domingo, junho 20, 2010

mundo globalizado

Este mundo da injustiça globalizada
Texto lido no encerramento do Fórum Social Mundial de 2002.


Começarei por vos contar em brevíssimas palavras um facto notável da vida camponesa ocorrido numa aldeia dos arredores de Florença há mais de quatrocentos anos. Permito-me pedir toda a vossa atenção para este importante acontecimento histórico porque, ao contrário do que é corrente, a lição moral extraível do episódio não terá de esperar o fim do relato, saltar-vos-á ao rosto não tarda.
Estavam os habitantes nas suas casas ou a trabalhar nos cultivos, entregue cada um aos seus afazeres e cuidados, quando de súbito se ouviu soar o sino da igreja. Naqueles piedosos tempos (estamos a falar de algo sucedido no século XVI) os sinos tocavam várias vezes ao longo do dia, e por esse lado não deveria haver motivo de estranheza, porém aquele sino dobrava melancolicamente a finados, e isso, sim, era surpreendente, uma vez que não constava que alguém da aldeia se encontrasse em vias de passamento. Saíram portanto as mulheres à rua, juntaram-se as crianças, deixaram os homens as lavouras e os mesteres, e em pouco tempo estavam todos reunidos no adro da igreja, à espera de que lhes dissessem a quem deveriam chorar. O sino ainda tocou por alguns minutos mais, finalmente calou-se. Instantes depois a porta abria-se e um camponês aparecia no limiar. 
Ora, não sendo este o homem encarregado de tocar habitualmente o sino, compreende-se que os vizinhos lhe tenham perguntado onde se encontrava o sineiro e quem era o morto. "O sineiro não está aqui, eu é que toquei o sino", foi a resposta do camponês. "Mas então não morreu ninguém?", tornaram os vizinhos, e o camponês respondeu: "Ninguém que tivesse nome e figura de gente, toquei a finados pela Justiça porque a Justiça está morta".
Que acontecera? Acontecera que o ganancioso senhor do lugar (algum conde ou marquês sem escrúpulos) andava desde há tempos a mudar de sítio os marcos das estremas das suas terras, metendo-os para dentro da pequena parcela do camponês, mais e mais reduzida a cada avançada. O lesado tinha começado por protestar e reclamar, depois implorou compaixão, e finalmente resolveu queixar-se às autoridades e acolher-se à protecção da justiça. Tudo sem resultado, a expoliação continuou. Então, desesperado, decidiu anunciar urbi et orbi (uma aldeia tem o exacto tamanho do mundo para quem sempre nela viveu) a morte da Justiça. 
Talvez pensasse que o seu gesto de exaltada indignação lograria comover e pôr a tocar todos os sinos do universo, sem diferença de raças, credos e costumes, que todos eles, sem excepção, o acompanhariam no dobre a finados pela morte da Justiça, e não se calariam até que ela fosse ressuscitada. Um clamor tal, voando de casa em casa, de aldeia em aldeia, de cidade em cidade, saltando por cima das fronteiras, lançando pontes sonoras sobre os rios e os mares, por força haveria de acordar o mundo adormecido... Não sei o que sucedeu depois, não sei se o braço popular foi ajudar o camponês a repor as estremas nos seus sítios, ou se os vizinhos, uma vez que a Justiça havia sido declarada defunta, regressaram resignados, de cabeça baixa e alma sucumbida, à triste vida de todos os dias. É bem certo que a História nunca nos conta tudo...
Suponho ter sido esta a única vez que, em qualquer parte do mundo, um sino, uma campânula de bronze inerte, depois de tanto haver dobrado pela morte de seres humanos, chorou a morte da Justiça. Nunca mais tornou a ouvir-se aquele fúnebre dobre da aldeia de Florença, mas a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exacto e rigoroso sinónimo do ético, uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida é o alimento do corpo. Uma justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em acção, uma justiça em que se manifestasse, como um iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste.
Mas os sinos, felizmente, não tocavam apenas para planger aqueles que morriam. Tocavam também para assinalar as horas do dia e da noite, para chamar à festa ou à devoção dos crentes, e houve um tempo, não tão distante assim, em que o seu toque a rebate era o que convocava o povo para acudir às catástrofes, às cheias e aos incêndios, aos desastres, a qualquer perigo que ameaçasse a comunidade. Hoje, o papel social dos sinos encontra-se limitado ao cumprimento das obrigações rituais e o gesto iluminado do camponês de Florença seria visto como obra desatinada de um louco ou, pior ainda, como simples caso de polícia. 
Outros e diferentes são os sinos que hoje defendem e afirmam a possibilidade, enfim, da implantação no mundo daquela justiça companheira dos homens, daquela justiça que é condição da felicidade do espírito e até, por mais surpreendente que possa parecer-nos, condição do próprio alimento do corpo. Houvesse essa justiça, e nem um só ser humano mais morreria de fome ou de tantas doenças que são curáveis para uns, mas não para outros. Houvesse essa justiça, e a existência não seria, para mais de metade da humanidade, a condenação terrível que objectivamente tem sido. Esses sinos novos cuja voz se vem espalhando, cada vez mais forte, por todo o mundo são os múltiplos movimentos de resistência e acção social que pugnam pelo estabelecimento de uma nova justiça distributiva e comutativa que todos os seres humanos possam chegar a reconhecer como intrinsecamente sua, uma justiça protectora da liberdade e do direito, não de nenhuma das suas negações. 
Tenho dito que para essa justiça dispomos já de um código de aplicação prática ao alcance de qualquer compreensão, e que esse código se encontra consignado desde há cinquenta anos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aquelas trinta direitos básicos e essenciais de que hoje só vagamente se fala, quando não sistematicamente se silencia, mais desprezados e conspurcados nestes dias do que o foram, há quatrocentos anos, a propriedade e a liberdade do camponês de Florença. E também tenho dito que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tal qual se encontra redigida, e sem necessidade de lhe alterar sequer uma vírgula, poderia substituir com vantagem, no que respeita a rectidão de princípios e clareza de objectivos, os programas de todos os partidos políticos do orbe, nomeadamente os da denominada esquerda, anquilosados em fórmulas caducas, alheios ou impotentes para enfrentar as realidades brutais do mundo actual, fechando os olhos às já evidentes e temíveis ameaças que o futuro está a preparar contra aquela dignidade racional e sensível que imaginávamos ser a suprema aspiração dos seres humanos.
Acrescentarei que as mesmas razões que me levam a referir-me nestes termos aos partidos políticos em geral, as aplico por igual aos sindicatos locais, e, em consequência, ao movimento sindical internacional no seu conjunto. De um modo consciente ou inconsciente, o dócil e burocratizado sindicalismo que hoje nos resta é, em grande parte, responsável pelo adormecimento social decorrente do processo de globalização económica em curso. Não me alegra dizê-lo, mas não poderia calá-lo. E, ainda, se me autorizam a acrescentar algo da minha lavra particular às fábulas de La Fontaine, então direi que, se não interviermos a tempo, isto é, já, o rato dos direitos humanos acabará por ser implacavelmente devorado pelo gato da globalização económica.
E a democracia, esse milenário invento de uns atenienses ingénuos para quem ela significaria, nas circunstâncias sociais e políticas específicas do tempo, e segundo a expressão consagrada, um governo do povo, pelo povo e para o povo? Ouço muitas vezes argumentar a pessoas sinceras, de boa fé comprovada, e a outras que essa aparência de benignidade têm interesse em simular, que, sendo embora uma evidência indesmentível o estado de catástrofe em que se encontra a maior parte do planeta, será precisamente no quadro de um sistema democrático geral que mais probabilidades teremos de chegar à consecução plena ou ao menos satisfatória dos direitos humanos. Nada mais certo, sob condição de que fosse efectivamente democrático o sistema de governo e de gestão da sociedade a que actualmente vimos chamando democracia. E não o é. É verdade que podemos votar, é verdade que podemos, por delegação da partícula de soberania que se nos reconhece como cidadãos eleitores e normalmente por via partidária, escolher os nossos representantes no parlamento, é verdade, enfim, que da relevância numérica de tais representações e das combinações políticas que a necessidade de uma maioria vier a impor sempre resultará um governo.  
Tudo isto é verdade, mas é igualmente verdade que a possibilidade de acção democrática começa e acaba aí. O eleitor poderá tirar do poder um governo que não lhe agrade e pôr outro no seu lugar, mas o seu voto não teve, não tem, nem nunca terá qualquer efeito visível sobre a única e real força que governa o mundo, e portanto o seu país e a sua pessoa: refiro-me, obviamente, ao poder económico, em particular à parte dele, sempre em aumento, gerida pelas empresas multinacionais de acordo com estratégias de domínio que nada têm que ver com aquele bem comum a que, por definição, a democracia aspira. Todos sabemos que é assim, e contudo, por uma espécie de automatismo verbal e mental que não nos deixa ver a nudez crua dos factos, continuamos a falar de democracia como se se tratasse de algo vivo e actuante, quando dela pouco mais nos resta que um conjunto de formas ritualizadas, os inócuos passes e os gestos de uma espécie de missa laica.
E não nos apercebemos, como se para isso não bastasse ter olhos, de que os nossos governos, esses que para o bem ou para o mal elegemos e de que somos portanto os primeiros responsáveis, se vão tornando cada vez mais em meros "comissários políticos" do poder económico, com a objectiva missão de produzirem as leis que a esse poder convierem, para depois, envolvidas no açúcares da publicidade oficial e particular interessada, serem introduzidas no mercado social sem suscitar demasiados protestos, salvo os certas conhecidas minorias eternamente descontentes...
Que fazer? Da literatura à ecologia, da fuga das galáxias ao efeito de estufa, do tratamento do lixo às congestões do tráfego, tudo se discute neste nosso mundo. Mas o sistema democrático, como se de um dado definitivamente adquirido se tratasse, intocável por natureza até à consumação dos séculos, esse não se discute. Ora, se não estou em erro, se não sou incapaz de somar dois e dois, então, entre tantas outras discussões necessárias ou indispensáveis, é urgente, antes que se nos torne demasiado tarde, promover um debate mundial sobre a democracia e as causas da sua decadência, sobre a intervenção dos cidadãos na vida política e social, sobre as relações entre os Estados e o poder económico e financeiro mundial, sobre aquilo que afirma e aquilo que nega a democracia, sobre o direito à felicidade e a uma existência digna, sobre as misérias e as esperanças da humanidade, ou, falando com menos retórica, dos simples seres humanos que a compõem, um por um e todos juntos. Não há pior engano do que o daquele que a si mesmo se engana. E assim é que estamos vivendo.
Não tenho mais que dizer. Ou sim, apenas uma palavra para pedir um instante de silêncio. O camponês de Florença acaba de subir uma vez mais à torre da igreja, o sino vai tocar. Ouçamo-lo, por favor.

Data: 18/06/2010
Fonte: Carta Maior

sábado, junho 19, 2010

família

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Saramago cidadão

Encontros
por Fundação José Saramago
Os caminhos por onde os homens circulam só aparentemente são complicados. Procurando bem, sempre se encontram sinais de passos anteriores, analogias, contradições resolvidas ou resolúveis, plataformas onde de repente as linguagens se tornam comuns e universais.
In Viagem a Portugal, Editorial Caminho, 21ª edição, p. 237
(Selecção de Diego Mesa)

Saramago, bye

O único céu
por Fundação José Saramago
Além da conversa das mulheres, são os sonhos que seguram o mundo na sua órbita. Mas são também os sonhos que lhe fazem uma coroa de luas, por isso o céu é o resplendor que há dentro da cabeça dos homens, se não é a cabeça dos homens o próprio e único céu.
In Memorial do Convento, Editorial Caminho, 43.ª ed., p. 121
(Selecção de Diego Mesa)

quinta-feira, junho 17, 2010

nordestinos e a transposição do rio

Oito milhões de nordestinos serão vítimas da transposição

Evento em Campina Grande, PB, vai discutir o tema. Representantes dos cinco estados nordestinos envolvidos na transposição do Velho Chico participarão do evento

Imagine uma promessa de prosperidade transformada em pesadelo. Agora multiplique esse sonho mau por um coletivo de oito milhões de nordestinos. Esse é o cenário que será apresentado por especialistas, pesquisadores, famílias vitimadas e sertanejos apreensivos sobre a falsa bonança nesta quinta-feira (17/6), em Campina Grande, quando tem início o Encontro de Atingidos e Atingidas pelo Projeto de Transposição do Rio São Francisco . O evento, pioneiro no Nordeste, acontece até o próximo sábado (19) e causa impacto porque vai além das projeções aparentemente pessimistas dos estudiosos para expor casos reais de nordestinos que já provaram o efeito nocivo da obra encampada pelo governo federal.

Na programação do evento, que será realizado na Casa de Encontro São Clemente, no bairro de Bodocongó, estão lançamentos de livro e projeção de vídeo, discussões sobre o tema, relatos de quem viveu de perto a decepção dos primeiros quilômetros de transposição, apresentação de quesitos técnicos, ato público e homenagens. Tudo permeado por questões essenciais nesse fórum polêmico e necessário: as águas do São Francisco serão mesmo a solução da seca no semi-árido nordestino? A transposição vai beneficiar famílias que têm sede e precisam de água para sobreviver ou prioritariamente as plantações e seus grandes proprietários? Não seria mais eficiente e barato investir em soluções como reflorestamento e limpeza dos rios? Falta mesmo água ou falta melhor distribuição desse bem?

Aos cerca de cem participantes aguardados para o Encontro de Atingidos e Atingidas pelo Projeto de Transposição do Rio São Francisco somam-se entidades e grupos sociais que representam milhares e estão dispostos a listar argumentos contrários à chamada “obra faraônica” do governo federal. Entre eles estão o Banco Mundial, que alerta sobre a “orientação comercial” do projeto; a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que classificou a transposição como inconstitucional; o Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), que acredita no direcionamento do projeto para o agronegócio e não para o desenvolvimento sustentável do semi-árido; da Sociedade Brasileira de Limnologia, que aponta insuficiência de dados sobre o impacto da transposição na ecologia das águas; e ainda a ASA (Articulação do Semi-Árido), que congrega mais de 700 organizações da sociedade civil e defende soluções mais simples, viáveis e eficientes para resolver problemas de má gestão da água no Nordeste brasileiro.

Representantes dos cinco estados nordestinos envolvidos na transposição do Velho Chico participarão do evento. Entre os convidados estão a promotora baiana Luciana Khoury, que falará sobre os aspectos jurídicos do projeto e a atuação do Ministério Público; Rubens Siqueira, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Bahia; Gilberto Queiroz, biólogo e Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento; o engenheiro agrônomo João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, de Pernambuco; além de sertanejos do Ceará e Rio Grande do Norte para contar suas experiências e expectativas com a chegada das águas do principal rio do Nordeste.

O Encontro de Atingidos/as pelo Projeto de Transposição do Rio São Francisco é uma realização da Frente Paraibana em Defesa da Terra, das Águas e dos Povos do Nordeste; da Frente Cearense por uma Nova Cultura da Água e Contra a Transposição do Rio São Francisco; e da Ação Popular pela Revitalização do São Francisco.

* Da Assessoria, no Política PB.
** Colaboração de Ruben Siqueira, CPT/BA, para o EcoDebate, 17/06/2010.
Fonte: EcoDebate.

terça-feira, junho 08, 2010

a nova arquitetura da governança mundial

A geopolítica da desaparição do Euro
Na massa de informações que circula sobre a crise do euro, não é fácil detectar os fenômenos de fundo que se estão produzindo. Por isso, é importante adotar alguma distância, situar essa crise no curso dos acontecimentos dos últimos 20 anos, depois da queda da União Soviética, e projetar uma perspectiva geopolítica de médio a longo prazo. A crise grega confirmou, como se fosse necessário, que a Europa como união política não existe mais.
Nas últimas semanas, a União Européia (UE) revelou ao resto do mundo sua extrema debilidade. O euro não resistiu às ofensivas de todo tipo que sofreu nos últimos meses, apesar de ser a moeda de uma das regiões mais ricas e industrializadas do mundo.
A primeira grande crise financeira mundial da era da globalização evidenciou que a moeda européia não podia aguentar as turbulências do mercado e os ataques especulativos, exatamente porque não tinha um respaldo político sólido e coerente. Os ideólogos ultraliberais que inventaram a moeda européia decidiram aplicar com rigor o princípio do laisser-faire, proibindo aos governos de intervirem nas políticas do Banco Central Europeu (BCE).
Os governos da zona do euro se auto-mutilaram, quando aceitaram o dogma da independência do BCE, renunciando a qualquer possibilidade de submeter as políticas financeiras a condições políticas. Depois de muitas discussões, apresentaram como um grande avanço a decisão de constituir um fundo de resgate de 440 bilhões de euros. E nenhum governo, vendo o desastre social que os planos de ajustes impostos pelo BCE e pelo FMI, quis opor políticas concorrentes à doxa ultraliberal.
O que o público europeu não vê em geral é que, com a intervenção do FMI, os Estados Unidos agora têm direito de intervir na economia européia. Todas as decisões do FMI requerem necessariamente a aprovação do governo estadunidense, se é que não vêm inspiradas diretamente por esse país. Na reforma dos direitos de voto no FMI, anunciada na última Cúpula do G20, os EUA conserva intacta a minoria de controle com 16% dos votos. Pediu-se a UE que reduzisse sua parte para que a cota de países emergentes aumentasse. O presidente Obama exerce plenamente o poder que lhe dá a nova arquitetura financeira internacional, chamada governança mundial, e exige da Grécia e de outros países europeus que baixem os salários de seus funcionários, que reformem o regime de aposentadorias e que diminuam o gasto público em geral. E os europeus obedecem.
Com a crise financeira européia, está se dando um passo a mais no avassalamento da Europa. Com o Tratado de Lisboa, a Europa entregou sua defesa à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN): acabou-se o velho sonho de uma defesa européia independente. E agora, com uma política financeira controlada pelo FMI, a UE renunciou a um pilar essencial de sua independência. Sem a defesa e a moeda, não lhe resta nada para afirmar sua independência dentro do bloco ocidental e frente ao resto do mundo.
Neste contexto, parece lógico que o euro tenda a se aproximar da paridade com o dólar. Fala-se, nos círculos financeiros, de uma possível dolarização da zona do euro. Tecnicamente convém aos países industrializados da Europa, para recuperarem sua competitividade econômica, castigada na última década por um euro forte. Politicamente convém aos Estados Unidos eliminar uma moeda rival do dólar frente a China e a outros países emergentes. Os novos membros da União Européia vêem com muito bons olhos a dolarização da Europa, que seria para eles uma garantia suplementar com que contar, um guarda-chuva estadunidense, como para sua defesa frente a Rússia, seu inimigo de sempre.
O diretor do FMI, Dominique Strauss Khan refere-se com frequência à necessidade de uma moeda mundial, consequência lógica da globalização econômica e financeira. Em Zurique, em 12 de maio, ele fez um chamado a favor da criação de um banco central mundial, com uma moeda mundial. Na França, o Secretário de Estado para a Europa, Pierre Lellouche, militante atlantista incansável, anunciou triunfalmente que no plano monetário se chegou a um mecanismo de solidariedade automática idêntico ao que prevê o artigo 5 do Tratado da OTAN. Com isso, dá-se o último toque à construção de um espaço europeu subsidiário do território estadunidense para formar um bloco perfeitamente homogêneo sob a liderança de Washington. Desde a sua eleição, o presidente Barack Obama pede a seus aliados que cerrem filas para enfrentar as novas ameaças mundiais.

Outro efeito da crise, os planos de ajuste estrutural impostos como remédio, terão como consequência a curto prazo a tatcherização da Europa continental, ou seja, o fim do modelo social europeu. A Grã Bretanha, aliado incondicional dos Estados Unidos, não membro da zona do euro com a libra esterlina, será o grande vencedor dessa crise, com a imposição de seu modelo econômico e financeiro a toda a Europa, e com o fortalecimento da City como praça financeira impermeável a todos os intentos de regulação que se sugere para prevenir novas catástrofes financeiras mundiais.
Com a dolarização da Europa vai se fechar um capítulo da história moderna aberto com a derrubada do campo socialista. Para a corrente atlantista européia, atualmente majoritária, a desaparição da Europa como ator político e financeiro autônomo é o preço a pagar para que o Ocidente continue controlando o mundo frente aos países emergentes.
(*) Pierre Charasse, diplomata de carreira, ex-embaixador, trabalhou no Ministério de Relações Exteriores da França, entre 1972-2009. Ocupou vários cargos nas Embaixadas da República Francesa em Moscou, na Guatemala, em Havana e no México. Foi conselheiro técnico no gabinete de Claude Cheysson, Ministro de Assuntos Exteriores, e de Pierre Joxe, Ministro do Interior entre 1984 e 1986. Foi Cônsul Geral em Nápoles e em Barcelona, embaixador no Uruguai, no Paquistão e no Peru, e embaixador itinerante encarregado da cooperação internacional contra o crime organizado e a corrupção, entre 2000 e 2003, assim como chefe da delegação francesa na Conferência das Nações Unidas sobre o comércio ilícito de armas leves e de pequeno calibre (Nova York, 200-2001), Secretário Geral da Conferência Ministerial “As Rotas da droga da Ásia Central a Europa” (abril de 2003) e Ministro Plenipotenciario desde 1998. Aposentou-se em agosto de 2009. 
Tradução: Katarina Peixoto
FONTE: Carta Maior 07/06/2010.

segunda-feira, junho 07, 2010

racionalidade ambiental (I)

A Capitalização da Natureza e as estratégias fatais do desenvolvimento sustentado*
por Enrique Leff
* trecho do livro Racionalidade Ambiental.

As estratégias de apropriação dos recursos naturais do Terceiro Mundo no marco da globalização econômica se reconfiguraram nas perspectivas da sustentabilidade. Ante a impossibilidade de assimilar as condições de sustentabilidade e os princípios que orientam a construção de uma nova racionalidade ambiental, a política de desenvolvimento sustentado vai desativando, diluindo o pervertendo as perspectivas abertas pelo conceito crítico do ambiente a um desenvolvimento alternativo. Se nos anos 1970 a crise ambiental tornou necessário que se colocasse um freio antes que o colapso ecológico fosse alcançado, a partir dos anos 1980 o discurso neoliberal anunciou a desaparição da contradição entre ambiente e crescimento. Os mecanismos de mercado são postulados como o meio mais correto de assimilação das condições ecológicas e dos valores culturais ao processo de crescimento econômico. Na perspectiva neoliberal, desaparecem as causas econômicas dos problemas ecológicos. A crise ambiental não é mais um efeito da acumulação de capital, mas resultado do fato de não haver outorgado direitos de propriedade (privada) e atribuído valores (de mercado) aos bens comuns. Uma vez estabelecido o anterior – afirma o discurso do desenvolvimento sustentado -, as leis clarividentes do mercado se encarregariam de ajustar os desequilíbrios ecológicos e as diferenças sociais, a equidade e a sustentabilidade.
                O discurso do desenvolvimento sustentado promove o crescimento econômico negando as condições ecológicas e termodinâmicas que estabelecem os limites e possibilidades de uma economia sustentável. A natureza está sendo incorporada ao capital mediante uma dupla operação: de um lado, procura-se internalizar os custos ambientais do progresso atribuindo valores econômicos à natureza; ao mesmo tempo, instrumentaliza-se uma operação simbólica, “um cálculo de significação” (Baudrillard, 1974) que recodifica o homem, a cultura e a natureza como formas aparentes de um mesma essência: o capital. Assim, os processos ecológicos e simbólicos são reconvertidos em capital natural, humano e cultural, para serem assimilados pelo processo de reprodução e expansão da ordem econômica, reestruturando as condições da produção mediante uma gestão economicamente racional do ambiente.[1]
                A ideologia do desenvolvimento sustentado libera o mercado, desencadeando um processo incontrolado e desregulado de produção, um delírio da razão econômica, uma mania de crescimento (Daly, 1991). O discurso da sustentabilidade aparece assim como um simulacro que nega os limites do crescimento para afirmar a corrida desenfreada em direção à morte entrópica do planeta. Afirma-se, assim, um processo que se aparta de toda lei de conservação ecológica e reprodução social para dar curso a um processo que desborda toda norma, referência e sentido para controlá-lo. O discurso da sustentabilidade opera uma estratégia fatal, uma inércia cega que se precipita em direção à catástrofe. O discurso de Baudrillard se reflete e encontra seu referente no discurso do desenvolvimento sustentado e em suas manifestações da crise ambiental quando afirma que:

Estamos governados não tanto pelo crescimento, mas por crescimentos. Nossa sociedade está fundada na proliferação, em um crescimento que continua apesar de não poder medir-se diante de nenhum objetivo claro. Um sociedade excrescente cujo desenvolvimento é incontrolável, que ocorre sem considerar sua autodefinição, onde a acumulação de efeitos vai de mãos dadas com a desaparição das causas. O resultado é um congestionamento sistêmico bruto e um mau funcionamento causado por um hipertelia: por um excesso de imperativos funcionais, por uma sorte de saturação [...] As próprias causas tendem a desaparecer, a se tornar indecifráveis, gerando a intensificação de processos que operam no vazio. Enquanto existir uma disfunção do sistema, um desvio das leis conhecidas que governam sua operação, sempre existirá a perspectiva de transcender o problema. Mas, quando o sistema se precipita sobre seus pressupostos básicos, desbordando seus próprios fins, de maneira que não é possível encontrar-se nenhum remédio, não estamos contemplando mais uma crise e sim uma catástrofe [...] O que chamamos de crise é de fato a antecipação de sua inércia absoluta (Baudrillard, 1993: 31-2).

                O capitalismo engoliu o mundo, mascarou-o e velou-o em sua própria imagem, levado por “essa estratégia exponencial na qual as coisas, privadas de sua finalidade ou de sua referência, se reiteram em um tipo de jogo no abismo”. A hipereconomização do mundo gerou uma

revolução nas coisas que não se dá mais em sua superação dialética, mas sim em sua potencialização, em sua elevação à potência dois, a potência n, dessa ascensão aos extremos na ausência de qualquer regra de jogo [...] Parece que as coisas, tendo perdido sua determinação crítica e dialética, só puderam se redobrar em sua forma exacerbada e transparente [que] nos leva para um êxtase que é também o da indiferença (Baudrillard, 1983: 38, 46).

                O que está em ato nessa excrescência do Mundo Objeto não é a celebração do gasto, a manifestação exacerbada da pulsão à dissipação na qual Bataille via o destino governado pelo excesso, por “uma organização aventureira, eventualmente absurda, um projeto de energia devastadora, um antieconomia, um prodígio, um desafio à natureza conservacionista” (1983: 86-7). Trata-se de uma compulsão ao consumo que, contra o princípio da escassez da economia, desborda a ideologia do progresso. A questão não se apresenta como um dilema do sujeito – do controle racional diante da falta de medidas do desejo -, e sim da própria racionalidade econômica, cujo falso princípio de racionalização da escassez o conduz a todos os excessos, a que perverte a ética iluminada pelo pensamento da complexidade e da natureza ecologizada.
                A retórica do desenvolvimento sustentado reconverteu o sentido crítico do conceito de ambiente em um discurso voluntarista, proclamando que as políticas neoliberais haverão de nos conduzir para os objetivos do equilíbrio ecológico e da justiça social pela via mais eficaz: a do crescimento econômico guiado pelo livre mercado. Esse discurso promete atingir seu objetivo sem uma fundamentação a respeito da capacidade do mercado em dar seu justo valor à natureza, desmaterializar a produção, reverter as leis da entropia e atualizar as preferências das gerações futuras. Isto leva a questionar a possível sustentabilidade do capitalismo (M. O’Connor, 1994), quer dizer, do irrefreável impulso em direção ao crescimento da racionalidade econômica e sua impotência para deter a degradação entrópica que gera. A racionalidade econômica resiste à sua desconstrução e arma um simulacro no discurso do desenvolvimento sustentado, uma estratégia de simulação, um jogo falaz de perspectivas – trompe l’oeil -, que burla a percepção das coisas e perverte toda razão e ação no mundo em relação a um futuro sustentável. O discurso do desenvolvimento sustentado volta como um bumerangue, decapitando o ambiente como conceito que deve orientar a construção de uma nova racionalidade social. A estratégia discursiva da globalização se converte em um tumor semiótico e gera a metástase do pensamento crítico; dissolve a contradição, a alteridade, a diferença e a alternativa, para oferecer-nos em seus excrementos retóricos uma revisão do mundo como expressão do capital. O ambiente já não apenas refuncionalizado para valorizar e reintegrar suas externalidades dentro da racionalidade econômica que o gera, ao mesmo tempo que o rechaça. O ambiente é reapropriado pela economia, fragmentando e recodificando a natureza como elementos do sistema: do capital globalizado e da ecologia generalizada.
                Não faltou quem quisesse ver na origem comum de seus conceitos a via para reintegrar a economia ao sistema mais amplo da ecologia, pelo reconhecimento de sua idêntica raiz etimológica: oikos. Mas essa operação hermenêutica de sua tática semiótica não poderiam unificar os sentidos diferenciados dentro dos quais foram construídos os paradigmas da economia e da ecologia, assim como as diferentes cosmovisões e significações culturais em que se desenvolveram os saberes sobre a vida e a produção, nem dissolver as estratégias de poder da economia que dominaram a ecologia. O discurso do desenvolvimento sustentado colonizou a natureza, convertendo-a em capital natural. A força de trabalho, os valores culturais, as potencialidades do homem e sua capacidade inventiva se transmutam em capital humano. Tudo é redutível a um valor de mercado e representável pelos códigos do capital. O capital clona identidades para assimilá-las a uma lógica, a uma razão, a uma estratégia de poder para a apropriação da natureza como meio de produção e de reprodução da racionalidade econômica. Dessa maneira, as estratégias de sedução e de simulação do discurso do desenvolvimento sustentado constituem o mecanismo extra-econômico por excelência da pós-modernidade para manter o domínio sobre o homem e a natureza.
                O capital, em sua fase ecológica, está passando das formas tradicionais de apropriação primitiva, selvagem e violenta dos recursos da comunidade – a rapina do Terceiro Mundo denunciada por Pierre Jalée (1968) -, dos mecanismos econômicos de intercâmbio desigual entre matérias-primas dos países subdesenvolvidos e produtos tecnológicos do Primeiro Mundo (Amin, 1973, 1974; Emmanuel, 1971), a uma estratégia discursiva que legitima a apropriação dos recursos naturais e ambientais que não são diretamente internalizados pelo sistema econômico. Através dessa operação simbólica, a biodiversidade é definida como patrimônio comum da humanidade, as comunidades do Terceiro Mundo como um capital humano e seus saberes como recursos patenteáveis por um regime de direitos de propriedade intelectual. O discurso da globalização aparece assim como um olhar guloso mais do que como uma visão holística; em lugar de aglutinar e dar integridade à natureza e à cultura, fragmenta-as como partes constitutivas do desenvolvimento sustentado para globalizar racionalmente o planeta e o mundo sob o princípio unitário do mercado. Essa operação simbólica submete todas as ordens do ser aos ditames de uma razão global e universal. Dessa forma, prepara as condições ideológicas para a capitalização da natureza e a redução do ambiente à razão econômica. As estratégias fatais do discurso do desenvolvimento sustentado resultam em seu pecado capital: sua gula infinita e insaciável.
                As políticas de desenvolvimento sustentado procuram conciliar os lados opostos contrários da dialética do desenvolvimento: o meio ambiente e o crescimento econômico. A tecnologia seria o meio instrumental que poderia reverter os efeitos da degradação entrópica nos processos de produção, distribuição e consumo de mercadorias (o monstro devora seus próprios desejos e os reintegra às suas entranhas; a máquina anula a lei natural que a cria). O discurso do crescimento sustentado ergue uma cortina de fumaça que mascara as causas da crise ecológica. Ante o aquecimento global do planeta, é ignorada a degradação entrópica produzida pela atividade econômica – cuja forma mais degradada é o calor – e nega-se a origem antropogênica do fenômeno ao qualificar seus efeitos como desastres “naturais”. Dessa maneira, o discurso do desenvolvimento sustentado não significa apenas mais uma volta na porca da racionalidade econômica, mas um salto mortal, um vôo e um aperto na razão: seu móvel não é internalizar as condições ecológicas da produção, e sim postular o crescimento econômico como um processo “sustentável”, sustentado nos mecanismos do livre mercado e na tecnologia, que seriam meios eficazes para garantir o equilíbrio ecológico e a justiça ambiental.
                O desenvolvimento sustentado chegou a proclamar seu triunfo antecipado, baseado nas possibilidades de “desmaterializar a produção”.[2] A tecnologia foi chamada para dissolver a escassez de recursos fazendo a produção repousar em um uso indiferenciado de matéria e de energia (Barnet e Morse, 1963); os demônios da morte entrópica seriam exorcizados pela eficiência tecnológica. A racionalidade tecnológica foi, por sua vez, transferida ao campo da tecnologia. A ecoeficiência e o manejo ecossistêmico se converteram em instrumentos idôneos para a gestão do desenvolvimento sustentado, ampliando o espaço biosférico para estender os limites do crescimento econômico. O sistema ecológico funciona como uma tecnologia de reciclagem e diluição de contaminantes; a biotecnologia inscreve os processos da vida no campo da produção, refuncionalizando o espaço que dá suporte à produção e ao consumo de mercadorias.
                As políticas de desenvolvimento sustentado se inscrevem nas vias de ajuste que a economia neoliberal aportaria à solução dos processos de degradação ambiental e ao uso racional dos recursos ambientais; ao mesmo tempo, responde à necessidade de legitimação da economia de mercado, que em seu movimento inercial resiste ao estampido que lhe foi determinado pela sua inércia mecanicista. Como se fosse uma bola de neve, na queda verifica-se a adesão de uma capa discursiva com a qual se tenta deter seu colapso, sem horizontes nem perspectivas, que fecha as vias para a desconstrução da ordem econômica antiecológica e impede o trânsito no sentido da nova ordem social, guiada pelos princípios da sustentabilidade ecológica, da democracia participativa e da racionalidade ambiental.
                As estratégias fatais de capitalização da natureza penetraram o discurso oficial das políticas ambientais e seus instrumentos legais e normativos. Com base nos objetivos comuns do desenvolvimento sustentado, convocam-se todos os setores sociais (governo, empresários, acadêmicos, cidadãos, camponeses, indígenas) para uma operação de concertamento e participação na qual se integram as diferentes visões e mascaram-se os interesses contrapostos em um olhar especular, convergente na representatividade universal de todo ente no reflexo do capital argentário. Assim, dissolve-se a possibilidade de dissentir diante do propósito de um futuro comum, uma vez que o desenvolvimento sustentado é definido, em boa linguagem neoclássica, como uma contribuição igualitária do valor que os diferentes fatores da produção adquirem no mercado.[3]
                Essa estratégia discursiva procura codificar e reconverter a cultura e a natureza dentro da lógica do capital. Do mesmo modo, tenta levar as disputas sobre os sentidos da sustentabilidade e da expropriação dos recursos naturais e culturais das populações para um esquema combinado, em que seja possível dirimir os conflitos em um campo neutro. Através desse olhar especular (especulativo), pretende-se que as populações indígenas se reconheçam como capital humano, que ressignifiquem seu patrimônio de recursos naturais e culturais (sua biodiversidade) como um capital natural, que aceitem uma compensação econômica negociada pelo dano ou pela cessão de seu patrimônio de recursos naturais e genéticos às empresas transnacionais de biotecnologia. Esta seriam as instâncias encarregadas de administrar racionalmente os “bens comuns da humanidade” em benefício do equilíbrio ecológico e de garantir a distribuição eqüitativa de seus benefícios, de lograr o bem-estar da sociedade atual e o das gerações futuras. Da valorização dos custos ambientais se passa à legitimação da capitalização do mundo como forma abstrata e norma generalizada das relações sociais. Esse simulacro da ordem econômica, que levita sobre as relações ecológicas e sociais de produção, pretende libertar o homem das cadeias da produção para reintegrar seu corpo exausto à metástase da ordem simbólica em que se configuram os desígnios do desenvolvimento sustentado.
                Assim, as estratégias do capital para reapropriar-se da natureza vão degradando o ambiente em um mundo sem referentes nem sentidos, sem relação entre valor de troca e a utilidade do valor de uso. A economia do desenvolvimento sustentado funciona dentro de um jogo de poder que outorga legitimidade à ficção do mercado, conservando os pilares da racionalidade do lucro e do poder de apropriação da natureza fundado na propriedade privada do conhecimento científico-tecnológico. As estratégias fatais da globalização econômica conduzem a uma nova geopolítica da biodiversidade, da mudança climática e do desenvolvimento sustentado.

[1] “As condições da produção não são apenas transformadas pelo capital. Devem, também, ser transformadas através do discurso [...] Uma vez completada a conquista semiótica da natureza, torna-se imperativo o uso racional e sustentável do ambiente. Ali está radicada a lógica subjacente dos discursos do desenvolvimento sustentável e da biodiversidade” (Escobar, 1995: 202-3).
[2] Este foi o projeto prometéico empreendido pelo Wuppertal Institute e pelo World Resources Institute com o propósito de reduzir o uso de recursos naturais por unidade de produto graças ao aumento da eficiência tecnológica e à mudança na estrutura da demanda.
[3] Esse discurso conciliador pretende reunir todos os grupos de interesse para alcançar consensos e dirimir conflitos socioambientais, sem perceber, que embora existam interesses e posições negociáveis, existem outros fatores que não poderão harmonizar-se no “concerto” dos protagonistas do drama atual da desigualdade social e da insustentabilidade.

sexta-feira, junho 04, 2010

texto reeditado

A conta gotas

Tem nenhum mistério os propósitos dos defensores do capitalismo financeiro em sua fase de agonia “globalitária” (Santos) em seus limites de expansão nesse nosso velho e pós-moderno mundo. Em seus ataques de ansiedade diante da indiferença diante da realidade que bate forte na questão ética, para muitos, e da clara apatia de certos intelectuais que se autodenominavam marxistas, me lembro de um velho amigo que repetia: "entre os capitalistas não existem contradições, mas, sim, contrariedades". Em outras palavras, querem que o mar pegue fogo para assar o leitão (o lucro, o capital especulativo etc) na própria banha, desconsiderando o Outro (meio ambiente e seres vivos).
Os episódios recentes demonstram apenas o “processo a conta gotas" em que a crise vem sendo postergada, administrada pelos gerentes do capital. Está bastante óbvio que nenhum arauto do sistema sabe exatamente aonde isso tudo vai dar; inclusive porque os paradigmas históricos, sócio-econômicos, e o próprio "ecologismo", continuam a procurar “associar à ofensiva destruidora contra os povos, esses mesmos povos e suas organizações”. A propalada "gestão da crise", a questão dos preços do petróleo e o desenvolvimento dos biocombustíveis, a questão da “escassez” (e da qualidade) da água, o “ouro azul” do século XXI, um direito humano e bem universal; esse “ouro azul” que ficou apenas definido como “necessidade humana” pelo V Fórum Mundial da Água, recém realizado em Instambul,  sob a pressão exercida pelo poderoso lobby privado do setor hídrico, que desconsiderou, mesmo em meio a presente crise econômica, que o peso de tal decisão atrasará em uma década o acesso à água potável para cerca de um bilhão de seres humanos, que ainda vivem sem ela, embora, seja de fato um bem essencial à vida na Terra.
A exportação da água virtual através do comércio de grãos e frutas para a China, União Européia e EUA, revela que onde a fome tem presença marcante também falta o uso adequado desse bem ambiental, e que o capital transformou através da criação dos mercados da água em um bem econômico (recurso hídrico). Tem um sentido fundamental toda a manobra dos governos do G7 frente a situação atual da economia mundial, em um quadro de crise gerada pela grande bolha originada de “capitais podres” e derivativos americanos, quando tangencia o problema da relação entre o tsunami da crise financeira e a questão climática global, que na verdade é propriamente ecossistêmica, partes que estão intrinsecamente relacionadas ao todo que não é somente uma expressão ou soma das partes e que não devem ser tratadas isoladamente, separadas, em qualquer tempo, pois, há um (des)equilíbrio vital por existir um inter-retro-relacionamento entre elas.
É de se questionar qualquer defesa desse quadro atual do capitalismo, financeiro, transnacional, que se sustenta em fundamentos indefensáveis ou "renovados" sobre um arcabouço teórico por demais testado e pouco criativo, que não engana mais ninguém (ou não?) em suas "repetições" e crises de identidade que se reinventa, mas que tampouco dura muito tempo em mostrar seu lado desumano, cruel, a cada desmatamento, cada crime ambiental, exploração do próprio homem em suas várias formas de relação inescrupulosas ainda em pleno século XXI, e a sua direção nos revela: destruição da natureza e consequentemente do ser humano. Fato é, que estamos frente a um momento de sérias mudanças (necessárias), não só de paradigmas relacionados ao que chamamos reducionismo econômico, seu cúmulo financeiro, mas, sobretudo, quanto à "teia da vida que não só humana", senão, da preservação da vida em um sentido holístico, da percepção do "desenraizamento” da emoção humana, do “ser da terra e da água”, do ecossistema onde se insere o próprio ser.
Estamos no limiar de uma significativa ruptura de paradigmas e valores, independente do que alguns iluminados achem ou professem em suas "crenças" e referências ideológicas.
O capitalismo já deu provas que tem limitações sérias, inexoravelmente para o caos na forma de barbárie, e nos condiciona (a maioria da humanidade) a "sobreviver" como animais; seguindo as premissas darwinianas para "justificar a existência da concorrência e fazer da economia de mercado uma lei natural". Lembrando Engels: "Darwin não sabia que amarga sátira da humanidade, e especialmente de seus concidadãos, ele escrevia quando demonstrava que a livre concorrência, a luta pela vida, celebrada pelos economistas como a mais alta conquista da história, era o estado normal do reino animal".

quarta-feira, junho 02, 2010

Os limites das liberdades

O limites das liberdades

Há coisas que não se deve impor limites, a liberdade de expressão, e a arte é uma delas. Nenhum tempo, nada e nem ninguém deveria impor qualquer limite ao impulso criativo. De outro modo, quem ouviria a composição do surdo compositor da música universal, a expressão do corpo eficiente do talento que dança, falar uma vírgula das tintas que muitos deixam e deixaram postas do surrealismo, no concreto, abstratos, no imaginário, não circunstancialmente colorindo as dores da história que tanto reinventam nosso mundo.


Faço coro com quem compartilha as ideias transformadoras, contrapontos à velha moral hipócrita, às virtudes viciadas do progressismo, e ao ativismo autoritário, antagônicos ao que expõem a alma humana. Aí, danço com aqueles que, persistentes, percebem de estalo a razão não cerceadora contra aquela do dono do cortical repressivo, e se arrepia no momento em que o falso ator se pronuncia pragmático, corrompe utilizando-se da ilusão fácil, planejada, ao ditar obrigando a sua vontade e direção, e subitamente inverte o desenho da face esperançosa, diminuindo o texto do outro, desqualificando-o e violentando o espírito criativo e confiante da mudança por represar as inovações ou revoluções essenciais. 


Aqueço-me no coração dos dançarinos, artistas, músicos, escritores, junto-me com os que honram o ofício da arte verdadeira e sincera; sou aqueles que sabidamente interferem, transformadores que são, nos comportamentos identitários, repetitivos, agora reacionários, e afastam a mão invisível castradora das liberdades e do viver humano simples e natural, essas forças que invariavelmente tende a impedir as (r)evoluções e ações produtivas da alma humana. 


Assim, quero mergulhar no rio profundo da evolução sustentável, das cores da boa emoção, que ilumina abre e desperta o melhor futuro, de todos, e que jamais perpetue a mesmice secular do ódio, sob qualquer pretexto.


terça-feira, junho 01, 2010

morte do bioma

Destruindo o meio ambiente

por Maurício Gomide Martins


[EcoDebate] Uma empresa de vulto internacional está instalando grande fábrica de cerveja em determinada cidade de Minas Gerais. Será a segunda maior indústria da espécie no Brasil, ocupando imensa área. Para tanto, reuniram-se as autoridades municipais, os representantes da mencionada indústria e o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente, órgão integrante da administração local para tratar e resolver os trâmites burocráticos, de forma que a empresa ficasse legalmente habilitada para iniciar as obras no menor prazo possível. E os representantes da indústria saíram com a aprovação total.
Imaginamos como terá ocorrido tal reunião. Naturalmente, depois de pagas todas as taxas, o mencionado Conselho, por unanimidade, aprovou o corte de 140 árvores frutíferas nativas, condenando à morte todo o bioma da área, sob promessa de compensações. Deveriam ser substituídos, teoricamente, todos os seres vivos, macro e micro, (não só as árvores). Segundo supomos, as autoridades presentes devem ter declarado mais ou menos assim: “se é para o progresso, aprovamos”.
Para formalidade de aparências e tranqüilidade de consciências, exigiram que, em troca, a empresa prometesse plantar outras árvores em outros lugares e em tempos futuros. Trocaram um ato concreto de morte e destruição por uma vaga promessa, cuja efetividade já conhecemos há muito tempo. Ninguém foi ouvir a opinião das árvores mártires nem da biodiversidade existente no solo.
Essas ações nos fazem compará-las com as que ocorreram outrora na ilha de Páscoa, quando os nativos cortaram todas as árvores em benefício da fabricação de moais de pedra, seus deuses. Decisões daquela época devem ter sido parecidas: “se é para louvar nossos deuses, aprovamos o corte de árvores”. E todos sabem das conseqüências para os habitantes daquela ilha, sem o suporte de seus seres vivos vegetais.
Além desses tais Conselhos Municipais, conta o Estado de Minas Gerais com os seguintes órgãos oficiais para defesa do meio ambiente:
1) Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema);
2) Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad);
3) Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam);
4) Instituto Estadual de Florestas (IEF);
5) Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam);
É muita gente ganhando para defender o meio ambiente. Bem entendido: defender no faz-de-conta. Porque não vemos ações efetivas; só discursos.
Descrevemos acima um fato concreto, ocorrido há dias, que deve estar harmonizado com os outros órgãos oficiais por esse Brasil afora, cuja verdadeira função é fingir que defendem a Natureza, mas que, na efetividade, ungem os atos do esquema econômico. São, portanto, instrumentos que servem ao senhor lucro e, em conseqüência, apressam o suicídio da humanidade.
Como podem tantos órgãos ambientalistas oficiais terem tanta omissão, tanta hipocrisia, tanta irresponsabilidade!!?

Maurício Gomide Martins, 82 anos, ambientalista e articulista do EcoDebate, residente em Belo Horizonte(MG), depois de aposentado como auditor do Banco do Brasil, já escreveu três livros. Um de crônicas chamado “Crônicas Ezkizitaz”, onde perfila questões diversas sob uma óptica filosófica. O outro, intitulado “Nas Pegadas da Vida”, é um ensaio que constrói uma conjectura sobre a identidade da Vida. E o último, chamado “Agora ou Nunca Mais”, sob o gênero “romance de tese”, onde aborda a questão ambiental sob uma visão extremamente real e indica o único caminho a seguir para a salvação da humanidade.
Nota: o livro “Agora ou Nunca Mais“, está disponível para acesso integral, gratuito e no formato PDF, clicando aqui.

FONTE: EcoDebate, 01/06/2010

segunda-feira, maio 31, 2010

comemorando o niver

Terremotos

Abraços fazem terremotos no coração
Estremece partes quentes que derretem
Abalando toda estrutura e respiração

Cada natureza se entrega a essa corrente
O olhar e impulso alternam céu e solidão
Calados nesse momento simples e intenso

Esse tempo que parece fazer um favor cruel
Nos juntando nessa curta entrega infinita
Para depois nos lembrar o quanto amamos

quinta-feira, maio 27, 2010

técnicas e valores (III)

Ecoética e conhecimento a partir de uma postura hermenêutica*
*(continuação do resumo do capítulo, do livro Correntes da Ética Ambiental de M. L. Pelizzoli).

             É Gadamer principalmente que levanta “o problema filosófico de desenvolver uma nova ontologia do evento da compreensão”, a saber, apontando que o conhecimento se liga aos elementos de interesse existencial, social, histórico e da cultura/linguagem dos povos. [...] “A verdade zomba do homem metódico”; hermenêutica, portanto, designa, primeiramente, “o movimento básico da existência humana, constituída pela sua finitude e historicidade, e por conseguinte abrangendo a globalidade da sua experiência no mundo. [...] O movimento de compreensão é englobante e universal”.[1]
            É por isso que Gadamer vai adotar, como primeiro exemplo hermenêutico, a experiência da obra de arte, na medida em que ela, não se esgotando apenas no “horizonte subjetivo de interpretação”, não se esgota também na racionalidade científica, e, apesar disso, tem ou faz um sentido – nos atinge. Ela não pode ser também captada ou produzida de igual modo pela tecnologia nos moldes da modernidade.
            Ao pensar a História, o hermeneuta, busca aquilo que na tradição remete a uma visão de conhecimento menos dominadora e mais dialógico-dialética, com o sujeito deixando-se admirar e impressionar  mais pela Natureza, pela arte, pelo ser das coisas, o que só uma experiência existencial e concreta (e com o “Outro”) pode “compreender”. Essa visão dialética é eminentemente dialogal, ouve a Natureza e a Cultura, interage cautelosamente. Se a verdade da Ciência é interessada, levando à solidão (ego cogito) daquele que domina a natureza e os outros como objetos de conhecimento, a verdade dialético-hermenêutica é plural, aberta ao outro (mesmo passado), não reducionista, relevando sempre aquilo que fica fora dos limites da razão instrumental do “progresso”. Neste sentido, pensamos numa posição próxima de defesa do Outro contra a hegemonização violenta do Mesmo, como aponta o filósofo E. Levinas.
            No método reducionista, o tema a investigar “orienta”, controla e manipula a realidade, o “objeto”; na dialética, é o tema que levanta as questões a que irá responder [...] aquele que interroga descobre-se como sendo o ser que é interrogado pelo tema”, pela coisa real, o que leva sempre à auto reflexão. É por isso que no método tecnicista impera o “esquema sujeito-objeto”, a noção de causa-efeito linear e dura (simplificadora), onde o próprio sujeito “torna-se agora objeto”.[2]
            O mundo da vida, da sabedoria acumulada, dos saberes antigos, da experiência produtiva, do lidar com as pessoas como “humanos”, nas culturas diversas, estes elementos “abertos” não são apenas uma fonte de conhecimento preciosa, mas condição inseparável do conhecimento científico e das tecnologias, que devem respeitar os chamados saberes sustentáveis em primeiro lugar. Assim, é fundamental considerarmos o nosso mundo da tecnologia e do american way of life hoje como uma possibilidade de mundo entre tantas outras que já ocorreram e que poderão ocorrer. O “mundo da vida” não se acaba simplesmente porque robôs e computadores inteligentes e a tecnologia de controle total surgem; ele é ponto de partida e contém elementos de alteridade (singularidades humanas e da Natureza...) que não se dobram à objetificação da Vida.
            Não se trata, porém, de uma mera volta ao passado contra o conhecimento atual; não podemos ter nunca o entendimento do passado como tal; contudo, devemos considerar os elementos da tradição que estão sempre em jogo quando nos relacionamos e conhecemos. Não se trata de acabar com os pressupostos, pois eles não são elimináveis, mas sim iluminar a sua participação e torná-la produtiva. Para a hermenêutica, o significado de uma experiência liga-se à “tradição da interpretação” sobre a qual estamos assentados, assim como as “possibilidades futuras que se nos abrem”; tal tradição “é produto de relações, é o horizonte no interior do qual pensamos. [...] A autocompreensão não é uma consciência que flutua livremente [...]; é uma compreensão que já se situa na história e na tradição, e apenas pode compreender o passado alargando o seu horizonte” de modo a englobar aquilo que se apresenta.[3] É claro que ocorrem também os preconceitos negativos, que devem ser humanamente aceitos, porém confrontados – para ver se não nos aprisionam ou tornam nosso pensamento “ideologizado”.
            À lembrança de M. Buber, Gadamer fala de três tipos de relação Eu-Tu, tentando explicar a força da consciência histórica que nos habita; e o que nos serve também para pensar a relação com o Outro e a ecoética.
            Na primeira forma de relação, o Tu é um objeto dentro de um campo de conhecimento objetivo, e algo que tem um uso determinado para seus fins. As coisas, o Saber, “torna-se então um objeto separado de nós [...] Uma “objetividade” destas, orientada para o método, domina nas ciências naturais e também nas ciências sociais, exceto onde a fenomenologia se faz sentir”.[4]
            Na segunda forma de experimentar e compreender o Tu, ele é visto dentro de uma “projeção reflexiva”, é encarado como uma pessoa, “mas Gadamer mostra que esta relação ‘pessoal’ pode ainda manter-se prisioneira do Eu, sendo de fato uma relação entre o Eu e um Tu reflexivamente construído”. É uma relação guiada pela consciência dominadora, partindo do interioridade do Eu (do Mesmo); aí, por conseguinte, “há sempre a possibilidade de que cada parceiro da relação possa vencer a atividade reflexiva do outro”.[5]
            A terceira forma de relação “caracteriza-se por uma autêntica abertura ao Tu. É a relação que não projeta o significado a partir do eu mas que tem uma abertura que ‘permite’ que algo seja dito [...]”; aqui, nos posicionamos de modo que o outro tenha face, nos reclame. “A pessoa ‘que teve a experiência’ não só não tem um conhecimento meramente objetificado ‘como tem uma experiência’ não objetificável que a amadureceu e a fez aberta à tradição e ao passado”, ao Outro e à Natureza viva.[6] Aqui, sabe-se melhor lidar com a realidade; aprendeu-se o valor de lidar eticamente com as pessoas, na autenticidade e atitude de não-dominação (não-violência); indica sabedoria.
            [...]
Nós pertencemos a uma cultura, a um mundo, a uma tradição, e também a uma série de interações com os processos e ambientes que chamamos de Natureza. Ou seja, nada escapa a isso; não é possível ocultar o que produzimos e descartamos, bem como a nossa visão de ser humano e de mundo (de relação), que se refletem na concretude do dia-a-dia.



[1] Gadamer em Verdade e método, apud Palmer, p, 168s.
[2] Cf. Palmer, p. 170.
[3] Ibid., p. 186. Ainda: “A compreensão inclui sempre uma aplicação ao presente” (Gadamer).
[4] Ibid., p. 194s.
[5] Ibid. “A alteridade do outro e o passado do passado apenas são conhecidos do mesmo modo que o Eu conhece o Tu – através da reflexão. Ao pretender reconhecer o outro em todo o seu condicionalismo, ao pretender ser objetivo, aquele que conhece pretende realmente dominar” (Ibid., p. 195).
[6] Ibid., p. 196.

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