o processo continuou. Depois, vieram as Olimpíadas,com muita corrupção. O gasto previsto com o evento não chegava inicialmente a 5 bilhões de euros, mas acabou que a dívida já supera 30 bilhões de euros, por causa de aditivos, acréscimos aos contratos, refinanciamentos em condições onerosas. De qualquer forma, a parte mais relevante, sem dúvida, foi a destinada ao salvamento dos bancos, que é esta contraída de 2010 para cá. 
Qual é a composição da dívida grega, avaliada hoje em 321 bilhões de euros?
No nosso relatório, por questões metodológicas, nós consideramos o valor total da dívida de 312 bilhões de euros. Deste total, 131 bilhões de euros foram para a empresa de fachada criada em Luxemburgo, a SFS, para operar o esquema. Outros 53 bilhões de euros foram para o chamado acordo bilateral, em que o dinheiro não chegou na Grécia. Foi aberta uma conta no Banco Central Europeu (ECB) e o dinheiro que os países emprestavam ia direto para lá, e de lá para os bancos privados que detinham alguma parcela da dívida. O montante destinado ao Fundo Monetário Internacional (FMI) - que é um empréstimo stand by, que não é entregue ao país, mas fica ali para socorrer os bancos, caso o país não consiga efetuar o pagamento – é de mais 20 bilhões. Além disso, tem a parte do ECB, de mais 20 bilhões de euros, que também está conectado com o salvamento bancário. Só aí temos mais de 220 bilhões de euros. 
A outra parte é dívida interna, inclusive dívida interna gerada para pagar os encargos desses empréstimos, que são abusivos. São encargos sobre cada coisa que esses credores fazem, do tipo emitir um documento, emitir um adendo, despesas com advogados, despesas em bolsas, tudo quanto é tipo de taxa que se possa imaginar, é tudo cobrado da Grécia. E esses encargos têm que ser pagos no prazo de cinco dias. Então, a Grécia acaba emitindo dinheiro, aumentando a dívida interna, para gerar liquidez. 
Se a dívida grega recente é ilegal, por que o governo se submeteu à pressão para fechar esta nova renegociação anunciada esta semana? É possível o país se reerguer com um acordo que exija esse nível de sacrifício?
Não, não é possível. E mais. Esse refinanciamento que agora eles estão propondo vai pegar toda essa dívida ilegítima e refinanciá-la. Simplesmente, vai jogar para a frente o problema. Como tem acontecido aqui no Brasil desde a década de 1980. 
Mas o governo grego tem apoio popular para não pagar esta dívida, manifesto inclusive por meio do plebiscito do último dia 5. Por que ele cede?
A pressão é muito grande. Do jeito que foi feito, o euro virou uma camisa de força. O governo grego está sob forte pressão da troika, que é formada pelo ECBFMI e Comissão Europeia, todos eles órgãos dominados por interesses do setor financeiro. O FMI não precisa nem falar, sempre foi um órgão de socorro aos bancos, e não aos países. O ECB é dirigido pelos grandes brancos privados, como é também o banco central dos Estados Unidos. É uma instituição privada, independente. E na Comissão Europeia, o setor que coordena esta parte dos empréstimos, e inclusive tem enorme responsabilidade sobre estes tipos de contratos, está totalmente comprometido com este esquema. Além dessa pressão da troika, a Grécia ainda sofre a pressão dos próprios bancos privados e de alguns países europeus, principalmente a Alemanha
Há o risco concreto da Grécia ser expulsa da zona do euro? Isso inviabilizaria uma retomada do país?
A criação da comunidade europeia foi regida pelos princípios da solidariedade, da cooperação, da colaboração. Por isso, não há previsão legal para expulsar um país, porque isso está totalmente fora de cogitação dos princípios que regeram a criação da comunidade europeia. Então, a Grécia não tem o que temer. Ela pode ser convidada a se retirar, ser pressionada. Mas ela sai se quiser. Expulsa, não. Mas a pressão é brutal.
Muitos economistas já dizem que é melhor a Grécia trabalhar com uma moeda alternativa enquanto não se resolve essa situação, que não finaliza a auditoria. Tem até um economista que já foi do Banco Mundial, Peter Koening, que advoga que o próprio Banco Central da Grécia poderia imprimir euro, que as regras do Banco Central Europeu não impede isso. E olha que não é ninguém de esquerda que está dizendo isso. É um cara de mercado que foi da direção do Banco Mundial por 30 anos.
Como se deu esse processo de salvamento dos bancos privados a partir da imposição de uma alta dívida pública a um país?
Os bancos quebraram em 2008, naquela história da bolha, mas foram considerados grandes demais para quebrar e os países decidiram salvá-los. Então, esquemas ilegais e fraudulentos foram criados para fazer este salvamento. Um desses esquemas foi a criação de uma empresa em Luxemburgo, a FSF, hoje tida como a maior credora da Grécia. É uma empresa que pode ser considerada de fachada, porque envolve países europeus, o que é um escândalo. E isso não é denunciado. Não é dito. E quem dirige de fato esta empresa é a Agência de Dívidas alemã
O que é exatamente uma agência de dívidas?
Para nós é um pouco difícil entender o que é uma agência de dívidas, porque quem gerencia a dívida pública aqui é o tesouro nacional, mas lá na Alemanha é uma agência independente, como aqui tem a Anatel, a Aneel etc. Essa agência é que dirige a empresa de Luxemburgo. É uma fachada e o objetivo dessa empresa é trocar garantias emitidas pelos países. Garantia é igual dívida. Tem outro nome, mas é uma obrigação que você tem que honrar em determinado momento, e que também rende juros. Então, todos os países que compõem esta empresa emitem garantias milionárias. Quando ela foi aberta, eram 440 bilhões de euros. Depois passou para 779 bilhões de euros. E essa empresa troca as garantias dos países por papéis podres em poder dos bancos, usando o sistema da dívida. 
Se o salvamento dos bancos fosse anunciado dessa forma, exatamente com esse nome, seria um escândalo e, talvez, essas medidas não passassem. Então, a Grécia foi colocada como cenário. E está sendo colocada como cenário até hoje. Se você pegar o noticiário desde 2010, a Grécia é manchete sempre. Tudo é culpa da dívida da Grécia.
E por quê justamente a Grécia? Por que a dívida pública grega é um problema tão grande para o mundo?
A questão é que, lá em 2010, estavam em curso todas essas medidas de salvamento bancário. Em 2010, no mesmo dia em que foi endereçado o plano para a Grécia, foi criada essa empresa de Luxemburgo. O mesmo ato da Comissão Europeia que menciona o socorro para a Grécia, também menciona a criação dessa empresa em Luxemburgo, dando a entender que era tudo para ajudar a Grécia. Neste mesmo dia, o EBC lançou também no mercado um programa de compra de ativos, principalmente títulos públicos de dívidas dos países, que é ilegal. Se você pegar o artigo 123 do Tratado Comum Europeu, vê que é expressamente ilegal fazer isso. E, no entanto, o programa foi lançado e está operando, para ser possível a transferência da bolha do balanço dos bancos para a dos países. Porque, pelos princípios contábeis, qualquer transferência de bem, se não for uma doação, exige uma operação de compra e venda. Mas isso não poderia ser feito. Então, a Eurostat, que é o órgão que cuida de todas as regras estatísticas e contábeis da Europa, mudou a norma e permitiu a mera transferência de papéis, sem operação de compra e venda, justificando essa aberração dos princípios contábeis por conta da “turbulência econômica”. Tudo isso ficou escondido. E, quando eu denunciei em uma artigo, economistas gregos vieram comentar comigo que ainda não tinham visto toda essa relação entre as operações. 
E como você concluiu que a Grécia era apenas o cenário deste esquema muito maior?
Por que eu me fazia a mesma pergunta que você fez: por que a Grécia? Aí eu descobri que a Comissão Europeia já vinha fazendo um monitoramento das estatísticas e dos dados da Grécia. Como se houvesse um grande problema com esses números e a Grécia tivesse um déficit maior do que estava apresentando. Só que outros países também tinham problemas estatísticos e de déficits. E chegou um momento em que a Comissão Europeia começou a isolar a Grécia, sem razão aparente. Citaram um grupo de países, que deveriam corrigir seus problemas de uma maneira. Apontaram um outro grupo, que deveria corrigir de outra. E isolaram a Grécia, dizendo que a Grécia era diferente. E a Grécia foi colocada na berlinda, tendo que receber esse pacote de ajuste.
A desculpa era que o déficit estava alto demais e poderia afetar a economia de toda a região. Então, eu fui pesquisar este déficit e tentar entender porque toda essa narrativa diferenciada com a Grécia. E quando eu comecei a pesquisar, encontrei denúncias públicas de ex-chefes da ElStat, o órgão que cuida das estatísticas da Grécia, equivalente ao nosso IBGE, de que, em apenas uma noite, colocaram cerca de 50 bilhões de euros na dívida grega. Primeiro, essas denúncias de falsificação do déficit – que foi a justificativa para a Grécia ser colocada nessa berlinda - foram ignoradas. 
Segundo, vários economistas gregos, especialistas, servidores e até o representante da Grécia junto ao FMI diziam que o pacote proposto não interessava à Grécia, que era melhor fazer uma reestruturação. E isso tudo foi ignorado porque, naquele momento, o que interessava era fazer essa troca da bolha dos bancos. Eles queriam este esquema. Agora, depois do esquema todo implantado, estão falando em reestruturação. Mas, agora, esse acordo vai ser uma grande burrice. Vai reestruturar uma dívida ilegal, correndo o risco de sacramenta-la e, no futuro, tornar muito mais difícil a sua revisão.
A Alemanha é a grande detentora da dívida grega, mas também possui uma dívida histórica com a Grécia, em função da ocupação nazista. O valor dessa dívida histórica alemã é, de fato, como dizem, suficiente para cobrir a dívida pública grega?
O parlamento grego criou a nossa comissão, para fazer a auditoria, e criou uma outra comissão para verificar esse crédito. Então, essa apuração está em andamento, mas é feita por outro grupo. E é extremamente relevante porque há uma dívida que, se corrigida, é muito superior a esses 321 bilhões da dívida da Grécia. E a própria Alemanha já recebeu uma grande ajuda mundial para se reerguer, quando perdeu a guerra. 
Você acaba de chegar de uma temporada de dois meses na Grécia. Qual a situação econômica e social do país hoje?
É uma situação de crise humanitária. A própria presidente do parlamento já repetiu isso várias vezes. E é fato. Quando você olha o encolhimento do PIB de 2009 a 2014, de 22%, dá pra estimar o dano. O orçamento caiu 40 bilhões de euros. As privatizações que o país já fez, o patrimônio que entregou de forma criminosa. Porque quando oFMI entrou lá, junto com a troika, em 2010, ao mesmo tempo em que ele determinou o corte de várias instituições de saúde, educação, assistência, também determinou a criação de duas estruturas caríssimas: um Fundo para Recapitalização de Bancos Privados e um Fundo para Privatizações.
O site desde último fundo é deprimente. É como se você estivesse olhando um catálogo do Shoptime. É o país colocado a venda. Tudo vai passando e você pode escolher: terra, infraestrutura, água, ilhas, trens, portos, marinas, aeroportos... tudo colocado a venda. E na internet. Triste. E o Brasil está assim também. O que a Dilma foi fazer nos Estados Unidos é a mesma coisa: colocar o país a venda. Já o outro fundo grego, o dos bancos, já deixa claro: “O objetivo é contribuir para a manutenção e estabilidade dos bancos e do sistema bancário”. Então, ao mesmo tempo em que o FMI cortou tudo que era essencial, mandou construir essas duas estruturas caríssimas. Eu estudei os relatórios. O Fundo de Privatizações não tem transparência nenhuma, mas o dos bancos produz relatórios. Daqueles 131 bilhões euros que a Grécia recebeu da empresa de Luxemburgo, 48,8 bilhões de euros entrou direto neste fundo para salvar bancos. É escandaloso.
Aqui no Brasil, a gente escuta a mesma cantilena há anos: se não pagar a dívida, o país fica isolado e quebra. Mas, no Equador, a suspensão do pagamento da dívida, da qual você também participou da auditoria, funcionou. Por quê?
A diferença é que o Equador tinha dinheiro para recomprar a dívida. 
Mas o presidente Rafael Correa não reconheceu e pagou apenas 30% do total?
Sim, foi o que ele fez. Mas no nosso relatório zerava a dívida e ainda deixava o Equador com crédito. Só que ele fez um cálculo político da corresponsabilidade dos equatorianos, porque os políticos anteriores foram coniventes, que houve uma corresponsabilidade. Por isso, o Rafael Correa anunciou que recompraria os títulos por no máximo 30% e, quem não quisesse vender, que entrasse na Justiça. Os detentores dos títulos da dívida, claro, concordaram, porque sabiam que, se entrassem na justiça, não receberiam nada, por causa do relatório. Na Grécia, a situação é diferente, porque o país está quebrado. As reservas já se foram todas. 
Como o Equador se beneficiou com a revisão desta dívida?
Em 2007, quando o Rafael Correa assumiu, o valor destinado ao pagamento da dívida já deu uma caída. Em 2008, depois que a gente entregou o relatório da auditoria e ele suspendeu o pagamento dos juros da dívidas, caiu ainda mais. A partir daí, a equação se inverteu e os gastos sociais que eram irrisórios até então, passaram a ser muito maiores, só com o montante dos juros. E em 2009, quando ele recomprou a dívida, os gastos sociais ficam maiores que os gastos com a dívida pela primeira vez na história. Assim, o Equador triplicou o salário dos professores. Voltou a investir em saúde pública, que tinha sido suspensa desde 2000 por causa do peso da dívida. Quando eu estive no Equador pela primeira vez, em 2001, vi aquelas favelas horizontais enormes, todas elas cercadas, e questionei o que acontecia quando uma pessoa dali adoecia. E me explicaram que ou ela achava uma alma caridosa para pagar um remédio ou simplesmente morria. Com a revisão da dívida, tudo isso foi revisto. Tudo foi reconstruído. É por isso que o Correa está sendo reeleito, reeleito e reeleito.
Já na Grécia, ocorre o movimento contrário e, pelo jeito, agora, com a complacência do novo governo de esquerda, eleito para fazer diferente...
No nosso relatório preliminar, nós trazemos uma lista de tudo o que eles perderam. E, além disso, apresentamos asilegalidades dos acordos com os maiores credores. O Banco Central Europeu não poderia ter o programa que teve. A empresa de Luxemburgo é uma aberração. E este acordo bilateral é um arranjo para reciclar os papéis podres em poder nos bancos. Para mim, que tive acesso aos contratos, que vi o que ocorreu naquele país e, portanto, tenho a segurança de falar o que estou falando, é muito triste ver que o governo optou por não suspendeu esse pagamento. 
Há perigo de um giro à direita do governo grego, que alguns já vêm sinalizado desde o pedido de demissão do ex-ministro das Finanças, Yanis Varoufakis
Eu não tenho como dizer isso. Porque ele também vinha negociando desde janeiro. Agora, ele não tinha esse resultado da auditoria que temos agora. E que faz a diferença. Porque aí, coisas que não estavam conhecidas vieram à tona. É ainda um relatório preliminar, claro, mas já consegue mostrar a ilegalidade da dívida. E que já foi mostrado, na minha opinião, é suficiente para um passo mais firme de repúdio a essa situação. Não há porque continuar com isso aí, refazer esse tipo de acordo, porque é claro que vai dar errado.
Voltando à composição da dívida grega, é verdade que parte dela, aquela parte mais antiga, foi contraída devido à necessidade de gasto em armamento para a entrada do país na OTAN?
Nesta nossa análise preliminar, nós focamos a dívida de 2010 para cá, porque é a vigente, mas na dívida anterior, a maior parte dela é, sim, para comprar armamento. A Grécia é um país da OTAN e nós sabemos que todos os países da OTAN são bases militares dos Estados Unidos, que exigem o cumprimento da cota de armamento. É um problema sério, mas, esta parte, ainda não investigamos. Eu sei tanto quanto você.
Nesta análise da composição dívida antiga podem também surgir mais informações relevantes....
Sim, essa dívida é o que juridicamente chamamos de dívida odiosa. E o termo não tem nada a ver com ódio ou odiar. A dívida odiosa é uma dívida contraída contra o interesse do povo que vai pagá-la. É, por exemplo, como a origem da nossa dívida externa, contratada para financiar a ditadura. Ditadura era algo de interesse do povo? Não, o povo queriademocracia. Então, uma dívida contraída para financiar um regime despótico, uma ditadura, ela é contrária ao interesse do povo. O governante ditador vai contrair e ainda vai botar o povo, que é a vítima desse poder, para pagar. Então, a dívida brasileira, assim como a grega, é odiosa. 
A Grécia também passou por uma ditadura durante um período, o que é até uma contradição para o país que é o berço da democracia. E o berço da democracia passa agora pela ditadura do capital. Eu havia comemorado oplebiscito do último dia 5, dizendo que, com ele, a Grécia voltava a ser o berço da democracia porque submeteu ao povo uma decisão econômica importante. Mas, agora o governo não está acatando a decisão, eu fico muito triste. Porque o povo votou contra a austeridade. Isso é lamentável e só pode ser decorrente da enorme pressão que faz com que o governo não enxergue saída dentro da estrutura criada pela União Europeia.

segunda-feira, julho 13, 2015

A crise que o Brasil está experimentando é de uma gravidade extrema

A respeito da gravidade da crise

O quadro de redução da atividade econômica somada à passividade do governo na área tributária provoca uma diminuição da própria capacidade arrecadatória.


É claro que a evolução da conjuntura grega nos oferece um mais-do-que-justificado entusiasmo momentâneo. Uma espécie de desabafo a todos os que insistimos, há muito tempo, na tese de que é possível um outro caminho para a superação de nossa crise tupiniquim. No entanto, infelizmente parece estarmos longe da adoção de tal mudança de rumo. Ao que tudo indica, permanece a falta de vontade e de coragem políticas para operar tal alteração na essência da política econômica. Ao optar pela entrega completa da condução de tais decisões nas mãos de um representante legítimo do financismo privado, o governo perde toda a capacidade de voltar-se na direção dos setores mais penalizados pela estratégia do arrocho e do austericídio.

A crise que o Brasil está experimentando é de uma gravidade extrema. E aqui vou me deter tão somente aos elementos fundantes de todos os outros aspectos de nossa vida social: as dificuldades na esfera da economia. Não bastasse o acompanhamento cotidiano das informações estatísticas e dos números oficiais, a própria realidade da vida dos indivíduos e das empresas demonstra que as opções adotadas desde o final das eleições passadas encaminham o País ladeira abaixo. Aliás, essa tem sido a receita base de todas as políticas de ajuste e de estabilização implementadas há décadas pelo mundo afora. As contas dos sacrifícios são sistematicamente jogadas nas costas dos mais vulneráveis, sejam eles países ou classes sociais.

A reação inicial típica de desqualificar a priori qualquer observação crítica aos rumos da política econômica não me parece ser uma opção inteligente. O simples fato de que as representações políticas das forças mais conservadoras ocupem seus discursos com acusações contra o governo não pode inibir aqueles que temos também nossas observações. Inclusive pelo fato de que são críticas para que se recupere o sentido do desenvolvimentismo e do projeto de país que foi vitorioso nas eleições de outubro passado. Se os grandes meios de comunicação aproveitam o quadro para bater no governo em razão da crise e sugerir a todo momento a saída pela via das tentações golpistas, isso não deve servir como desculpa para que se apoiem, de forma incondicional, as irresponsabilidades contidas nas propostas do Ministério da Fazenda.

A crise pode ser mais bem descrita a partir de uma rodada ampla sobre os mais diversos indicadores de nossa dinâmica econômica. Vamos a eles.

A inflação tem apresentado uma tendência de alta ao longo dos últimos meses, pressionada principalmente pela alta dos preços administrados pelo governo (tarifas de energia elétrica, água, transporte público, entre outras) e por movimentos sazonais nos preços de alimentos. Além disso, está em curso um impacto sobre os preços derivado do movimento recente (necessário, aliás) de desvalorização cambial, em razão do aumento dos custos dos bens importados. Os resultados do IPCA de junho apontam para a inflação anual se aproximando perigosamente de 9%. Ou seja, bem acima da meta de 4,5%, com seu intervalo superior aceitável até 6,5%.

Um dos principais problemas associados a essa alta da taxa de inflação reside na forma como o imexível modelo do tripé da política econômica lida com o fenômeno. O viés ortodoxo recomenda cegamente que a solução para tanto seja o arrocho na política monetária, por meio da elevação da taxa oficial de juros. E aqui chegamos ao outro ponto fulcral da gravidade da crise. O Comitê de Política Monetária (COPOM) tem marcado sua atuação na contramão do recomendado para a retomada do crescimento. O histórico de suas últimas 6 reuniões apresentou uma sequência sucessiva de decisões do colegiado pela elevação da taxa de juros. A SELIC estava estabilizada em 11%  entre abril e setembro do ano passado. A partir de então ela iniciou essa trajetória altista, até atingir os atuais 13,75%.

A opção pela manutenção da política de geração de superávit primário vem completar o quadro que aponta para a recessão. Tendo por objetivo inquebrantável atingir uma meta irrealista, o governo se sujeita a uma estratégia que concentra o foco no corte de despesas, em particular aquelas de natureza social e as relativas aos investimentos necessários. Ao se recusar a lançar mão de fontes de receita que mirassem no chamado andar de cima, mantém-se um modelo de tributação altamente regressivo, onde os setores de menor renda contribuem relativamente muito mais do que as empresas e as camadas mais abastadas da sociedade. As despesas financeiras da União com pagamento de juros da dívida pública aumentam e as desonerações para o capital não são lá muito afetadas em sua essência. Reproduz-se aqui também a crueldade da brutal desigualdade de renda e patrimônio.

Esse foi o caldo de cultura para piorar ainda mais o clima de incerteza e custos elevados dos empresários. A (in)ação do governo terminou por se revelar pró-cíclica, no sentido da paralisia que levava à redução do ritmo das atividades de uma forma generalizada. E os números começaram a expressar o movimento real da economia. As informações das entidades do comércio demonstram que as atividades encerraram o primeiro semestre com os piores resultados para os últimos 12 anos. Apesar de ainda registrar alta de 2,6%, as quedas foram puxadas por setores mais dinâmicos como automobilístico, construção civil e combustíveis. Por outro lado, dados da Pesquisa Mensal do Comércio do IBGE relativos a abril revelam que o volume anual de vendas está praticamente estagnado, com aumento de 0,2% nos últimos 12 meses.

A dinâmica na indústria também apresenta uma retração, com queda na produção, adoção de férias coletivas e demissão generalizada. Dados do IBGE de maio revelam que a produção industrial geral tem acumulado uma perda de 5,2% ao longo dos últimos 12 meses. Os dados mais preocupantes referem-se a setores estratégicos, que são os maiores agregadores de valor na escala produtiva da indústria: bens de capital aparecem com -15,8% e bens duráveis com -14,5%. A construção civil também apresenta um quadro de redução das atividades, atingindo níveis de 5 anos atrás. Além da dificuldade geral das empresas e das famílias, o setor é bastante dependente da demanda do governo e este sinaliza com redução de seus gastos. O clima das operações levadas a cabo pela Polícia Federal, pelo Judiciário e pelas CPIs no Congresso também contribui para reforçar tal paralisia.

Frente a essa combinação de fatores negativos, a tendência à recessão se impõe. Segundo o IBGE, o nível de desemprego continua subindo e atingiu a marca de 8,1% em maio. Além disso, as pesquisas revelam que o rendimento real médio dos assalariados diminuiu ao longo dos últimos 12 meses. Com isso, a conclusão inequívoca passa também a ser comprovada pelo Instituto: a massa salarial registrou redução de 10% no período recente, a maior queda verificada nos últimos 10 anos.

Ora, como o motor do processo inclusivo foi basicamente por meio do acesso a consumo estimulado pelo crédito, o maior custo financeiro também pesa sobre a capacidade de pagamento. Como o Banco Central não atua sobre os spreads elevadíssimos praticados pelos bancos, à elevação da SELIC dá-se uma avalanche de aumentos dos encargos financeiros. As taxas efetivamente cobradas pelas instituições financeiras são surreais, sem nenhum controle ou sanção por parte do órgão regulador. As taxas de cartão de crédito, por exemplo, já ultrapassaram a faixa de 300% ao ano. Uma loucura! Com isso, o nível de endividamento das famílias também subiu de 39% para 55% entre janeiro e maio deste ano.

Como o modelo todo se assentou na total liberdade de movimentação de capitais internacionais e no estímulo à importação bens, em função da taxa de câmbio artificialmente valorizada por mais de uma década, aos poucos as contas do setor externo também passaram a registrar déficits expressivos. A conjuntura mais recente de queda dos preços das commodities no mercado internacional também contribuiu para reduzir o valor de nossas exportações. Apesar da Balança Comercial de Bens ainda se mostrar positiva, o fato a exigir cautela é que a conta de Transações Correntes fechou 2014 deficitária em US$ 91 bilhões, com algum sinal de melhoria ao longo do exercício atual. Isso revela o peso dos movimentos de juros, lucros e demais itens financeiros de nossas relações com o resto do mundo.

Finalmente, como era de se esperar, esse quadro de redução da atividade econômica somada à passividade do governo na área tributária provoca uma diminuição da própria capacidade arrecadatória do governo. De acordo com o Tesouro Nacional, suas receitas apresentaram queda real de 5% para o período janeiro-maio. Esse movimento só deve se aprofundar ao longo dos próximos meses, uma vez que as previsões para o comportamento do PIB em 2015 apontam para redução entre 1,5% e 2%.

A situação é séria e exige mudanças.

(*) Doutor em economia pela Universidade de Paris 10 (Nanterre) e integrante da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental, do governo federal.

quarta-feira, julho 08, 2015

MP 680: o abalo é enorme.


E o governo brasileiro disse SIM!

souto brasil sim
Enquanto o governo grego possibilitou ao povo dizer NÃO à submissão aos interesses do capital estrangeiro, no Brasil, o governo disse SIM, fazendo-o de modo a gerar mais um sacrifício aos trabalhadores, como já houvera feito, na história recente, com as MPs 664 e 6651.
É preciso entender que a última Medida Provisória editada pelo governo, MP 680, segue uma diretriz que já podia ser identificada desde quando se pretendeu conter as manifestações de junho por meio de uma aliança política e econômica que tenderia a ser utilizada também contra os trabalhadores.
Em junho de 2013, cheguei a formular a seguinte advertência a respeito:
…para que fique registrado que os problemas sociais ainda persistem e que, portanto, a mobilização ainda tem razão de ser, sobretudo para que nenhum ajuste de preservação de poder, como forma de superação do momento de crise, seja feito de modo a, novamente, prejudicar os trabalhadores, como se daria, por exemplo, com o acolhimento de alguma das 101 (cento e uma) providências flexibilizantes requeridas pela CNI, com o não acolhimento da igualdade integral de direitos trabalhistas aos empregados domésticos e, principalmente, com a aprovação dos projetos de lei do ACE e da terceirização, perigo este que se torna mais concreto principalmente agora que o anúncio da redução da tarifa em São Paulo foi feito em uma coletiva com a presença do Prefeito Haddad e do Governador Alckmin.2
E a fórmula, infelizmente, se consagrou: desgasta-se politicamente o governo e este para se manter no poder agrada o setor econômico com a promoção da “venda” dos espaços públicos e a suspensão da ordem constitucional para realização de eventos que favorecem a grandes negócios comerciais, mantendo-se sob vigilância e mediante violenta opressão os movimentos populares de resistência, e ainda promove a redução dos direitos dos trabalhadores. Não se esqueça que após as manifestações de junho, o governo, além de promover a Copa de 2014 na forma como se deu, com suspensão da ordem constitucional, ainda editou as Medidas Provisórias 664 e 665, que retiraram direitos dos trabalhadores, deu alimento à retomada da PL 4.330/04, que busca a ampliação da terceirização, e, agora, editou a MP 680, que representa um golpe de morte no Direito do Trabalho e na classe trabalhadora.
Assim, estão conseguindo levar adiante o ideário conservador nacional de destruir a CLT, reduzindo direitos dos trabalhadores, e tudo para atender aos interesses do capital estrangeiro, sob a falsa retórica de uma crise, que é eterna vale lembrar, e que sempre esteve presente em todo argumento a favor da redução de direitos trabalhistas nos últimos 27 (vinte e sete) anos, pelo menos.
E não me venham falar em necessidade econômica para a preservação da competitividade das empresas, pois se o sacrifício dos trabalhadores se apresenta como requisito necessário para salvaguardar as empresas, há algo muito errado no funcionamento estrutural da economia, que não vai se resolver por uma medida recessiva que atinge apenas uma parcela da sociedade, composta exatamente por aqueles que produzem valor e aos quais nunca se permitiu participar de forma igualitária da riqueza gerada.
Não há, afinal, nenhuma garantia que a mera redução de custos das empresas solucione problemas de crises estruturais. Aliás, o que se pode prever, ao ser assumida a lógica recessiva, é exatamente a retração do mercado e a ampliação da crise, com benefício apenas para quem conta com o mercado consumidor externo, servindo, ainda, aos oligopólios.
De todo modo, como já dito no “Manifesto contra Oportunismo e em Defesa dos Direitos Sociais”, publicado em 2009, quando em razão da crise de 2008, seguimentos econômicos também reivindicavam a redução de direitos trabalhistas, “a superação de uma crise econômica estrutural requer sacrifícios de cima para baixo e não de baixo para cima. Não se promove uma sociedade, salvando empresas e deixando pessoas à beira da fome. Se há um problema na conjuntura econômica, que atinge a todos indistintamente, e não apenas a uma ou outra empresa, é necessário, então, o sacrifício conjunto, começando pelos próprios empresários e passando por diversos outros setores da sociedade (profissionais liberais, servidores públicos, senadores, deputados, prefeitos, governadores, juízes etc.). É impensável que se busque a solução de problemas econômicos estruturais do país com o sacrifício apenas de trabalhadores cujo salário já está entre os mais baixos do mundo.”3
Para atacar a crise não se viu nenhuma redução dos lucros de grandes empresas e Bancos, e de ganhos de governantes, políticos, desembargadores, juízes, diretores de grandes empresas e acionistas, além do necessário ajuste fiscal, para tributação das grandes fortunas, por exemplo. O que se viu foi a concessão de benefícios fiscais à FIFA; a realização de ajustes com grandes empreiteiras dos quais adveio a retomada do projeto de ampliação da terceirização; um permissivo, pela falta de fiscalização, de uma maior precarização nas condições de trabalho, com o consequente aumento dos acidentes do trabalho; uma intensa repressão policial a greves e a movimentos sociais etc.
E neste quadro, em que os trabalhadores historicamente são tratados como inimigos, diante de nova “crise” estes são chamados de “parceiros” ou “colaboradores”, para oferecerem o seu sacrifício em prol do engrandecimento geral da nação ou, meramente, do fortalecimento da economia, que é uma economia que promove, como se sabe, extração de valor do trabalho em benefício de alguns poucos e, de forma mais precisa, de empresas de capital estrangeiro.
E o que diz a MP 680, exatamente?
A MP 680, de 06/07/15, instituiu o que chamou de Programa de Proteção ao Emprego, com os seguintes objetivos: “I – possibilitar a preservação dos empregos em momentos de retração da atividade econômica; II – favorecer a recuperação econômico-financeira das empresas; III – sustentar a demanda agregada durante momentos de adversidade, para facilitar a recuperação da economia; IV – estimular a produtividade do trabalho por meio do aumento da duração do vínculo empregatício; e V – fomentar a negociação coletiva e aperfeiçoar as relações de emprego” (art. 1º).
Essa tal “proteção ao emprego” se daria, concretamente, nos termos da MP, por intermédio da redução temporária, em até trinta por cento, da jornada de trabalho dos empregados, com a redução proporcional do salário (art. 3º.), permissivo concedido às empresas que aderirem, até 31/12/15, ao PPE e se “encontrarem em situação de dificuldade econômico-financeira, nas condições e forma estabelecidas em ato do Poder Executivo federal” (art. 2º).
Essa redução poderá ter duração de seis, com possibilidade de prorrogação para 12 meses, e terá como condição a “celebração de acordo coletivo de trabalho específico com o sindicato de trabalhadores representativo da categoria da atividade econômica preponderante, conforme disposto em ato do Poder Executivo” (§ 1º, art. 3º.).
Em compensação pela redução temporária, que “deverá abranger todos os empregados da empresa ou, no mínimo, os empregados de um setor específico” (§ 2º, art. 3º), a MP confere algumas “vantagens” aos trabalhadores: a) garantia do recebimento do salário mínimo a ser pago pela empresa; b) compensação pecuniária equivalente a cinquenta por cento do valor da redução salarial e limitada a 65% (sessenta e cinco por cento) do valor máximo da parcela do seguro-desemprego, enquanto perdurar o período de redução temporária da jornada de trabalho; c) garantia de emprego durante o período em que vigorar a adesão da empresa ao PPE, estendendo-se ao prazo equivalente a um terço do período de adesão, após cessada esta.
Dá-se a impressão que os trabalhadores saem beneficiados porque lhe são garantidos os empregos e ainda recebem uma compensação pecuniária paga pelo governo de até 65% do seguro-desemprego.
Mas o abalo é enorme.
Primeiro, porque a lógica da MP 680 agride a pedra de toque do Direito do Trabalho, cuja função é a de melhorar a condição social dos trabalhadores e não a de criar mecanismos para adaptação a um modelo econômico falido (art. 7º, CF).
Segundo, porque atribui aos sindicatos, por meio da negociação coletiva, o papel de algozes dos direitos dos trabalhadores e não o de protagonistas na luta por melhores condições. Esse, aliás, é um dos piores problemas da lógica trazida pela MP, o da fragilização da atuação sindical, já que as grandes empresas, que possuem forte poder negocial, diante do permissivo ou, mais propriamente, incentivo estatal, saberão jogar os trabalhadores contra os sindicatos e colocar sindicatos uns contra os outros, expondo-os à concorrência do “quem cede mais para garantir empregos”, punindo os “xiitas”.
Terceiro, porque nos impulsiona a raciocinar na perspectiva do mal menor, naturalizando a exploração e o sofrimento dos trabalhadores, para preservar um sistema que há longa data prioriza uma pequena parcela da sociedade e que, no caso de um capitalismo periférico e dependente como o Brasil, favorece a evasão de divisas.
Há, de todo modo, problemas jurídicos insuperáveis para o alcance dos propósitos politicamente nebulosos e economicamente equivocados da MP 680.
A respeito do alcance jurídico da negociação coletiva, cumpre reproduzir o que já disse por ocasião de apelo empresarial semelhante, em 2009:
É neste sentido que se consagrou no direito comparado a idéia de que os instrumentos coletivos de natureza normativa (acordos coletivos, convenções coletivas e sentenças normativas) têm por objetivomelhorar as condições sociais e econômicas do trabalhador, não se prestando, pois, à diminuição das garantias já auferidas.
É totalmente equivocado, desse modo, considerar que acordos e convenções coletivas de trabalho possam, sem qualquer avaliação de conteúdo, reduzir direitos trabalhistas legalmente previstos, simplesmente porque a Constituição previu o “reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho” (inciso XXVI, do art. 7º.) e permitiu, expressamente, por tal via, a redução do salário (inciso VI, art. 7º.), a compensação da jornada (inciso XIII, art. 7º.) e a modificação dos parâmetros da jornada reduzida para o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento (inciso XIV, do art. 7º.).
Ora, o artigo 7º., em seu “caput”, deixa claro que os incisos que relaciona são direitos dos trabalhadores, ou seja, direcionam-se a um sujeito específico, o trabalhador, não se podendo entendê-las, conseqüentemente, como algum tipo de proteção do interesse econômico dos empregadores. Além disso, as normas são, inegavelmente, destinadas à melhoria da condição social dos trabalhadores.
Não se pode ver nos preceitos fixados nos incisos do art. 7º. os fundamentos jurídicos para fornecer aos empregadores a possibilidade de, por um exercício de poder, induzirem os trabalhadores, mesmo que coletivamente organizados, a aceitarem a redução dos direitos trabalhistas legalmente previstos, ainda mais quando tenham sede constitucional e se insiram no contexto dos Direitos Humanos.
O inciso VI, do art. 7º., por exemplo, que cria uma exceção ao princípio da irredutibilidade salarial, permitindo a redução do salário, e nada além disso, por meio de negociação coletiva, insere-se no contexto ditado pelo “caput” do artigo, qual seja, o da melhoria da condição social do trabalhador e não se pode imaginar, por evidente, que a mera redução de salário represente uma melhoria da condição social do trabalhador. Assim, o dispositivo em questão não pode ser entendido como autorizador de uma redução de salário só pelo fato de constar, formalmente, de um instrumento coletivo (acordo ou convenção).
A norma tratada, conseqüentemente, só tem incidência quando a medida se considere essencial para a preservação dos empregos, atendidos certos requisitos. A Lei n. 4.923/65, ainda em vigor, mesmo que parte da doutrina assim não reconheça, pois não contraria a Constituição, muito pelo contrário, fixa as condições para uma negociação coletiva que preveja redução de salários: redução máxima de 25%, respeitado o valor do salário mínimo; necessidade econômica devidamente comprovada; período determinado; redução correspondente da jornada de trabalho ou dos dias trabalhados; redução, na mesma proporção, dos ganhos de gerentes e diretores; autorização por assembléia geral da qual participem também os empregados não sindicalizados.
A própria Lei de Falência e Recuperação Judicial, n. 11.101/05, de vigência inquestionável, parte do pressuposto ao respeito à política de pleno emprego, à valorização social do trabalho humano e à obrigação de que a livre iniciativa deve assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social.
A recuperação judicial é um mecanismo jurídico, cuja execução compete ao Estado, por intermédio do Poder Judiciário, e tem por finalidade preservar as empresas que estejam em dificuldade econômica não induzida por desrespeito à ordem jurídica e que tenham condições de se desenvolver dentro dos padrões fixados pelo sistema, tanto que um dos requisitos necessários para a aprovação do plano de recuperação é a demonstração de sua “viabilidade econômica” (inciso II, do art. 53, da Lei n. 11.101/05).
O art. 47, da Lei n. 11.101/05, é nítido quanto a estes fundamentos: “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.” (grifou-se)
Fácil verificar, portanto, que tal lei não se direciona à mera defesa do interesse privado de um devedor determinado. A lei não conferiu um direito subjetivo a quem deve, sem se importar com a origem da dívida e a possibilidade concreta de seu adimplemento. Não estabeleceu, conseqüentemente, uma espécie de direito ao “calote”, até porque sem a possibilidade concreta de manter a atividade da empresa com base em tais postulados esta deve ser conduzida à falência (art. 73, da Lei n. 11.101/05).
O que há na lei é a defesa das empresas numa perspectiva de ordem pública: estímulo à atividade econômica, para desenvolvimento do modelo capitalista, preservando empregos e, em conformidade com a Constituição, visualização da construção de uma justiça social.
A lógica do ordenamento jurídico que se direciona à manutenção da atividade produtiva das empresas é a da preservação dos empregos, admitindo como meios de recuperação judicial, a “redução salarial,compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva” (art. 50, inciso VIII, da Lei n. 11.101/05).
Para tanto, exige-se, ainda, a “exposição das causas concretas da situação patrimonial” da empresa e “das razões da crise econômico-financeira” (inciso II, do art. 51), além da “demonstração de sua viabilidade econômica” (inciso II, do art. 53), dentre diversos outros requisitos, sendo relevante destacar que a dispensa coletiva de empregados, em respeito ao art. 7º, I, da Constituição, não está relacionada como um meio de recuperação da empresa (vide art. 50).
Como se vê, a ordem jurídica não autoriza concluir que os modos de solução de conflitos trabalhistas possam ser utilizados como instrumentos de meras reduções dos direitos dos trabalhadores, sendo relevante realçar os fundamentos que lhe são próprios, conforme acima destacado:
  1. fixar parâmetros específicos para efetivação, em concreto, dos preceitos normativos de caráter genérico referentes aos valores humanísticos afirmados na experiência histórica;
  2. melhorar, progressivamente, as condições sociais e econômicas do trabalhador.4
Ou seja, só se pode chegar ao efeito preconizado pela MP 680 dentro dos parâmetros jurídicos trabalhistas e respeitando-se o projeto constitucional. O argumento da crise, portanto, para atingir os trabalhadores deve se inserir em um padrão de sacrifício geral, atingindo, primeiramente, e de forma mais intensa, as camadas privilegiadas da sociedade.
E dentro desse contexto de autêntico pacto social, há de definir que tipo de sociedade se está salvando, afinal. Vamos salvar empresas multinacionais que ao longo de décadas exploraram o trabalhador brasileiro, acumulando riquezas? Vamos salvar empresas que chegaram à situação de dificuldade econômica por conta de má gestão de descapitalização irresponsável? Vamos salvar empresas que jamais respeitaram direitos trabalhistas ou cumpriram obrigações fiscais e previdenciárias? Vamos salvar um Estado que arrecada parte da riqueza produzida para favorecer, mediante empréstimos, a reprodução desse modelo de acumulação socialmente irresponsável? Vamos nos sacrificar para manter privilégios? Vamos nos sacrificar para favorecer a manutenção de um modelo de exploração internacional do trabalho, que remete todos os ganhos de capital aos países do capitalismo central?
Dito de outro modo: vamos salvar um modelo que produz desigualdade e sequer tem sido capaz de garantir aos cidadãos serviços públicos mínimos em áreas consideradas pela Constituição como fundamentais: educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, e assistência aos desamparados? (art. 6º, CF)
Assim, mesmo para se chegar a um pacto social deve-se conseguir, de forma clara e objetiva, responder a uma indagação fundamental: qual é o projeto? Ou ainda: o que se está fazendo concretamente para se alcançar uma sociedade verdadeiramente igualitária, na qual todos possam viver com dignidade?
Sem essas definições, que trazem a necessidade de se fazer enfrentamentos com relação ao grande capital, que, ademais, foi acumulado ao longo de décadas de exploração do trabalho, pedir aos trabalhadores que paguem a conta da crise é um despropósito sem tamanho, uma afronta à inteligência humana. É, na verdade, uma enorme violência!
Mas não nos furtemos a enfrentar de forma mais precisa os termos, contradições e formas fugidias da MP, visualizada, então, no contexto de situações individualizadas.
Destaque-se, primeiramente, a retórica de que o governo vai pagar uma compensação pecuniária aos trabalhadores. Ora, o dinheiro do FAT é um patrimônio da classe trabalhadora. Assim, os próprios trabalhadores estariam pagando parte de seu salário, mas para favorecer a um interesse econômico das empresas. Verdade, que esse dinheiro também serve aos propósitos do BNDES, mas isso só agrava a situação, pois de fato o pagamento aos trabalhadores, para aceitarem redução de salários, conferindo às empresas, consequentemente, menor custo, representa uma forma de fomento indireto, que as empresas sequer precisariam pagar.
A MP, além disso, não exige comprovação da dificuldade econômica, como exige, por exemplo, a Lei n. 4.923/65, acima citada, comprovação esta que somente pode se dar, de forma plena, com realização de uma auditoria independente e não por mera alegação.
A redução de jornada precisaria, também, ser acompanhada de definição clara quanto ao ritmo de trabalho, para evitar a extração de mais valor na jornada menor.
Além da necessidade de uma redução, na mesma proporção, de ganhos de diretores, acionistas, fomentadores e credores de toda espécie, a MP ainda teria que estabelecer que a situação temporária se inseriria necessariamente no contexto da visualização da retomada da situação inicial. Não há uma compensação equivalente, como supõe a MP, com a preservação dos empregos durante a redução, e a extensão dessa “estabilidade” pelo prazo de um terço do tempo da redução. Isso só se daria com a preservação do emprego pelo período de pelo menos o dobro do tempo da redução (fórmula adotada, por exemplo, com o trabalho no dia destinado à folga semanal e na negação ao direito de férias), com a recomposição dos valores dos salários, incluindo as perdas inflacionárias do período, já que o princípio do Direito do Trabalho, calcado no projeto constitucional, é o da melhoria da condição social dos trabalhadores, repita-se.
Impressiona, ainda, o caráter discriminatório e antissocial da MP, que inclusive não possui qualquer base econômica, de permitir que a redução atinja apenas aos “empregados de um setor específico” (§ 2º, art. 3º), sendo que se a redução é precedida de acordo coletivo o que a MP faz é estimular uma divisão odiosa entre os empregados da empresa na votação pela redução setorial.
Certo é que há inúmeros equívocos jurídicos na MP, que a tornam impraticável, sendo que do ponto de vista econômico e da conformação social não há o mínimo sentido em se exigir dos trabalhadores um sacrifício para depois se retomar à mesma situação anterior, que foi, ademais, a que deu origem à crise e que tem dado causa a tantos desajustes sociais.
Já que querem visualizar sacrifícios, para superar problemas estruturais, que se o faça dentro de um projeto com vistas a melhorar as coisas e não para deixá-las exatamente como estavam antes das medidas adotadas, correndo o risco de piorá-las.
À adaptação e à naturalização da trágica situação em que há muito vivem milhões de brasileiros digamos NÃO!

terça-feira, julho 07, 2015

E sejamos claros: se a Grécia terminar fora do euro, não significa que os gregos são europeus maus.

O fim do sangramento da Grécia

Economista vencedor do Nobel diz que ‘bullying’ contra os gregos foi um momento vergonhoso para uma Europa democrática

POR PAUL KRUGMAN, DO NEW YORK TIMES
06/07/2015 12:31 / ATUALIZADO 06/07/2015 16:01
Votantes do “não” se reuniram em frente ao Parlamento grego em Atenas no domingo - Dimitris Michalakis / Reuters
NOVA YORK - A Europa se esquivou de uma bala no domingo. Confundindo muitas previsões, os eleitores gregos apoiaram fortemente a rejeição de seu governo às demandas dos credores. E mesmo os apoiadores mais fervorosos da União Europeia devem estar suspirando de alívio.
Claro, esta não é a forma que os credores gostariam que você enxergasse. A versão deles, ecoada por muitos da imprensa de negócios, é de que a falência na tentativa de intimidar a Grécia ao consentimento foi um triunfo de irracionalidade e irresponsabilidade sobre bons conselhos tecnocráticos.
Mas a campanha de bullying — a tentativa de aterrorizar os gregos ao cortar financiamento bancário e ameaçar o caos geral, tudo com a meta quase escancarada de empurrar a corrente esquerdista do governo para fora — foi um momento vergonhoso em uma Europa que afirma acreditar em princípios democráticos. Isso teria instalado um terrível precedente se a campanha obtivesse sucesso, mesmo se os credores tivessem razão.
E mais, eles não tinham. A verdade é que os tecnocratas de estilo próprio da Europa são como médicos medievais que insistiam em sangrar os pacientes — e quando o tratamento oferecido deixasse os pacientes ainda mais doentes, demandavam ainda mais sangue. O “sim” na Grécia teria condenado o país a anos de mais sofrimento sob políticas que não têm dado certo e, de fato, dada a aritmética, não funcionam: austeridade provavelmente afunda a economia mais rápido do que reduz a dívida, de modo que todo o sofrimento não serve a propósito algum. A vitória esmagadora do lado “não” oferece ao menos a chance de uma fuga desta armadilha.
Mas como tal saída pode ser administrada? Há alguma maneira de a Grécia permanecer na zona do euro? E isso é desejável em algum caso?

A questão mais imediata envolve os bancos gregos. Antes do referendo, o Banco Central Europeu (BCE) cortou o acesso a fundos adicionais, ajudando a precipitar o pânico e a forçar o governo a impor um feriado bancário e o controle de capitais. O banco central agora enfrenta uma escolha incômoda: se mantiver o financiamento normal, estará admitindo que o congelamento prévio foi político, mas se não, vai efetivamente forçar a Grécia a introduzir uma nova moeda.
Especificamente, se o dinheiro não começar a fluir de Frankfurt (sede do BCE), a Grécia não terá opção a não ser começar a pagar salários e pensões com promessas de pagamento, o que de fato seria uma moeda paralela — e poderá se tornar em breve a nova dracma.
Suponhamos, por outro lado, que o BCE retome a linha de financiamento normal, e a crise bancária seja amenizada. Ainda resta a questão de como restaurar o crescimento econômico.
Nas negociações fracassadas que levaram ao referendo de domingo, o ponto central era a demanda da Grécia por alívio permanente da dívida, para remover a ameaça que pairava sobre a economia. A troika — as instituições que representam os interesses dos credores — recusou, apesar de sabermos agora que um dos membros da troika, o Fundo Monetário Internacional, havia concluído independentemente que a dívida grega não pode ser paga. Mas será que vão reconhecer agora que a tentativa de retirar a coalizão de esquerda do governo fracassou?
Não faço ideia — e, de qualquer forma, existe agora um argumento forte de que a saída da Grécia do euro é a melhor das piores opções.
Imagine, por um momento, que a Grécia nunca tivesse adotado o euro, que ela tivesse somente fixado o valor da dracma em termos de euros. O que análises econômicas básicas diriam que ela deveria fazer agora? A resposta, esmagadoramente, seria que ela deveria desvalorizar a moeda — deixar o valor da dracma cair, tanto para estimular exportações e quebrar o ciclo de deflação.
Claro, a Grécia não tem mais uma moeda própria, e muitos analistas afirmavam que a adoção do euro era um movimento irreversível — afinal, qualquer insinuação de saída da zona do euro acarretaria corridas bancárias e crise financeira. Mas, neste ponto em que a crise financeira já aconteceu, os custos maiores da saída do euro já foram pagos. Por que, então, não buscar os benefícios?
A saída da Grécia do euro funcionaria tão bem quanto a desvalorização bem-sucedida da Islândia em 2008-2009, ou o abandono da Argentina da política “um peso, um dólar” em 2001-2002? Talvez não, mas considere as alternativas. A menos que a Grécia receba realmente um alívio principal da dívida, e talvez ainda assim, abandonar o euro oferece a única rota de fuga plausível do seu interminável pesadelo econômico.
E sejamos claros: se a Grécia terminar fora do euro, não significa que os gregos são europeus maus. O problema da dívida do país reflete concessão e recebimento de empréstimos irresponsáveis, e, de qualquer maneira, os gregos pagaram pelos pecados do seu governo muitas vezes. Se eles não conseguem ser bem-sucedidos com a moeda comum da Europa, é porque tal moeda não oferece nenhuma trégua a países com problemas. A coisa mais importante agora é fazer o que for preciso para estancar o sangramento.

Fonte: http://oglobo.globo.com/economia/o-fim-do-sangramento-da-grecia-16674106#ixzz3f8sOalN0 

Como se pode perceber, trata-se de um mundo bastante idealizado, muito distante de nossa realidade concreta.

Taxa de juros ou depósito compulsório?

As pressões inflacionárias não serão resolvidas apenas pelo aumento da Selic, cuja alta compromete a própria tentativa de conter gastos públicos.


A atual prioridade concedida pelo Ministério da Fazenda, em termos de política econômica, tem sido direcionada à obtenção da meta de superávit primário. Apesar de todas as dificuldades para cumprir com os objetivos de redução de despesas do Orçamento da União, permanece a intenção oficial de atingir os 1,1% do PIB como valores assegurados para o pagamento dos juros da dívida pública.

Ocorre que a adoção de tal estratégia de promoção do ajuste fiscal se dá em um contexto de redução do ritmo da atividade econômica. As expectativas para o desempenho do PIB apontam para uma retração de -1,3% ao longo de 2015. Esse processo deve provocar uma frustração na receita tributária, implicando maiores cortes nos gastos sociais.

O crescimento dos preços faz com que o governo mantenha a política monetária restritiva para corrigir a distorção inflacionária. Assim, optou-se por uma política persistente de elevação da taxa de juros. Essa estratégia altista mais recente do COPOM teve início no final de outubro do ano passado, quando a taxa foi aumentada de 11% para 11,25%. A partir daí, foram realizadas mais 5 reuniões, com igual número de elevações da taxa, até atingir os atuais 13,75%.

A fixação da SELIC em tais níveis acaba por comprometer a própria tentativa de conter gastos públicos, tal como recomendado pela política de ajuste fiscal. Com o estoque da dívida pública se aproximando de R$ 2,5 trilhões, cada ponto percentual de aumento da taxa de juros corresponde uma elevação de despesas com serviços da dívida de R$ 25 bilhões anuais. Ou seja, apenas com os aumentos praticados ao longo de 2015, os gastos federais já teriam subido por volta de R$ 38 bilhões.

A lógica neoclássica encara a inflação apenas como um problema de descompasso entre oferta e demanda de bens e serviços. Em razão da livre ação das forças no mercado, um determinado volume de demanda agregada maior do que a oferta agregada pode significar fator de desequilíbrio. Sob tais circunstâncias, esse fenômeno tende a provocar preços mais altos nos mercados, em comparação ao que seriam em situação de suposto equilíbrio.

De acordo com esse raciocínio, a política monetária entraria em ação para retirar recursos dessa pressão da demanda sobre a oferta. Esse seria o caminho para reequilibrar os preços de uma forma geral e evitar a inflação. E aqui entra o pulo do gato da política monetária contracionista.

A hipótese subjacente é que a elevação dos juros operaria como atrativo para uma parcela desses recursos da demanda, que deixariam de se dirigir ao consumo e seriam reorientados à poupança, em busca da maior rentabilidade oferecida pelos títulos no mercado financeiro.

Como se pode perceber, trata-se de um mundo bastante idealizado, muito distante de nossa realidade concreta. As pressões inflacionárias mais recentes não serão resolvidas apenas pelo aumento da SELIC, pois a maior parte da pressão sobre a demanda vem de setores que não possuem capacidade de poupança e muito menos que deixariam de consumir para aplicar seus recursos em títulos oferecidos pelas instituições financeiras.

Alguns aumentos de preços não devem ser combatidos por juros altos. É o caso típico da tão famosa “inflação do tomate” que ressurge todos os anos, em função de um ciclo típico desse produto. Os preços recuaram pela dinâmica cíclica da produção e oferta de determinados alimentos. Tampouco não são afetados pela SELIC os aumentos mais recentes dos preços administrados, como transportes e energia elétrica, que tanto contribuíram para a alta do IPCA.

Além disso, é importante mencionar o efeito perverso da taxa de juros elevada sobre a realidade cambial. A opção pela “livre flutuação” da taxa de câmbio com o ingresso maciço de recursos externos especulativos contribui para uma sobrevalorização artificial do real, acentuando a desindustrialização e o desequilíbrio no setor externo.

Mas imaginemos que o problema fosse realmente o excesso de demanda agregada e que ela deva mesmo ser reduzida. Nesse caso, qualquer manual básico de macroeconomia tradicional oferece uma alternativa à elevação da taxa de juros para se obter o mesmo resultado de redução da pressão da demanda sobre a oferta. Trata-se do aumento da alíquota do depósito compulsório. É interessante observar que tal opção não encontra espaço nos meios do sistema financeiro e quase nunca aparece na imprensa.

O depósito compulsório é um instrumento já existente na regulamentação de nosso sistema financeiro e prevê que os bancos sejam obrigados recolher junto ao Banco Central um percentual de todos os seus depósitos. A ideia é evitar que os bancos emprestem a terceiros um volume muito grande dos recursos que ali são depositados.

Esse mecanismo de controle sobre a chamada “criação monetária” pelo sistema bancário permite, assim, atuar sobre a quantidade de recursos que são canalizados para consumo. Com isso, tem-se uma redução da massa monetária disponível para a demanda agregada.

Atualmente, por exemplo, a alíquota de recolhimento compulsório sobre os depósitos à vista nas instituições financeiras é de 44%. Em outros tempos, já foi bem maior. No primeiro semestre de 2003, por exemplo, estava em 60%. Em 1999, oscilou entre 65% e 75%. Ou seja, há espaço para uma eventual mudança.

Assim, se o governo pretende endurecer a política monetária, ele pode aumentar o compulsório, ao invés de elevar a SELIC. O efeito sobre a redução da demanda agregada será no mesmo sentido. O impacto sobre o nível de preços será da mesma magnitude.

Já os efeitos sobre a redução do nível de investimento não serão tão negativos, uma vez que as taxas de juros sobre operações poderão ser mais baixas. E a maior parte da sociedade ficará agradecida, uma vez que não haverá o enorme impacto negativo sobre as despesas financeiras do orçamento do Estado nem sobre a valorização indesejada do câmbio.
Fonte: http://cartamaior.com.br/?/Coluna/Taxa-de-juros-ou-deposito-compulsorio-/33859

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