A capacidade da Ásia de continuar dando sinais de vigor apesar
das dificuldades econômicas do Ocidente está diminuindo lentamente. Na maior
parte do ano, as economias da região da Ásia-Pacífico pareciam estar distantes
da agitação observada em outras partes do mundo. As bolsas caíam junto com as
outras no resto do globo, mas as economias continuavam avançando.
No entanto, nas últimas semanas alguns estalos foram ouvidos nas
poderosas economias da região, e analistas e políticos começam a se preocupar
com a possibilidade de um colapso doloroso que pode se espalhar pela Ásia à
medida que a situação na Europa se deteriora e o crescimento nos Estados Unidos
continua comprometido.
As exportações da Ásia vêm diminuindo há meses com a queda da
demanda, especialmente da Europa. Embora hoje muitos países dependam menos das
exportações, o setor ainda é crucial para economias como as de Taiwan e da
Coreia do Sul, ou para as pequenas economias de Hong Kong e Cingapura.
"Os riscos potenciais para a Ásia aumentaram" à medida
que a crise europeia se alastrou das pequenas economias periféricas, como a
Grécia, e chegou a países mais poderosos como Itália, Espanha e até mesmo
França e Alemanha, disse Frederic Neumann, um dos chefes da unidade de pesquisa
econômica asiática no HSBC de Hong Kong.
As dificuldades econômicas que vêm se propagando ficaram
evidentes na quarta-feira, quando um indicador seguido com muita atenção
mostrou que o setor de manufatura chinês está contraindo.
Publicado pelo HSBC, o índice caiu de 51 em outubro para 48 em
novembro, o menor nível em quase três anos e bem abaixo do que os economistas
esperavam. Uma medida 50 é a linha entre expansão e contração.
Essa queda aumentou as preocupações de um extravasamento dos
problemas do Ocidente para a Ásia. Mas também intensificou o nervosismo na
direção oposta: o Ocidente necessita cada vez mais de uma Ásia forte para
comprar os produtos ocidentais num momento em que os consumidores de outras
partes se colocam à margem.
"Hoje, a Europa está onde os Estados Unidos estavam três
anos atrás: a contração econômica é apenas o início", afirmou Pranay
Gupta, diretor de investimento do ING Investment Management para a região da
Ásia-Pacífico, em Hong Kong.
Até agora as dificuldades econômicas na Ásia têm sido
relativamente pequenas, e grande parte da região está no caminho de um
crescimento econômico vigoroso.
A economia chinesa deve expandir 9,5% este ano, de acordo com
projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) em setembro. A Índia crescerá
7,8%, a Indonésia 6,4% e muitas outras nações do Sudeste Asiático devem
contabilizar um crescimento superior a 5%, de acordo com o FMI. Mas no geral
esses números são inferiores às taxas de crescimento registradas em 2010, e
devem cair nos próximos anos, afirmam muitos economistas e o próprio FMI.
Política monetária. Reagindo à piora do ambiente econômico global,
Indonésia e Austrália reduziram os juros nas últimas semanas. Muitos outros
bancos centrais da região descartaram aumentos que pareciam quase certos há
poucos meses, uma vez que estão menos preocupados com a inflação e mais
interessados no crescimento.
No Japão, as dificuldades aumentaram em consequência do
terremoto devastador, seguido pelo tsunami, em março, e da persistente força do
iene. Diante das dificuldades econômicas em outras partes do mundo, a
valorização da moeda tornou os produtos japoneses mais caros para os
consumidores estrangeiros, reduzindo os lucros dos exportadores. Sem espaço
para reduzir os juros já baixos, o governo interveio diretamente nos mercados -
vendendo ienes por dólares - quatro vezes em pouco mais de um ano, forçando uma
desvalorização da moeda.
No setor financeiro, entretanto, bancos como HSBC, UBS e Nomura
estão cortando vagas no mundo todo. E, embora muitos preferissem crescer na
região da Ásia-Pacífico, centros financeiros como Hong Kong e Cingapura não
escaparam dos cortes e do congelamento de vagas de trabalho.
"Ainda existem áreas de contratação no setor financeiro
asiático, mas a situação ficou mais difícil nos últimos meses", disse
Matthew Bennet, disse o diretor gerente da empresa de recrutamento Robert
Walters.
Com a crise na zona do euro se espalhando para economias mais
fortes, a preocupação é que os efeitos sobre a Ásia possam aumentar. Analistas
começam a se preocupar com o fato de que os problemáticos bancos europeus podem
cortar drasticamente os empréstimos para a Ásia e outros mercados emergentes,
procurando se ajustar às regras mais rígidas para o capital que serão
implementadas no próximo ano.
No geral, os empréstimos bancários continuaram estáveis durante
o primeiro semestre de 2011, informou o Banco Mundial numa análise sobre as
economias do Leste da Ásia, divulgada esta semana. Qualquer fechamento brusco
dos mercados de crédito, como ocorreu após a falência do Lehman Brothers em
setembro de 2008, terá repercussões dolorosas para a Ásia. Nos seis meses após
aquela crise, diz o Banco Mundial na sua análise, os bancos internacionais
reduziram a exposição a empresas em países emergentes do Leste Asiático em US$
36 bilhões.
"Os sistemas financeiros da Ásia, no geral, têm liquidez
suficiente para financiar o crescimento e podem preencher a lacuna. Mas, se os
bancos europeus decidirem não emprestar mais para a região, isso será bastante
problemático, uma vez que será necessário um tempo de ajuste para o déficit de
crédito ser coberto", disse Frederic Neumann do HSBC, acrescentando que,
nos últimos anos, o crescimento na Ásia ficou mais dependente do crédito.
A capacidade das empresas de levantar dinheiro nos mercados de
capital já vem diminuindo. As bolsas asiáticas não deram muita importância para
os fundamentos econômicos favoráveis da região este ano e caíram drasticamente.
Índices-chave em Hong Kong, Índia e Taiwan registraram queda de 20% desde o
início do ano; o que está mais ou menos de acordo com o desempenho das 50 ações
listadas no Euro Stoxx.
Os recursos do mercado acionário na região da Ásia-Pacífico
também despencaram, para cerca de US$ 74 bilhões este ano, até agora,
comparados a quase US$ 159 bilhões durante o mesmo período do ano passado, de
acordo com dados da Reuters.
Apesar de tudo isso, muitos economistas e estrategistas da área
de investimentos acreditam que a região como um todo continua bem posicionada.
As contratações fora da área financeira - especialmente nos setores do varejo,
bens de consumo e turismo e hotelaria - continuam dinâmicas, segundo Bennet da
empresa de recrutamento.
As taxas de desemprego estão bem abaixo das registradas no
Ocidente (3,3% em Hong Kong, por exemplo; 3,1% na Coreia do Sul; 5,2% na
Austrália) comparadas com os 9% nos Estados Unidos e 10,2% na zona do euro, de
modo que os consumidores continuam gastando.
O aumento no número de ricos também transformou nações de grande
população como China, Índia e Indonésia em grandes mercados para produtos,
ajudando a compensar a queda da demanda na Europa e Estados Unidos.
Além disso, muitas economias asiáticas, com exceção do Japão,
não possuem uma dívida soberana enorme como Estados Unidos e Europa. Por
exemplo, o rendimento de títulos de dez anos está agora abaixo das de Espanha e
Itália, uma situação antes inconcebível que mostra como o nível de confiança se
alterou.
Tradução: Terezinha Martino
Fonte: Estadão |
Economia & Negócios, 25/11/2011
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