O novo Código Florestal e o impacto na água.
.
“O novo Código Florestal não está considerando o papel dinâmico da vegetação no sistema ambiental”, declara José Galizia Tundisi, referindo-se à redução e utilização de áreas alagadas e florestais para o plantio. O pesquisador explica que as matas e áreas ripárias são fundamentais para a manutenção do ciclo hidrológico e a não preservação desses territórios irá interferir diretamente na quantidade e na qualidade da água. “A vegetação constitui um componente muito importante para o ciclo da água, porque ela a retém e a infiltra no solo, contribuinto com ar para atmosfera através da transpiração e da evapotranspiração”.
“O novo Código Florestal não está considerando o papel dinâmico da vegetação no sistema ambiental”, declara José Galizia Tundisi, referindo-se à redução e utilização de áreas alagadas e florestais para o plantio. O pesquisador explica que as matas e áreas ripárias são fundamentais para a manutenção do ciclo hidrológico e a não preservação desses territórios irá interferir diretamente na quantidade e na qualidade da água. “A vegetação constitui um componente muito importante para o ciclo da água, porque ela a retém e a infiltra no solo, contribuinto com ar para atmosfera através da transpiração e da evapotranspiração”.
Em entrevista concedida por telefone para a IHU
On-Line, José Galizia Tundisi também explica que, caso o novo
texto do Código Florestal seja aprovado, o custo com o tratamento da água
poderá aumentar porque a “remoção, tanto de áreas alagadas como de vegetação,
causa naturalmente uma perda de qualidade da água”, menciona. E esclarece:
“Onde há a preservação dos mananciais, gastam-se no máximo 2 ou 3 reais por 1000 metros cúbicos
para tratar a água, enquanto em regiões degradas gastam-se mais de 300 reais
para tratar a água, só com substâncias químicas. Essa diferença é o trabalho
que a vegetação e as áreas alagadas fazem e que serão retirados pela insanidade
do Código Florestal”.
O texto do novo Código Florestal começou a ser discutido na
Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle –
CMA, na manhã de ontem, 21-11-2011.
A votação do texto deverá acontecer na próxima
quarta-feira. Caso aprovado, o projeto segue para o Plenário, para a última
etapa de tramitação no Senado.
José Galizia Tundisi é graduado em História Natural, mestre em
Oceanografia na University of Southampton e doutor em Ciências Biológicas
(Botânica) pela Universidade de São Paulo – USP. Atualmente é professor titular
aposentado da USP e professor titular do curso de Qualidade Ambiental, da
Feevale. É presidente da Associação Instituto Internacional de Ecologia e
Gerenciamento Ambiental – IIEGA e pesquisador do Instituto Internacional de
Ecologia – IIE.
Confira a
entrevista.
IHU On-Line Que impactos o novo texto do Código Florestal pode
gerar nos recursos hídricos?
José Galizia Tundisi – O ponto fundamental é que a vegetação
constitui um componente muito importante para o ciclo da água, porque ela a
retém e a infiltra no solo, contribuindo com ar para atmosfera através da
transpiração e da evapotranspiração. Portanto, a vegetação tem uma função
dinâmica no ciclo da água. A remoção desta vegetação vai justamente causar
problemas qualitativos e quantitativos na água, porque a vegetação filtra
materiais em suspensão, metais pesados, e retém estas substâncias e elementos em
suas raízes. A quantidade da água também será prejudicada porque a reposição da
água subterrânea fica prejudicada pelo corte da vegetação. O novo Código
Florestal não está considerando esse papel dinâmico da vegetação no sistema
ambiental.
IHU On-Line – Em sua opinião, como o novo texto do Código
Florestal aborda a questão da preservação das florestas?
José Galizia Tundisi – O novo texto do Código Florestal ameaça
transformar as florestas ripárias, que são aquelas florestas derradeiras de
rios, em Áreas de Proteção Permanente – APPs. Toda propriedade tem que ter uma
área de proteção permanente, e os defensores do novo Código querem incluir
essas florestas ripárias na porcentagem das APPs. Qualquer diminuição dos
mosaicos da vegetação da bacia hidrográfica é prejudicial.
IHU On-Line – O novo texto do Código Florestal permite esse tipo
de plantio? Quais os equívocos do plantio em áreas alagadas?
José Galizia Tundisi – As áreas alagadas têm um papel
fundamental na remoção de substâncias e elementos das raízes do sistema, e
também são importantes para a recarga dos aquíferos. O Brasil tem 600 mil km²
de áreas alagadas, qualquer remoção de tais áreas causará problemas
significativos na qualidade e quantidade de água, porque junto com a vegetação
existem outros elementos fundamentais na proteção da qualidade e da renovação
das águas. Além disso, elas são importantes porque controlam as enchentes,
especialmente em regiões urbanas. Portanto, a proteção das áreas alagadas é
fundamental no processo de gestão das bacias hidrográficas. Sua remoção para o
cultivo de outras plantas também é prejudicial ao ciclo da água.
IHU On-Line – Com que frequência as áreas alagadas costumam ser
degradadas e usadas para a agricultura?
José Galizia Tundisi – O Rio Grande do Sul utiliza muitas áreas
alagadas para plantar arroz, mas em outras regiões do país ainda há certa
preservação. Se houver uma recomendação explícita no novo Código Florestal de
que essas áreas alagadas possam ser removidas, certamente sua utilização será
ampliada e, consequentemente, haverá uma degradação ainda maior da vegetação
dos mosaicos. A combinação de áreas alagadas, matas ripárias e mosaicos de
vegetação nas bacias hidrográficas é que faz a diferença na preservação
ambiental. O conjunto de elementos estruturais de uma bacia hidrográficas: as
matas, as matas galeria e as várzeas é que consegue manter os ciclos
funcionando nas bacias hidrográficas e que mantém a qualidade e a quantidade de
água. Retirando-se tais componentes, retiram-se as áreas tampão, permite-se que
escorra mais material para os rios e que degrade a qualidade da água. Isso irá
gerar um prejuízo grande, inclusive para a agricultura brasileira.
IHU On-Line – Os custos com o tratamento da água serão elevados
caso o novo texto do Código Florestal seja aprovado? Por quê?
José Galizia Tundisi – Quando se têm áreas com vegetação e
mananciais preservados, não é preciso usar tantos insumos químicos para fazer o
tratamento de água, pois ele é feito naturalmente pela vegetação, pelas raízes,
pelos componentes e pelas áreas alagadas. A remoção, tanto de áreas alagadas
como de vegetação, causa naturalmente uma perda de qualidade da água. Então,
será necessário gastar mais dinheiro para tratá-la, utilizando mais substâncias
químicas para tratar esta água e recuperar a sua potabilidade. Em algumas
regiões, onde há a preservação dos mananciais, gastam-se no máximo 2 ou 3 reais
por 1000 metros
cúbicos para tratar a água, enquanto em regiões degradas
gastam-se mais de 300 reais para fazer o mesmo só com substâncias químicas.
Essa diferença é o trabalho que a vegetação e as áreas alagadas fazem e que
serão retirados pela insanidade do Código Florestal.
IHU On-Line – De que maneira o novo texto do Código Florestal
pode prejudicar a agricultura?
José Galizia Tundisi – Pode prejudicar a agricultura de várias
maneiras. Vai degradar a qualidade da água dos rios que passam pelas fazendas,
pelas regiões de plantação, e, com a diminuição das matas ripárias, os rios
ficarão desprotegidos. A quantidade de água será diminuída, porque tanto a água
superficial como a subterrânea dependem muito da presença da vegetação.
IHU On-Line – Como o Código Florestal aborda hoje a plantação de
arroz em áreas de várzea, a questão da pecuária no Pantanal e as culturas que
são cultivadas em encostas ou topos de morros? Como esses casos deveriam ser
abordados na reformulação do Código Florestal?
José Galizia Tundisi – O Código não se refere muito a essas
questões, o que é bastante ruim. O Código não dá muita atenção às áreas
alagadas, a não ser pelo fato de que essas áreas serão cultivadas. Portanto,
ele deixa uma brecha para o cultivo nesses territórios. Não se mencionam
especificamente o arroz ou outras culturas. O código que está sendo proposto
ignora a importância das áreas alagadas e não menciona estas importâncias;
simplesmente abre uma brecha para o uso, o que é realmente prejudicial.
IHU On-Line – Como esses casos deveriam ser abordados na
reformulação do Código Florestal?
José Galizia Tundisi – Depende. O arroz é uma gramínea, e,
portanto, seu cultivo faria o mesmo papel que as gramíneas que crescem em áreas
alagadas naturais. Por outro lado, essas áreas alagadas têm outro potencial:
estimulam a biodiversidade, o que não acontece em uma monocultura de arroz, por
exemplo. Uma área alagada natural tem maior diversidade de pássaros, peixes,
insetos, além de plantas diferentes, que num conjunto funcionam muito bem.
Quando as áreas alagadas naturais são substituídas por uma monocultura, embora
não haja um prejuízo muito grande, há naturalmente uma perda das funções da
área alagada.
IHU On-Line – É necessário atualizar o Código Florestal vigente?
José Galizia Tundisi – Sim. É importante atualizar o Código
Florestal vigente, mas o Brasil perderá a oportunidade de criar condições de
proteger a sua biodiversidade e de aumentar a capacidade de uso que dela se
faz, caso seja aprovado o novo Código Florestal.
IHU On-Line – Por que, em sua avaliação, há tanta pressa em
votar o novo Código Florestal?
José Galizia Tundisi – Porque os grandes produtores têm pressa
em aprová-lo. O que está acontecendo é que os grandes produtores estão se
escondendo atrás dos pequenos produtos. Estão dizendo que o novo Código
Florestal vai proteger os pequenos produtores, mas não é verdade. Ele vai
proteger os grandes, e são eles que têm interesse em aprovar o novo texto e,
especialmente, a questão das anistias das multas. A partir da aprovação do novo
Código, eles querem plantar mais. Não sei qual é a pressa em plantar mais, uma
vez que o problema não é aumentar a área plantada, mas sim aumentar a
eficiência da área já plantada. É necessário atualizar o Código Florestal
vigente; mas isso pode ser feito sem assoberbamento, utilizando a informação
científica, equilibrando as informações científicas com o desenvolvimento.
Fonte: Ecodebate, 23/11/2011, publicado pela IHU
On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na
socialização da informação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário