segunda-feira, agosto 31, 2009

ver (des) envolvimento

Desenvolvimento sustentável é estratégico
Agencia Estado, 30/08/2009 às 14:58

Em discurso na cerimônia da sua filiação ao PV, a senadora Marina Silva (AC) evitou hoje fazer críticas ao PT, partido do qual saiu no dia 19, depois de 30 anos de militância. Marina disse enxergar no PV espaço para mostrar que o desenvolvimento sustentável é estratégico para o Brasil e para o planeta. "Está germinando uma nova forma de produzirmos a base material da nossa existência", afirmou.
Marina disse que começou a pensar na proposta de filiação ao PV quando lhe ofereceram uma oportunidade de mudança programática do partido. "Comecei a me expor sobre a possibilidade de saída (do PT)", lembrou. "Muitas pessoas me perguntavam: Por que não permanece no PT para o embate interno? Aí eu vi que meu trabalho não era de convencimento, mas de atuar ao lado de quem está convencido daquilo que o mundo inteiro também já está convencido", afirmou, referindo-se ao tema da sustentabilidade.
A senadora citou a crise financeira internacional para destacar a importância do debate sobre a sustentabilidade. "Existem hoje duas crises, uma é a econômica e outra é uma crise ambiental sem precedentes", afirmou. "A segunda é mais grave. Se não resolvermos a crise ambiental, qualquer saída para a crise econômica será uma falsa saída. Chegamos à era dos limites."
Marina, pelo menos na cerimônia realizada pelo PV numa casa de eventos no bairro de Pinheiros, zona oeste da capital, demonstrou não ter mágoas do PT. "Tenho 30 anos de militância dentro do Partido dos Trabalhadores", afirmou. "Com outras pessoas, sonhamos, aprendemos. Sofremos alguns constrangimentos por erros de poucos. Não venho mais com a ilusão do partido perfeito." Ela comparou sua saída do PT ao convívio familiar, quando umfilho deixa a casa dos pais mas não deixa de fazer parte da família. "Estou saindo para fazer uma outra casa, para morar talvez na mesma rua, no mesmo bairro, na mesma vizinhança", afirmou.
Ao analisar sua mudança do PT para o PV, Marina se emocionou. Disse que tinha preparado um discurso, mas percebera que era "um momento de falar com o coração". Para "homenagear" seu passado, citou uma frase de um conto de Guimarães Rosa. "Será que você seria capaz de se esquecer de mim, e, assim mesmo, depois e depois, sem saber, sem querer, continuar gostando? Como é que a gente sabe?" Para homenagear seu futuro no PV, preferiu Santo Agostinho: "Tarde vos amei, ó beleza tão antiga e tão nova, Tarde vos amei ! Eis que habitáveis dentro de mim, e eu lá fora procurando-vos!".

alternativas ?

Marina Silva, um novo olhar sobre o Brasil
por Leonardo Boff

Erram os que pensam que a saída da senadora Marina Silva do PT obedece a propósitos oportunistas de uma eventual candidatura à Presidência da República. Marina Silva saiu porque possuía um outro olhar sobre o Brasil, sobre o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo que identifica desenvolvimento com crescimento meramente material e com maior capacidade de consumo. O novo olhar, adequado à crescente consciência da humanidade e à altura da crise atual, exige uma equação diferente entre ecologia e economia, uma redefinição de nossa presença no planeta e um cuidado consciente sobre o nosso futuro comum. Para estas coisas a direção atual do PT é cega. Não apenas não vê. É que não tem olhos. O que é pior.
Para aprofundar esta questão, valho-me de uma correspondência com o sociólogo de Juiz de Fora e Belo Horizonte, Pedro Ribeiro de Oliveira, um intelectual dos mais lúcidos que articula a academia com as lutas populares e as Cebs e que acaba de organizar um belo livro sobre “A consciência planetária e a religião”(Paulinas 2009) Escreve ele:
“Efetivamente, estamos numa encruzilhada histórica. A candidatura da Marina não faz mais do que deixá-la evidente. O sistema produtivista-consumista de mercado teima em sobreviver, alegando que somente ele é capaz de resolver o problema da fome e da miséria – quando, na verdade, é seu causador. Acontece que ele se impôs desde o século XVI como aquilo que a Humanidade produziu de melhor, ajudado pelo iluminismo e a revolução cultural do século XIX, que nos convenceram a todos da validade de seu dogma fundante: somos vocacionados para o progresso sem fim que a ciência, a técnica e o mercado proporcionam. Essa inércia ideológica que continua movendo o mundo se cruza, hoje, com um outro caminho, que é o da consciência planetária. É ainda uma trilha, mas uma trilha que vai em outra direção”.
“Muitos pensadores e analistas descobriram a existência dessa trilha e chamaram a atenção do mundo para a necessidade de mudarmos a direção da nossa caminhada. Trocar o caminho do progresso sem fim, pelo caminho da harmonia planetária”.
“Esta inflexão era a voz profética de alguns. Mas agora, ela já não clama mais no deserto e sim diante de um público que aumenta a cada dia. Aquela trilha já não aparece mais apenas como um caminho exclusivo de alguns ecologistas, mas como um caminho viável para toda a humanidade. Diante dela, o paradigma do progresso sem fim desnuda sua fragilidade teórica e seu dogma antes inquestionável ameaça ruir. Nesse momento, reunem-se todas as forças para mantê-lo de pé, menos por meio de uma argumentação consistente do que pela repetição de que “não há alternativas” e que qualquer alternativa “é um sonho”.
“É aqui que situo a candidatura da Marina. É evidente que o PV é um partido que pode até ter sido fundado com boas intenções mas hoje converteu-se numa legenda de aluguel. Ninguém imagina que a Marina – na hipótese de ganhar a eleição – vá governar com base no PV. Se eventualmente ela vencer, terá que seguir o caminho de outros presidentes sul-americanos eleitos sem base partidária e recorrer aos plebiscitos e referendos populares para quebrar as amarras de um sistema que “primeiro tomou a terra dos índios e depois escreveu o código civil”, como escreveu o argentino Eduardo de la Cerna”.
“Mesmo que não ganhe, sua candidatura será um grande momento de conscientização popular sobre o destino do Brasil e do Planeta. Marina Silva dispensará os marqueteiros, e entrarão em campanha os seguidores de Paulo Freire”.
“Esta é a diferença da candidatura Marina. Serra, do alto da sua arrogância, estimula a candidatura Marina para derrubar Lula e manter a política de crescimento e concentração de riqueza. Lula, por sua vez, levanta a bandeira da união da esquerda contra Serra, mas também para manter a política de crescimento e de concentração da riqueza, embora mitigada pelas políticas sociais”.
“Marina representa outro paradigma. Não mais a má utopia do progresso sem fim, mas a boa utopia da harmonia planetária. A nossa visão não é restrita a 2010-2014. Estamos mirando a grande crise de 2035 e buscando evitá-la enquanto é tempo ou, na pior das hipóteses, buscar alternativas ao seu enfrentamento.
É por isso, por amor a nossos filhos, netos e netas, temos que dar força à candidatura da Marina. E que Paulo Freire nos ajude a fazer dessa campanha eleitoral uma campanha de educação popular de massas”.
Digo eu com Victor Hugo: ”Não há nada de mais poderoso no mundo do que uma idéia cujo tempo já chegou”.

(*) Leonardo Boff é teólogo e autor do livro Que Brasil queremos? Vozes 2000.
Fonte: EcoDebate, 31/08/2009.

domingo, agosto 30, 2009

é preciso

Permanecer

Até onde nosso olhar se estende
Inesperada dança viva de entregas
Ainda que pareça simples e singela
Vamos em passos que se aprende

Mãos entreabrem visões distintas
Nossos rostos se mostram profundos
Risos nascem de nossa cara criança
Por alguns minutos refazemos tudo

Somos transformação abraçando a vida
Queremos limpar o musgo das unhas
Brilhar livres às intimas galáxias
Que permanecem internamente juntas


nessa

Grande Viagem

Agora entre limites que rasgam o coração
Já não sou o mesmo de quando te conheci
Alguma química mudou o humor dos dias
Reparo no encanto das palavras ao seguir

Como os sonhos chegam bem perto assim
Velejo desgarrado de todo peso do passado
Costurando uma roupa que cai bem em mim
Pois é leve o ar das mudanças que trazem

Uma paixão que queima conta outra história
Em vôo rasante minha sorte está batendo
Repetindo o tom de uma idéia desenhada
Dispo-me do que não cabe mais aqui dentro

Solto um suspiro pelo prazer da grande viagem
Quero alcançar aquela fonte que me espera
Avanço com todo espírito que me preenche
Num reflexo rumo ao horizonte feito flecha


terça-feira, agosto 25, 2009

último ato

imagem em metal de Joaquim Luiz Mendes de Almeida

Mar e Naufrágios

A praia exibia montinhos de areia fina e branca
De repente uma onda derramou-se em espuma
E pinceis da natureza misturaram os horizontes
O mar fez-se céu e o sólido chão moveu-se em dunas

Mergulhamos em ângulos feito gaivotas soltando asas
As cores de nosso sol reviraram arco-íris em calda
Nossa pele cochichando em línguas soltas e variadas
Nos movimentos do sexo nossos corações cavalgavam

Gostosuras criando formas de navegar sem regras
Entrelaçados no prazer de remar com as mesmas mãos
E pés fincados nos próprios pés para deslizarmos tortos
Nos vários naufrágios resgatados por insaciável paixão

Como aguardar por essa brisa da manhã despertada
Sem saber para onde correria nosso perpetuo balão
Acordamos trôpegos sob planos de viver o agora
Leves de certezas nos enchemos de mútua admiração

Vimos mudanças em vagões alados sobre trilhos
Brincamos na superfície de uma lâmina da vida
Para comer e beber das horas de nosso trabalho
E nos acharmos numa estrada de viagem indefinida


recursos naturais

Chegada de mineradora em Caetité divide opiniões
por Emanuella Sombra

À beira da estrada, no distrito de Brejinho das Ametistas, em Caetité, o lavrador José Francisco da Silva pede carona. Havia andado cinco léguas – ou 30km – até ali, vindo de sua propriedade. Para chegar à sede do município, onde tinha marcada um cirurgia na vesícula, seriam outros 28 km. Dois ônibus quebrados em um posto próximo dimensionavam a dificuldade da tarefa. “A gente vive há mais de 40 anos em cima de um morro de pedra onde só pousa urubu”, lastima o baiano de sotaque amineirado.

Próximo à divisa entre Bahia e Minas Gerais, a 757km da capital baiana, Caetité tem um imbróglio nas mãos. De um lado, a chegada da mineradora Pedra de Ferro, empreendimento que em 15 anos deverá extrair do subsolo algo em torno de 15 milhões de concentrado do minério.

Do outro, Igreja Católica e ambientalistas denunciam impacto ambiental e crescimento desordenado na região, além de uma pressão psicológica, já existente, para que agricultores vendam suas terras. Possibilidade que, aos olhos de José Francisco, passa longe de ser compulsória. Minutos de conversa, e um quase delírio: “Se quisessem comprar minha terra eu vendia era correndo”.

A especulação imobiliária de que são alvo moradores da zona rural daquela cidade e da vizinha Pindaí ainda não lhe bateu à porta. Do compadre, que deixou a casa depenando-lhe as telhas, recorda o que disse. “Zé, agora eu tô é rico”. Do padre, contrário ao êxodo “forçado”, o sertanejo desdenha: “Queria ver é ele morar aqui”.

Em fase de licenciamento, o projeto carrega a marca da Bahia Mineração (Bamin), controlada pelo investidor indiano Pramod Argawal e pela ENRC, do Cazaquistão. Em troca da promessa de 4 mil empregos na construção da mina – reduzidos a 1,3 mil na fase de extração – Pedra de Ferro se beneficiará de 765m³ de água/hora do São Francisco, canalizada por 150 km de um duto até Malhada (BA).

Uma hipótese para o escoamento do ferro é a concretização da Ferrovia Bahia Oeste, entre Ilhéus (Ba) e Alvorada (TO). Apesar de já possuir outorga prévia da Agência Nacional de Águas (ANA) para extração no Velho Chico, a Bamin não tem o apoio de ambientalistas.

Fonte: A Tarde on Line CIDADES 16/08/2009 às 21:19 ATUALIZADA EM: 17/08/2009 às 11:44

quantos lêem?

Folheando

Livros que nunca caducam
Livros que se perpetuam
Livros de loucos geniais
Livros que serão e foram tidos
Antes, durante e depois vício

Quando guardados aonde for
Vão expor cada alma livre
E desfolhar-se em sonhos
Agitar-se em praças e celas
Imaginados nossos sempre

Que cada mão os deseje
Prova de não se verem técnicos
Com certeza nem de auto ajuda
Sem jamais serem esquecidos
Nem de se tornarem velhos

Porque parte permanecem todos
De nossa dança da vida
Quem lê e escolhe o que ser
Um pedaço de cada história
E de cada insônia vazia

Substituto de Deus e vinhos
Também um cobertor à mão
Livros que permanecem cheios
De perguntas nuas e idéias vãs
Livros que temos na cabeceira

segunda-feira, agosto 24, 2009

prosa

Andar ereto
por Viviane de Santana Paulo

Houve aquele domingo da semana, sem saber ao certo o que fazer a mãe ficou feliz com a espontânea idéia de ir ao zoológico com as crianças — programa perfeito para um domingo sem planos. As crianças estavam animadíssimas, empolgadas em ver o leão, o urso polar e os macacos. Foram de carro, suas duas filhas e os dois filhos da vizinha, o marido ficou em casa, reparando alguma coisa no computador, um vírus de última hora se alastrando na sagrada paz do domingo, não houve remédio, o homem teve de ficar sentado em frente à tela eletrônica.
É uma grande vantagem não haver trânsito nas ruas, elas adquirem uma outra aparência, temos a impressão de estarmos em uma outra cidade ao depararmos com o sossego superficial e as ruas momentaneamente desabitadas.
Um repentino bem-estar apoderou-se da motorista cantando uma música infantil com as crianças, dirigindo o automóvel, atravessando uma metrópole infestada de civilização duvidosa. Ela logo arrumou um lugar no estacionamento, não estava cheio, não se sabe o que as famílias ficam fazendo nos domingos ao invés de levarem os filhos ao zoológico. Ah, talvez estivessem em casa, assim como seu marido, consertando o computador. A mãe comprou o sorvete na entrada e todos seguiram para dentro do parque, bem próximos uns dos outros para não se perderem.
Havia a jaula estreita da pantera andando de um lado para o outro, quase não havendo espaço para dar a volta com seu corpo negro e selvagem e ela fitava as grades de aço passando verticais pelos olhos felinos e verdes. Como se não houvesse nenhum mundo por trás das grades e não havia, porque o mundo que se tem é aquele no qual se vive.
Eva estava agora diante da jaula dos macacos, viu uma fêmea amamentando o filho. Quantas vezes não se sentou assim com a Maria no peito? Mas aquela não era ela, era um animal, um mamífero, que dá leite às crias, mas não as levam à escola. Riram com os macacos, da semelhança que possuem com os seres humanos e porque não limpam a bunda. A fêmea fez um carinho no filho. Repararam que do outro lado do habitat um velho macaco pegava no sono deitado numa rede, os pequenos olhos abriam e fechavam, ele olhava sonhando para as crianças. O macaco estava nesse zoológico já havia alguns anos, depois que escreveu o tal relatório para a academia, deram-lhe um monte de medalhas, de prêmios, e o deixaram em paz. Porém, logo viram que ele vivia muito em paz e resolveram lhe tirar as medalhas, os prêmios, e o colocaram na jaula dos macacos para ser igual aos outros. Temos que fazer parte de nossa espécie e ser como ela e não rebelar-se ou mostrar superioridade. Foi esse o argumento usado para o processo de regressão doAffe. Contudo, ele demorava-se a ficar igual aos de sua espécie, continuava inteligente e escrevendo as esconsas. Os manuscritos eram sabotados para fora da jaula e publicados sob pseudônimo nos jornais. De resto, ele dissimulava que era igual aos outros e os homens sabiam que ele dissimulava e que ele sabia que eles sabiam que era simulacro.
A arte de viver é também fingir não conhecer a verdade, seguir mostrando que o que sabemos é somente aquilo que exigem de nós, o que é permitido, outra coisa é fuga, o risco de sobreviver por si só, de ser livre; fingir que não estamos cientes de os outros de nossa espécie saberem que simulamos a verdade. Enfim, tudo se resume em um fingimento e a verdade em si se perde em alguma fresta dessa encenação, da hipocrisia.
Eva não se recordava muito bem, mas havia lido algo do macaco no jornal. Engraçado, com tantas coisas para fazer, não conseguia se lembrar do tema, tinha apenas certeza de ter sido um desses escritos levados para fora do zoológico. Os leitores conheciam o dilema, liam os artigos impregnados de desespero apático, sabendo que era injusto, mesmo assim ninguém fazia nada pelo macaco. Deixaram-no abandonado à sina de ser ele próprio.
A míope ajeitou os óculos na cara, viu que estavam sujos, tirou-os, limpou-os na barra da blusa, e colocou-os novamente. Muitos não haviam lido o tal do relatório, senão esse animal não estaria ali, atrás da jaula de vidro cheia de plantas e cipós, de onde os macacos nos olham sem entender o quanto somos esquisitos, selvagens e falsos com nossa espécie e com as outras.
Estavam agora em frente à jaula do orangotango, Eva reparou que os pêlos meio alaranjados estavam sujos e refletiu sobre a sorte que ele teve de ser absolvido, os crimes cometidos na rua Morgue foram perdoados. Afinal... não passava de um animal que não sabe o que faz.
E Eva continuou pensando que, há milhões de anos, se não tivéssemos nos levantado, estaríamos como eles. Foi o andar ereto a grande chave do desenvolvimento, a partir daí iniciou-se o vôo rasante para o futuro imprevisível e inerente, em linha reta ao progresso humano, à solidão e ao isolamento. Porém, a partir daí procura-se o distanciamento do mundo animal. O homem se colocou num ápice, cada vez mais evidente, onde somente ele é o soberano e tenta negar a si próprio. O andar ereto para o futuro desconhecido, contra a parede, as grades da jaula estreita.
Eva andava ereta, com o corpo de fêmea que havia parido, os seios caídos amparados pelo sutiã, os quadris largos, as celulites nas nádegas, a barriga flácida, o excesso de peso inchando os pés pequenos. Estavam no caminho que ia dar no viveiro dos pássaros: gaivotas; araras coloridas; tucanos curiosos; papagaios verdes e amarelos, e tagarelas; revoada de periquitos... Pareciam tão livres, tão livres...! Batiam as asas e alguns se sustentavam no ar: tão leves, tão leves... e soltos ali dentro. Habituaram-se porque quando não há outra possibilidade, a única sobrevivência é adaptar-se ao que se vive no momento. E o homem se adapta com rapidez! Os animais demoram mais, alguns acabam morrendo. Não estes que já estavam habituados à restrita imensidão, ao azul do céu engradado e à brisa trazendo, de vez em quando, o cheiro do distante.
Em seguida pegaram um atalho para irem ao habitat do jaguar onde uma pomba obstruía o caminho estreito e não se movia com os movimentos espalhafatosos das crianças, os gritos e risos altos. A pomba inofensiva e insistente, fitava arrulhando aqueles seres humanos, amedrontando passantes de um caminho corriqueiro. Mas ela não era o Noel, não ficaria ali estarrecida e ameaçada, pensando em tudo que poderia ter sido e não foi e no abismo que havia entre ela e aquela espécie. Pegou as crianças pela mão e foi decidida em cima do estorvo. A pomba que desse passagem e não ela! Porém, a ave não saiu do lugar, mesmo tendo os pés das crianças quase em cima da cabeça. As crianças riram e em seguida ignoraram a pomba, esqueceram o episódio, queriam ver o jaguar que era muito mais interessante do que uma simples pomba cotidiana e doméstica.
Eva deu a volta, as crianças a seguindo, juntas, para não se perderem no enorme zoológico tranqüilo de um domingo à tarde, com os pais na frente do computador, por causa de um vírus infectando os costumes e rituais de antigamente. E o jaguar que havia andado pela imensa floresta do equador, salvado Antonio José Bolivar, estava mancando, dava para ver quando se levantou para ir comer o alimento que os funcionários lhe ofereceram. As crianças ficaram com muita pena dele. Melhor sair daqui, ir para outro bicho menos fragilizado! Porque não queremos a fragilidade, buscamos a força e nos esquecemos que uma depende da outra, para entrelaçar-se e formar uma coisa só.
Chegaram então na jaula da mula-sem-cabeça jorrando fogo pelo pescoço, cavalgando num cercado sem mato e capim e defecando crenças que lhe introduziam pescoço abaixo, como se enfia uma pá de carvão no forno. Impressionante como modernizaram seu habitat: um vidro à prova de fogo e escuro, lá dentro as noites de quinta-feira, os pecados da carne da mulher e a infidelidade dos sacerdotes.
No habitat do boto a água turva do Rio Negro reluzia a pele rosa. Ele nadava com tanta desenvoltura e sorria atrás do vidro do gigantesco aquário. Aquele sorriso incrustado no focinho. Há espécies que são assim: carregam esse sorriso incrustado que não desmancha nem quando estão tristes ou odiando ou falecendo. E, enquanto todos se certificam de sua felicidade, eles se corroem por dentro cada vez mais e o sorriso ficando ainda mais evidente.
Ali estavam no covil das anacondas. Eva se lembrou da manchete dos jornais sobre o regresso da anaconda que fugiu do zoológico. Depois de ter conseguido a liberdade, caiu nas garras da selva que não era mais a mesma. Veio um homem, depois outro e mais outros e a selva se tornou outra coisa. A anaconda não reconheceu mais sua pátria e regressou ao cárcere voluntariamente. Isto também acontece, quando cerceiam a confiança no nosso mundo, desmatam aquilo que tanto conhecemos e que faz parte de nossa natureza. Foi uma sensação! Todos queriam visitá-la, recebeu um habitat maior, mais alimento e aquele respeito indevido, do qual era obrigada a usufruir, porque o respeito maior e autêntico seria a selva, mas esta já lhe era há muito inacessível.
Havia também os filhotes da imensa anaconda, que havia sido a rainha da selva, e que morreu com um tiro na cabeça, quando certo vaporzinho passava pelo rio Paranahyba. O passageiro avistou, de longe, o réptil na margem do rio, e atirou, acertando-a na mente. Restaram os ovos que havia botado, um momento antes, no meio do corpo em putrefação do homem que havia morrido por ali, sem ninguém saber. O homem morto que ela tanto velou para, por fim, usá-lo como ninho de vida selvagem e livre.
Agora estavam cansados e foram para uma dessas lanchonetes estratégicas no meio do zoológico, cheia de souvenires de bichos de plástico, adesivos, camisetas, canecas, livros, Cds e etc. Havia algumas mesas no terraço, com o guarda-sol aberto, pois fazia calor, de onde se podia ver os longos pescoços das girafas comendo folhas colocadas nas cestas penduradas nos galhos das árvores.
As crianças comeram hambúrgueres, tomaram coca-cola e estavam correndo pra lá e pra cá. Eva se cansou de dizer para uma e para outra: não faz isso, não faz aquilo, não mexe aí, não sobe aí, deixa isso e etc. Calou-se e a boca mordeu o hambúrguer. Estava mastigando o grande pedaço e só reparou que estava com mais fome do que pensava quando sentiu o gosto da carne bovina. Não era nenhuma vaca sagrada, nenhum boi mitológico seqüestrando a Europa sentada em seu lombo, atravessando o Mediterrâneo. Era a carne de um boi cheio de antibióticos, que passou a vida inteira imóvel dentro de um cercado de ferro, onde não podia sequer enfiar os chifres no impenetrável obtuso e tê-los partidos. Ter partido não o obtuso que é duro demais, mas os chifres! Nem isso podia fazer, autodestruir-se, tinha de esperar que outros o fizessem da maneira e na hora que quisessem. Para depois devorarem-no assim: com maionese e ketchup.
Continuaram o passeio, mas de repente, entrando por um atalho para chegar no viveiro das focas, depararam-se com um chiqueiro de porcos. Mas o que esses animais estavam fazendo num zoológico? Eram simplesmente porcos, desses que a gente vê nas fazendas. Naturalmente, os filhos nunca os haviam visto, viviam nessa grande cidade e estavam integrados nessa época, gostavam de ver televisão e jogar no computador. Onde veriam suínos? Só mesmo no meio do pão, no lanche para a escola, ou no feijão, quando cozinhava feijoada. Seja como for, achou interessante encontrar o animal caseiro no meio de um zoológico cheio de bichos selvagens. Vai ver que serviriam de alimento para alguns dos animais! E por que quebraria a cabeça se não era nenhuma Mrs. Jones na fazenda de Mr. Jones cuidando de alguma revolução de bichos?
Contemplaram os porcos como se fossem qualquer outro animal exótico na iminência de ser extinto, encarcerado na civilização.
Depois seguiram adiante.
Pararam em frente aos rinocerontes, parece que não se achavam mais os melhores do mundo e não tentavam mais dominar toda a cidade, como haviam feito em certo momento da história. Andavam de um lado para o outro, com o corpo maciço, preocupados com o passado pesado. E as crianças, de repente, repararam no senhor Behringer, que coçava a cabeça do seu lado, e gritaram seu nome. O senhor behringer era o vizinho alcoólatra de Eva que costumava vir sempre ao zoológico para tentar descobrir se era o rinoceronte africano que possuía dois chifres ou o asiático. Era fixado nos rinocerontes ou traumatizado porque, por mais que Behringer seja ele mesmo, os rinocerontes não irão deixar de ser rinocerontes com um ou dois chifres, não serão extintos, alguns permanecerão ainda tentando dominar a cidade e o mundo. Mas Eva nunca se deixará dominar por esses brutamontes, pensou ela também coçando a cabeça num gesto automático. Depois olhou furtivamente para o senhor Behringer que lhe sorria, cumprimentando-a. Ele sempre lhe perguntava se ela sabia qual rinoceronte possuía dois chifres. "O africano" —, respondia, pois ela se informara, depois de ouvir essa pergunta várias vezes. Mas o que adiantava lhe responder se o senhor Behringer não deixava de repetir essa pergunta? Eva se despediu do vizinho amavelmente, chamou as crianças e continuaram o passeio. Porém, de vez em quando, sentia suas pernas engrossarem, ficarem pesadas, se sentia corpulenta, maciça e cansada, com uma dor de cabeça no meio da testa...
Melhor ir embora!
No final da tarde, na saída do zoológico Eva pensou: bem mais adiante é a amplitude ou o cimo frio do pedestal?
No fundo, fomos nós que andamos uma parte muito importante de nós. Para, por fim, pegarmos nossos filhos e levá-los para casa.
Havia começado a chuviscar uma garoa fina de verão, o ar estava abafado e nublado. Eva veio dirigindo o carro, torcendo para que o marido tivesse terminado de consertar o computador e as crianças pudessem jogar.

Do livro: Estrangeiro de mim, Gardez Verlag Alemanha, 2005.

Viviane de Santana Paulo publicou Passeio ao longo do Reno (poesia) e Estrangeiro de mim(contos), na Alemanha. A autora pertence à primeira geração de escritores brasileiros radicados no exterior. Promove autores brasileiros no meio literário alemão:foi mediadora na publicação dos artigos de Affonso Romano de Sant`anna e José Miguel Wisnik em duas edições da Lettre International, revista de grande renome na Alemanha. "Procuro criar um amálgama entre os valores heterogêneos das culturas, e também uma ponte entre a realidade brasileira e a internacional e fazer com que muitos leitores a transitem de um lado para o outro." Vive em Berlim e trabalha na Embaixada do Brasil.

E-mail: vsantanapaulo@yahoo.com.br

Fonte: Cronópios

sábado, agosto 22, 2009

Ponto Trágico

Meus prezados leitores,
Essas três frases abaixo são de Henry David Thoreau, elas expressam meu pensamento sobre os últimos acontecimentos no Congresso Brasileiro, especificamente quanto ao comportamento dos Senadores do PT, partido construído com suor e lágrimas pelos trabalhadores, que há 30 anos representou um passo para a esperança de liberdade, soberania e a consolidação das transformações sociais, políticas e econômicas necessárias aos cidadãos brasileiros:

"A maioria dos homens vive uma existência de tranquilo desespero".
O que não é o caso da trabalhadora ex-senadora do PT, Marina Silva;

"Quando o súdito nega obediência e quando o funcionário se recusa a aplicar as leis injustas ou simplesmente se demite, está consumada a Revolução".
Esse não é o caso do Senador Aloísio Mercadante; Sejam quais forem os argumentos políticos, eleitorais, isso só aconteceu por imposição do Presidente Lula e do Partido; o recuo do Senador só revelou a verdadeira situação do PT quanto as suas práticas internas, óbviamente "desautorizada" pelas expectativas democráticas dos trabalhadores reforçando seu distanciamento dos ideais históricos de seus representados;

"A massa nunca se eleva ao padrão do seu melhor membro; pelo contrário, degrada-se ao nível do pior".
Esse é o significado dos fatos recentes lamentavelmente vistos no seio do Congresso Brasileiro. Basta trocar o têrmo "massa" por "postura de certos políticos", o que é extensivo aos políticos de "boa" conduta ética e aos de conduta reconhecidamente conservadora e reacionária.


sexta-feira, agosto 21, 2009

imagine


Únicos

De estarmos em sintonia
E assim cuidar do mundo
Acreditar ainda no outro
Conhecendo as diferenças
Como irmãos ou irmãs
Sendo homem e mulher
Agindo de modo são
Vivendo como únicos
Sendo desenhos diferentes

Caindo de lágrimas internas
Entre abraços inteiros
Colhendo o que se espera
O amor como um templo
A mais alta lei fora da letra
Sem palavras que descreva
Sangrando no leite materno
Choro de flores nas guerras
Jogo de uma única chance
Em tempo de faltar o todo

"beautiful love", Joe Pass

sangre

O sangue em Chiapas
por José Saramago

Todo o sangue tem a sua história. Corre sem descanso no interior labiríntico do corpo e não perde o rumo nem o sentido, enrubesce de súbito o rosto e empalidece-o fugindo dele, irrompe bruscamente de um rasgão da pele, torna-se capa protectora de uma ferida, encharca campos de batalha e lugares de tortura, transforma-se em rio sobre o asfalto de uma estrada. O sangue nos guia, o sangue nos levanta, com o sangue dormimos e com o sangue despertamos, com o sangue nos perdemos e salvamos, com o sangue vivemos, com o sangue morremos. Torna-se leite e alimenta as crianças ao colo das mães, torna-se lágrima e chora sobre os assassinados, torna-se revolta e levanta um punho fechado e uma arma. O sangue serve-se dos olhos para ver, entender e julgar, serve-se das mãos para o trabalho e para o afago, serve-se dos pés para ir aonde o dever o mandou. O sangue é homem e é mulher, cobre-se de luto ou de festa, põe uma flor na cintura, e quando toma nomes que não são os seus é porque esses nomes pertencem a todos os que são do mesmo sangue. O sangue sabe muito, o sangue sabe o sangue que tem. Às vezes o sangue monta a cavalo e fuma cachimbo, às vezes olha com olhos secos porque a dor lhos secou, às vezes sorri com uma boca de longe e um sorriso de perto, às vezes esconde a cara mas deixa que a alma se mostre, às vezes implora a misericórdia de um muro mudo e cego, às vezes é um menino sangrando que vai levado em braços, às vezes desenha figuras vigilantes nas paredes das casas, às vezes é o olhar fixo dessas figuras, às vezes atam-no, às vezes desata-se, às vezes faz-se gigante para subir às muralhas, às vezes ferve, às vezes acalma-se, às vezes é como um incêndio que tudo abrasa, às vezes é uma luz quase suave, um suspiro, um sonho, um descansar a cabeça no ombro do sangue que está ao lado. Há sangues que até quando estão frios queimam. Esses sangues são eternos como a esperança.

quinta-feira, agosto 20, 2009

One Life

rio Madeira


por Carol Salsa

A mídia volta a colocar em pauta um dos assuntos mais discutidos em termos de geração de energia na região amazônica: o Complexo do Rio Madeira. De um modo geral, os projetos de barragem, à revelia da população local, não contemplam os aspectos sociais e muito menos os ambientais previstos. Exemplo disso é o Complexo do Rio Madeira. Após a entrega do Estudo de Impacto Ambiental EIA ao IBAMA, foi convocada uma equipe técnica composta por oito analistas ambientais deste órgão, entre eles, engenheiros civis, biólogos e historiadora, que apresentaram o Parecer Técnico nº014/2007. Este Parecer condenava o Complexo caso não fossem atendidas as diretrizes propostas para revisão quanto à : ictiofauna, existência de mercúrio no leito do rio, volume de sedimentos etc.. O próprio IBAMA não fez qualquer alusão ao Parecer e desconsiderou-o.

Pela equipe foi atestado a falta de um Plano de Mitigação que tratasse os eventuais problemas na implantação do empreendimento confirmando o que poderia acontecer como fatos já acontecidos e que serviriam de referência aos estudos de anterioridade nas construções de barragens na região. As experiências com Balbina e Tucuruí não são lá tão “auspiciosas” , e nem devem ser replicadas. A primeira porque alagou uma enorme área plana de 2.360 quilômetros quadrados para gerar 250 MW. Soma-se a este o fato de não ter sido feito o destocamento de todas as árvores existentes no local. Conclusão: tornou-se uma área de emissão de gases estufa, dióxido de carbono- CO2 e metano CH4 , gratuita para os idealizadores e a serem pagas pelas sociedades que a ela subsistirá.

Como se não bastasse, as barragens não contemplam as populações tradicionais. A compensação pela desmobilização das comunidades, subtração de recursos naturais os quais se constituem em fonte de renda para os ribeirinhos, pescadores, agricultores familiares, não atende à qualidade de vida anteriormente desfrutada. Tucuruí representa a ausência do Estado quando se trata de Soberania Nacional. Na realidade, a barragem foi construída para fabricar lingotes de ferro gusa para serem exportados para o Japão. Se, por acaso, é uma questão de Soberania Nacional, onde ficou ou está a contrapartida para a população local, se nossos recursos usados na fabricação de produtos para exportação dispensaram a responsabilidade sócio-ambiental para com o povo brasileiro? Não é dizer que só hoje os projetos se preocupam com o meio ambiente. Em todas as épocas sempre foi um pré-requisito de qualquer tomador de decisão a qualidade intrínseca do famoso “bom senso“. A biodiversidade é insubstituível e não permutável. Acresce ainda que as espécies formadas durante séculos, exigiriam centenas de gerações para a produção evolutiva delas. A consideração feita já é suficiente para se pensar profundamente e, inúmeras vezes, no que se está fazendo. Com a visão ultrapassada dos tomadores de decisão que só vêm nos projetos o lucro, a ganância de ter cada vez mais dá um “chega pra lá” na resolução dos problemas das comunidades soberanas, também carentes, e condenadas a viver uma pobreza que se perpetua durante anos.

Não estamos contra os projetos de barragens. Reconhecemos que um apagão teria conseqüências desastrosas para todos nós. Mas a técnica tem que andar lado a lado com a política, tipo “ Cosme e Damião”. Será que é, atualmente, impossível corrigir erros de governos passados que se diziam ao lado do povo? Demagogia é o que não falta no cardápio de políticos que ludibriam os eleitores. O bom exemplo dos que comandam a Nação é imperioso existir. Se não houver respeito em todos os estratos sociais, não reclamem da juventude que só teve até hoje péssimos exemplos de cidadania, moral e ética no trato do patrimônio natural, direto de todos. O Manifesto sobre o Complexo do Rio Madeira é um problema complexo na verdadeira acepção da palavra. Cita o documento que considera, entre outros:

  • Irregularidade no processo de licenciamento ambiental;
  • Sub-dimensionamento da área de influência dos empreendimentos;
  • Falta de avaliação adequada de impactos socioambientais dos empreendimentos em relação a questões chave;
  • Desconsideração de impactos sociais e ambientais;
  • Desconsideração dos protestos de movimentos sociais e outras organizações da sociedade civil brasileira;
  • Falta de uma garantia mínima de equivalência da qualidade de vida das famílias ribeirinhas e de outras comunidades locais;
  • Indiferença de Governo Federal pela sentença condenatória do projeto do Complexo do Madeira no Tribunal Latinoamericano de Águas (TLA), em setembro de 2008, e pelo recente trabalho realizado pela Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente, da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais ( Plataforma DhESCA Brasil); ambos evidenciaram violações de direitos humanos associados à implementação das usinas no rio Madeira, que chama a responsabilidade do Estado brasileiro para o cumprimento dos diplomas internacionais afins;
  • Constrangimentos diplomáticos;
  • Indícios de intervenção política e irregularidade na utilização de fundos públicos de cunho social;
  • Desrespeito aos Princípios do Equador.

Ainda estaria em tempo de rever detalhes de projeto cujo eixo foi mudado para uma distância de 9 km em relação ao eixo original e que por isso mesmo, foi considerado pelos interessados no projeto, provavelmente, “ muito perto “, desconsiderado-se o necessário e importante , novo EIA/RIMA . Também, não podemos olvidar o impacto das águas no solo para a formação do reservatório. A operação revolverá camadas do leito do rio onde há mercúrio que por sua vez afetará toda uma cadeia alimentar. E o volume de sedimentos que fluirá do reservatório não prejudicará o funcionamento das turbinas tipo bulbo? Onde este volume de sedimentos se depositará?

Outra dúvida: como explicar a liberação de uma “ licença parcial “ para o início das obras, emitida, equivocadamente, em 2008 ? O Ministério Público não desculpou. Chega de criatividade fora da Lei. Só há três licenças possíveis para empreendimentos potencialmente poluidores do meio ambiente conhecidas como LP, LI e LO, respectivamente, Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação. Qualquer outra adotada é “ledo engano”. Só não disseram para eles ?

Lamento afirmar que o que estamos deixando registrado na memória das pessoas íntegras e da juventude, é um deplorável livro que está sendo escrito pelos déspotas contemporâneos, intitulado “ História da Desumanidade .”

Carol Salsa, colaboradora e articulista do EcoDebate é engenheira civil, pós-graduada em Mecânica dos Solos pela COPPE/UFRJ, Gestão Ambiental e Ecologia pela UFMG, Educação Ambiental pela FUBRA, Analista Ambiental concursada da FEAM ; Perita Ambiental da Promotoria da Comarca de Santa Luzia / Minas Gerais.

Fonte: EcoDebate, 20/08/2009

pancada

Água de chuva

Ainda descubro que pouco te conheço
Mesmo assim respiro a sua companhia
Enquanto venta o tempo de acontecer
Caio em pingos quentes sobre o leito

Sombra e asas estendidas entre distâncias
Querer essa viagem mais que o destino
Afasto nuvens até aonde vejo a sua torre
Carregando a sede na bagagem em silêncio

Deveria passar nos sinais que embaraçam
Certo em provar o que solta minha língua
Despir-me sob uma luz líquida e generosa
Gotas que me guiam afora de denso labirinto

terça-feira, agosto 18, 2009

contando

Segredos que bastam

Achados em sonhos inúmeros segredos são contados
Os acontecidos por dentro viram manchas solares
Insistem em nos lançar sem pára-quedas ao vento
Grãos de suspiros por cima de um horizonte inflamado

As mínimas vontades parecem alimentar suspeitas
De anseios e palpites batem loucas em nosso peito
Nas voltas por praças à beira de penhascos e rios
Crespas e arriadas sobre selvagem montaria em pelo

Inebriados pelos cheiros bordados nos cabelos e panos
Pelas roupas translúcidas admiramos seixos molhados
Braços rasos e imaginação nos aproxima da tona
Saltando de um mar em gozo após mergulho cobiçado

Agora pisamos em terreno que conhecemos desde cedo
Mas desatentos acariciamos nossos rostos no fim do dia
Quando as ondas da retina se deitam em luzes de navios
Em direção a um balé primoroso de divino rebuscado

Sinestésico poder de nosso ser em outro movimento
Acaba e repõe suas formas e tons do jeito que são
Como a vida que dá sentido ao que existe ao redor
Evoluindo a cada dor em perpétuo ponto de fusão

água virtual e valor econômico


A consideração do valor econômico da água virtual, um virtuosismo na contabilidade ambiental?
por Carol Salsa

Nos anos 20, para organizar o balanço de materiais da economia soviética, Vassily Leontief cria a Teoria do Insumo e Produto ( Input-Output Theory ) que reúne um conjunto de informações de extrema utilidade para se fazer a avaliação dos impactos dos custos relativos ao uso da água ou de qualquer outra matéria prima sobre os agregados da economia. A expressão água virtual surge na década de 70, nos Estados Unidos, e significa a água utilizada na produção de um bem ou serviço, desde o início de sua cadeia produtiva. Do latim, virtual ou virtualis ou ainda virtus, significa virtude, potência e força.

A água está de novo em destaque em todas as agendas de muitos dos principais países, como que acordados e antenados para uma visão inovadora da sua importância. É uma percepção refeita à luz do novo conceito que gradualmente se faz sentir na economia, investigação científica, na segurança e defesa de cada país ou de blocos econômicos. A água é considerada como um bem econômico distribuído no espaço e no tempo, a qual se encontra associada a quatro Princípios Básicos. Esses princípios foram aprovados na Conferência Internacional sobre Água e Meio Ambiente realizado em Dublin, em 1992, e descritos a seguir.

PRINCÍPIO nº 1: “A água doce é um recurso finito e vulnerável, essencial para manter a vida, o desenvolvimento sustentável e o meio ambiente“.

PRINCÍPIO nº 2: “O aproveitamento e a gestão da água devem se basear na participação dos usuários, dos planejadores e dos responsáveis pelas decisões em todos os níveis”.

PRINCÍPIO nº 3: “A mulher desempenha um papel fundamental no abastecimento, na gestão e na proteção da água”.

PRINCÍPIO nº 4: “A água tem um valor econômico em todos os diversos usos aos quais se destina e deveria ser reconhecida como um bem econômico”.

Com tantos ingredientes sugestivos, uma verdadeira revolução ocorreu em 1993, quando o cientista John Anthony Allan, de 72 anos, do King´s College de Londres, desenvolveu o conceito de água virtual e conseguiu chegar à formula de cálculo que estima o valor de água necessário para produzir um alimento ou produto. A importância da descoberta de Allan reside nas novas relações estabelecidas entre a produção agrícola, o uso da água, a economia e os processos políticos. O cientista foi vencedor do Water Prize 2002, pelo trabalho desenvolvido e apresentado em evento realizado anualmente pelo Instituto Internacional de Água de Estocolmo. O Instituto tem por objetivo premiar pesquisas que contribuam sobremaneira para soluções sustentáveis. A partir do trabalho de Allan, o comércio mundial mudou substancialmente as políticas que envolvem o comércio mundial. Diz o Instituto: “as pessoas não consomem água só quando bebem ou tomam banho“. Em cada chávena de café estão contidos 140 litros de água utilizados na sua produção, embalagem e distribuição. Dados do Instituto revelaram que cada americano gasta por dia o equivalente a 6.800 litros de água, três vezes mais que gasta um chinês. Allan também concluiu que países como os Estados Unidos, Brasil e Argentina exportam milhões de litros água em seus produtos, enquanto que Egito, Itália e Japão são importadores de milhões de litros de água virtual.

O conceito desenvolvido em 1993 nos dá a dimensão do real valor econômico da água, como um modelo alternativo de desenvolvimento sustentável e o resgate de valores responsáveis pela justiça e inclusão social. A idéia deveria ser aplicada a todos os usos da água, por isso mesmo a reconhecida como um bem econômico. Cientistas advertem sobre o uso da água em tempos de escassez, face a degradação ambiental, pela falta de sensibilização no uso deste recurso e pelo desperdício comprovado em muitos países. O mercado internacional de água virtual implica na movimentação de 15% de toda a água usada no mundo. Com previsões sombrias até 2050, a contabilidade ambiental tem mais um “para casa“, que é considerar as tabelas já prontas que estimam os valores incorporados de água nos alimentos, com a virtuosidade de quem sabe do papel e da importância que ela desempenha nos dias de hoje.

Carol Salsa, engenheira civil, pós-graduada em Mecânica dos Solos pela COPPE/UFRJ, Gestão Ambiental e Ecologia pela UFMG, Educação Ambiental pela FUBRA, Analista Ambiental concursada da FEAM; Perita Ambiental da Promotoria da Comarca de Santa Luzia / Minas Gerais.

Fonte: [EcoDebate, 10/03/2009]

"nova utopia"

Marina Novamente
por Roberto Malvezzi

A possibilidade Marina já está na praça. Depois de tanta reação a um texto curto e simples – “A Candidatura de Marina” -, achei por bem comentar os comentários em um segundo texto.


Tantas reações, tão diferenciadas, desde aqueles que vêem nela a “nova utopia”, substituindo Lula, até os que não vêem aí nada de novo, e acham até nefasta sua candidatura, há uma certeza: sua candidatura provocará grande debate em nível nacional. Portanto, gostando ou não, a candidatura de Marina pode suscitar um intenso debate sobre os rumos do país – já está suscitando -, mas também sobre ela mesma e sua conduta como Ministra.

Se o PV é o lugar, se seria refundado, se é possível uma aliança com Heloísa, se os movimentos sociais viriam para essa batalha, até mesmo se vai merecer um voto, tudo dependeria das costuras, das alianças, do programa que se construiria. O Brasil é o inventor do sócio-ambientalismo e está na hora de virar programa político.

Quanto ao PT, Lula e seu governo tiveram todas as chances. Definitivamente, mesmo com conquistas sociais importantes na ponta – que podem continuar -, Lula não soube, não quis, não mostra vontade de entrar numa economia do Século XXI. É triste, mas é a realidade. Portanto, sair para outras articulações não é só lógico, mas absolutamente necessário.

Marina tem falado praticamente como candidata. Fala em inserir o país no século XXI, vencendo a visão economicista dos séculos passados recentes. Se vai ter coerência para defender essa visão, firmeza, grandeza, ou se vai vergar-se diante dos poderes, como tantas vezes o fez como Ministra, só a história dirá. Mas, ela pode ser o pivô de um novo concerto brasileiro, de forças que estão insatisfeitas com as possibilidades presidenciais já apresentadas e que gostariam de pautar a eleição com esses novos conteúdos que os tempos atuais exigem.

Roberto Malvezzi (Gogó) é Assessor da Comissão Pastoral da Terra – CPT, colaborador e articulista do EcoDebate.

Fonte: EcoDebate, 18/08/2009

segunda-feira, agosto 17, 2009

sucessão


Uma Silva sucessora de um Silva

por Leonardo Boff

A senadora Marina Silva fala à imprensa em 11/08/2008. Foto: José Cruz/Abr


Não estou ligado a nenhum partido, pois para mim partido é parte. Eu como intelectual me interesso pelo todo embora, concretamente, saiba que o todo passa pela parte. Tal posição me confere a liberdade de emitir opiniões pessoais e descompromissadas com os partidos.

De forma antecipada se lançou a disputa: Quem será o sucessor do carismático presidente Luiz Inácio Lula da Silva?

De antemão afirmo que a eleição de Lula é uma conquista do povo brasileiro, principalmente daqueles que foram sempre colocados à margem do poder. Ele introduziu uma ruptura histórica como novo sujeito político e isso parece ser sem retorno.

Não conseguiu escapar da lógica macro-econômica que privilegia o capital e mantém as bases que permitem a acumulação das classes opulentas. Mas introduziu uma transição de um estado privatista e neoliberal para um governo republicano e social que confere centralidade à coisa pública (res publica), o que tem beneficiado vários milhões de pessoas. Tarefa primeira de um governante é cuidar da vida de seu povo e isso Lula o fez sem nunca trair suas origens de sobrevivente da grande tripulação brasileira.

Depois de oito anos de governo se lança a questão que seguramente interessa à cidadania e não só ao PT: quem será seu sucessor? Para responder a esta questão precisamos ganhar altura e dar-nos conta das mudanças ocorridas no Brasil e no mundo. Em oito anos muita coisa mudou. O PT foi submetido a duras provas e importa reconhecer que nem sempre esteve à altura do momento e às bases que o sustentam. Estamos ainda esperando uma vigorosa autocrítica interna a propósito de presumido “mensalão”. Nós cidadãos não perdoamos esta falta de transparência e de coragem cívica e ética.

Em grande parte, o PT virou um partido eleitoreiro, interessado em ganhar eleições em todos os níveis. Para isso se obrigou a fazer coligações muito questionáveis, em alguns casos, com a parte mais podre dos partidos, em nome da governabilidade que, não raro, se colocou acima da ética e dos propósitos fundadores do PT.

Há uma ilusão que o PT deve romper: imaginar-se a realização do sonho e da utopia do povo brasileiro. Seria rebaixar o povo, pois este não se contenta com pequenos sonhos e utopias de horizonte tacanho. Eu que circulo, em função de meu trabalho, pelas bases da sociedade vejo que se esvaziou a discussão sobre “que Brasil queremos”, discussão que animou por decênios o imaginário popular. Houve uma inegável despolitização em razão de o PT ter ocupado o poder. Fez o que pôde quando podia ter feito mais, especialmente com referência à reforma agrária e a inclusão estratégica (e não meramente pontual) da ecologia.

Quer dizer, o sucessor não pode se contentar de fazer mais do mesmo. Importa introduzir mudanças. E a grande mudança na realidade e na consciência da humanidade é o fato de que a Terra já mudou. A roda do aquecimento global não pode mais ser parada, apenas retardada em sua velocidade. A partir de 23 de setembro de 2008 sabemos que a Terra como conjunto de ecossistemas com seus recursos e serviços já se tornou insustentável porque o consumo humano, especialmente dos ricos que esbanjam, já passou em 40% de sua capacidade de reposição.

Esta conjuntura que, se não for tomada a sério, pode levar nos próximos decênios a uma tragédia ecológico-humanitária de proporções inimagináveis e, até pelo final do século, ao desaparecimento da espécie humana. Cabe reconhecer que o PT não incorporou a dimensão ecológica no cerne de seu projeto político. E o Brasil será decisivo para o equilíbrio do planeta e para o futuro da vida.

Qual é a pessoa com carisma, com base popular, ligada aos fundamentos do PT e que se fez ícone da causa ecológica? É uma mulher, seringueira, da Igreja da libertação, amazônica. Ela também é uma Silva como Lula. Seu nome é Marina Osmarina Silva.

Leonardo Boff é autor do livro Que Brasil queremos? Vozes 2000.

* Colaboração de Tita Barreto.

Fonte: EcoDebate, 17/08/2009

sábado, agosto 15, 2009

paz e música

blues e jazz, utopias locais...

Desde uns dois meses atrás queria ir ao Farol Music Bar, no Rio Vermelho, ouvir e assistir o "blues man" Álvaro Assmar, e decidi ir no mesmo dia do aniversário da amiga Neila, 14 de agosto. Ao chegar até lá redescobri o prazer de ouvir a guitarra “chorar” de alegria com o blues, mas encontrar o amigo foi um momento de conversa com um significado histórico, com o resgate de lembranças de um tempo que o desejo de formar uma banda e tocar os sonhos em frente, se fazia sob a luz de ídolos como Jimmy Hendrix, Bob Dylan, Jimi Page, Muddy Waters, James Brown, Robert Johnson, John Lee Hooker, Stevie Ray Vaughan, Joe Pass, B.B. King, Jeff Back etc etc Era anos setenta, e os reflexos dos ventos de Woodstock ainda se fazia sentir, remanescentes da utopia “Paz e Música”, ainda era um alento possível para os quatro jovens aspirantes ao mundo da música começar algo tão simples. Nessa caminhada ia eu, Álvaro, Macedinho, Adelmo (irmão de Álvaro) e “Eginhas” que morava atrás do Colégio Central. Nossos ensaios eram combinados no palco do "teatro" do Colégio Maristas, eram tardes de "criação coletiva", um encontro de "estrelas diferentes", um grupo que apropriadamente chamamos Kaos. Pouco tempo depois os nossos interesses individuais se confrontariam e se adequariam à necessidade das mudanças, de se dedicar aos estudos universitários e à gravidade do mercado de trabalho. Anos se passaram, uns continuariam no encalço peregrino da música, insistindo em seu próprio estilo, e outros na busca da sobrevivência, constituimos família, já que a vida de músico não oferecia promessas, um fato. Até hoje poucos são contemplados pelo “interesse” dos produtores. São as leis do mercado.

Ao relembrar muita coisa dessa época pulo para a nossa realidade de agora e o que percebo é que a vontade de muitos jovens músicos ainda se repete na busca desse sonho, só que apesar de existir um público a espera de outros estilos, da boa música, do som universal como o blues e o jazz, pouco vemos algo ser feito nessa direção, pouco se faz no sentido de divulgação e ampliação desse segmento que obviamente tem seu espaço, tem um público, mas é propositadamente afastada pelo interesse do nicho mercadológico tradicional do carnaval. Interesses que dificultam o fluxo natural de outras opções se expandirem e atender com a rica produção de seus representantes, o seu público, seu resistente ouvinte, uma demanda reprimida.

Claramente, se tornaria mais um atrativo e importante canal de democratização da música local e realização de seus músicos, instrumentistas, profissionais vinculados a outros modos de vida, uma porta que se abre para muitos soteropolitanos e turistas amantes do blues e jazz, muitos que gostam da vida cultural de uma das cidades mais recheada de diferenças, diversidades de paladares musicais, espíritos universais, embora alguns estejam abertamente submetidos a uma indústria de interesses estritamente monopolizadores, sem atentar para os variados modos de viver, sentir, e de prazeres culturais existentes em nossa pobre metrópole.

Acredito que a necessidade de romper horizontes limitados, e a dinamização de outros gêneros musicais se pronunciam cada vez mais forte, possivelmente se fortaleça a partir de projetos culturais de governo (com uma “nova administração” da Secretaria Estadual quem sabe isso se torne possível; apenas devo marcar aqui, que cultura, não se trata apenas de uma questão de gestão, mas é tão necessária quanto a distribuição dos recursos na área), ao incentivar ações onde os profissionais que não vivem do estilo predominantemente carnavalesco venha redesenhar outros padrões, novos modelos que impeçam o crivo do monopólio do axé e do pagode, sem perpetuar a monotonia singular da “madeirada”, que não deve servir de referencial, como única forma de diversão e conhecimento musical, e quiçá aconteça uma real democratização da diversidade da oferta de produção, de nossa musicalidade, que vai ficando anos e anos refém do “padrão global” e de uma clara mediocridade lucrativa de seus produtores interferindo e alterando a geografia das manifestações populares e os espaços culturais históricos da cidade. Falei, to pagando... pra ver!

woodstock, utopias

15/8/2009 03:13:00
Woodstock 40 anos. O poder do som

por Jorge Sanglard

A utopia libertária de Woodstock, 40 anos depois, permanece viva. E volta e meia é reativada pela celebração daqueles três dias de paz e muita música que entraram para a história do século XX. O poder do som e a força das imagens do maior festival de todos os tempos transcenderam as terras da fazenda de Max Yasgur, em White Lake, na cidade de Bethel, Condado de Sullivan, Nova York, e ganharam impulso com os lançamentos de discos e de um documentário. A cada reedição comemorativa, os ritmos e as imagens da Feira de Arte e Música de Woodstock ampliam a reflexão sobre a transformação de costumes desencadeada nos dias 15, 16 e 17 de agosto de 1969.
No livro “Back to the garden” – no Brasil, “Woodstock” –, lançado pela editora Agir, o radialista norte-americano Pete Fornatale mergulha nas impressões de mais de uma centena de personagens que estiveram lá, nos bastidores, no palco, na produção, na grama, na lama, e abre um diversificado leque de opiniões sobre o evento que sacudiu a América. E dá voz a alguns analistas do fenômeno Woodstock. Também marcando as quatro décadas do evento, "Woodstock - 3 Days of Peace & Music" é uma nova edição, em 4 DVDs pela Warner, do documentário "Woodstock - Onde Tudo Começou", de Michael Wadleigh, a síntese visual e sonora do maior ícone do movimento hippie. Uma série de CDs ainda joga mais lenha na fogueira, despertando o interesse na música que abriu alas para eternizar Jimi Hendrix, Santana, Joe Cocker, Richie Havens, Joan Baez, Janis Joplin, Sly & The Family Stone, Country Joe And The Fish e muitos mais.
A Rhino Records - Warner lançou a caixa de 6 CDs “Woodstock - 40 Years On: Back to Yasgur’s Farm”, com 77 músicas, sendo que 38 estavam inéditas em disco. As trilhas sonoras “Music From the Original Soundtrack and More: Woodstock” e “Woodstock 2” também foram remasterizadas e relançadas. E a Legacy / Sony Music articulou a coleção de 5 CDs duplos “Woodstock Experience”, reunindo álbuns originais de 1969 de Janis Joplin, Johnny Winter, Santana, Jefferson Airplane e Sly & the Family Stone e as performances completas de cada um no festival. E, nos Estados Unidos, o Bethel Woods Center for the Arts e o Museum at Bethel Woods ocupam parte da fazenda de Max Yasgur, reúnem a memória do festival e trabalham para que a “volta ao jardim” continue viva.
Pete Fornatale assegura que o festival, sem qualquer intenção prévia, se tornou um manifesto, um símbolo das mudanças que borbulharam na primeira metade e transbordaram durante a segunda metade dos anos 60 nos Estados Unidos. No livro, ele levanta a questão sobre tudo o que rolou durante as 65 horas de som no evento que redefiniu a cultura e os valores de toda uma geração e lançou sementes para além de seu tempo: “Woodstock foi, sem dúvida, o marco principal da grande revolução jovem da época, uma onda de transformação musical, política e social”. A empreitada idealizada por Michael Lang, Artie Kornfeld, John Roberts e Joel Rosenman nasceu de um encontro a partir de um anúncio de jornal e transformou a música e o comportamento do século XX.
O músico Graham Nash sintetizou: “A lenda e o mito de Woodstock se tornaram maiores do que a sua realidade. Foi inegavelmente um tremendo evento social. Muita música de qualidade. Muita diversão para muita gente. Acho que, à medida que o tempo passou, a lenda, o mito de Woodstock, se tornou maior do que a realidade”. A antropóloga Margaret Mead viu tudo como um fenômeno sociológico e assegurou na revista Red, na época, que foi uma confirmação de que esta geração tem, e compreende que tem, sua própria identidade. E David Crosby, em seu livro “Stand and Be Counted”, deu uma pista: “não foi um evento político no sentido tradicional do termo, mas foi tão grande que teve um impacto político semelhante”.
Muitas controvérsias marcaram o festival. Talvez a maior delas é quanto ao número de gente que conseguiu reunir, 400 mil, 500 mil. Pouco importa, era um mar de gente. O certo é que às 17h07 da sexta-feira, 15 de agosto de 1969, uma onda humana como nenhuma outra nos anais da história, como descreve Pete Fornatale, ouvia os primeiros sons de Richie Havens, que fora escolhido na hora para abrir o festival num vôo solo ao violão. Quase três horas depois, já exausto, o músico continuava no palco, a pedido da produção, e não sabia mais o que cantar, já cantara tudo, quando veio a inspiração: “Olhei para a platéia e não conseguia ver o fim dela porque, como se vê no filme, é gente até onde se consegue enxergar. Então olhei para cima e disse ‘liberdade não é o que eles fazem a gente pensar que é, nós já a temos. Tudo que devemos fazer é exercê-la, e é isso que estamos fazendo bem aqui’. Então comecei a tocar umas notas procurando alguma coisa e a palavra saiu, ‘freedom’, e aí, claro ‘Motherless child’, que eu não cantava há uns seis, sete anos, surgiu. Depois apareceu uma parte de uma canção que eu costumava cantar quando tinha 15 anos e entrou no meio. Foi assim que juntei tudo”.
Fornatale esclarece que a performance de Richie cristalizou e iluminou a verdadeira razão subjacente para que aquele meio milhão de pessoas se reunisse ao toque de uma única palavra, repetida mil vezes e ecoada pela multidão: “Freedom, freedom, liberdade, liberdade”. A performance de Havens hipnotizou e seduziu a massa e o músico, segundo Fornatale, parece em transe, transformado, transportado: “ele ainda é a maior encarnação viva do ethos de Woodstock”.
Para o escritor e crítico Bob Santelli, Havens salvou o dia do festival. Mas ainda no primeiro dia nasceu uma inesperada estrela solo, Coutry Joe McDonald, uma inclusão tardia no elenco. O Fish estava escalado só para o domingo, Joe chegou cedo para curtir a abertura do festival, na sexta, e dava bobeira na lateral do palco, quando o apresentador e gerente de produção, John Morris, resolveu convocá-lo. E Joe soltou logo uma adaptação de um grito de guerra que usara antes e soletrou a palavra “fuck” no lugar de “fish”. Segundo o coordenador artístico, Bill Belmont, quando soou “Me dá um F!”, todo mundo sabia o que ia acontecer. O que veio depois está no filme, a multidão inteira gritando “fuck”, uma palavra proibida na América até então. “E, claro, não é só a palavra, mas o significado por trás dela”, esclarece Santelli: “todas as regras e leis tinham ficado do lado de fora dos portões”.
Na opinião de Santelli, “quando se pensa em Woodstock e nas canções da Guerra do Vietnã, se pensa na apresentação de Joe. Foi lendária e importante. Ele se impôs. Foi uma das poucas vezes em que a política foi realmente convidada ao palco e realmente aceita. De modo geral, Woodstock não foi sobre política. Não foi sobre o que estava acontecendo no mundo, as coisas ruins. Foi sobre a criação de um novo mundo, uma nova identidade, uma nova nação, a Nação Woodstock. Não foi sobre tentar resolver a Guerra do Vietnã ou sobre se manifestar e mandar uma tremenda mensagem ao mundo careta e ao governo americano de que queríamos que a guerra parasse. Ainda assim, Joe, da única maneira que ele podia fazer, conseguiu adicionar um elemento político que foi aceito”.
A pobreza, a injustiça, o racismo e o belicismo estavam à solta na “terra da liberdade” e no “lar dos bravos”, assegura Fornatale; afinal, nenhum tema revelou mais o crescente abismo nos Estados Unidos do que o Vietnã: “ao mesmo tempo em que esta geração estava abraçando sexo, drogas e rock’n’roll, aprendia a suportar o choque e o trauma dos assassinatos, os distúrbios e a brutalidade policial. Eram essas as nuvens que pairavam sobre Woodstock, e nada tinham a ver com o tempo”.
A crítica de rock, Ellen Sander, aponta uma pista: “o ano anterior tinha sido muito tumultuado, com muita violência no país e muitos distúrbios. Havia um grande descontentamento no ar, e ele acabou achando um lar em Woodstock. Acho que os assassinatos de Martin Luther King e Robert Kennedy e os distúrbios na Convenção Nacional Democrata criaram o clima e as condições para algo assim. Nós, boomers, crescemos em circunstâncias únicas e fomos atingidos por um monte de coisas que não atingiram as gerações anteriores. A Guerra do Vietnã, todos achávamos ser um conflito injusto e não declarado. Houve muitos protestos contra a guerra. Não creio que alguém jamais saberá a resposta do mistério de Woodstock não ter degringolado em caos e violência – porque todos os elementos estavam a postos – mas, em vez disso, foi muito pacífico. Na época, a gente sentiu que era uma espécie de destino, que seria um caminho para o futuro – de cooperação pacífica, espírito de comunidade, tribalismo, essas coisas. Não saiu bem do jeito que a gente esperava (risos), mas pelo menos existiu naquele fim de semana”.
O diretor Michael Wadleigh aponta Sly Stone como o músico que conquistou a maior reação da platéia no festival. “Quando Sly disse, ‘I wanna take you higher’ (Quero te levar mais alto), a multidão ficou frenética, quando falou, ‘Dance to the music’ (Dance para a música), não havia como deixar de dançar. A música era mais do que poderosa. Sly & the Family Stone capturaram a essência do festival”. E Fornatale conseguiu de Roger Daltrey, do The Who, uma emocionada lembrança: “O sol nascendo em ‘See me, Feel Me’ é a melhor. Quer dizer, foi uma experiência incrível. Assim que as palavras ‘see me’ saíram da minha boca no final de ‘Tommy’, aquele enorme e vermelho sol de agosto começou a surgir no horizonte sobre a multidão. É um show de luz imbatível”. Daltrey ainda esclareceu: “o sucesso e a importância de Woodstock é que foi um triunfo humanista. A platéia foi a estrela”. E Pete Townshend também arrematou: “O que aconteceu depois do show de Woodstock foi milagroso. Todo mundo foi em frente e a América é um país melhor por conta disso”.
Por sua vez, o músico e editor Stan Schnier argumentou: “nada naquele filme se aproxima da energia de Carlos Santana. Foi uma espécie de experiência fora do corpo ver esses caras. Eles eram muito jovens e incendiários. É uma dessas convergências maravilhosas, existia alguma coisa sobre Carlos Santana na época que parecia de outro planeta”. Joe Cocker também ganhou notoriedade depois “do rolo compressor da pièce de résistance que fechava sua performance, uma recriação única de ‘With a Little Help from My Friends’, a canção de John Lennon e Paul McCartney”. Para Michael Wadleigh, “Cocker faz tudo, está dentro daquilo. Ele é um bom exemplo de porque a música dos anos 60 e a década de 60 duraram e presumivelmente vão durar para sempre. São performances e músicas verdadeiramente emotivas, comoventes e fundamentais”.
O encerramento do festival, já na manhã da segunda-feira, 18 de agosto, foi apoteótico, apesar do público reduzido que ficou para ouvir Jimi Hendrix e o grupo experimental Electric Sky Church. Depois de tocar por cerca de duas horas, Hendrix deu o golpe final e tocou a Guerra do Vietnã nas cordas da sua guitarra branca, com direito a toque de recolher, estouro de bombas, metralhadoras disparando e o barulho de helicópteros no céu. Sua interpretação visceral do hino norte-americano “Star-Spangled Banner” simbolizou toda a essência de Woodstock. A Nação Woodstock, enfim, dava seu grito libertador. Daí em diante, é história.
No Brasil, pai e filho avaliam o fenômeno. O psicanalista Jacob Pinheiro Goldberg e o analista da arte anarquista Leonardo Goldberg refletem sobre o festival. Para Jacob, “no imaginário e no simbólico, Woodstock foi a resposta do inconsciente coletivo da humanidade à repressão que culminou com o nazi-fascismo e as ondas conservadoras em todo o mundo (inclusive da esquerda stalinista). Foi o dia em que o superego dançou. A liberação do Id abriu os territórios do prazer, rompendo com os tabus e inaugurando a liberdade enquanto esperança. Embora, posteriormente, cooptado e desfigurado – pelo capitalismo e pela droga – historicamente, o indivíduo num instante épico e dramatizado levou a imaginação ao teatro existencial”. E, segundo Leonardo, "sob um viés piagetiano, se a espécie humana pudesse ser concebida como um único indivíduo, o festival de Woodstock seria sua fase rebelde, a adolescência, o divisor de águas que marcaria a concepção de liberdade num caráter macro”.

Fonte: Cronópios

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