O impacto da internalização da variável ambiental no paradigma reducionista da Economia tradicional
Afranio Campos*
A variável ambiental possui uma forte complexidade, e até arriscaria dizer que possui uma característica (métastable) de meta-estabilidade[1]. Suponho que a natureza da variável ambiental seja invariavelmente de pura expansão, o que a torna “implosiva” para qualquer modelo econômico matemático ou econométrico conhecido, pois se trata de uma variável multidimensional, isto é, envolve n-elementos nela mesma. Esse caráter dinâmico lhes confere uma razoável, ou melhor, uma considerável importância na configuração de um sistema complexo, econômico e com n-inputs: recursos naturais, capital e trabalho (intelectual, laboral), sobretudo, se se pretende analisar, planejar, acompanhar, prospectar, regular, através da formulação de determinada função de produção que contemple as exigências de condições da sustentabilidade econômica e do equilíbrio temporário inerente a sua instabilidade natural.
Uma concepção ricardiana de rendimentos decrescentes do emprego dos recursos materiais e do trabalho humano, ao meu ver, se tornou caduca, mas com serventia, tanto para os cooptados pelo status quo, tornados gerentes do Estado Democrático burguês, quanto aos vencidos pelo cansaço aceitando os benefícios pecuniários da tecno-burocracia, recompensa que o bom combate da praxis não promete. Certamente, cabe nesse quadro os fiéis da recorrente tese malthusiana que se respaldam direta ou indiretamente na defesa da esterilização em massa, e também aos históricos autores de genocídios.
Se conhecemos o grau de intolerância em que as necessidades humanas e ambientais chegaram – ainda que, com todos os recursos tecnológicos disponíveis para soluções variadas, e irregularmente aplicados do ponto de vista sócio-ecônomico-ambiental -, percebemos que a situação requer decididamente uma atenção redobrada de políticas públicas efetivas, estratégias e ações integradas dos agentes econômicos e das atividades produtivas, cadeias e elos que se fortalecem ao contratarem entre si objetivos coletivos e funções específicas, partes de um todo, formando estruturas complexas tendencialmente estáveis.
Mas, sem esquecer da condição entrópica do sistema ou da enganosa e insistente demagogia do “desenvolvimento sustentável” estimulado por interesses capitalistas (mercado verde, mercado da água, mercado do lixo), em que o esforço de todos tem de pagar pelo erro permanente de grandes grupos empresariais oportunistas que enriquecem cada vez mais, com o caos das crises sistêmicas do capitalismo, com a indústria das armas e guerras, especuladores cruéis da fome e agora também da sede de imensa parcela da humanidade. Numa perspectiva ética da economia do meio ambiente, exigem-se responsabilidades científico-tecnológicas voltadas para um desenvolvimento sócio-econômico-ambiental melhor planejado, com uma visão sensível aos ecossistemas e biodiversidades. Em princípio, uma nova linguagem econômica que exprima seu caráter equânime no âmbito da produção, reprodução e distribuição da riqueza.
Para tal, a questão educacional quanto ao ensino de “como fazer ciência” é também um dos paradigmas de sempre, que tem sua significação para o coletivo, e parece essencial tratá-la de forma diferenciada. Nunca existiu em nenhum lugar do mundo sociedade que querendo crescer economicamente e se desenvolver, que não tenha atentado para a formação de seus quadros de cientistas, pesquisadores e profissionais da educação.
O potencial da combinação dos recursos naturais com o estado da arte tecnológico atuais devem ser considerados, não simplesmente com o diletantismo cínico próprio das “velhas” raposas da academia, acomodadas à quietude de suas salas, ou a inexperiência dos novos e curiosos estudantes da economia, mas fundamentalmente com o olhar cuidadoso de quem sabe o destino do consumismo entrópico ou do empreendedor destrutivo desinteressado com o amanhã; e, nem mesmo, como o dedicado estudioso que procura se atualizar com o mais recente artigo publicado pelos melhores centros de produção de conhecimento, embora recheado de positivismo reducionista em suas predileções por modelos sem qualquer ligação concreta com a história, reforçando a fé na “mão invisível” do livre mercado ou perseguindo o equilíbrio mesmo de curto prazo.
Absurdamente, ainda desfrutam um “passeio pelas curvas” das funções matemáticas da economia, numa completa inversão do real, ao acreditar que a determinação de um modelo signifique, por si, a manipulação concreta da própria realidade, ou pior, seja ela mesma, tratando-a como um simples jogo de números e estatísticas, mostrando o sorriso pretensioso do racionalismo econômico tradicional, afirmando-se como a única opção de resposta consistente.
[1] Segundo Simondon, é “connaitre l’individu à travers l’individuation plutôt que l’individuation à partir de l’individu”. E nesse permanente processo de individuação, a relação entre o ser vivo e o meio ambiente é fundamental. ”Relação” é uma palavra-chave chave do vocabulário de Simondon. Equilíbrio META-ESTÁVEL (métastable), um tipo de equilíbrio que não exclui o devir. Não há oposição entre ser e devir. O devir é uma dimensão do ser, correspondendo a uma capacidade do ser de se defasar (déphaser) em relação a ele mesmo. O ser pré-individual é mais que uma unidade, não se aplicando a ele as noções lógicas tradicionais de identidade e do terceiro excluído. O problema é que desde os gregos, conhecia-se apenas um tipo de equilíbrio, o estável, ao passo que agora, especialmente após a física quântica, podemos falar de equilíbrio META-ESTÁVEL.
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