O que é público não é de ninguém
por Daniel Simões Coelho
Nunca antes na história deste país houve tantos concursos como nestes últimos anos. A euforia pela entrada no serviço público criou um mercado promissor onde se destacam os cursos preparatórios, lojas de materiais didáticos, profissionais especializados e entre outros. Tanto assim, que hoje se diz que é mais difícil passar em um concurso que em um vestibular.
Os resultados de pesquisas de institutos respeitados mostraram que o desemprego reduziu significativamente nos últimos cinco anos. A renda dos brasileiros também apresentou um salto considerável, o que levou uma parcela da população a ingressar na tão sonhada classe média. Associado a esses fenômenos está o crescimento brasileiro, apesar de ainda tímido, a economia brasileira foi ovacionada pela estabilidade apresentada frente à última crise internacional.
O termo vestibulando está em desuso em favor do conceito de concurseiros. Verbete que meu MSO Word marcou em vermelho por não reconhecer em seu dicionário. A gramática, aliás, é bem vinda neste debate. O sufixo em “vestibulando” refere-se a algo em processo, ou seja, que em algum momento irá se concluir. Afinal, ninguém deseja ser um vestibulando por muito tempo. Por outro lado, o componente “eiro” é descrito nos manuais como formador de palavras que caracterizam carreira, profissões.
De fato, os concursados ao tomarem posse e exercício de seus cargos não pensam em parar e descansar. Prosseguem a vida como servidores públicos e concurseiros simultaneamente. Sempre em busca de um cargo melhor e, de preferência, com mais status.
O que motiva os jovens a desistir de seus sonhos, não prestarem vestibular e partirem para os cursos preparatórios de concursos? Estabilidade, salários médios maiores que da iniciativa privada e o sonho de trabalhar em uma empresa onde seu chefe não é o dono da empresa.
Esta é uma realidade bem diferente de décadas atrás, onde ser servidor público era quase que motivo de vergonha. Mas as coisas bem que mudaram. Algum tempo atrás fui buscar informações sobre financiamento de um apartamento. Inicialmente o consultor não acreditou na possibilidade de eu realmente está interessado, mas quando disse que era servidor público ele mudou totalmente o comportamento, quase me oferecendo um tapete vermelho para passar.
Quando digo que os jovens abrem mão de seus sonhos não estou afirmando que não seja um sonho ser servidor público. Mas eu, como um servidor público, vejo que a grande maioria está neste ramo pelos benefícios e não pela satisfação. Geralmente quem entra no quadro funcional do Estado após a faculdade se frustra ao saber que não exercerá sua profissão, mesmo que tenha feito concurso para tal cargo. Quantos bacharéis em Direito eu já vi trabalhando em serviços puramente administrativos.
Esse entusiasmo com o concurso me fez perguntar uma vez: Seria hipócrita um pensador liberal ser servidor público? Ainda não descobri a resposta, não que eu seja um pensador liberal, não que eu seja um pensador também.
Fonte: Academia Econômica, 29/01/2011
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