Fantasmas que vagam pela noite morta
(crença afro-brasileira)
É uma visão futurista. Milhões de
zumbis vagando pelo planeta, a procura de suas mercadorias e marcas preferidas.
A temperatura já subiu mais de 1 grau, estamos chegando no ano 2050. A população beira os
9 bilhões. O último bilhão todo integrado à classe média, inclui brasileiros,
chineses, indianos, indonésios, africanos. Talvez isso aconteça em 2030, se
considerarmos a visão dos executivos de empresas globais como Coca-cola ou
McDonald’s. Mesmo o gigante financeiro Goldman Sachs, prevê que mais de 600
milhões de pessoas dos chamados países emergentes atingirão a classe média nos
próximos 20 anos. Aliás, a China será a maior economia do mundo com PIB de 70
trilhões de dólares, seguida pelos Estados Unidos, com 40 trilhões, depois a
Índia, seguida pelos cinco maiores europeus juntos, e em 5º lugar, o Brasil.
A preocupação de muitos
estudiosos, pesquisadores e cientistas é sobre o impacto deste crescimento nas
condições já degradadas do Planeta. Mas essa não é a realidade da elite
econômica deste mesmo Planeta. O que pensam os 1.011 bilionários da lista da
Forbes, de 2010, encabeçada pelo mexicano Carlos Slim, dono da telefonia na
América Latina (276 milhões de clientes), mas com negócios em petróleo,
imobiliárias, turismo, resumindo: representa 40% da Bolsa de Valores do México,
país com 112 milhões de habitantes, 50% na linha de pobreza. Certamente, em
como manter o crescimento econômico indefinidamente, como pregam os clássicos
da economia ortodoxa. Crescimento ao infinito, para um planeta fisicamente
finito.
Número de milionários aumenta
As pesquisas divergem em detalhes,
mas todas realizadas sobre a divisão da riqueza no mundo, apontam para menos de
1% da população com 40% dos ativos. O estudo da Boston Consulting Group, de
Nova York, registrou em 2010 de US$121,8 trilhões em ativos globais sob gestão,
um crescimento de 8%, na comparação com o ano anterior. O número de famílias
estava em 12,5 milhões, com um aumento liderado por Cingapura, uma ilha com 5
milhões de habitantes, mas o maior percentual de milionários do mundo. Seguida
por Suíça, Qatar e Arábia Saudita, que registra o maior número de
arquimilionários - possuem mais de 100 milhões de dólares investidos.
A definição de milionários na
pesquisa envolveu 62 países, de pessoas com mais de 1 milhão de dólares, fora o
patrimônio, investido em algum mercado. São 120 empresas globais administrando
os investimentos dos milionários. Com um detalhe importante: US$7,8 trilhões
investidos fora do país de origem. Quase a mesma cifra que está depositada nos
bancos da Praça de Genebra (Suíça), que é de US$6,8 trilhões. Apesar da fama, a
Suíça detém apenas 23% do mercado de fortunas “offshore” (fora de origem), no
mundo.
Mais um número que auxilia na
compreensão dos caminhos impostos ao Planeta nas últimas décadas, desde os
chamados “30 gloriosos”, período entre 1950-1980, de grande crescimento
econômico e riqueza na Europa e Estados Unidos. Trata-se de um levantamento
realizado por Simon Johnson, ex-economista-chefe do Fundo Monetário
Internaciona(FMI). Entre os anos 2000-2008, algumas pessoas no comando das 14
principais instituições financeiras do mundo, receberam em dinheiro (salário,
bonificações e valor das ações vendidas) em torno de US$2,6 bilhões. Desse
total US$2 bilhões foram recebidos pelas 5 mais bem pagas e também foram as
peças principais na criação das estruturas de ativos de alto risco que levaram
o sistema à beira do abismo. São elas: Sandy Weil, desenvolveu o Citigroup, que
implodiu logo após sua saída; Hank Paulson, expandiu o Goldman Sachs, fez lobby
para garantir mais alavancagem dos bancos, depois virou Secretário do Tesouro e
ajudou a salvar os bancos; Angelo Mozilo, desenvolveu a Country Wide, peça
central na concessão irresponsável de hipotecas; Dick Fuld, comandou o Lehman
Brothers até a falência e Jimmy Cayune, comandou o Bear Stearns até a falência.
Os prejuízos públicos em
comparação aos ganhos deles, ressalta Simon Johnson, foram gigantescos: 8
milhões de empregos nos Estados Unidos e cerca de US$ 6 trilhões, contando
apenas o aumento das dívidas do governo federal americano.
Era do hiperconsumo
Esse modelo, agora, implantado nos
países emergentes, já proporcionou uma nova vida para 447 mil milionários na
China. Ou 126 mil famílias com disponibilidade de investir mais de 1 milhão de
dólares na Índia. A classe média indiana será formada por 583 milhões de
pessoas até 2030. Cerca de quase outro 500 milhões continuarão na linha da
pobreza, conforme pesquisa do Banco Mundial – seria o terceiro maior país em
termos populacionais, porém os números não traduzem a expressão do capitalismo
desregulado, atualmente em voga na economia mundial. O que expressa um novo
sentido às massas, segundo a visão do filósofo francês, Gilles Lipovetsky, um
estudioso do consumismo, é a vontade de comprar, o “acesso democrático às
marcas globais”.
- A felicidade é o valor central,
o grande ideal celebrado sem tréguas pela civilização consumista. Cada vez mais
mercado, cada vez mais estimulações, viver melhor, cada vez mais indivíduo,
cada vez mais exigência de felicidade”.
Vivemos a era do hiperconsumo, o
reinado da mercadoria efêmera, o ápice do hedonismo, a vontade individual de
viver, sem horizontes. Tudo isso multiplicado por cada membro da família, como
a época é de “cada um com seus objetos”. Aumentou ainda mais com a expansão dos
equipamentos eletrônicos, celulares e similares. A era do hiperconsumidor e do
pluriequipamento. Mais de 5 bilhões de celulares, cerca de 245 milhões de
computadores vendidos anualmente no mundo, 20 mil aviões e 10 mil navios
circulando pelo globo, com 3 bilhões de passageiros aéreos. Além de 62 milhões
de carros, já passamos de 1 bilhão em termos mundiais, 50 milhões de toneladas
de papel, 240 milhões de toneladas de plástico e mais de 1 bilhão de toneladas
de aço.
O mundo precisa de crescimento e o
consumo das famílias é o motor que movimenta a economia. No caso dos Estados
Unidos 70%. Mesmo assim, somando todo o consumo da Ásia, com mais de 2 bilhões
de habitantes, ele atinge apenas 40% do consumo dos pouco mais de 310 milhões
de estadunidenses.
Ocidentalização do mundo
Traçar um modelo de consumidor
mundial é um dos objetivos deste texto, embasado em informações dos jornais de
economia dos últimos dois anos. A versão é global porque as marcas são globais.
Toda segunda-feira, Bob Macdonald, executivo-chefe da Procter & Gamble,
formado na Academia Militar de West Point, se reúne com membros da sua equipe,
na frente de um mapa mundi digital. Capaz de identificar a situação dos 250
principais produtos da corporação nos 50 maiores mercados disputados por eles.
Marcas que estão no avião do
Faustão, na promoção da Rede Globo: fraldas Pampers, Gillet, Ariel, Pantene.
São marcas bilionárias, puxadas pelas fraldas que vende US$8,8 bilhões no
Planeta. O xampu divulgado por Gisele Bunchen (Pantene), rende US$3,1 bilhões.
A P&G como é reconhecida fatura US$79 bilhões e tem 4,2 bilhões de
clientes. Aumentou de tamanho em 2007 com a compra da Gillete por US$56
bilhões, representa 10% do seu faturamento.
Até 2015 espera atingir 5 bilhões
de clientes. Aposta nos emergentes. Quer os indianos consumindo Mach 3 (lâmina
de barbear), ao invés de fazer a barba na rua, um costume tradicional na Índia.
Os africanos devem usar produtos de higiene ocidentais. Os brasileiros mais
pasta de dente, e os americanos mais branqueadores para os dentes. Em termos de
faturamento, a rede de supermercados Walmart é a maior com 4,6 mil lojas
espalhadas por vários continentes e US$420 bilhões em vendas. O último lance
foi a compra de uma rede de supermercados na África do Sul.
As lanchonetes Mcdonald’s são 32
mil no mundo, sendo 1.300 na China e mais de 200 na Índia, que inclui cidades
pequenas no interior, onde o aluguel é mais barato, e eles vendem o Mc Aloo
Tikki, com ervilhas e purê de batata. Tudo pela ocidentalização global, como
destaca o economista francês Daniel Cohen no livro, “A Prosperidade do Vício”.
- A elite mundial busca apenas um
objetivo: tornar o modelo único, incluir costumes culturais, comida e bens
duráveis.
É claro que o momento é de balanço
no capitalismo desregulado, compensado pelo crescimento nos países que também
procuram um lugar ao sol. Serão responsáveis pelo crescimento nos próximos
anos. Um outro economista, também já foi chefe do FMI, Joseph Stiglitz, em seu
livro, “O Mundo em Queda Livre ”,
onde aborda a crise de 2008, quando a banca internacional quase despencou
precipício abaixo, traz uma informação importante. A renda dos americanos médios
tem caído desde o ano 2000, em torno de 4% (está em torno de 38 mil dólares). O
modelo implantado nos “30 gloriosos” de compras ilimitadas, baseada no crédito
imobiliário, ou seja, minha casa vale tanto, posso pegar outro tanto
emprestado. Furou, naufragou.
- Os americanos, diz ele, não
podem mais viver neste modelo no século XXI. O consumo terá que ser reduzido em
10%, pelo menos.
Ou seja, a economia dos Estados
Unidos vai continuar patinando por muito tempo, e nunca mais será a mesma. O
problema como acentua o cronista do jornal The New York
Times, Thomas Friedman, no livro “Quente, Plano e
Lotado...” "é que surgiram muitos outros americanos e
o Planeta não tem recursos suficientes para sustentar o modelo".
Vinho francês com gelo
Friedman na verdade não está
somente preocupado com o mundo, mas com a perda da liderança dos Estados Unidos
que deveriam “liderar a revolução verde”. Mas esse ainda é um detalhe. Afinal,
todos têm direito ao crescimento e, por conseqüência, ao resto do pacote, que
inclui modelos de todos os tipos: roupas, sapatos, malas, perfumes, carros,
relógios, iates, vinhos, uísque, apartamentos (que agora estão com os preços
reduzidos na Europa e nos EUA). As empresas globais mudam de foco. Os lucros
não crescem no território de origem, então vamos onde ele está. As griffes
famosas, Louis Vuitton, do conglomerado LVMH, do bilionário francês Bernard
Arnaut (4 na lista da Forbes com 40 bilhões de dólares de patrimônio líquido,
também é acionista do Carrefour), Gucci, do outro conglomerado francês PPR, e
montadoras como a Mercedez Bens, a maior em vendas de carros de luxo, já se
instalaram na China. A Mercedez transferiu o centro de criação do Japão para
Pequim. O luxo é um mercado de US$238 bilhões, em termos globais.
Os chineses gastaram US$114
milhões em vinhos da região de Bordeaux, em 2010. Um banqueiro brasileiro jura
que já viu chineses em Xangai tomando vinho francês caríssimo com gelo e
emborcando uma taça, como se fosse “baijuu”, a cachaça nativa feita de arroz ou
sorgo. Simples questão de adaptação. Afinal de contas, quem pagou US$232 mil em Hong Kong num leilão da
Sotheby’s em 2010, por uma garrafa do Chateau Lafite, safra 1869, não está nem
aí para parâmetros de preços ou convenções ocidentais. Por sinal, os chineses
milionários, onde já foi criada a categoria dos “princelings” (princepezinhos
nascidos na era atual), acostumados a gastar US$1 mil numa garrafa de uísque
escocês, também são apaixonados por relógios. Mantém a média de 4 Cartier por
proprietário.
Um joalheiro privado de São Paulo,
da Griftin, não atende ao público, tem uma definição psicológica para o caso:
- O desejo das pessoas é algo
muito interessante. O desejo de comprar era irresistível para o dono desse
relógio, que custa duas centenas de milhar de dólares, explica ele ao repórter
do jornal Valor (ainda estava com a proteção na pulseira). Depois de satisfeito
esse desejo, o objeto quase que perdeu totalmente o valor para ele”.
Pré-histórico do turboconsumidor
As compras podem ser impulsivas,
principalmente depois que o império da publicidade se instalou no Planeta.
Assim como o luxo se tornou um mercado bilionário, a publicidade abocanhou
US$447 bilhões em 2010, 39,2% para a televisão, segundo os dados do Grupo
Publicis, o terceiro maior do mundo que acabou de comprar a agência de
publicidade DPZ, de São Paulo. O filósofo, Gilles Lipovetsky, diz que a
publicidade nasceu em 1880, nos Estados Unidos – em 1882 a Coca-cola gastou 11
mil dólares para divulgar seu produto. Em 1929 foram quase US$4 milhões. As
mercadorias, até então, eram vendidas anonimamente e a granel, na maioria dos
casos. Sem embalagem, sem marca, em mercados localizados. Somente a partir de
1930 surgiram os supermercados. Embora ainda no final do século XIX, na França,
surgissem os grandes magazines, como Le Bon Marché (1865).
Eram templos deslumbrantes, de
luzes e cores, onde a mercadoria estava disponível diretamente aos
consumidores, sem intermediários. A sensação de comprar e gastar já se tornava
estimulante, sensual e gratificante. Segundo Gilles, o consumidor moderno
começou o “shopping”, a olhar vitrines, nesta época. Nasceu o pré-histórico do
turboconsumidor dos tempos atuais. Marca, embalagem, distribuição, mais a
publicidade instauraram o que desde 1920 se decidiu chamar de “sociedade do consumo”,
hoje, extrapolada ao máximo. A publicidade não vende mais uma mercadoria, vende
uma visão do mundo, uma necessidade psicológica, uma vontade de viver ou de
quase sucumbir, no caso daqueles que não tem a disponibilidade financeira para
comprar, de fato, grande parte da população do mundo. Onde 1 bilhão moram em
favelas, segundo a ONU, e 2 bilhões não tem acesso a água.
No caso do Brasil temos mais 35
milhões na classe média, mas 8 milhões não tem banheiro, e 40 milhões não tem
água tratada em casa, conforme o IBGE. Sem contar os 14 milhões de analfabetos.
600 fábricas terceirizadas
Entretanto, o modelo de consumismo
está implantado e só cresce. A Coca-cola tem como objetivo em 2020 vender 30
bilhões de litros na China, onde detém 15% do mercado, é a líder no segmento
dos refrigerantes. Os chineses tomam apenas 34 garrafas pequenas por ano, muito
longe do líder, os mexicanos, que consomem 674. O Brasil é o quarto com 229
garrafas. A Nike, por exemplo, com suas 600 fábricas terceirizadas, em 48
países, montou seus centros de treinamento no Vietnã e Sry Lanka, depois de
sucessivas denúncias de exploração de mão de obra infantil. Continuará sua
expansão no modelo aprimorado de marca globalizada sem dispor de uma única
fábrica própria, mas tendo 800 mil trabalhadores na confecção dos seus
cobiçados tênis. Foram alvo das revoltas na Grã-Bretanha, recentemente.
Também pode ser o mercado de
diamantes, que já movimentou US$65 bilhões, mas registrou queda depois da crise
financeira, quando mais de mil joalherias fecharam as portas nos Estados Unidos
– 40% do mercado, onde os noivos obrigatoriamente compram anéis de diamantes na
consumação do compromisso. Voltou a crescer em 2010, porém as marcas globais
que dominam o mercado, como a Tiffanys tiveram que entrar no negócio da
mineração. A empresa abriu uma lapidadora de diamantes em Botsuana para
diminuir os custos.
Quem está preocupado com a redução
do faturamento (US$720 bilhões no mundo) são os executivos da indústria
farmacêutica, não pela redução no número de doenças, pela quebra de patentes e
venda de genéricos. Um Planeta degradado enfrenta cada vez mais o aumento de
doenças, seja pelo crescimento da obesidade, já atinge 1,6 bilhão de pessoas no
mundo, conforme dados da Organização Mundial de Saúde, sendo 400 milhões de
obesos, seja pelos efeitos da mudança climática, secas e inundações, que
desorganizam os sistemas vivo.
PIB mundial vezes 6
Daniel Cohen fez uma conta futura
sobre o crescimento do Planeta em 2050. Se a expansão dos emergentes continuar,
e a renda per capita atingir os quase 38 mil dólares dos norteamericanos (dados
de 2005), o PIB global teria que sair dos US$70 trilhões para o patamar de
US$420 trilhões. O custo para o mundo seria multiplicado por seis, com todas as
conseqüências imagináveis. Por exemplo, a Siemens, multinacional alemã,
especializada em energia e saúde, faturamento de US$70 bilhões prevê para 2025
cerca de 29 megacidades com mais de 10 milhões de habitantes – atualmente são
21. Como definiu o presidente da empresa, Peter Loscher “serão imensas manchas
humanas, com muitos problemas para resolver. As cidades no Planeta ocupam
apenas 1% da área e consomem 80% da energia.
Na contramão, o Relatório
Repensando a Pobreza, divulgado pela ONU, no ano passado, apontava:
- Mais de 80% da população mundial
vive em países onde os diferenciais de renda estão se ampliando. Os 40% mais
pobres na população mundial reponde por apenas 5% da renda mundial, enquanto os
20% mais ricos representam 75%. “Para os pobres do mundo, o lema negócios como
sempre jamais foi uma opção aceitável”.
Ao mesmo tempo, em Dubai, o xeque
Al Maktoum pretendia criar uma opção de investimento para ricos globais, lançou
centenas de projetos imobiliários (mais de 400 cancelados no pós crise), mas
um, mundialmente conhecido: o Burj Khalifa, o edifício mais alto com 834 metros . É preciso
esclarecer que o nome oficial do prédio era Burj Dubai. Mas surgiu uma conta
urgente do emirado para pagar no valor de US$10 bilhões, e o Khalifa de Abhu
Dabi pagou e trocaram o nome do prédio, afinal o patrocinador pagou a conta.
Símbolo do poder global envolve 1.044 apartamentos, 160 para um hotel com
quartos projetados por Georgio Armani, piscinas, uma mesquita, a mais alta do
mundo, em seus 200 andares de opulência.
Não por muito tempo. Na Arábia Saudita,
a construtora da família Bin Laden e o príncipe Al Waleed, considerado o árabe
mais rico (US$20 bilhões de patrimônio líquido), tem 7% da News Corp., de
Rupert Murdoch é um grande acionista do Citigroup, quer construir um novo
edifício, que será o maior do maior do mundo, com um quilômetro de altura. O
recorde anterior estava em Taipei, na Ásia, um predinho de menos de 500 metros .
Modelos extravagantes
Modelos extravagantes imobiliários
são uma febre entre os ricos e os muito ricos no Planeta. E atraem emergentes.
O Aman Resort, considerado um projeto para os muito ricos (850 apartamentos no
mundo, em formato de bangalôs, choupanas ou vilas de arrozeiros na Tailândia),
mandou um executivo ao Brasil para vender “villas”, no arquipélago de Turks &
Caicos, território britânico no Caribe, que custam entre US$ 9 e 16 milhões, de
4 a 5 quartos , chef de
cozinha exclusivo, carrinho de golfe, assessoras para marcar mergulhos e etc.
Adrian Zecha, um indonésio, começou o negócio em Cingapura, maior acionista do
Aman, diz que se interessou pelo Brasil, quando viu brasileiros pagando diárias
entre US$5 e 10 mil em seus resorts.
Não chega nem perto dos US$100
milhões que o bilionários russo Yuri Milner pagou por uma mansão de estilo
francês no Vale do Silício (Califórnia), novo recorde de valor para uma casa
nos Estados Unidos. O ucraniano Rinat Akhmetov comprou dois dos mais caros
apartamentos já vendidos em Londres por US$222,5 milhões. Em Paris, uma
princesa do Golfo Pérsico gastou US$96,5 milhões em 2010 por uma mansão com
pátio, jardim e capela, na margem esquerda do rio Sena. Como escreveu o
comentarista do The Wall Street Journal: “são os estrangeiros milionários
aproveitando a queda nos preços dos imóveis dos países ricos”.
A incorporadora e corretora
Fortune International investiu no Brasil para vender o edifício de 50 andares,
Jade Ocean, com piscinas infinity, cinema prive, área para crianças com mobília
Philipe Starck, coberturas duplex custam entre US$2,9 e 5 milhões – 85% dos
apartamentos vendidos a estrangeiros.
A vida é uma festa
Também podemos relacionar, não com
tanta extravagância, os mais de US$5,9 bilhões que os brasileiros gastaram em
2010 nos Estados Unidos, 423 mil visitaram Nova York, onde gastaram quase 6 mil
dólares por cabeça, ocupando a quarta posição entre os turistas globais. Duas
coisas chamam a atenção no modelo mundial de consumo. A extravagância
registrada pelos emergentes, como bem definiu o executivo do grupo Publicis,
recentemente, em visita ao Brasil, Maurice Levy:
- Nesses países temos,
normalmente, duas situações distintas. Uma parte da população ainda vive abaixo
da linha de pobreza. Mas a fatia que integrou a classe média tem como modelo de
consumo o ocidental: eles querem tudo rápido, as últimas marcas, o que está
mais na moda, os carros e os relógios mais luxuosos. Nesse caso é uma
oportunidade para os anunciantes que “é preciso aproveitar”.
E a outra: a mediocridade de
copiar tudo dos países ricos e de sua elite. Em Xangai, por exemplo, a Diageo,
maior na venda de destilados do mundo (dona da marca de uísque Johnny Walker)
reformou um palacete colonial com paredes de cevada e garrafas de uísque.
Gastou US$3,2 milhões. Para ensinar os novos bebedores, e também aos barzeiros,
como se deve beber o precioso líquido. Incluir chá verde pode. Na China o
consumo maior é The Johnny Walker, a garrafa custa 3 mil dólares. Na Índia, a
empresa dona da marca Contreau (conglomerado PPR), patrocina eventos sociais,
com integrantes da elite de Nova Déli, para divulgar suas bebidas. Um desses
promotores, Vikrant Nath, diz que a vida é uma festa, ao receber 25 prósperos
profissionais, todos vestidos a moda ocidental, conforme relato da Associated
Press, interessados em bebidas finas.
- Queremos saber sobre a boa vida
e aprender a receber as pessoas – diz a esposa Akka, na entrada da casa de três
andares. Isso inclui aprender mais sobre as grifes de luxo, que são vendidas na
Índia. O número de indianos com patrimônio de US$1 milhão para investir cresceu
51%, depois da crise de 2008, segundo levantamento da Merryl Linch. São 126 mil
pessoas. O produtor Nath faz entre 15 e 20 eventos por mês. A Índia, ainda
segundo a agência de notícias é a maior fabricante de bebidas alcoólicas da
Ásia produzidas ilegalmente, são 700 milhões de caixas. E uma percentagem de 5%
da população (60 milhões de pessoas) são consideradas alcoólatras.
Última tentativa: testosterona
Boomers são os nascidos do
pós-guerra, na década de 1950, nos Estados Unidos. Muitos enriqueceram e
ficaram conhecidos por seus gastos. Comenta-se que sustentaram as vendas de
Mercedez Bens e BMW antes da crise (a Mercedez vendeu 245 mil carros até 2007).
Viraram modelo para os emergentes. Embora um tanto envelhecidos ainda sustentam
os gastos de novidades nos Estados Unidos. Nesse caso, da indústria farmacêutica.
A última moda da indústria antienvelhecimento é a venda de produtos a base de
testosterona (hormônio masculino). As vendas desse segmento chegam a US$80
bilhões. Surgiram problemas com algumas embalagens, como cremes, podem colar em
outras pessoas ou diluir na água. É a última tentativa de manter de pé os 70%
do consumo, já que a dívida das famílias estadunidenses é quase tão grande
quanto a dívida do país – mais de US$13 trilhões.
Os consumidores dos EUA recebiam
até 2007, mais de 6 bilhões de cartões de crédito pelo correio. O número caiu
para 1,4 bilhão depois da crise. Um dos quatro bancões (Bofa, Citi, Goldman, JP
Morgan) anunciava na televisão: “aprovado ao nascer”. Na era do neuromarketing,
quando as glândulas sudoríparas dos humanos são monitoradas, e suas áreas
cerebrais fotografadas, os consumidores são enquadrados por categorias desde o
nascimento: bebê, infantil, pré-adolescente, adolescente, jovem adulto e
sênior. Nada escapa. Como acentua Gilles Lipovetsky, no livro “A Felicidade Paradoxal”:
- Enquanto a vida cotidiana for
dominada por esse sistema de referência a menos que se enfrente um cataclisma
ecológico ou econômico, a sociedade de hiperconsumo prossegue em sua
trajetória... antropólogos analisarão no futuro a civilização esclarecida em
que o homo sapiens prestava culto a um deus tão derrisório quanto fascinante: a
mercadoria efêmera”.
Não deixa de ter razão. A
velocidade do crescimento dos shopping no Brasil, futura quinta economia, é
impressionante. Em 2008, eram 377. Em 2011, serão 422. Em Porto Velho , capital
de Rondônia, onde duas hidrelétricas serão inauguradas a partir do próximo ano
colocaram tapete vermelho na inauguração. Tem mais 30 projetos em lançamento no
Brasil. Custa em média R $200
milhões a construção de um shopping.
Marcha rumo à felicidade
A China pretende adquirir 200
milhões de carros até 2020, em 2010 produziram 18 milhões. A história universal
tem um sentido, diz Gilles Lipovetsky, ela não é mais que o progresso rumo ao
infinito da humanidade, a marcha desta rumo à felicidade mais completa.
Cada um escolhe a marcha que acha
mais provável. Eric Hobsbawn, historiador inglês, no final de “A Era dos
Extremos”, onde analisou os acontecimentos do século XX, incluindo as duas
guerras mundiais (50 milhões de mortos) ”se a humanidade repetir o que já fez
nos séculos passados e no presente, só tem um futuro: a escuridão”.
Em 1970, quando a NASA lançou o
projeto da Estação Espacial Internacional, os cientistas e políticos da época
falavam do futuro da humanidade. Em breve os foguetes viajariam rapidamente ao
espaço, por preços baratos. A Estação Espacial seria a plataforma para alcançar
outros planetas. Quarenta anos depois, ao finalizar o programa do ônibus
espacial – 202 bilhões de dólares de custo -, sem contar os US$100 bilhões da
própria Estação, o que temos? Cadê os outros planetas. A facilidade da
tecnologia que nos levaria ao infinito espacial?
A viagem, agora, custará ao
governo dos EUA, nas cápsulas russas da nave Soyus, US$43 milhões por
astronauta. A NASA agendou 45 assentos até 2016. O ônibus lançou o telescópio
Hubble, que nos deu imagens belíssimas do Universo. Na Estação, experiências
importantes, sem gravidade, são praticadas. E o resto? Essa prepotência da
tecnologia, o domínio da técnica sobre tudo, se compara a arrogância da
economia ortodoxa, responsável pela sustentação desse sistema no Planeta. Quer
levar as compras à eternidade, mesmo sabendo com antecedência, que esta marcha
pode ser a dos zumbis, fantasmas que vagam pela noite morta, quando o Planeta
não suportar mais o peso do modelo.
(*) Najar Tubino é jornalista com mais de 30 anos de carreira. Nos
últimos anos tem se dedicado à temática ambiental. É autor do livro O
Equilíbrio, publicado em 2005. E-mail: najartubino@yahoo.com.br
Fonte: Carta Maior | Economia, 16/09/2011
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