Crise chega aos pomares e frutas apodrecem no pé
Produtores tentam sobreviver ao preço baixo pago pela caixa de laranja e a erradicação de árvores doentes
por Paula Pacheco
No silêncio do campo, o som da serra elétrica é perturbador. Da terra vermelha, um monte de pés de laranja é arrancado e será usado pelas cerâmicas da região de Pirassununga, a 213 quilômetros de São Paulo, para alimentar os fornos. O Estado é o maior produtor de laranjas do Brasil. O País é responsável por 40% da produção mundial da fruta e 83% das exportações de suco. Nesta safra, no entanto, a cultura vive um dos piores momentos. O desalento tomou conta dos citricultores por dois motivos: o preço pago pela indústria processadora de suco e o greening, doença que condena as árvores.
Agrônomo e agricultor, Marcos Rosolen tem cerca de 20 mil pés. Já teve por volta de 26 mil e precisou se desfazer de parte do pomar por causa do greening e da crise. Como a propriedade é arrendada, Rosolen decidiu devolver o sítio. Antes, vai acabar com o pomar. O dono da área deve substituí-lo por cana e eucalipto, e Rosolen planeja se dedicar à consultoria. "Vou vender minha casa e pagar as dívidas para tentar recomeçar. Não tenho como investir na propriedade tudo que é necessário com o preço tão baixo pago pela caixa de laranja", lamenta.
Os citricultores afirmam que a atividade é inviável. Ademir Borges, de 62 anos, também vive da laranja. Ele detalha parte da sua composição de custos. Cada caixa de laranja custa R$ 1,60 para a fruta ser colhida e R$ 1,20 de frete até a porta da indústria processadora. O Fundecitrus, instituto de pesquisa do setor, recebe R$ 0,20 por caixa. Custo total: R$ 3. A indústria paga hoje cerca de R$ 3,70 por caixa. Portanto, sobram 70 centavos para despesas fixas, como mudas e agrotóxicos.
Com essa remuneração, muitos produtores têm preferido deixar a laranja apodrecer e virar adubo a empatar dinheiro na colheita. Borges perderá 300 pés por causa do greening.
O citricultor tem uma dívida de R$ 120 mil com o banco e não sabe se vai dar conta de pagá-la. Nos últimos cinco anos, como a atividade anda ruim, ele tem pago as despesas com a renda do pequeno pesque-pague na zona rural de Porto Ferreira.
Oscar Müller deve R$ 200 mil aos bancos. Pouco antes da colheita, ele foi obrigado a se livrar de 2,5 mil pés doentes. Com a baixa remuneração da fruta, ele não consegue fazer o trato correto para evitar que a doença se espalhe pelo pomar. "Antes, toda propriedade tinha um burro. Agora, todo burro tem uma propriedade".
O produtor Pedro Tonetti sugere que o governo ofereça uma garantia mínima de preço pela laranja: "O que se vê é uma indústria concentrada, com quatro empresas, fixando preço".
João Sampaio, secretário de Agricultura do Estado de São Paulo, espera ter uma solução parcial. Ainda em setembro, deve ser apresentado um seguro de indenização aos produtores que arrancaram os pés de laranja com greening. O governo estadual vai arcar com 60% e o federal com 40% do seguro.
Na próxima safra, os citricultores deverão pagar 30% do custo do prêmio. "Isso minimiza o problema. Os produtores devem se mobilizar para vender o suco processado no mercado interno", analisa Sampaio.
O secretário tem razão quanto ao potencial. O brasileiro consome só 11 litros de suco de laranja por ano. E não é à toa. Em um restaurante na beira da rodovia que passa ao lado de Pirassununga, o copo custa R$ 3.
"A laranja vem sendo substituída pelo refrigerante e outras frutas. O citricultor precisa fazer a sua parte. É fácil pegar a laranja, entregar na indústria e responsabilizá-la por encontrar comprador. Há linhas de crédito com juros de 3% ao ano para quem quer renovar o pomar ou montar uma pequena agroindústria", critica Sampaio.
Pedro Becker, assessor da Secretaria de Comércio, Indústria e Agricultura de Pirassununga, também defende que o citricultor vá para as ruas, de forma organizada, para vender a produção: "É preciso encontrar alternativas".
A queda do consumo de suco de laranja é um fenômeno mundial, explica Margarete Boteon, pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo. "Uma política emergencial, abrindo uma das fábricas que estão fechadas daria fôlego ao citricultor. Outra ação seria indenizar os citricultores que estão erradicando as lavouras com o greening."
FONTE: O Estado de São Paulo, Economia & Negócios
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