[EcoDebate]
A relação dos economistas com o meio ambiente passa, indubitavelmente, pela
seguinte pergunta: Quando é que
os economistas vão entender definitivamente que a economia é apenas um subsistema do meio ambiente?
Tal qual ocorre com o debate em torno da
necessidade de se incluir as pessoas nas análises econômicas, fato esse quase
sempre ignorado pela economia tradicional, também a questão do meio ambiente e
sua relação com o todo da economia enfrenta certa
resistência. Inserir essas duas análises (pessoas e meio ambiente) no conjunto
da economia não é tarefa fácil.
No caso específico das relações do processo
econômico com a natureza essa dificuldade se agrava pelo seguinte fato: a
tradicional economia sempre viu a natureza como mera participante do processo
produtivo, o que é um erro crasso, pois, com isso, não se leva em conta que
essa mesma economia precisa da natureza, e não o contrário.
De toda sorte, a economia jamais pode ser
pensada, ensinada e mesmo levada a sério em seu arcabouço teórico e analítico
partindo-se do pressuposto de que o diagrama do fluxo circular é hermeticamente
fechado, isolado e restrito; como se com isso não houvesse nada mais além das
famílias e empresas, insumos, renda e despesas, convivendo-se num mercado de
fatores de produção apontando apenas para o produto final. Ora, considerar o
fluxo circular como um dos principais paradigmas da economia é abster-se por completo
da interrelação existente entre a economia e a natureza.
Os verdadeiros postulados da ciência econômica
devem considerar para efeito de justa explicação que há uma relação de troca
entre o sistema produtivo e a natureza. Dessa forma, defendemos que a economia
deva ser entendida como um subsistema de um sistema maior: o meio-ambiente.
É imperioso então romper com a ideia dominante que faz a economia passar por
cima das questões ambientais.
Partindo-se desse primeiro comentário que em si
encerra uma visão míope do sistema econômico antigo, dono de uma visão fechada
e não passível de relação para com as causas naturais, é possível remexer nessa
história para acrescentar algo de suma importância: inserir a temática do meio
ambiente no contexto econômico e, com isso, de certa forma, passar a recontar a
história econômica.
Nesse pormenor, como bem aponta Clóvis
Cavalcanti, estudioso das relações da economia com o meio ambiente, é
necessário entender, definitivamente, que “não existe sociedade (e economia)
sem sistema ecológico, mas pode haver meio ambiente sem sociedade (e
economia)”.
A economia do “fluxo real” é considerada de
forma diferente da economia do “fluxo circular”, ignorando o que realmente se
sucede em termos reais de movimentação dentro de um sistema econômico, a saber:
entra (materiais) e sai (resíduos); entra matéria e energia, sai ejetada a
poluição.
Nesse ponto, chamamos a atenção que o desenho
aqui apresentado é o seguinte: fluxos de entrada (materiais e energia) e de
saída (produtos e resíduos ejetados) precisam ser considerados em sua essência,
e não relegados ao esquecimento como tem sido comum.
Esse fluxo real com todas suas interações consiste
apenas num subsistema de algo muito maior: o sistema ambiental, visto ser esse
um sistema “inteiro”, completo e repleto de interações. Tal sistema, é
importante frisar, engloba todas as leis; incluindo as leis econômicas que
determinam a capacidade de produção.
Dessa forma, é equivocado pensar a economia
isoladamente. A economia é apenas uma parte de um todo; o todo, que fique bem
claro, é o meio ambiente. Logo, a economia por essa ótica é como se fosse um
algo a mais expandindo
o ambiente. Visto que a ciência econômica sempre avança, até por ser de
natureza dinâmica, e não estática, cabe à economia dentro dessa visão estender
análises e procedimentos para os problemas derivados da relação (interação) não
consensual entre o homem e o meio ambiente. Essa relação, grosso
modo, envolve alguns aspectos: alterações do clima que são
potencialmente provocadas pela ação do homem; exagero de produtos tóxicos
ejetados no meio ambiente como resposta à política de crescimento sem respeito
aos limites físicos do Universo; a falta de energia e matéria para lidar com
sociedades cujos desejos de consumo são cada vez mais intensos, desconhecendo
com isso a existência de limites e imposições.
Nessa relação entre a economia e o meio ambiente, convém mencionar
de antemão que ao propormos a “defesa do meio ambiente” não estamos apenas
desejando “defender” o ambiente em si, mas sim e, especialmente, a espécie
humana; simplesmente, estamos “defendendo” a nossa possibilidade de termos
continuidade à vida. Isso se deve ao seguinte argumento: se alguém corre risco
de extinção em função do fortíssimo desequilíbrio ambiental provocado
essencialmente pela constante ação/agressão humanas, certamente não é o
ambiente, mas, nós, os seres humanos. É a nossa espécie que corre sério risco
de se extinguir mediante as agressões ao meio ambiente em nome de se buscar a
qualquer preço o propagado progresso econômico. Especialmente em relação a essa
temática, não há dúvidas que o Universo poderá continuar sua longa caminhada
sem a nossa incômoda presença; o Universo “vive” muito bem sem o ser humano; o
contrário, certamente, não pode acontecer. Não à toa, na escala do tempo, o ser
humano foi à última coisa que apareceu no Universo; isso quando
as luzes da criação já estavam quase se apagando. Portanto, o Universo soube e,
certamente, saberá (con) viver muito bem sem seus incômodos, inconvenientes e agressores
hóspedes.
Destarte, se temos (a nossa espécie) qualquer
pretensão em continuarmos desfrutando dos prazeres desse mundo, que tratemos
urgentemente de resguardar à nossa casa, à nossa Gaia. Nesse pormenor, a
economia pode a bom termo ser de grande valia; desde que aplique uma justa e
perfeita sintonia nessa relação de exploração das coisas naturais.
Nessa linha sistemática de defesa em torno do
meio ambiente, quando se aponta dedo em riste sobre a atividade econômica,
pontuando a exploração de recursos em favor de um crescimento antieconômico, é
forçoso aventar que o “tipo de economia” que todos pretendemos ver em atuação,
assegurando a capacidade de progresso à geração futura, não está fazendo o jogo
do antiprogresso, do antidesenvolvimento, da antievolução. A questão aponta
justamente em sentido contrário: essa “nova economia”, que interage com o meio
ambiente, pautada no bom senso deve procurar, a seu turno, ser uma ferramenta
capaz de fazer os homens enxergarem que uma produção com limites é razoável,
pois é potencialmente capaz de assegurar na atualidade a continuidade da
existência de todos.
O que fazemos questão de frisar se refere à
defesa de políticas macroeconômicas que recomendam o crescimento tendo em
conta, essencialmente, a existência do meio ambiente a ser cuidadosamente
“manejado”. Nesse ínterim, não há como escapar da seguinte premissa: crescer
significa usar o meio ambiente, e mais crescimento significa menos meio ambiente.
Aqui, então, há de se criar maneiras para um
bom e adequado uso das coisas naturais. O que não se pode (e não se deve)
considerar e aceitar é a existência de um fluxo monetário que somente vê a
natureza como uma externalidade negativa. Em
termos de conceitos econômicos, a natureza jamais foi ou será um dia uma externalidade.
Dessa maneira, se tudo for visto pelas lentes
do conceito criado pelos economistas como sendo “externalidades”, chegar-se-á
facilmente a conclusão de que não há limites ao crescimento econômico. Assim,
qualquer tentativa de crescimento da economia não envolveria, por definição, os
chamados custos de oportunidade. Ora,
isso é um falso dilema. É evidente que na busca pelo crescimento econômico há
diversos custos de oportunidades pelo caminho, até mesmo porque vivemos num
mundo marcado pela inexorável lei da escassez. Não há como
fugir disso.
A ênfase – se não for essa a principal
constatação desse pressuposto -, é a tentativa de explicar o comportamento
humano condicionado pela implacabilidade da escassez. A vida, por sinal, também
repete essa história, pois viver significa constantemente enfrentar uma
sucessão contínua de escolhas, representando na maioria das vezes conflitos de
valoração. Como a economia essencialmente estuda a vida comportamental dos
consumidores, produtores e dos agentes econômicos, nada mais propício imaginar
que estamos nos referindo a uma ciência que trata a todo instante desses
conflitos (trade-off).
Visto por esse prisma, as escolhas (na verdade,
os conflitos) nos conduzem inevitavelmente ao processo que nós economistas
denominamos custos de oportunidades.
Ademais, ao escolher certa opção estamos
concomitantemente abrindo mão de outras possibilidades. A essa possibilidade
não escolhida consiste, pois, no conceito de custos de oportunidades. Vejamos
então que não há escapatória: os custos de oportunidades estão inseridos no
processo de escolhas que permeiam a ação econômica; que permeiam, por sua vez,
a atuação das pessoas dentro daquilo que poderíamos chamar no bojo de sistema econômico. Fechar os
olhos a isso é faltar com a coerência em termos de análise mais séria, sensata
e consistente. Portanto, que a economia “manejada” pelas mãos dos economistas
profissionais respeite, em tempo, o fato de que a natureza não pode ser
ignorada. Antes, é de fundamental importância ter em conta que, sem a natureza
não há economia e, evidentemente, não há vida.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista
e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO (São Paulo). Especialista em
Política Internacional pela (FESP) e mestre pela (USP). Blog – http://blogdoprofmarcuseduardo.blogspot.com
Fonte: EcoDebate, 08/09/2011
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