A capital da Grécia vê se multiplicarem problemas sociais
derivados da grave crise econômica. Desnutrição, aids, prostituição, drogas e
suicídios são ameaças crescentes. Apesar de o governo insistir em dizer que o
ajuste fiscal é necessário para melhorar a posição do país frente aos mercados
internacionais, os cidadãos vão se convencendo de que o custo social é muito
alto.
A reportagem é de Apostolis
Fotiadis, da IPS, e
publicada no sítio Envolverde,
04-11-2011.
Eis o artigo.
Desde o ano passado, o governo vem aumentando impostos e
reduzindo pensões e salários de servidores públicos. No mês passado, as
autoridades anunciaram que reduziriam o salário de 30 mil servidores estatais
como medida prévia à suspensão de seus contratos, e também que diminuiria as
pensões de quase meio milhão de aposentados do setor.
Além disso, o governo impôs um “imposto de solidariedade”, que
varia de 1% a 4% da renda, dessa forma jogando sobre os contribuintes a carga
dos serviços aos desempregados. Também introduziu taxas adicionais aos
trabalhadores autônomos. E, ainda, elevou o imposto sobre valor agregado da
maioria dos bens e serviços. O dos alimentos subiu de 13% para 23%. Apesar de
todas estas medidas, Atenas não conseguiu controlar a crise.
Na semana passada, a União Europeia concluiu o Acordo de Bruxelas,
destinado a reduzir pela metade a carga da dívida grega. A economia teve
contração de 5% este ano, enquanto o desemprego chegou a 20% da população
economicamente ativa. Em consequência, muitos enfrentam a ameaça da extrema
pobreza pela primeira vez em suas vidas. Muitos ficaram sem teto e, apesar de
aproximar-se o inverno, se reúnem em massa nas principais praças do país.
A organização sem fins lucrativos Doctors of the World (Médicos do Mundo) realiza um programa
voluntário para ajudar os sem-teto e também administra uma policlínica em
Perama, distrito de Atenas, onde a maioria da população economicamente ativa
dependia da construção e reparação das docas. O colapso dessa indústria nos
últimos anos levou à pobreza centenas de famílias do distrito.
Nikitas Kanakis, diretor
da Doctors of the
World, disse que Atenas está à beira de uma crise humanitária.
“Dos 40 meninos e meninas que nosso pediatra examinou há duas semanas, 23
estavam desnutridos”, disse à IPS.
“Há alguns anos pensávamos que este país havia passado a fase em que a falta de
comida era um relevante problema social. Agora estamos fazendo pedidos públicos
de abastecimento, para poder dar aos que necessitam rações secas e roupa, junto
com nossos medicamentos”, acrescentou Kanakis.
Segundo Giorgos
Apostolopoulos, chefe do Centro de Atenas
para Pessoas Sem Teto, a falta de alimentos está chegando a um
ponto crítico. O centro, que distribui refeições várias vezes ao dia para
pessoas necessitadas, experimentou um aumento de 30% nas visitas desde o começo
deste ano. “Oferecemos três mil refeições diárias em nosso Centro , e a Igreja Ortodoxa Grega outras 3.200, por meio de nossas
instalações”, disse Apostolopoulos à IPS. Há alguns dias, o Centro fez um
pedido público de doações de macarrão e molho de tomate em lata para cobrir as
rações do final de semana, que foram afetadas pela falta de recursos.
Cerca de 12 mil refeições são oferecidas em Atenas diariamente aos
necessitados. “Embora tenha havido aumento no número de visitantes, é
extremamente difícil calcular a quantidade exata de pessoas que sofrem
carências, já que os que experimentam essa condição pela primeira vez tendem a
ser muito reservados”, acrescentou Apostolopoulos.
Este ativista destacou que ele e seus colegas atravessam sérias
dificuldades diárias para manter o Centro funcionando. “Consideramos que a
crise econômica e política exerce enorme pressão nas estruturas
administrativas, temos que lutar para sobreviver a cada dia. Acredite, é uma
realidade muito difícil que temos de enfrentar”, contou à IPS.
Outro problema é o abuso de drogas, que agora tomou conta dos
espaços públicos, sobretudo nas proximidades de universidades, sem que haja
vigilância ou esforços de prevenção. Evvagelos Liapis,
médico do Centro para o Controle e a Prevenção de Enfermidades, disse que as
policlínicas móveis do instituto examinaram oito mil pessoas desde junho.
“Embora ainda não possamos apresentar números exatos, já podemos
constatar uma óbvia correlação entre a deterioração econômica e as condições de
saúde de grupos sociais específicos. Os impactos da crise são sentidos,
sobretudo pelas pessoas sem teto, pelos imigrantes ilegais e os viciados em
drogas no centro de Atenas”, ressaltou Liapis à IPS.
“Notamos um significativo aumento das doenças transmitidas por
contato da pele ou sexualmente, como a sífilis. Também estudamos um possível
aumento nos casos de hepatite e do vírus HIV (vírus da deficiência imunológica
humana, causador da aids) entre esses grupos de pessoas”, acrescentou o médico.
Liapis acredita que a deterioração das condições de saúde é o resultado
direto do colapso dos programas sociais, como os de troca de seringas para
viciados em drogas. “Um viciado sem dinheiro seguramente prefere economizar um
euro para sua dose do que comprar uma nova seringa”, o que o deixa sob risco de
contrair o HIV. “Além do aumento das doenças sexualmente transmissíveis, também
temos fortes indícios de aumento da prostituição nas ruas”, acrescentou. E, em
setembro, o ministro da Saúde, Andreas Loverdos,
informou que os suicídios aumentaram 40% nos primeiros meses de 2011.
Fonte: IHU | Notícias, 06/11/2011
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