O texto que se segue, foi extraído do livro Infância e História: destruição da experiência e origem da história, de Giorgio Agamben. Ele me trouxe reflexões interessantes, deixo aqui no desejo de que contribua pela leitura, em suas percepções e significações do real e do imaginário, do conhecimento e da experiência, do sujeito e do espírito. Um abraço.
Fantasia e experiência
Nada pode dar idéia da dimensão da mudança ocorrida no significado da experiência como a reviravolta que ela produz no estatuto da imaginação. Dado que a imaginação, hoje eliminada do conhecimento como sendo "irreal", era para a antiguidade o médium por excelência do conhecimento. Enquanto mediadora entre sentido e intelecto, que torna possível, no fantasma, a união de forma sensível e intelecto possível, ela ocupa, na cultura antiga e medieval, exatamente o mesmo lugar que a nossa cultura confere à experiência. Longe de ser algo irreal, o mundus imaginabilis tem a sua plena realidade entre o mundus sensibilis e o mundus intellegibilis, e é, aliás, a condição de sua comunicação, ou seja, do conhecimento. E, a partir do momento em que é a fantasia que, segundo a antiguidade, forma as imagens dos sonhos, explica-se a relação particular que, no mundo antigo, o sonho mantém com a realidade (como na adivinhação per somnia) e com o conhecimento eficaz (como na terapia médica per incubazione). Isto ainda é verdadeiro nas culturas primitivas. Devereux relata que os mohave (nisto não dissímeis das outras culturas xamânicas) crêem que os poderes xamânicos e o conhecimento dos mitos, assim como das técnicas e dos cantos que a eles se referem, são adquiridos no sonho. E não só: se viessem a ser adquiridos em estado de vigília, permaneciam estéreis e ineficazes até que fossem sonhados: "assim um xamã, que me permitira anotar e aprender os seus cantos terapêuticos rituais, explicou-me que eu não teria igualmente poder de curar, pois não havia potencializado e ativado os seus cantos através do aprendizado onírico".
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