Goldman Sachs: como criar uma crise e governar o mundo
por Eduardo Febbro -
Correspondente da Carta Maior em Paris
A história poderia satisfazer a todas
as expectativas dos adeptos das teorias da conspiração: onde está o poder
mundial? A resposta cabe num nome e num lugar: na sede do banco de
investimentos Goldman Sachs. O banco estadunidense conseguiu uma façanha pouco
frequente na história política mundial: colocar os seus homens na direção dos
governos europeus e do banco que rege os destinos das políticas econômicas da
União Europeia. Mario Draghi, o atual presidente do Banco Central Europeu,
Mario Monti, o presidente do Conselho Italiano que substituiu a Silvio
Berlusconi, Lukas Papademos, o novo primeiro ministro grego, todos pertencem à
galáxia do Goldman Sachs.
Desses três responsáveis, dois, Monti e Papademos,
formam o anexo avançado da política pela tecnocracia econômica, pertencem à
rede que o Goldman Sachs teceu no Velho Continente e, em graus diversos,
participaram nas mais truculentas operações ilícitas orquestradas pela
instituição estadunidense. Além do mais, não são os únicos. Pode-se também
mencionar Petros Christodoulos, hoje à frente do organismo que administra a
dívida pública grega e que no passado recente foi presidente do Banco Nacional
da Grécia, a quem o Goldman Sachs vendeu o produto financeiro hoje conhecido
como “swap” e com o qual as autoridades gregas e o Goldman Sachs orquestraram a
maquiagem das contas gregas.
O dragão que protege os interesses de Wall Street
conta com homens chave nos postos mais decisivos, e não só na Europa. Henry
Paulson, ex presidente do Goldman Sachs, foi em seguida nomeado Secretário do
Tesouro estadunidense, ao passo que William C. Dudley, outro alto funcionário
do Goldman Sachs, é o atual presidente do Federal Reserve de Nova York. Mas o
caso dos responsáveis europeus é mais paradigmático. A palma de ouro quem leva
é Mario Draghi, o atual presidente do Banco Central Europeu, que foi vice
presidente do Goldmann Sachs para a Europa entre os anos 2002 e 2005.
Neste posto, Draghi teve um desempenho mais do que
ambíguo. O título de seu cargo era “empresas e dívidas soberanas”. Precisamente
nesse cargo Draghi teve como missão vender o produto incendiário “swap”. Este
instrumento financeiro é um elemento determinante no ocultamento das dívidas
soberanas, quer dizer, na maquiagem das contas gregas. Esse engodo foi a
astúcia que permitiu que a Grécia se qualificasse para fazer parte da zona do
euro. Tecnicamente e com o Goldmann Sachs como operador, tratou-se de então de
transformar a dívida externa da Grécia numa dívida em euros. Com isso, a
dívida grega desapareceu dos balanços negativos e o Goldmann Sachs ganhou uma
vultuosa comissão.
Depois, em 2006, o banco vendeu parte desse pacote
de swaps ao principal banco comercial do país, o Banco Nacional da Grécia,
dirigido por outro homem do Goldmann Sachs, Petros Christodoulos, ex trader do
Goldmann Sachs e...atualmente diretor do organismo de gestão da dívida da Grécia,
que o mesmo e os já mencionados contribuíram para primeiro mascarar e depois,
incrementar. Mario Draghi tem um histórico pesado. O ex presidente da República
italiana Francesco Cossiga acusou Draghi de ter favorecido o Goldmann Sachs em
contratos importantes, quando Draghi era diretor do Tesouro e a Itália estava
em pleno processo privatizador.
O certo é que o agora presidente do Banco Central
Europeu aparece massivamente indicado como o grande vendedor de swaps em toda a
Europa.
Nesse entrevero de falsificações surge o chefe do
executivo grego, Lukas Papademos. O primeiro ministro foi governador do Banco
Central grego entre 1994 e 2002. Esse é precisamente o período em que o Sachs
foi cúmplice de ocultamento da realidade econômica grega e, enquanto
responsável pela entidade bancária nacional, Papademos não podia ignorar o
engodo que estava montando. As datas em que o cargo coincidem com a operação da
montagem. Na lista de notáveis Mario Monti o segue. O atual presidente do
Conselho Italiano foi conselheiro internacional do Goldmann Sachs desde 2005.
Em resumo, muitos dos homens que fabricaram o
desastre foram chamados agora para tomar as rédeas de postos chaves e com a
missão de reparar, ao custo do bem estar da população, as consequências dos
calotes que eles mesmos produziram. Não cabe dúvida de que existe o que os
analistas chamam de “um governo Sachs europeu”.
O português Antonio Borges dirigiu até há pouco –
acaba de renunciar – o Departamento Europeu do Fundo Monetário Internacional.
Até 2008, Antonio Borges foi vice presidente do Goldmann Sachs. O desaparecido
Karel Van Miert – Bélgica – foi Comissário Europeu da Competição e também um
quadro do Goldmann Sachs. O alemão Ottmar Issing foi sucessivamente presidente
do Bundesbank europeu, conselheiro internacional do Sachs e membro do Conselho
de Administração do Banco Central Europeu. Peter O’Neill é outro homem do
esquema: presidente do Goldmann Sachs Asset Management, O’Neill, apelidado de
“o guru” do Goldmann Sachs, é o inventor do conceito de BRICS, o grupo de
países emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
O’Neill é acompanhado por outro peso pesado, Peter Sutherland, ex presidente do
Goldmann Sachs Internacional, membro da seção “Europa” da Comissão Trilateral –
o mesmo que Lukas Papademos – ex integrante da Comissão de Competição na União
Europeia, Procurador Geral da Irlanda e mediador influente no plano que
culminou com o resgate da Irlanda.
Alessio Rastani tem toda razão. Este personagem que
se apresentou perante o BC como um trader disse há algumas semanas: “os
políticos não governam o mundo. O Goldmann Sachs governa o mundo”. Sua história
é exemplar, de jogo duplo, como as das personalidades e carreiras dos braços
mundiais do Goldmann Sachs. Alessio Rastani disse que ele era um trader
londrino, mas que depois se descobriu que trader não era e poderia ser parte do
Yes Men, um grupo de ativistas que, através da caricatura e da infiltração na
mídia, denunciam o liberalismo.
Entrará para as páginas da história mundial da
impunidade a figura desses personagens. Empregados por uma firma estadunidense,
eles orquestraram um dos maiores calotes já conhecidos, cujas consequências
hoje estão sendo pagas. Foram premiados com o timão da crise que eles
produziram.
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: Carta Maior | Internacional, 19/11/2011
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