OuVindo Umbrella com Rihanna
Afranio Campos, pós-verão de 2008.Essa noite eu não dormi. Meu emocional, meus sentimentos andam abalados. Desconheço-me por instantes. Fiquei escutando meu coração bater até o amanhecer. É sim, fui percebendo na pulsação da pele de meu pulso que logo em seguida se estendeu até o peito. Dava para marcar as batidas e seu compasso, 12/ 9. Nada aconteceu ao longo da madrugada. Uma torneira insistia em gotejar, mas parecia que era na vizinhança porque o som vinha lá de fora da janela do meu quarto. Isso não chegava a incomodar, ficava sendo parte de uma sonoridade acompanhante dos tambores do ensaio do Olodun no centro histórico do Pelourinho. O Pelourinho fica bem próximo de onde moro.
Cada canto das paredes do meu quarto tinha um jeito de se mostrar, uma cor, um novo ângulo, diferente do que recentemente acabara de observar, de onde costumava me deitar e mirar em pensamentos que sobravam para além de meus sonhos que resistiam em chegar. Procurei uma "aranhazinha" por companhia e nada de "nadica". Me virei, impaciente. Coloquei o celular bem ao lado junto dos meus óculos de lentes redondas e armação arranhados pelos anos de uso, que brilhava com a réstia de luz que penetrava do lustre do corredor em frente ao meu quarto, e que me fazia acreditar em uma noite tranqüila sem pesadelos. Era a impressão que tinha vendo esse objeto tão comum, de hastes e aros metálicos dourados e transparências cristalinas, revelador de todas as cores e texturas do mundo a minha volta, que de colorido (vocês sabem o que digo) muitas vezes não tem nada.
Senti-me muito cansado ao levantar para ir até a sala, e nesse curto caminhar, após me por de pé, cambaleante, meu corpo tinha um peso meio morto sobre o chinelo que ia sombreando o taco cobrindo o comprido corredor que me levou até a sala. A sala tomou uma dimensão muito maior ao me acolher sem mais outra companhia humana nesses meses que estou morando só e ocupando o quieto espaço de um apartamento de quatro quartos no bairro de Nazaré. Em seus lugares, os objetos, continuam um pouco empoeirados a minha espera como se inanimados possuíssem alguma animação, como sempre me aguardassem para um criativo “bate-papo” silencioso e insólito. O computador permanentemente ligado me ocupou, conectado a Internet, com seu som do cooler soando baixinho no giro lento da madrugada. Com muita informação circulando nas “veias” da via digital que se mantém ativada em quase todas as noites quente-frias-quentes mais quente que fria, desse outono-inverno. O notebook e eu ficamos alguns momentos da noite se notando ociosos e se convidando a um
chat, a TV também participando
zapeando na minha presença sonâmbula.
Curto a TVE noturnamente, assisto os jornais notoriamente sintonizando a Record News, Band News, as reprises do cinema nacional na Globo, o Jô (“Uma Hora” da madrugada!!!) que me chega tocando o seu ridículo bongozinho, no cansaço (eu), num a desejar (dele) nas suas escolhas de pauta e de entrevistados, o que o salva são as bandas legais que aparecem para sacudir a platéia animada, a performance da Silvia Machete (me lembro disso) com sua banana num blowjob que subitamente goza na “boca dela” (que vício, de linguagem eh eh), e mais gente precoce linda, talentosa, como a menina Malu Magalhães conhecedora do repertório, cantando e tocando com originalidade baladas, do Bob Dylan. Acesso, vejo e escuto o canal Mundial (26)
http://www.mundialcom.com.br/ e reparo que é uma má companhia musical (raramente passa cultura de boa qualidade) com uma enxurrada de músicas enlatadas do pop, rap, e hip-hop americanos, exibindo
clips marcadamente produzidos por uma produção cultural geléia geral, ovo mexido, “massificante” e “idiotizante” (endosso o Julio Medaglia), volatilizando toda arrogância da estadounidense riqueza material e sua vaidade luxuriosa estampadas no rosto, na dança, e nos gestos dos negros, brancos e latinos forjados no enriquecimento
american-way-of-life com seus carrões coadjuvantes, roupas estilizadas, correntes e pulseiras grossas de valor em peso, dentes de ouro (hê brega, ignorância de primeiro mundo na maré de uma economia em crise de “desaquecimento”), efeitos visuais e sonoros extravagantes, tipo os que a Madona, com volúpia, introduz aos montes em seus
clips, tudo feito chantili saboroso em
cakes caros para maquiar justamente a pobreza de seus conteúdos. Mas tem hora que descubro muito som legal, músicos e compositores e poetas com seus arco-íris sonoros, literários, abrindo horizontes para a galera dessa geração do “desenvolvimento sustentável”.
É no(as) Altas Horas e sua “vida inteligente” que me vejo vibrando na expectativa de uma coisa genial que impressione (e vira e mexe, acontece) ou que seja curiosamente informativa, e o Serginho Groisman “manda bala” mesmo, trazendo gente boa de fora (Cesaria Evora) e daqui também (Engenheiros do Hawaii, Mariana Aydar, Dominguinhos, Arnaldo Antunes). Sabe, chegou o sono, o que desejo agora, “o que eu (mais) quero: é sossego”, pô não é que chamei "o síndico”, Tim Maia. Fui.
Fala aí, minha gente bonita da música popular brasileira, do cinema, da literatura e das artes. Cantarolo com a Rita Lee e os Titãs (Acústico, em CD) em prosa e verso: a televisão deixou, deixa, a (muita) gente burra demais!